Chegado a Lisboa há cerca de meio ano, o embaixador kuwaitiano recorda que o seu país foi pioneiro na ajuda aos refugiados
O êxodo de milhões de pessoas para fugir aos conflitos no Médio Oriente colocou sob fogo os países árabes ribeirinhos do Golfo Pérsico. Por que razão as ricas petromonarquias não se mostravam disponíveis para acolher refugiados? “É para a Europa que os refugiados querem ir, e não para a região do Golfo”, justifica o embaixador do Kuwait em Portugal, Fahad Salim al-Sabah, em entrevista ao “Expresso”. “Ninguém pediu para ir para o Kuwait. Os refugiados querem ir para a Europa e para a América.”
O diplomata, membro da família real que governa o território desde o século XVIII, garante que o Kuwait está de portas abertas para receber refugiados sírios. “Há uma grande comunidade de sírios [cerca de 120 mil] que vive no país há dezenas de anos. Se tiverem familiares em situações difíceis na Síria, estes podem vir diretamente para o Kuwait. A Síria é um país em agonia e nós estamos atentos a isso.”
A guerra na Síria dura há mais de cinco anos e há quatro que o Kuwait se empenha na realização de conferências internacionais de doadores. A 30 de janeiro de 2013, quando ainda ninguém tinha ouvido falar do autodenominado Estado Islâmico (Daesh) nem a crise dos refugiados assumira as proporções atuais, o Kuwait acolheu a primeira cimeira do género. “O emir Sabah Al-Ahmad Al-Jaber Al-Sabah [no trono desde 2006] previu o que acabou por acontecer. Ele é o decano mundial dos ministros dos Negócios Estrangeiros, exerceu o cargo durante 40 anos [1963-2003]. Tem uma visão estratégica de longo prazo.”
No conjunto das quatro conferências de doadores já organizadas desde 2013 — as três primeiras na Cidade do Kuwait —, já foram angariados quase 18 mil milhões de dólares (16 mil milhões de euros). Para esse bolo, o Kuwait contribuiu com 1600 milhões de dólares (1400 milhões de euros). “O emir é um humanista. Percebeu desde o início desta crise que o problema era sério, quando outros pensavam que era temporário e que terminaria em meses. Ele conhecia as consequências e previu o efeito bola de neve.”
Portugal sem embaixada
Chegado a Lisboa há meio ano, Fahad Salim al-Sabah é apenas o segundo diplomata kuwaitiano desde 2010, ano em que foi aberta a embaixada. Inversamente, Portugal não tem embaixada no Kuwait — é o diplomata nos Emirados Árabes Unidos quem representa Portugal. “Estou ansioso por ver um embaixador português no Kuwait de forma a que possa transmitir informações aos empreendedores e às empresas portuguesas sobre o meu país.”
As trocas comerciais entre os dois países são modestas. Dados da AICEP referentes a 2015 revelam que o Kuwait está em 76.º lugar na lista de clientes de Portugal (compra sobretudo produtos agroalimentares, eletrodomésticos, calçado, madeira e papel) e em 95.º na de fornecedores. O embaixador já começou a visitar o país e confessou-se impressionado com o Centro de Incubação de Empresas de V. N. de Gaia (INOVAGAIA). Quer ir também para sul, apreciar o sector do turismo.
“Estou ansioso por ver um embaixador português no Kuwait. Seria uma ajuda às empresas portuguesas”
Com quatro milhões de habitantes (dois terços são imigrantes), o Kuwait é o 10.º produtor mundial de petróleo e o 4.º maior exportador. A baixa do preço do crude no mercado internacional não apanhou o país desprevenido. “Conseguimos estabilizar a situação porque diversificámos os nossos investimentos internacionais nos anos 70. Investimos em todo o mundo, em todos os mercados.” Portugal está na agenda.
(Foto: Placa no muro da Embaixada do Estado do Kuwait, em Lisboa MARGARIDA MOTA)
Artigo publicado no “Expresso”, a 9 de abril de 2016
