Egípcios aproveitam a liberdade para… protestar

De volta ao trabalho, muitos egípcios aproveitaram o espírito da revolução para reivindicarem regalias. Na praça Tahrir, permanecem umas centenas de irredutíveis manifestantes. Reportagem no Egito, com fotos de Jorge Simão

Às primeiras horas de liberdade, os egípcios começaram a… reivindicar. Em várias zonas do Cairo, grupos de pessoas juntaram-se em frente a edifícios públicos para pedirem aumentos salariais e melhores condições de vida. Junto ao ministério da Habitação, pedia-se uma casa nova. Junto à Misr Insurance, dezenas de funcionários da seguradora exigiam a demissão do “manager”.

A manifestação mais aparatosa aconteceu em frente ao ministério do Interior com milhares de polícias a exigirem aumentos salariais. Algumas horas de protestos deram frutos, com os agentes a verem algumas das suas exigências atendidas.

O dia começou quente no Cairo. Às primeiras horas da manhã, centenas de soldados dirigiram-se à praça Tahrir com dois objetivos em mente: abrir a praça ao trânsito — domingo é o primeiro dia da semana de trabalho no Egito — e retirar as tendas montadas na rotunda durante as manifestações anti-regime.

À espera de um calendário

Algumas centenas de manifestantes pessoas permaneciam na praça. Entre elas estava Ragi, um médico de 23 anos acabado de formar. “Precisamos que o exército nos apresente um calendário. Queremos saber qual vai ser o próximo passo”, dizia. Ragi dizia que na praça havia muitas pessoas oriundas de fora do Cairo.

O trabalho do exército decorreu entre momentos de tensão. Mas ao final da manhã, a praça Tahrir estava irreconhecível. Aos poucos, havia também cada vez mais automóveis a circular sobre as mensagens de liberdade pintadas, na véspera, no chão da praça.

Era perceptível que os irredutíveis que ali permaneciam já não eram representativos dos milhões que passaram pela praça nos 18 dias que durou a contestação. Percebia-se também que o futuro da revolução já não se joga na praça Tahrir, mas nos palcos políticos.

As primeiras horas de liberdade no Egito foram marcadas por protestos JORGE SIMÃO

Vida a caminho da normalidade

A custo, o Cairo tenta recuperar a normalidade. Há cada vez mais negócios abertos, gente atarefada nas suas vidas e o trânsito é cada vez mais caótico. A estação de metro da praça Tahrir — chamada Sadate — recomeçou a funcionar e a polícia está de regresso às ruas. No Nilo, os barcos de recreio estão preparados para recomeçar a funcionar.

Com o cair da noite, os néons dos edifícios reacenderam-se. E, recuperando o hábito dos dias recentes, muita gente começou a afluir à praça Tahrir. Já não se gritavam slogans anti-Mubarak, nem havia discursos pela noite dentro. Mas milhares de pessoas circulavam a pé e havia um engarrafamento monumental em direção à praça. Muitos carros buzinavam — não de irritação mas ainda de celebração.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 13 de fevereiro de 2011. Pode ser consultado aqui

DOSSIÊ CRISE NO EGITO NO SITE DO “EXPRESSO”

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