Espectro do terrorismo islamita volta a assustar

Dois atentados suicidas frustrados mostram o risco do terrorismo no país onde nasceu a Primavera Árabe e onde o Governo islamita moderado agoniza

Não passou de um susto, mas as duas tentativas de ataques suicidas, esta semana, na Tunísia provam que a ameaça terrorista está a ganhar dimensão. Quarta-feira de manhã, um homem fez-se explodir numa praia junto ao turístico Hotel Riadh Palm, na cidade costeira de Sousse, após ser descoberto.

Horas depois, em Monastir, igualmente na costa, as forças de segurança neutralizaram um suicida de 18 anos que planeava detonar a sua carga junto ao mausoléu do ex-Presidente e líder da independência tunisina Habib Bourguiba.

Vários suspeitos foram detidos e a segurança foi reforçada. Segundo Mohamed Ali Laroui, porta-voz do Ministério do Interior, o grupo salafita Ansar al-Sharia (Defensores da lei islâmica literal) está envolvido. O Governo de Tunis já o tinha rotulado de “organização terrorista”.

Na véspera desta jornada tensa, o embaixador português em Tunis alertava, numa conferência no Instituto de Defesa Nacional, em Lisboa, para o “fenómeno perigoso e imprevisível” que constitui o salafismo jihadista na Tunísia. “Pela primeira vez, ouço tunisinos reconhecerem que há um problema de terrorismo que tem de ser enfrentado”, disse Luís Faro Ramos.

Farol da Primavera Árabe, a Tunísia encontra-se num impasse quase três anos após a queda do ditador Ben Ali. “Hoje, a situação política assemelha-se a um processo de ajustamento de placas a seguir a um tremor de terra”, explicou o embaixador.

Ao ritmo das estações

Para este diplomata, desde a revolução de 14 de janeiro de 2011 o processo tunisino já percorreu todas as estações do ano. “A primavera durou até às eleições de outubro de 2011, ganhas pelo partido islamita Ennahda. O resultado surpreendeu muitos tunisinos que não se tinham dado conta que por baixo da ‘Tunísia de Ben Ali’ havia um país diferente. A vitória islamita iniciou um verão que se transformou em outono a 6 de fevereiro de 2013 quando se registou o primeiro assassínio político (do opositor Chokri Belaid). O outono transformou-se em inverno a 25 de julho com o segundo assassínio (do opositor Mohamed Brahmi). Agora, a primavera volta a espreitar.”

Na semana passada, islamitas (no poder) e oposição iniciaram um “diálogo nacional”. Sobre a mesa está a aprovação da Constituição, a escolha de um novo Governo provisório e a realização de eleições legislativas e presidenciais. Para Faro Ramos, o país tem instrumentos que podem contribuir para o cumprimento desses desafios: capacidade de diálogo, propensão para o consenso e aversão à violência e, ainda, “não-papel” das Forças Armadas, que se têm mantido equidistantes. “O tunisino privilegia a concertação o que, às vezes, pode criar a impressão de que as coisas demoram. Na verdade, as coisas vão-se fazendo, ao ritmo deles.”

(IMAGEM PIXABAY)

Artigo publicado no Expresso, a 2 de novembro de 2013

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