‘Só se fala euskera’ é a palavra de ordem nas escolas públicas bascas. O castelhano é língua ‘estrangeira’. Reportagem no País Basco

Por esta altura do ano, quando terminadas as aulas, é altura de tratar das matrículas para mais um ano escolar, milhares de encarregados de educação espanhóis sentir-se-ão estrangeiros no seu próprio país. A partir do ano lectivo 2009/2010, no País Basco (Euskal Herria), não será mais possível estudar em castelhano — apenas na língua basca (Euskera).
Um decreto do Governo basco (Eusko Jaurlaritza), que em Setembro será votado no Parlamento local (Eusko Legebiltzarra), converte o basco na principal língua de ensino e o castelhano numa disciplina — dado como que se de um idioma estrangeiro se tratasse.
Alegando pouca procura pelo castelhano, várias escolas públicas ou ‘concertadas’ (centros privados com acordos de subvenção com os Governos regionais) aplicarão esta Lei de Modelo Único já a partir do ano lectivo que arranca em Setembro. Com esta reforma, o Governo basco deseja que, em 2017, todos aqueles que concluírem o ensino obrigatório — até aos 16 anos — dominem de igual modo o “euskera” e o castelhano. Presentemente, 53% dos bascos dizem “não entender” a língua nativa.
Por força dos programas de imersão linguística — que visam transformar crianças monolingues em bilingues —, o número de pessoas que conhece o “euskera” tem vindo a crescer. Porém, apenas 12% dos bascos admitem usar o “euskera” como língua do quotidiano.
Em Bilbau (Bilbo) ou San Sebastián (Donostia), a língua que mais se ouve nas conversas de rua é o castelhano; nas igrejas bascas, há missas bilingues; e nas páginas do ‘Gara’, o jornal conotado com a ala radical basca, a maioria dos textos é escrita em castelhano e só um mínimo de 20% em “euskera”.
Até agora, qualquer encarregado de educação basco podia optar por um de três regimes do ensino obrigatório: o modelo A (integralmente em castelhano, sendo o “euskera” uma disciplina); o modelo D (em que as matérias são explicadas em “euskera” e o castelhano é uma cadeira) e o modelo B (bilingue).
Actualmente, há 158 mil alunos inscritos no modelo D (“euskera”), 72 mil no B (bilingue) e 30 mil no A (castelhano). À medida que os alunos vão avançando nos cursos, o castelhano ganha terreno. Mas Juan José Ibarretxe, o presidente do Governo regional (Lehendakari) que agendou para 25 de Outubro um referendo sobre a autodeterminação do País Basco, quer contrariar a tendência.
O Governo de Madrid pouco ou nada pode fazer. As competências administrativas e legislativas em matéria de Educação pertencem às comunidades autonómicas e o castelhano não está propriamente em perigo.
Impulsionada por um grupo de 18 intelectuais, uma campanha em defesa do castelhano — ‘Manifesto pela Língua Comum’ — é a contestação mais visível à iniciativa basca. Até à meia-noite de quinta-feira, 99.437 pessoas tinham já assinado o ‘Manifesto’ disponível no “site” do jornal ‘El Mundo’, entre as quais Luis Aragonés, o treinador vitorioso na ‘Eurocopa’. “Sou de Madrid e o madrileno popular encanta-me, tenho uma filha quase de Sevilha e adoro o andaluz. Gosto de qualquer língua, mas há que defender a nossa, de capa e espada”, disse Aragonés.
UMA LÍNGUA ENIGMÁTICA
Qual a origem do basco?
Não se sabe bem. Ao contrário das outras línguas do velho continente, o “euskera” não é um idioma indo-europeu. Crê-se que seja falada na região há mais de 8000 anos
Algumas expressões
Muito obrigado — Eskerrik asko
Bom dia — Egun on
Até logo — Gero arte
Provérbio basco
“O pássaro reconhece-se pela plumagem, o boi pelos cornos, o homem pela sua língua”
Artigo publicado no “Expresso”, a 5 de julho de 2008

