
Makan nasceu no Mali. Na quinta-feira, depois de ter percorrido milhares de quilómetros, iludiu as autoridades espanholas e entrou clandestinamente em Melilla. Do seu grupo, de cerca de 500 indivíduos, apenas ele escapou. Desorientado, cruzou-se com a equipa do “Expresso”, que o acompanhou às urgências do hospital. Coberto de chagas, provocadas pelo arame farpado da vedação que trepara, Makan confessou estar só no mundo.
Drama de um refugiado em Melilla
Cerca de 500 clandestinos tentaram, na madrugada de ontem, passar a fronteira entre Marrocos e Melilla, mas apenas Makan conseguiu. O “Expresso” encontrou-o, minutos depois de entrar na cidade, nas imediações do bairro chinês. Coxeava e esboçava, frequentemente, esgares de dor.
As luvas de metalúrgico que trazia nas mãos, e que todos os clandestinos usam para se desembaraçarem do arame farpado no cimo da vedação, estavam rasgadas. Nos pés, já sem sapatos, os dedos escapavam através das meias rotas. Vestia dois pares de calças e uma “T-shirt” por baixo de uma camisa estampada com fotografias de David Beckham.
As jornalistas do “Expresso” solicitaram ao seu taxista que transportasse o homem até ao hospital local. Mas Jossein não quis arriscar. Se as autoridades o apanhassem com um ilegal dentro do veículo teria problemas pela certa.
Enquanto se espera por um carro que o transporte, o clandestino senta-se, com dificuldade, numa pedra na berma da estrada. Em silêncio fixa o asfalto. Entregue aos seus pensamentos, o seu olhar está cada vez mais assustado.
Não se furta à conversa, mas a comunicação é difícil. Fica-se a saber que saltou a vedação sozinho e não encontrou polícias espanhóis. Do lado marroquino, sim, havia espancamentos.
Um autocarro pára e o motorista estende uma garrafa de água. O clandestino tem alguma dificuldade em pegar nela, mas lá consegue molhar os lábios. Queixa-se muito da mão direita e não pára de tremer. Aceita tudo o que lhe é sugerido. Entra nas urgências do Hospital Comarcal pelo próprio pé e desaparece por uma porta. Na recepção, fica um curto registo: “Makan, do Mali”.
Reportagem em Melilla realizada com a fotógrafa Ana Baião. Artigo publicado no “Expresso”, a 7 de outubro de 2005

