Após dez meses de protestos, o Presidente do Iémen abdicou do poder. Mas a estrutura do regime permanece intacta

Nesta semana, foi anunciada a queda de mais um ditador, acossado por manifestações populares — o quarto, no âmbito da chamada Primavera Árabe. Na quarta-feira, na capital da Arábia Saudita (Riade), Ali Abdullah Saleh — Presidente do Iémen desde há 33 anos — assinou um acordo de transferência de poder para o seu vice-presidente, Abd Rabbuh Mansur al-Hadi, a concretizar-se num prazo de 30 dias.
Porém, o acordo — que deixa intacta a atual estrutura de Governo — não tranquilizou os manifestantes iemenitas que continuaram a sair às ruas para exigir o fim do regime.
Os manifestantes contestam ainda a imunidade concedida a Saleh e família — e exigem o seu julgamento —, suspeitos de acumular, em bancos estrangeiros, grandes fortunas desviadas do erário público do Iémen, o país mais pobre do mundo árabe.
Saleh conservará o título de Presidente, mesmo após a transferência total de poderes para o vice-presidente. Este formará um governo de unidade nacional, liderado por uma figura da oposição, e organizará eleições presidenciais dentro de 90 dias.
Protegido pelos Estados Unidos, que o via como um precioso aliado na luta contra a Al-Qaida, Saleh segue nos próximos dias para Nova Iorque para receber tratamentos médicos. O atentado de que foi alvo, a 3 de junho, em Sana’a — que lhe perfurou um pulmão e queimou o rosto — ainda deixa mazelas consideráveis.
O ‘quintal’ saudita
Elaborado em abril pelo Conselho de Cooperação do Golfo — de que fazem parte Arábia Saudita, Kuwait, Bahrain, Qatar, Emirados Árabes Unidos e Omã —, este acordo é a prova de que o gigante saudita não tolera instabilidade nas suas fronteiras. Anteriormente, já Riade enviara para o Bahrain 30 veículos militares para ajudar a conter a revolta popular: o poder bahraini é sunita (como a Arábia Saudita) e a maioria da população é xiita (como o Irão, do outro lado do Golfo Pérsico).
No Iémen, a situação requer igual cuidados. Cerca de 35% da população são xiitas. E sendo o Iémen o país que acolhe um dos braços mais ativos da Al-Qaida — a Al-Qaida na Península Arábica —, os sauditas não abdicam de uma vigilância permanente.
Artigo publicado no “Expresso”, a 26 de novembro de 2011
