Separados pelo Golfo, árabes e iranianos não morrem de amores uns pelos outros. Em Abu Dhabi, a cimeira do Conselho de Cooperação do Golfo espelha essa inimizade. Reportagem nos Emirados Árabes Unidos

Khalid não gosta de iranianos. Nunca visitou o Irão nem tem curiosidade. Basta-lhe o contacto com os iranianos que trabalham no seu país — os Emirados Árabes Unidos —, sobretudo em oficinas de reparação de automóveis, e o interesse esgota-se. “Bem, no fundo, eles devem ser como qualquer povo”, diz condescendente. “Há boas e más pessoas…”
Natural de Sharjah e a trabalhar como motorista em Abu Dhabi — dois dos sete territórios que constituem os Emirados Árabes Unidos —, Khalid prefere os passeios de carro com a mulher e os quatro filhos até qualquer um dos países vizinhos a atravessar o Golfo e dar uma saltada ao Irão. Para além da antipatia, trata-se também de uma questão prática…
Para um cidadão dos Emirados Árabes Unidos, um fim de semana passado no vizinho Qatar, por exemplo, é apenas uma questão de quilometragem. Os dois países — juntamente com a Arábia Saudita, o Kuwait, Omã e o Bahrain — formam o Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) que, à semelhança da União Europeia, é uma organização que visa a integração regional e que, nesse sentido, privilegia a circulação de cidadãos dos seus Estados membros. Chegado à fronteira, Khalid apenas terá de mostrar o bilhete de identidade — não precisa de passaporte, muito menos de visto.
WikiLeaks ateia a chama
Esta terça-feira, termina em Abu Dhabi, a 31ª cimeira anual do Conselho de Cooperação do Golfo, ao nível dos chefes de Estado. A reunião foi dominada por preocupações de segurança regionais, que vão desde o terrorismo interno na Arábia Saudita até ao aumento do extremismo no Iémen.
A recente revelação, pela WikiLeaks, de que os sauditas, em privado, ter-se-iam mostrado favoráveis a um ataque militar contra o Irão veio aumentar a tensão entre as duas margens do Golfo Arábico, para os países da margem ocidental (árabes); chamado de Pérsico pelos iranianos.
Aproveitando a presença em solo emirati, o emir do Kuwait não perdeu a oportunidade para recordar disputas antigas e, na sessão de inauguração da cimeira, apelou ao “fim da ocupação iraniana” de três ilhas reclamadas pelos Emirados Árabes Unidos desde 1971.
As conclusões finais da cimeira serão conhecidas esta terça-feira. Com uma nova ronda de conversações em curso, em Genebra, entre o Irão e o grupo dos 5+1 (os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança e a Alemanha) sobre o programa nuclear de Teerão, o Conselho de Cooperação do Golfo não deixará de tomar posição.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 7 de dezembro de 2010. Pode ser consultado aqui