O Kuwait é a mais recente missão diplomática em Lisboa. Na quinta-feira, Sulaiman Ibrahim Al-Murjan apresentou as credenciais de embaixador a Cavaco Silva. Ao “Expresso”, comentou a turbulência política no Médio Oriente
Como está o Kuwait a seguir os protestos no mundo árabe?
Claro que estamos preocupados. Mas há alguma razoabilidade neste movimento. Infelizmente, houve Presidentes que deveriam ter percebido as exigências do seu povo desde o início.
Os protestos não o surpreendem…
Não. Surpreende-me talvez a sua dimensão. Mas como é possível um Presidente conservar o poder durante décadas? Repúblicas não são reinos! É inaceitável a forma violenta como a Líbia está a lidar com os protestos. Esperemos que os líderes árabes estudem e compreendam o que se passa. E que tudo decorra de forma pacífica. Não tenho dúvidas que no Egito os militares vão entregar o poder aos civis.
Teme o contágio a outras repúblicas?
Sim. Nas monarquias, o povo exige reformas, não contesta os regimes. Vemos isso em Marrocos, na Jordânia e no Bahrain. A influência do que se passou na Tunísia e no Egito na população árabe e, sobretudo, os media, tudo contribui para a mudança. Antes, os regimes tratavam os povos como queriam porque ninguém sabia. Agora, é impossível, graças a esta revolução da comunicação, que é muito positiva.
E como é a situação no Kuwait?
Já passámos por isto em 1961, quando acedemos à independência e adotámos uma Constituição democrática. Temos um Parlamento que ‘mostra os dentes’ e que questiona o primeiro-ministro, que pertence à família real. O Parlamento tem 50 lugares — quatro mulheres — e é eleito por sufrágio universal. No Governo, há uma ministra, na pasta da Educação.
Há manifestações no Kuwait?
Agora não. No início do mês, houve protestos a pedir a substituição do ministro do Interior — e conseguiram. O primeiro-ministro britânico, David Cameron, falou, esta semana, no Parlamento kuwaitiano e disse que a região vive “uma oportunidade preciosa”… Tem razão. O Médio Oriente está sob pressão. O que se está a passar nas ruas árabes não é uma interferência do Ocidente, tem origem no povo. Ninguém esperava uma coisa desta dimensão e com este sucesso. Mas não é negativo. Está a trazer grandes mudanças à região. É um tsunami no mundo árabe.
Teme a emergência de regimes extremistas islâmicos após estas revoluções?
Fala-se muito da Irmandade Muçulmana no Egito. São os mais bem organizados, mas são uma minoria. Além disso, a Irmandade é um movimento político. Está representada no Parlamento do Kuwait — não ultrapassa os 10-15%. Se reprimirmos a sociedade, vão surgir movimentos radicais. No Kuwait, há grupos islamitas, mas nunca usaram a violência, apesar de acolhermos bases militares dos EUA. E porquê? Somos uma democracia. Os Irmãos estão no Parlamento, falam nos media. Se lhes dermos oportunidade de se expressarem não há razões para preocupação, mas se os esmagarmos isso pode abrir as portas a atos terroristas.
Artigo publicado no “Expresso”, a 26 de fevereiro de 2011





