Faltam 18 meses para as eleições presidenciais nos Estados Unidos e 24 personalidades já andam de microfone na mão a tentar convencer eleitores. A batalha mais intensa trava-se entre os democratas, que têm no terreno 22 candidatos. No campo republicano, Donald Trump é (quase) apenas um observador
No mesmo dia em que tomou posse como 45.º Presidente dos Estados Unidos, a 20 de janeiro de 2017, Donald Trump fez soar o tiro de partida da corrida às eleições de 2020 e formalizou a sua recandidatura. Esta sexta-feira, a exatamente ano e meio das presidenciais — e também a nove meses do “caucus” do Iowa, que tradicionalmente marca o início oficial da fase das primárias —, Trump conta já com 23 concorrentes, 22 deles a competir pela nomeação democrata.
“No atual estado da corrida, há na minha opinião quatro nomes a olhar como possíveis vencedores, embora em diferentes estados de desenvolvimento e afirmação das respetivas candidaturas”, comenta ao Expresso Germano Almeida, analista de política americana.
“Joe Biden e Bernie Sanders são os ‘frontrunners’ [favoritos] e todas as sondagens o demonstram para já. Beto O’Rourke e Pete Buttigieg são os ‘challengers’ [desafoadores], ambos com potencial para crescer o suficiente até ao final da corrida a ponto de poderem ganhar, mas nesta fase com menos de metade das intenções de Biden e Sanders. O passado beneficia, nesta fase da corrida, a maior notoriedade de ambos. Mas o tempo está a favor de O’Rourke e Buttigieg — e geralmente as eleições americanas premeiam o ‘futuro’).”
As duas sondagens divulgadas após Joe Biden anunciar a sua candidatura, a 25 de abril, atribuem-lhe uma vitória inequívoca num possível confronto direto com Donald Trump a 3 de novembro de 2020. O ex-vice-presidente de Barack Obama consegue 43% contra 36% na pesquisa da empresa HarrisX e 51% contra 45% na da CNN.
“Joe Biden é forte em dois segmentos onde Hillary falhou (nos homens e nos brancos) e é forte no Midwest, a zona do mapa eleitoral onde Trump bateu inesperadamente Hillary”, em concreto os estados da Pensilvânia, do Michigan e do Wisconsin onde a diferença entre ambos não chegou a 100 mil votos.
Qual o favorito de Barack Obama?
Contrariamente ao que fez com Hillary Clinton, em 2016, Barack Obama (ainda) não declarou apoio. “Mas na prática já está a ajudar Biden — e basta olhar para o logótipo da campanha Biden para se perceber o desejo de ‘herança’ e ‘continuidade’ em relação aos dois mandatos de Obama que Joe Biden pretende corporizar. De resto, Obama aceitou fazer parte de um dos primeiros vídeos de campanha, para dizer que apesar da idade de Joe, ele ‘está muito longe do fim’ e foi sempre ‘resiliente e leal’.”
Precisamente a idade dos candidatos mais veteranos pode tornar-se um grande obstáculo para as pretensões democratas. “Quer Biden quer Sanders serão, de muito longe, o mais velho Presidente da história americana. Têm esse problema para enfrentar: convencer os democratas e, depois, todo o eleitorado americano de que estarem próximos dos 80 anos quando da tomada de posse não será uma barreira intransponível para derrotarem Trump.”
À parte a idade, estes dois “pesos pesados” da política norte-americana pouco têm em comum. “São muito diferentes. Biden é moderado, Sanders é radical. Joe herda o essencial dos anos Obama, Bernie elogia alguns aspetos mas é crítico da proximidade de Obama com o ‘establishment’. Biden defende a classe média dentro de uma visão ‘americana’ de premiar o mérito e não carregar excessivamente nos impostos, Sanders promete agravamento fiscal que leve a que o Estado tenha mais recursos para assumir uma redistribuição da riqueza mais justa”, enumera Germano Almeida.
“Sanders aposta no discurso ‘sexy’ de arrasar o ‘establishment’, Biden corre o risco de ficar com o rótulo de ser o candidato do sistema (e isso, por estes dias, é perigoso para quem vai a eleições). A grande armadilha em que os democratas podem cair será a de nomearem Bernie Sanders e, com isso, contribuírem para a reeleição de Trump. Sanders tem propostas demasiado radicais e demasiado à esquerda para o americano comum. Num duelo final com Trump, não terá grandes hipóteses de vitórias.”
As esperanças Beto e Pete
Dos 24 candidatos que já andam de microfone na mão, a tentar convencer o eleitorado, 22 estão empenhados na nomeação democrata.
“O ex-congressista estadual Beto O’Rourke, do Texas, parecia ser a maior esperança do centro político da América para estas eleições. Junta enorme carisma com apoios de eleitores independentes e até de republicanos, com o aliciante de alargar o mapa eleitoral dos democratas para os estados do Sul, geralmente reservados aos republicanos. Mas não está a descolar e terá sido a maior vítima do ‘momentum’ de Pete Buttigieg, que pode ser a grande surpresa destas eleições.”
Pete Buttigieg é o primeiro candidato assumidamente homossexual numas presidenciais norte-americanas. “Casado com um homem, está a transformar esse aparente problema junto do eleitorado mais conservador num tema forte de campanha. Tem um discurso moral, com uma componente religiosa, o que pode ser um trunfo para a eleição geral (os democratas estão a perder grande parte do voto mais religioso para os republicanos). Com 37 anos, pretende ser o mais jovem nomeado e o mais jovem Presidente de sempre.”
Seis mulheres na corrida
Numa entrevista concedida pouco antes de sair da Casa Branca, Obama projetou uma necessária renovação geracional na liderança democrata e identificou dois nomes: precisamente Pete Buttigieg e também Kamala Harris, senadora pela Califórnia e uma das seis mulheres que estão na corrida.
“Kamala Harris é a única que ainda pode chegar lá, mas com hipóteses muito reduzidas. Entrou muito forte, chegou a aparecer em segundo lugar, mas depois dos avanços de Bernie Sanders, Beto O’Rourke e agora Joe Biden, e sobretudo com a afirmação mediática de Pete Buttigieg, já quase não se ouve falar dela.”
Entre as restantes cinco candidatas, o analista identifica apenas uma que pode superar a fasquia dos 5% de votos — a senadora Elizabeth Warren, do Massachussets. “Mas depois do avanço de Bernie Sanders ficou sem espaço de crescimento”, diz Germano Almeida. “Elizabeth e Bernie disputam os sectores mais à esquerda do Partido Democrata. Ela teria hipóteses reais se conseguisse duas coisas nesta corrida: ser a herdeira do movimento Sanders 2016 (46% do voto democrata) e aliar a isso os créditos de ter feito parte da Administração Obama e de ter querido sair quando achou que Barack Obama não iria, afinal, tão longe quanto a esquerda americana desejaria em temas como a regulação financeira ou a reforma fiscal.”
No campo republicano, Donald Trump está tranquilo em matéria de primárias. Até ao momento, tem apenas um adversário com que se preocupar — o advogado Bill Weld. Sem perspetivas de vencer, o ex-governador do Massachusetts tem, na interpretação de Germano Almeida, autor do livro “Isto não é bem um Presidente dos EUA” (Prime Books, 2018), um objetivo: “Avisar o Partido Republicano de que os efeitos de um segundo mandato presidencial de Donald Trump podem ser destruidores para o argumentário clássico do conservadorismo americano.“
“Tendo em conta o comportamento do Presidente, e também a sua agenda (em vários aspetos contraditória com o que os republicanos andaram a defender durante décadas)”, conclui o analista, “um apoio cúmplice e passivo de todo o Partido Republicano a Trump seria a total capitulação”.
(IMAGEM US EMBASSY & CONSULATES IN THE UNITED KINGDON)
























Artigo publicado no “Expresso Online”, a 3 de maio de 2019. Pode ser consultado aqui