Finlândia aberta aos imigrantes

Mais de uma hora antes da partida do ferry para a capital da Estónia, Tallin, já a rua de acesso ao posto alfandegário na marina de Helsínquia tem uma fila de carros parados, todos de matrícula finlandesa, à espera de embarcar. «Vão às compras, lá é tudo mais barato», diz um jovem funcionário do terminal de mercadorias. Não é necessário visto para viajar entre a Finlândia e a Estónia, e Tallin está apenas a 70 quilómetros de Helsínquia, sendo o golfo da Finlândia percorrido, diariamente. por dezenas de navios.

A menos de quinze meses do alargamento da União Europeia a leste, há quem tente dramatizar dizendo que a Finlândia, um país de fraca imigração, irá, inevitavelmente, ser invadida por milhares de imigrantes oriundos do outro lado do Báltico, mas os finlandeses não parecem preocupados: «Também se dizia isso dos portugueses, espanhóis e gregos, quando entrámos para a UE, que seríamos invadidos por imigrantes. Onde é que eles estão?», questiona em entrevista ao EXPRESSO a Presidente da Finlândia, Tarja Halonen.

É inegável que o país — onde o salário médio ronda os dois mil euros — constitui uma tentação. Porém, há quem pense que a elevada carga fiscal — quase 50% do produto interno bruto — é suficientemente inibidora para abortar à nascença qualquer movimento migratório dos países do Báltico: «Eles teriam de pagar impostos tão altos que acabariam por achar que não compensa», afirma um taxista em serviço perto da marina de Helsínquia.

A Presidente finlandesa não acredita que «haja imigração em massa». O secretário de Estado para os Assuntos Europeus, Alec Aalto, não discorda: «Quando os salários aumentarem na Estónia com a entrada na UE, haverá menos probabilidade de virem imigrantes para a Finlãndia». E se vierem, tal não constituirá um drama: «Nos próximos anos, vamos precisar de mão-de-obra estrangeira, porque a população está a envelhecer. E já hoje precisamos de mais estrangeiros do que os que temos…»

Os finlandeses não parecem recear o alargamento a leste. Pelo contrário, preferem salientar os benefícios, designadamente as excelentes oportunidades de investimento que os países bálticos oferecem. Neste contexto, a relação com a Rússia — com quem a Finlândia partilha mais de 1300 quilómetros de fronteira — assume um papel vital. «As relações são melhores do que nunca, não temos qualquer disputa territorial em aberto, temos poucos problemas políticos e a Rússia não é mais uma ameaça militar», afirma Ari Heikkinen, chefe da Unidade para a Rússia do Ministério dos Negócios Estrangeiros. «Temos ameaças vindas da Rússia a que chamamos leves ameaças à segurança’ — os problemas ambientais e as doenças transmissíveis» — designadamente uma epidemia de sida em S. Petersburgo, cidade muito visitada pelos finlandeses — «e o tráfico de heroína», acrescenta. Por outro lado, o mercado russo está praticamente por desbravar: «A Nokia vende tantos telemóveis na China durante um dia como na Rússia num ano inteiro».

Sete anos após a adesão à UE, a Finlândia convive pacificamente com esse facto: «A UE trouxe-nos segurança económica e no combate ao crime organizado. Cuidar do bem-estar dos nossas cidadãos é mais fácil dentro da União», sublinha Alec Aalto. É, pois, esta Finlândia economicamente confiante e politicamente descomplexada que aguarda o Presidente português, Jorge Sampaio, que na próxima quarta-feira inicia uma visita oficial de três dias — a primeira de um chefe de Estado português ao país dos mil lagos.

Artigo publicado no “Expresso”, a 5 de outubro de 2002