Projeções dão menos deputados a Netanyahu, mas melhores condições para formar coligação

Duas sondagens à boca das urnas dão a vitória à aliança Kahol Lavan (centro) sobre o Likud (direita) do primeiro-ministro israelita. Uma terceira coloca-os empatados. Por blocos políticos, a direita leva vantagem, o que confere a Benjamin Netanyahu melhores condições para formar coligação

Duas horas após o encerramento das urnas em Israel (eram 20h em Lisboa), começaram a ser divulgados os primeiros resultados oficiais das eleições legislativas desta terça-feira.

Com 29 mil boletins contabilizados, a aliança Kahol Lavan (Azul e Branco) assumiu a liderança com 30,3% dos votos, seguida pelo Likud, do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, com 24,2%.

Os israelitas anseiam pela contagem final dos votos, após as projeções à boca das urnas anunciadas pelas televisões, após o fecho das urnas, terem semeado a confusão entre eleitores e analistas ao não preverem um vencedor claro.

Netanyahu perde em duas, empata noutra

O Channel 11 atribui 37 deputados à aliança Azul e Branco, liderada por Benjamin (“Benny”) Gantz e Yair Lapid, e 36 ao Likud.

No Channel 12, a vantagem de Gantz é maior: 37 contra 33. E o Channel 13 dá um empate, com 36 parlamentares cada.

O diário israelita “Haaretz” fez uma média dos resultados das três televisões que dá a liderança à formação de Gantz com 37 deputados, seguido pela de Netanyahu com 35.

O diário israelita “Haaretz” fala de “resultados chocantes que destruíram as esperanças do primeiro-ministro de Israel numa vitória fácil”.

A seguir à Kahol Lavan e ao Likud surgem três partidos com sete parlamentares cada: os dois religiosos ultraortodoxos (Shas e União da Torah Unida) e o histórico Partido Trabalista. Só depois surge o primeiro partido árabe, o Hadash-Ta’al, com seis deputados.

Em causa estão 120 lugares no Parlamento de Israel (Knesset). Para eleger um deputado, um partido tem de obter pelo menos 3,25% dos votos.

‘Vitória’, cantaram os dois lados

Num país que sempre teve governos de coligação, são importantes também os resultados por blocos políticos. O Channel 12 atribui exatamente 60 deputados aos partidos de direita, 48 aos partidos que se enquadram no centro-esquerda e 12 aos partidos árabes. O Channel 13, porém, dá uma maioria à direita de 66 contra 54 dos restantes.

Com tudo ainda por decidir, os dois líderes já se vitoriaram de forma enfática. Netanyahu reagiu no Twitter, mas parece só ter valorizado os resultados por blocos. “O bloco de direita que o Likud lidera obteve uma vitória clara. Agradeço aos cidadãos de Israel pela confiança. Começarei a organizar um governo de direita com os nossos parceiros naturais esta noite.”

Num comunicado, a aliança Kahol Lavan também clamou vitória: “Ganhamos! O povo israelita expressou-se! Estas eleições têm um vencedor claro e um derrotado claro.”

Mais tarde, dirigindo-se aos seus apoiantes, Gantz esbanjou confiança: “Sim, amigos, serei o primeiro-ministro de todos e não apenas daqueles que votaram em mim. Ninguém de um partido que não é o nosso deve ficar preocupado.”

(FOTO Cartazes partidários para as eleições legislativas de 9 de abril de 2019, em Israel WIKIMEDIA COMMONS)

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 9 de abril de 2019. Pode ser consultado aqui

Indícios de desespero em dia de eleições

Cerca de 6,3 milhões de israelitas escolhem, esta terça-feira, o próximo Parlamento e, por arrasto, o novo governo. Para Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro cessante, ganhar ou perder pode ser a diferença entre fazer História ou ficar vulnerável à Justiça. Para a minoria árabe de Israel poderá ser o pior resultado de décadas

“Deixem a água e vão votar. Amanhã, vão acordar com Yair Lapid como primeiro-ministro de um governo de esquerda. Deixem a praia, saiam de vossas casas, vão votar Likud.” Este apelo, que mais soa a desespero, saiu da boca do atual primeiro-ministro de Israel, esta terça-feira, durante uma caminhada junto à praia Poleg, na cidade costeira de Netanya.

Eram cerca de quatro da tarde (mais duas horas do que em Portugal Continental) e Benjamin Netanyahu não resistiu a acabar com a tranquilidade de alguns banhistas que — convocados para participar nas eleições legislativas desta terça-feira — se tinham deixado levar pelo espírito do feriado (decretado por ser dia de eleições) e desligaram da política.

Yair Lapid, a “ameaça” a que se referiu Netanyahu, é um dos rostos da recém formada aliança centrista Kahol Lavan (Azul e Branco, como a bandeira de Israel), liderada também por um ex-chefe de Estado-Maior, Benjamin (“Benny”) Gantz, que está taco a taco com o Likud na liderança das sondagens.

Ali junto ao Mediterrâneo, com todas as letras, Netanyahu tentava angariar apoios de última hora que o levem a um quarto mandato consecutivo. Se isso acontecer, ele poderá entrar para a História. A 17 de julho próximo, cumprirá 13 anos e 128 dias (não consecutivos) no cargo de primeiro-ministro, ultrapassando por um dia o histórico David Ben-Gurion, fundador do Estado.

Inversamente, uma eventual derrota será muito amarga de digerir. Para além de abandonar o cargo, Netanyahu ficará mais vulnerável face aos vários processos que correm na justiça contra si. A polícia israelita já concluiu haver provas suficientes para o acusar, e à mulher, de corrupção, encaminhando o caso para o Ministério Público.

Netanyahu é um homem nervoso e esta terça-feira deu vários sinais disso, nomeadamente quando não discordou de uma ação ilegal do Likud realizada em assembleias de voto de localidades de maioria árabe. Cerca de 1200 observadores afetos ao seu partido foram apanhados com câmaras ocultas no corpo. Uma das coligações árabes que estão a votos, o Hadash-Ta’al, apresentou queixa e a Comissão Eleitoral ordenou o confisco dos equipamentos.

Koby Matza, advogado do partido, tentou justificar o injustificável, dizendo que as câmaras “estavam escondidas, mas eram visíveis” e que “foram colocadas nas comunidades onde há um significativo receio de fraude”, disse. “As câmaras visavam assegurar uma votação justa.”

“Não nos vamos render à intimidação e às tentativas de nos tirar legitimidade”, reagiu a outra coligação árabe, Balad-Ra’am. “Vamos sentar-nos no próximo Knesset e representar os nossos eleitores mesmo que o Likud e a direita não nos queiram lá. A nossa legitimidade vem do nosso eleitorado e não de Netanyahu.”

Cerca de 20% da população israelita é de cultura árabe, mas a perda sucessiva de direitos — acentuada durante a governação de Netanyahu — tem tornado a convivência com a maioria de judeus cada vez mais tensa. Horas antes do incidente com as câmaras, perto de Nazaré (norte de Israel), cidade de maioria árabe, vários cartazes do Hadash-Ta’al foram grafitados com palavras em hebraico: “Morte aos árabes.”

Cerca das duas e meia da tarde, soaram alarmes entre a maior das minorias israelitas: a afluência às urnas dos árabes não ia além dos 15%. Apesar de não ser permitida a divulgação de sondagens à boca das urnas, alguns analistas começavam a deixar escapar algumas leituras com a fraca taxa de participação árabe à cabeça. “A afluência na comunidade árabe é algo nunca visto antes”, dizia um deles citado pelo “The Times of Israel”.

Nas eleições de 2015, os quatro partidos árabes foram capazes de esboçar uma unidade e apresentaram-se coligados na Lista Unida — conseguindo eleger 13 deputados. Quatro anos depois, deixaram que as diferenças falassem mais alto e apresentaram-se divididos em dois blocos: o Hadash-Ta’al e o Balad-Ra’am.

A meio da tarde, os alarmes continuavam a soar: “A baixa afluência nas cidades árabes é uma ameaça real às duas listas”, escrevia no Twitter Ahmad Tibi, o líder do Ta’al. “Um golpe muito sério na representação árabe no Knesset.”

(FOTO Boletins de voto dos partidos israelitas que participaram nas eleições de 9 de abril de 2019 LALIV G/WIKIMEDIA COMMONS)

Artigo publicado no “Expresso Diário”, a 9 de abril de 2019. Pode ser consultado aqui

Judeus e árabes escolhem o futuro de Israel

As assembleias de voto abriram às sete da manhã e estarão abertas até às 10 da noite. Até às duas da tarde, já votaram 35,8% dos cerca de 6,3 milhões de eleitores

Esta terça-feira, é feriado em Israel para que cerca de 6,3 milhões de israelitas possam escolher a composição do próximo Parlamento (Knesset) com toda a tranquilidade.

As assembleias de voto abriram às sete da manhã e assim continuarão até às 10 da noite. Até ao meio-dia (mais duas horas do que em Portugal Continental), já tinham votado 35,8% dos leitores — em 2015, por esta hora a taxa de afluência às urnas era de 36,6%.

Nos boletins de voto, surgem os nomes de 39 partidos, ainda que apenas 14 tenham reais hipóteses de eleger deputados. As sondagens dão uma vitória folgada ao conjunto dos partidos da direita e extrema-direita — um dado importante já que em Israel os governos são sempre de coligação.

Mas na corrida individual entre partidos, há uma luta acesa entre o Likud (direita), do primeiro-ministro Benjamin Netahyanu, e o recém criado Kahol Lavan (centro), liderado por Benjamin Gantz, um ex-chefe do Estado-Maior, e pelo jornalista Yair Lapid.

O “Masbaha” na mão deste eleitor israelita denuncia a sua crença religiosa: muçulmano AMIR COHEN / REUTERS
Judeu ultraortodoxo, reconhecível pela sua forma tradicional de vestir, numa assembleia de voto de Jerusalém RONEN ZVULUN / REUTERS
Uma israelita árabe deposita o voto, em Daliyat al-karmel, norte do país JALAA MAREY / AFP / GETTY IMAGES
Judias acompanhadas pelos filhos esperam vez para votar, em Jerusalém MENAHEM KAHANA / AFP / GETTY IMAGES
Um cego experimenta um sistema de votação para invisuais, durante uma sessão de formação com um assistente, em Jerusalém RONEN ZVULUN / REUTERS
Numa assembleia de voto da capital de Israel, Telavive CORINNA KERN / REUTERS
Duas crianças acompanham o pai, em Jerusalém MENAHEM KAHANA / AFP / GETTY IMAGES
Uma família árabe cumpre o dever cívico, na aldeia de Taibe, região da Galileia (norte) ILIA YEFIMOVICH / GETTY IMAGES
De fato de treino e jornal debaixo do braço, esta israelita prepara-se para um dia descontraído, em Rosh Ha’ayin (centro) AMIR LEVY / GETTY IMAGES
A minoria árabe, que corresponde a 20% da população israelita, vive sobretudo no norte do país AHMAD GHARABLI / AFP / GETTY IMAGES
Estima-se que os judeus ultraortodoxos correspondam a cerca de 10% da população israelita MENAHEM KAHANA / AFP / GETTY IMAGES
Participam nestas eleições 39 partidos FAIZ ABU RMELEH / ANADOLU AGENCY / GETTY IMAGES

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 9 de abril de 2019. Pode ser consultado aqui

Os rostos e as sensibilidades de quem vai a votos em Israel

Quase 40 partidos disputam, esta terça-feira, os 120 lugares do Parlamento de Israel. Mas só 14 têm reais possibilidades de eleger deputados

Seis meses antes do previsto, Israel vota esta terça-feira para escolher um novo Parlamento (Knesset). A última sondagem prevê uma corrida apertada entre o Likud, o partido de direita do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, e o partido de centro-esquerda Kahol Lavan (Azul e Branco), atribuindo 28 deputados a cada.

Parece confirmar-se, pois, uma constante da política israelita desde a fundação do país, em 1948: nunca um partido conseguiu uma maioria suficiente — ou seja, 61 dos 120 assentos no Knesset — para governar sozinho. A formação de coligações é, pois, o exercício que se segue a qualquer eleição legislativa.

Segundo a sondagem do Channel 13, o conjunto dos partidos de direita terá votos suficientes para eleger 66 deputados, o que, a confirmar-se, lhe dará folga para formar um executivo sem concessões à esquerda.

Nestas eleições, participam 39 partidos — para eleger um deputado, há que ultrapassar a fasquia dos 3,25%. Mas apenas 14 têm reais possibilidades de conseguir representação parlamentar.

LIKUD

Liderado pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, 69 anos, o Likud (Consolidação) é um partido histórico de Israel, aquele de onde saíram mais chefes de Governo. Defensor da privatização da economia, opõe-se a um Estado palestiniano e incentiva a construção de colonatos. Atualmente, tem 30 deputados (25% do Knesset).

À procura de um quarto mandato consecutivo, Netanyahu pode fazer história: se for reconduzido no cargo, a 17 de julho próximo cumprirá 13 anos e 128 dias em funções (não consecutivos), ultrapassando por um dia David Ben Gurion como o israelita que mais tempo ocupou o cargo de primeiro-ministro.

No sábado, Netanyahu sacou de um trunfo de última hora para tentar angariar votos e, assim, disparar nas intenções de voto. Numa entrevista ao Channel 12, afirmou: “Um Estado palestiniano colocará em perigo a nossa existência. Eu resisti a uma grande pressão nos últimos oito anos, nenhum outro primeiro-ministro resistiu a tal pressão. Temos de controlar o nosso destino”, disse. “Não dividirei Jerusalém, não evacuarei nenhuma comunidade [de colonos] e garantirei que controlaremos o território a ocidente do [rio] Jordão”, ou seja, o território palestiniano ocupado da Cisjordânia.

KAHOL LAVAN

Fundada a 21 de fevereiro passado, a aliança Kahol Lavan (Azul e Branco, como as cores da bandeira de Israel) tem dado luta ao veterano Likud nas sondagens.

A coligação reúne três fações: o Partido Resiliência de Israel, o Yesh Atid (Há um Futuro, que tem 11 deputados) e o Telem (do ex-ministro da Defesa Moshe Ya’alon).

A liderança é repartida entre o general Benjamin Gantz, de 59 anos, chefe do Estado-Maior entre 2011 e 2015, e o jornalista e ex-ministro das Finanças Yair Lapid (2013-2014), de 55 anos. Por acordo entre ambos, em caso de vitória, Gantz será primeiro-ministro nos primeiros dois anos e Lapid na segunda metade do mandato.

A aliança define-se como uma formação pluralista e representativa de todos os cidadãos de Israel, independentemente de ideologias políticas, crenças religiosas e identidades étnicas.

Entre as propostas do Kahol Lavan estão a introdução de limites aos mandatos de primeiro-ministro, a proibição de políticos acusados na justiça servirem no Parlamento, a alteração à polémica lei do Estado-Nação — que concede o direito de autodeterminação apenas aos judeus — para incluir as minorias e também o relançamento das negociações de paz com os palestinianos.

PARTIDO TRABALHISTA

Dominou a política israelita durante as primeiras décadas de vida do Estado de Israel e é hoje, juntamente com o Likud, o único partido em atividade que já liderou vários governos. Mas nas últimas eleições não foi além dos 18 deputados.

É liderado por Avi Gabbay, de 52 anos, que debutou na política apenas em 2014 após ter sido CEO (presidente executivo) da empresa de telecomunicações Bezeq de 2007 a 2013. Foi ministro de Netanyahu entre 2015 e 2016, com a pasta da Proteção Ambiental.

Os trabalhistas vão a votos com um programa que consagra a intenção de sarar feridas étnicas que excluíram alguns sectores da sociedade e de investir economicamente nas comunidades árabes. Talvez não seja suficiente: a última sondagem atribui-lhe uma perda de sete deputados.

KULANU

“Todos nós” foi fundado em finais de 2014, pelo atual ministro das Finanças, Moshe Kahlon (ex-Likud) que definiu o projeto como “a direita sã”.

Nas legislativas do ano seguinte, o partido conquistou 10 deputados. Hoje, a última sondagem diz que pode ficar com menos de metade.

O partido tem como prioridade as questões económicas, em especial a erradicação da pobreza e o combate à desigualdade. Apoia a solução de dois Estados para o conflito israelo-palestiniano.

BALAD-RA’AM E HADASH-TA’AL

Em Israel, cerca de 20% da população é de cultura árabe, com direito à cidadania israelita. Em sua representação, há quatro partidos árabes no Knesset: Hadash, Ra’am, Balad e Ta’al. Para os judeus mais fervorosos, primeiro-ministro incluído, são uma ameaça à existência de Israel.

Em 2015, concorreram juntos, na Lista Unida, e elegeram 13 parlamentares. Quatro anos depois, essa unidade deu mostras de ser, circunstancialmente, uma necessidade política que se desmoronou obrigando o eleitorado israelita árabe, nestas eleições, a optar entre dois blocos: o Balad-Ra’am e o Hadash-Ta’al. O que os separa?

A aliança Hadash-Ta’al é vista como uma formação que, de alguma forma, procura participar no sistema. Os seus principais rostos são Ahmad Tibi — líder do Ta’al (secular) e antigo conselheiro do líder histórico palestiniano, Yasser Arafat — e Ayman Odeh, líder do Hadash (comunista).

Inversamente, a coligação Balad-Ra’am é considerada uma frente empenhada em rejeitar e que nega a legitimidade de Israel. O Balad é um partido nacionalista pan-árabe radical. Já Ra’am é o acrónico hebraico de Lista Árabe Unida (islamita).

A sondagem do Channel 13 diz que o Hadash-Ta’al pode aumentar de cinco para seis deputados e o Balad-Ra’am pode cair de oito para quatro. Se, há quatro anos, a união fez a força, a dispersão pode levar a uma alta abstenção entre a minoria árabe.

SHAS E JUDAISMO DA TORAH UNIDA

Na origem da antecipação destas eleições, esteve um braço de ferro entre o Governo de Netanyahu e os judeus ultraortodoxos, que se estima correspondam a cerca de 10% da população. Os haredi pautam a sua vida pelo cumprimento rigoroso dos preceitos religiosos e sempre rejeitaram cumprir o serviço militar, exceção que desagrada à restante população.

Um recente diploma legislativo prevendo a extensão do serviço militar aos homens ultraortodoxos desencadeou uma crise no seio da coligação parlamentar que apoia o Governo levando à antecipação das eleições.

No Knesset. há duas bancadas que refletem a sensibilidade haredi: o Shas e o Judaismo da Torah Unida.

Com sete deputados, o Shas é liderado por Ariye Deri, o atual ministro do Interior e dos Assuntos Religiosos. A sua base eleitoral é composta sobretudo por judeus ultra-ortodoxos com ascendência no Médio Oriente ou na Península Ibérica (sefarditas).

Por seu lado, o Judaismo da Torah Unida tem seis deputados, entre os quais Yakov Litzman, o atual ministro da Saúde. Representa em especial a sensibilidade asquenaze — judeus oriundos da Europa Central e Oriental.

Segundo a última sondagem, o Shas deverá perder dois deputados e o Judaismo da Torah Unida manter os seis.

YISRAEL BEITENU

“Israel é o nosso lar” é um partido ultranacionalista liderado por Avigdor Lieberman, ministro da Defesa de Netanyahu entre 2016 e 2018. Lieberman bateu com a porta em novembro passado após o primeiro-ministro ter optado por assinar um cessar-fogo com o grupo islamita Hamas em vez de bombardear a Faixa de Gaza, como o seu ministro defendia.

Apologista de uma linha dura com os palestinianos, Lieberman é um protagonista na primeira pessoa da ocupação israelita da Palestina já que vive, com a mulher e três filhos, no colonato de Nokdim, a sul de Belém (Cisjordânia).

As sondagens dizem que Yisrael Beitenu pode perder um dos seus cinco deputados.

MERETZ

Membro da Internacional Socialista, o Meretz defende a retirada israelita dos territórios palestinianos ocupados na Guerra dos Seis Dias (1967) e o estabelecimento de um Estado palestiniano com Jerusalém como capital partilhada pelos dois povos.

A degradação do processo de paz e o reforço dos partidos de direita em Israel contribuíram para o desgaste do Meretz que, nos anos 1990, chegou a ter 12 deputados. As projeções dizem que conservará os cinco deputados que tem agora.

É liderado por uma mulher, Tamar Zandberg, de 42 anos. Vai a votos com um programa assente na redução do custo de vida dos israelitas, numa reforma tributária e no combate à corrupção.

UNIÃO DE PARTIDOS DE DIREITA

Fundada em fevereiro passado, agrupa três partidos de direita e extrema-direita: Lar Judaico (religioso, ortodoxo e sionista), União Nacional (que é em si uma aliança de quatro partidos) e o polémico Poder Judeu (Otza Yehudit).

A inclusão deste último tem colocado a União de Partidos de Direita sob fogo já que o Poder Judeu reclama-se herdeiro ideológico do controverso rabino Meir Kahane. Nascido em Nova Iorque em 1932, foi um supremacista judeu que fundou a Liga de Defesa Judaica nos EUA e o radical Kach em Israel. Foi assassinado em 1990, na cidade onde nasceu.

Michael Ben Ari, o líder do Poder Judeu de 55 anos, foi impedido pelo Supremo Tribunal de Israel de se candidatar a um lugar no Knesset em virtude das suas opiniões racistas. Ainda assim, a sondagem do Channel 13 atribui à União um aumento de deputados dos cinco (eleitos pelo Lar Judaico) para sete.

A NOVA DIREITA

É mais uma formação política que tenta tirar partido do desgaste do partido no poder (Likud). A sondagem prevê que duplique a sua representação no Knesset, de três para seis deputados.

Foi lançada em dezembro passado por dois membros do Governo de Netanyahu, até então militantes do Lar Judaico: o ministro da Educação, Naftali Bennett, de 47 anos, e a titular da Justiça, Ayelet Shaked, de 42 anos.

Bennett quer limitar os poderes do Supremo Tribunal sobre os soldados israelitas para que não se sintam constrangidos durante as operações militares. Já Shaked é uma acérrima defensora da maioria judaica de Israel mesmo que à custa dos direitos humanos das populações árabes.

A Nova Direita opõe-se à criação de uma Palestina independente e advoga anexação das áreas dos colonatos na Cisjordânia.

GESHER

Orly Levy-Abekasis é uma antiga manequim e apresentadora de televisão que, em 2015, conseguiu um lugar no Knesset, como independente, prometendo defender os mais desfavorecidos.

Aos 45 anos, casada, com quatro filhos e a viver num kibbutz no norte de Israel, tenta renovar o mandato de deputada, desta vez nas fileiras de um partido que o pai — o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros David Levy — chegou a liderar: o Gesher (centro-direita), que derivou do Likud.

Orly Levy-Abekasis diz querer romper com a tradicional divisão entre direita e esquerda. Mas nas sondagens surge com vida difícil, aquém dos 3,25% necessários para entrar no Knesset.

ZEHUT

O “Identidade” não tem qualquer deputado no Knesset, mas pode vir a ser um dos vencedores destas eleições: as sondagens dão-lhe seis deputados. Foi fundado em 2015, por Moshe Feiglin, de 56 anos, um antigo vice-presidente do Parlamento.

O Zehut é um partido sionista e libertário que, no seu manifesto, propõe a legalização da canábis, condição “sine qua non” para entrar numa coligação governamental.

Apologista da solução de um Estado único para o conflito israelo-palestiniano, defende a anexação da Cisjordânia, com o mesmo vigor com que, no passado, se opôs aos Acordos de Oslo de 1993 e tentou boicotá-los. A 8 de agosto de 1995, chefiou uma espetacular ação não-violenta de desobediência civil que bloqueou 80 cruzamentos por todo o país. Foi condenado pelo Supremo Tribunal a seis meses de prisão por sedição — sentença depois comutada para serviço comunitário. Esta terça-feira, poderá ser a grande surpresa do novo xadrez político em Israel.

(FOTO Boletins de voto dos partidos israelitas que participaram nas eleições de 9 de abril de 2019 LALIV G/WIKIMEDIA COMMONS)

Relacionado: “Judeus e árabes escolhem o futuro de Israel” (fotogaleria)

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 9 de abril de 2019. Pode ser consultado aqui

“Primavera argelina” afasta Bouteflika do poder. Depois dos protestos, a festa

Abdelaziz Bouteflika renunciou ao poder na Argélia após quase seis semanas de protestos populares. Ao Expresso, um professor da Universidade do Qatar recorda um Presidente que não era democrata, mas que levou a paz ao país após uma sangrenta guerra civil

Parecem festejos alusivos a um grande feito futebolístico. Mas a euforia popular que tomou conta da capital da Argélia celebra um outro tipo de conquista: o afastamento de um líder que já levava 20 anos de poder. A saída de Abdelaziz Bouteflika segue-se a quase seis semanas de manifestações populares que “surpreenderam toda a gente, até os próprios manifestantes”, diz ao Expresso Youcef Bouandel, professor na Universidade do Qatar.

“A primeira exigência visou a rejeição de um quinto mandato presidencial de Bouteflika, mas as autoridades não deram uma resposta rápida”, recorda este professor de Ciência Política. “Depois, o Presidente disse que não tinha intenções de se candidatar, mas adiou as eleições presidenciais e convocou uma conferência nacional de diálogo”, numa aparente tentativa de ganhar tempo.

Esta terça-feira, cedeu finalmente à pressão e formalizou a renúncia à presidência da Argélia. A decisão adiou “sine die” as eleições presidenciais previstas para dentro de duas semanas, 18 de abril.

Regime podre, povo com moral elevada

Numa comparação inevitável com os primeiros meses da Primavera Árabe, em 2010-2011 — que varreu o Norte de África, levando à queda dos líderes da Tunísia, do Egito e da Líbia —, Bouandel salienta o facto de os protestos na Argélia terem decorrido de forma pacífica.

“As exigências do povo aumentaram devido à natureza tanto dos manifestantes como do regime. Os protestos têm sido pacíficos, organizados e realizam-se nos quatro cantos do país. Quanto ao regime, está muito podre e as pessoas sentiram que tinham a moral elevada e uma oportunidade única para se livrarem deste regime que não podia ser desperdiçada. Os manifestantes não querem que fique ninguém associado ao regime.”

Abdelaziz Bouteflika sai do poder aos 82 anos e muito debilitado já que, desde 2013, quando sofreu um AVC, só se deslocava em cadeira de rodas. Raramente surgia em público e deixou de fazer viagens ao estrangeiro. Nas ruas, ao desfraldarem gigantescas bandeiras da Argélia, os manifestantes pareciam querer dizer-lhe que o seu apego ao poder não podia sobrepor-se ao amor de todos pelo país.

“Bouteflika não era um democrata, nunca o foi. Era um líder narcisista que não tolerava que discordassem dele”, comenta Bouandel. “Rodeou-se de ‘yes men’ que ajudaram a cimentar a ideia de que ele era o salvador da Argélia: trouxe paz e estabilidade ao país através do seu projeto de reconciliação nacional”, após a guerra civil dos anos 1990. Estima-se que nela tenham morrido cerca de 200 mil civis.

Bouteflika tem o mérito de ter afastado a ameaça extremista que sangrou o país nessa “década negra”, quando grupos islamitas vingaram a anulação da vitória da Frente Islâmica de Salvação (FIS) na primeira volta das eleições legislativas de 1991 espalhando a violência pelo país.

Em 1999, quando Bouteflika subiu ao poder, os argelinos viviam sob o signo do medo e sem grandes aspirações democráticas. O seu desaparecimento iniciará um novo — e incerto — capítulo na história do país.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 3 de abril de 2019. Pode ser consultado aqui