Acossado pela contestação interna e internacional, Muammar Kadhafi diz-se firme no poder. A sua influência no exército e as sensibilidades tribais podem dificultar uma eventual entrega do poder aos militares
Ao fim de 41 anos no poder, Muammar Kadhafi é um homem cada vez mais só. Com os jornalistas estrangeiros impedidos de entrar no país, os relatos chegam a conta-gotas e dão conta do alastramento dos confrontos desde a região de Benghazi (no leste) até à capital, Tripoli. E nos corredores da diplomacia, vários embaixadores líbios, após demitirem-se das suas funções, estão a apelar a uma intervenção internacional.
Num discurso à nação, Muammar Kadhafi afirmou, hoje, a sua autoridade e determinação perante a contestação. Mas, na realidade, a sobrevivência do seu regime e a sua própria continuidade em terras líbias depende menos da sua vontade e mais da lealdade de duas instituições: o exército e as tribos.
Primeiro a tribo
Apesar do tribalismo continuar a ser visto como um obstáculo à mobilidade social, à igualdade de oportunidades e ao desenvolvimento da sociedade, muitos líbios continuam a identificar-se, prioritariamente, com uma tribo. Pertencer a uma tribo pode abrir portas nos serviços públicos, garantir um emprego ou resolver disputas familiares.
A rivalidade tribal é evidente, inclusivé, no coração do exército, onde os Qadhadfa — tribo à qual pertencem os Kadhafi — rivalizam com os Magariha. Há dias, Saif al-Islam, de 38 anos, apontado como o sucessor do coronel, alertou para a possibilidade de uma guerra civil no país, com membros de diferentes tribos a “matarem-se uns aos outros nas ruas”.
Solução à egípcia?
Mas não são apenas as sensibilidades tribais que podem condicionar o comportamento do exército durante a revolta popular. Ian Black, analista do diário britânico “The Guardian”, cita fontes não confirmadas para referir que a repressão em Benghazi está a ser dirigida por Jamis, um dos filhos de Muammar Kadhafi, que comanda uma unidade de forças de elite.
Na região, estará também Saadi, outro dos sete filhos do coronel, juntamente com o chefe da inteligência militar, Abdullah al-Senusi. A preponderância dos Kadhafi nas Forças Armadas pode dificultar um cenário “à egípcia” para a Líbia: a demarcação do exército em relação ao regime para assumir o controlo da situação.
(FOTO Manifestação em Bayda, no litoral nordeste da Líbia, a 22 de julho de 2011 WIKIMEDIA COMMONS)
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 22 de fevereiro de 2011. Pode ser consultado aqui