“Terrorismo abriu nova frente em Argel”

Uma mulher é consolada no exterior do hospital Zmirli, em Argel, para onde foram levadas as vítimas de um massacre, a 23 de setembro de 1997. Esta foto, que ficou conhecida como “Madonna de Bentalha”, venceu o World Press Photo em 1998 HOCINE ZAOURAR / WORLD PRESS PHOTO

Entrevista a Bruce Riedel ex-agente da CIA e investigador nos Estados Unidos

Há meio ano, Bruce Riedel, antigo agente da CIA durante 29 anos, alertou, num artigo na revista “Foreign Affairs”, para as “oportunidades” que se abrem em África ao extremismo islâmico. Esta semana, em entrevista ao “Expresso”, este investigador da Brookings Institution (Washington) disse que os atentados na Argélia são a prova de que a organização de Osama bin Laden está em força às portas da Europa.

O terrorismo no Norte de África beneficia dos conflitos no Afeganistão e no Iraque?
O que vimos, esta semana, em Argel é uma indicação muito dramática de que a Al-Qaida abriu com sucesso uma nova frente da “jihad” global no Norte de África. Essa frente está a ser muito dirigida por Osama bin Laden e pelos seus comandantes a partir de bastiões ao longo da fronteira entre o Paquistão e o Afeganistão. A escolha de alvos, especialmente o ataque às Nações Unidas, demonstra que é a liderança de Bin Laden que está a tomar as decisões, uma vez que a ONU é um alvo da “jihad” global e não da “jihad” argelina. Nesse sentido, as movimentações da Al-Qaida estão a beneficiar muito da guerra, especialmente no Paquistão e no Afeganistão, que está a correr mal e que lhes está a proporcionar portos de abrigo para desencadearem operações e expandirem a “jihad” para o Norte de África. A guerra no Iraque também os beneficia no sentido de que fornece motivação e é um terreno para desenvolver e testar todos os tipos de novas técnicas.

Podemos então dizer que a seguir ao Afeganistão, ao Paquistão e ao Iraque, a Argélia é o país onde a Al-Qaida está mais activa?
Sim. Há mais de um ano, a liderança da Al-Qaida decidiu afectar recursos para tornar a Argélia a próxima frente da guerra. O objectivo visa não só desestabilizar a Argélia mas também criar uma base no seio da diáspora argelina para atacar a Europa Ocidental, sobretudo a França.

E porquê a França?
A maior comunidade magrebina na Europa está em França. O objectivo é usar a Al-Qaida para o Magrebe Islâmico e penetrar as comunidades argelina, marroquina e tunisina na Europa Ocidental, Portugal incluído. É preciso dizer que a esmagadora maioria dos magrebinos na Europa Ocidental são cidadãos honestos e moderados. A Al-Qaida procura uma pequena minoria para poder recrutar e usar na expansão da “jihad” para fora da Argélia e para dentro da Europa.

Como pode a Europa combater esta ameaça?
Os serviços secretos europeus estão muito concentrados neste problema. Para assegurar a derrota da Al-Qaida no Magrebe e impedir que se instale uma base forte na Argélia há que procurar formas de fortalecer as forças moderadas em Argel. Nos últimos anos, muitos esforços da União Europeia para fazer progredir o Processo de Barcelona foram sensatos. Provavelmente, são precisos mais meios. Uma política inteligente é apostar num Magrebe mais próspero para prevenir a expansão do extremismo islâmico. Outra é intensificar os esforços em redor do núcleo da Al-Qaida no Sul da Ásia, onde está o quartel-general da organização. Isto implica um papel mais forte da NATO no Afeganistão e pressão sobre o Paquistão para que acabe com a permissividade aos portos de abrigo.

Os Estados Unidos preocupam-se com o terrorismo no Norte de África?
Há uma preocupação considerável nos Estados Unidos, mas a Administração Bush afectou todos os recursos da luta contra o terrorismo na guerra do Iraque. Foi um erro nas prioridades porque por muito sério que seja o problema iraquiano não é lá que estão situados os quartéis-generais da Al-Qaida. O centro do movimento para a “jihad” global está no Paquistão e no Afeganistão. Os nossos recursos foram usados erradamente.

A captura de Osama bin Laden deveria ser a prioridade das prioridades?
Sem dúvida. Os ataques desta semana em Argel provam que ele é ainda uma força activa nesta “jihad” global. O comunicado do grupo que levou a cabo os atentados diz que eles seguem Osama bin Laden. Chamam-lhe “o nosso emir”.

DE CASABLANCA A ARGEL

16/05/2003 — Casablanca (Marrocos)
Cinco ataques suicidas contra um restaurante espanhol, um hotel de luxo e um centro judeu matam 45 pessoas.

11/04/2007 — Argel (Argélia)
Várias bombas matam 33 pessoas em ataques reivindicados pela Al-Qaida.

06/09/2007 — Batna (Argélia)
Um ataque suicida, antes de uma visita do Presidente Abdelaziz Bouteflika, mata 20 pessoas e fere 107.

08/09/2007 — Porto de Dellys (Argélia)
Um carro-bomba mata 37 pessoas nas casernas da guarda costeira.

11/12/2007 — Argel (Argélia)
Duas explosões matam 31 pessoas: uma bomba visou o Conselho Constitucional, a outra a representação das Nações Unidas.

(Foto: Pintura exposta no Museu Nacional do Mujahidin, em Argel MARGARIDA MOTA)

Artigo publicado no Expresso, a 15 de dezembro de 2007

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