O melhor e o pior dos últimos Presidentes

Barack Obama entrou para a história dos Estados Unidos da América ao tornar-se o primeiro chefe de Estado negro. Mas à semelhança dos 18 Presidentes que o precederam — eleitos desde o início do século XX —, Obama somará sucessos e não escapará a reveses

FALTA INFOGRAFIA

Texto Margarida Mota infografia Sofia Miguel Rosa

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 16 de janeiro de 2009. Pode ser consultado aqui

Os ruídos da guerra

Em Gaza, os palestinianos aproveitam a trégua diária para mudar de casa. Do lado israelita, o silêncio dos tanques é vivido com tensão

“Mais uma casa em Gaza destruída por IsraHell” (Hell = Inferno). “Diz-me o que vês…”, pergunta o soldado israelita, mostrado os sapatos de bebé. O outro responde: “Botas de combate” CARLOS LATUFF / WIKIMEDIA COMMONS

Há duas semanas que Noura não se deita tranquila se antes não conseguir telefonar para Gaza. “As comunicações não são fáceis, tenho de fazer várias tentativas, mas não descanso enquanto não ouvir a voz de um familiar — de manhã e à noite”, conta ao Expresso esta dentista palestiniana de 29 anos, a viver em Lisboa.

Do outro lado do Atlântico, uma irmã de Noura — que vive nos Estados Unidos — empenha-se na mesma tarefa. Assim que uma delas consegue falar com a mãe ou com um dos dois irmãos que vivem na cidade de Gaza avisa a outra, de imediato. “A minha família abandonou a nossa casa no primeiro dia de bombardeamentos. A casa, que fica perto da zona dos ministérios, foi logo atingida. Desde então, andam a saltar de uma casa para outra”, diz Noura.

Desde quarta-feira que, durante três horas por dia, Israel acata uma trégua humanitária, possibilitando aos habitantes de Gaza que se abasteçam e procurem locais mais seguros. “Hoje (quinta-feira) falei com o meu irmão. Disse-me que tinha acabado de ir ao banco. Algumas lojas abriram, mas outras não se arriscaram”, continua Noura.

Os habitantes de Gaza orientam-se pelo barulho das explosões e tentam assim fintar o próximo raide. Imad Eid, de 36 anos, também enveredou por uma vida de saltimbanco. “Fui a casa a última vez há uma semana, levar comida à minha família”, disse ao Expresso, na quinta-feira, este jornalista da agência palestiniana Maan. “Levo-os de um sítio para o outro, mas não é seguro. Tenho cinco filhos, o maior tem 12 anos e o mais pequeno um. A minha mãe tem 75 anos e não se mexe. Tenho de transportá-la nos meus braços, de um lado para o outro. Às vezes, não encontro leite para o meu bebé”, diz.

Já morreram 169 crianças — cerca de 50% da população de Gaza tem menos de 15 anos. Até ao fecho da edição, o Centro Palestiniano para os Direitos Humanos contou 712 vítimas. Morreram também oito militares israelitas.

Israel ignorou o GPS

Um dos episódios mais marcantes dos primeiros 13 dias de guerra aconteceu na quarta-feira, quando o fogo israelita atingiu a escola feminina de Al-Fakhura, provocando 42 mortos. Gerida pelas Nações Unidas, a escola abrigava centenas de civis que procuravam proteger-se dos bombardeamentos —  como acontece em 23 das 200 escolas geridas pela ONU na Faixa de Gaza.

Israel diz que respondeu a disparos vindos do interior da escola. “Investigámos o incidente e podemos dar 99,9% de garantias de que não havia militantes (do Hamas) na escola”, respondeu ao Expresso Christopher Gunness, porta-voz da Agência da ONU para os Refugiados Palestinianos (UNRWA). Gunness garante que as Nações Unidas forneceram aos israelitas as coordenadas de GPS dos seus edifícios. “Pedimos às autoridades de Israel que respeitem a neutralidade da ONU”, disse.

A escola atingida pertence ao campo de refugiados de Jabalia, a norte de Gaza, criado em 1948 para receber 35 mil palestinianos, subitamente despojados das suas terras após o nascimento do Estado de Israel. Hoje, nesse campo, a ONU tem registados 106.691 refugiados… Os albergues há muito que deixaram de ser tendas — agora são edifícios em cimento —, mas as condições continuam precárias. Os refugiados são cidadãos de segunda e carregam o estigma de um povo sem Estado — este é, aliás, um dos dossiês de mais difícil resolução no processo de paz israelo-palestiniano.

O pesadelo dos refugiados arrasta-se há 60 anos. Cada nova geração é mais permeável à violência e ao extremismo do que a anterior. Em Dezembro de 1987, foi precisamente no campo de Jabalia que começou a Intifada.

Até quinta-feira, sete dos oito campos da Faixa de Gaza — onde moram, ao todo, quase meio milhão de refugiados — tinham já sido atingidos. “Israel mostra um total desprezo pela vida humana”, denunciou ao Expresso Hamdi Shaqqura, porta-voz do Centro Palestiniano para os Direitos Humanos. “Se eles quiserem atingir um membro da resistência, não hesitarão, mesmo que ele esteja entre 100 pessoas. Farão tombar as 100.”

AO TELEFONE, DESDE GAZA

“Isto é guerra! É como no Iraque e no Afeganistão. Há ataques aéreos a toda a hora, tiros, bombas que explodem ao mesmo tempo. É impossível viver” (Imad Eid, jornalista)

“Não sei quais são as motivações de Israel. Olhando para todo este horror, para a destruição de vidas civis. Espero que alguém diga basta!” (Christopher Gunness, ONU)

Artigo escrito em colaboração com Cristina Pombo

COMO CONTAR AS VÍTIMAS?

A guerra de números sobre as vítimas dos combates em Gaza assumiu contornos surpreendentes no final de 2008, quando a ONU excluiu da contagem de baixas civis um funcionário seu morto pelos ataques israelitas. A organização falou em 62 vítimas civis, mas só incluiu nesse total as mulheres e crianças. O responsável das Nações Unidas para os Assuntos Humanitários, John Holmes, explicou que, embora soubesse que nem todos os homens palestinianos mortos eram militantes do Hamas, era impossível distinguir estes dos civis. Disse querer dar um número mínimo de mortos, sem exageros, e negou que este método de contagem se destinasse a favorecer os interesses de Israel. Órgãos de comunicação como a BBC citaram os números de Holmes sem esta precisão, o que gerou reacções indignadas em blogues e obrigou a emissora britânica a corrigir textos. A porta-voz de Holmes, Stephanie Bunker, admite ao Expresso que “o subsecretário-geral não devia ter falado da contagem de civis”. “Eram os números de que dispúnhamos, mas não há forma de saber quantos civis morreram. O que podemos dizer é que uma porção significativa do total de mortos e feridos corresponde a civis”, acrescenta a representante da ONU.

HAMAS VERSUS ISRAEL

1988
O Movimento de Resistência Islâmica (cujo acrónimo — Hamas — significa zelo) publica a Carta Constitutiva: defende a libertação da Palestina e o estabelecimento de um Estado islâmico do Mar Mediterrâneo ao rio Jordão. A primeira Intifada começara na Faixa de Gaza havia oito meses e o Hamas emergira como grupo activo, à margem da Organização de Libertação da Palestina (OLP). O Hamas assenta a sua força no facto de ser, sobretudo, um movimento social, com uma vasta rede de escolas, mesquitas e serviços de saúde. Israel viu nessa popularidade um útil contrapeso ao protagonismo da OLP e foi condescendente em relação às acções sociais do Hamas.

1989
O líder espiritual do Hamas, Ahmed Yassin, ordena o rapto de soldados israelitas dentro de Israel, para funcionarem como moeda de troca com prisioneiros do Hamas. Foi preso e condenado a duas penas de prisão perpétua e o Hamas ilegalizado.

1991
São criadas as Brigadas Izz Al-Din Al-Qassam. Numa primeira fase, raptavam e sequestravam suspeitos de cooperarem com Israel. O assassínio de um cidadão israelita, em Dezembro, marcou uma mudança no modus operandi das Brigadas.

1994
Em Fevereiro, o massacre de Hebron — o colono Baruch Goldstein mata 29 palestinianos — encoraja os ataques suicidas. A Autoridade Palestiniana (AP), liderada por Yasser Arafat, inicia uma campanha contra o Hamas. Em 1997, na Jordânia, a Mossad tenta assassinar Khaled Meshaal, o líder político do Hamas no exílio. Para recuperar os dois agentes envolvidos, Israel liberta Ahmed Yassin.

2000
Durante a segunda Intifada, Israel responde aos atentados do Hamas com assassinatos selectivos: os dois fundadores do Hamas (Ahmed Yassin e Abdel Aziz al-Rantissi) são abatidos.

2006
O Hamas vence a Fatah nas eleições. A comunidade internacional exige que o Hamas reconheça Israel. O Governo de unidade palestiniano fracassa e, em Junho de 2007, o Hamas toma de assalto os edifícios da AP em Gaza.

Artigo publicado no Expresso, a 10 de janeiro de 2009

Um terço das vítimas são crianças

O número de mortos não pára de aumentar: em 12 dias já morreram quase 700 pessoas em Gaza, entre as quais 220 crianças. Israel quer punir o Hamas, mas os civis não estão a salvo

ILUSTRAÇÃO DE CARLOS LATUFF

A guerra na Faixa de Gaza pode estar para durar. Na quarta-feira, os doze ministros que compõem o gabinete de segurança de Israel aprovaram a continuação da operação militar naquele território palestiniano. Depois dos bombardeamentos aéreos e da incursão terrestre, está agora em causa uma terceira fase que passa pela penetração nas zonas mais populosas.

Ao 12º dia da incursão israelita, Gaza é uma cidade sitiada pelos tanques israelitas. Na quarta-feira, um cessar-fogo de três horas, que Israel decretou por razões humanitárias, permitiu a entrada no território de 80 camiões com mantimentos e combustível industrial. As populações formaram fila para se abastecer e as organizações humanitárias aproveitaram a aberta para socorrer os necessitados. Israel diz que apenas quer punir o movimento islâmico Hamas, que controla a Faixa de Gaza, mas as agências humanitárias denunciam uma crise “total”. Desde o início da operação, já terão morrido 693 palestinianos, entre os quais 220 crianças.

Na terça-feira, o bombardeamento de uma escola gerida pela ONU, no campo de refugiados de Jabalia, perto de Gaza, resultou na morte de cerca de 40 pessoas. Centenas de pessoas tinham procurado segurança à sombra da bandeira da ONU. Cerca de 1,5 milhões de palestinianos estão impedidos de sair do território. Inversamente, muitos jornalistas acumulam-se no lado israelita da fronteira, proibidos de entrar na Faixa de Gaza. De longe, os repórteres vão dando conta do barulho da guerra, designadamente das sirenes de alerta nas cidades israelitas mais próximas da fronteira que apitam sempre que o Hamas dispara mais um roquete a partir de Gaza.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 7 de janeiro de 2009. Pode ser consultado aqui

Conflito israelo-palestiniano: Os dois lados da guerra

O embaixador de Israel e a delegada-geral da Palestina explicam ao Expresso os contornos da ofensiva em Gaza

ILUSTRAÇÃO CARLOS LATUFF

Entrevista com Randa Nabulsi, delegada-geral da Palestina em Portugal

Entrevista com Aaron Ram, embaixador de Israel em Portugal

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 3 de janeiro de 2009. Pode ser consultado aqui