A sofisticação da pirataria marítima é uma ameaça à economia global
Os piratas estão de volta aos mares do Sudeste Asiático. As consequências do “tsunami” de 26 de Dezembro e a súbita quebra nos ataques a embarcações que se lhe seguiu lançaram a dúvida quanto ao futuro da pirataria marítima. Mas a “trégua” revelar-se-ia uma ilusão.
A 12 de Março, 35 homens munidos de armas automáticas e lança-granadas tomavam de assalto um navio-tanque indonésio e raptavam dois membros da tripulação. Dois dias depois, um rebocador japonês era atacado no estreito de Malaca e três tripulantes feitos reféns. Era a confirmação de que a “saison” 2005 da pirataria — iniciada a 28 de Fevereiro com um assalto a um rebocador malaio — começava tarde mas de forma inequívoca.
Em qualquer dos casos, os reféns foram libertados, mas nem sempre o desfecho é feliz. Os piratas de hoje já pouco se assemelham aos dos livros de aventuras. Dispõem de um pesado arsenal e obedecem a autênticas tácticas terroristas. De acordo com o relatório anual do Gabinete Marítimo Internacional (GMI), o ano de 2004 foi o mais violento de sempre, com um total de 30 tripulantes mortos — metade dos quais ao largo da Nigéria.
Estreito traiçoeiro
Segundo o GMI, o número de ataques em todo o mundo diminuiu de 445 em 2003 para 325 no ano passado — excepto no estreito de Malaca.
No mapa das rotas perigosas para o tráfego marítimo, esse canal — 900 quilómetros de mar entre a Malásia e a ilha indonésia de Sumatra — ocupa o primeiro lugar. Visando o roubo de carga para venda no mercado negro ou o rapto de tripulantes para pedidos de resgate, o estreito registou 28 incidentes em 2003 e 37 em 2004.
Todos os anos o estreito de Malaca é atravessado por 50 mil navios e, segundo algumas estatísticas, por um terço do comércio mundial e metade das remessas de petróleo; 90% do crude importado pelo Japão, por exemplo, passa por lá.
Polvilhadas por milhares de ilhas, as águas da Indonésia foram palco em 2004 do maior número de ataques — 93. As autoridades de Jacarta têm acusado o Movimento Aceh Livre — um grupo separatista islâmico que luta pela independência da província de Aceh, no norte de Sumatra — pela crescente sofisticação e violência dos ataques.
A confirmar-se esta aliança entre a pirataria e o terrorismo será caso para temer pela economia global. “Tal como os terroristas aprenderam a pilotar para o 11 de Setembro, podem aprender a ser piratas”, escreve John Burnett, autor de Águas Perigosas: Pirataria Moderna e Terror no Alto Mar. “Fazer encalhar um petroleiro transportando dois milhões de barris de crude num sítio como Batu Berhanti (Indonésia), onde o estreito tem pouco mais de uma milha de largura (1852 metros), fecharia o canal indefinidamente. Atrasar o fornecimento de petróleo à China, Japão e Coreia do Sul provocaria uma crise económica global”.
Artigo publicado no “Expresso”, a 30 de abril de 2005
