Coronavírus e gafanhotos: a tempestade
perfeita no Corno de África

O coronavírus está a galgar o continente africano, onde alguns
países andam há meses a combater nuvens gigantescas de
gafanhotos. Dois especialistas identificam ao Expresso o principal
perigo que resulta desta coincidência

No Corno de África, há neste momento duas crises em rota de colisão: a pandemia do coronavírus e uma praga de gafanhotos do deserto de proporções bíblicas. Se a primeira é uma ameaça direta à vida humana, a última é-o indiretamente, já que os insetos devoram colheitas e pastagens à sua passagem, destruindo os meios de subsistência primários de muitos milhões de pessoas.

Para as populações sobretudo do Quénia, Etiópia e Somália, que se debatem há meses com gigantescas nuvens de gafanhotos — no início de janeiro, um enxame no nordeste do Quénia tinha 60 quilómetros de comprimento por 40 de largura —, a chegada do coronavírus coloca obstáculos à batalha em curso contra os insetos.

“As equipas de voo [envolvidas nas operações aéreas de pulverização das áreas afetadas] chegaram à Etiópia e ao Quénia antes do confinamento [decretado por causa do coronavírus]. Até agora, a covid-19 não afetou a capacidade de pulverização”, diz ao Expresso Keith Cressman, especialista sénior na Previsão de Gafanhotos da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

“Mas os fornecedores de pulverizadores motorizados e de pesticidas estão a enfrentar grandes desafios, com opções limitadas de frete aéreo para realizar as entregas. Já ocorreram alguns atrasos no fornecimento de pesticidas devido à redução de mão de obra em alguns países de origem.”

Gafanhotos do deserto alimentam-se de vegetação, na aldeia queniana de Larisoro FOTO TONY KARUMBA / AFP / GETTY IMAGES

África é a última fronteira do coronavírus. Comparativamente aos restantes continentes, o número de casos positivos é ainda baixo — cerca de 4300, segundo o balanço de domingo da Organização Mundial de Saúde (OMS). Entre os três países mais assolados pela praga de gafanhotos, apenas o Quénia registou uma morte.

Mas, enquanto nos boletins da OMS (sobre o coronavírus) o Corno de África surge como das áreas mais poupadas à pandemia, nos da FAO (sobre a praga de gafanhotos) a situação no Quénia, Somália e Etiópia “permanece extremamente alarmante”, lê-se na última atualização. “A procriação generalizada está a progredir e estão a começar a formar-se novos enxames, o que representa uma ameaça sem precedentes à segurança alimentar e aos meios de subsistência no início da próxima safra”, alerta a FAO.

Para esta agência da ONU, três outros países assediados pelos gafanhotos merecem especial preocupação: o Sudão do Sul (ainda sem casos de covid-19), o Iémen (com uma guerra em curso) e o Irão, um dos mais atingidos pelo coronavírus. Em sete outros países, a ameaça dos gafanhotos “está sob controlo”: Arábia Saudita e Omã, na Península Arábica, Iraque, Índia e Paquistão e ainda Sudão e Eritreia, na margem africana do Mar Vermelho.

“O atual surto de gafanhotos do deserto teve origem principalmente ao longo do Mar Vermelho — uma área-chave para a procriação desta espécie, no inverno —, devido a chuvas favoráveis durante a época de reprodução de 2018-2019”, explica ao Expresso Rick Overson, investigador da Iniciativa Global para os Gafanhotos, um projeto da Universidade do Estado do Arizona (EUA).

“Mesmo antes do coronavírus aparecer, uma combinação de chuvas
favoráveis aos gafanhotos em regiões-chave e uma diminuição dos recursos de monitorização levou à tempestade perfeita. A guerra civil no Iémen, por exemplo, é citada como tendo desempenhado um papel no surto atual.”

No telhado de um edifício em Sana, a capital do Iémen, um homem tenta afugentar um enxame de gafanhotos FOTO MOHAMMED HUWAIS / AFP / GETTY IMAGES

As chuvas favoráveis de que fala o entomologista norte-americano resultaram de dois ciclones que se formaram no oceano Índico, em maio e outubro de 2018, que criaram condições favoráveis à reprodução dos gafanhotos: vegetação em regiões desérticas e também solos húmidos e arenosos. Entre junho de 2018 e março de 2019, nasceram três gerações de gafanhotos — o número destes insetos aumentou 8.000 vezes.

No terreno, os gafanhotos combatem-se de múltiplas formas. No Quénia, há pequenos aviões em ação, voando a baixa altitude para borrifar com químicos áreas fustigadas pelos insetos. Noutras zonas, essas operações são asseguradas por homens a pé, de mochila pulverizadora às costas — no Uganda foram mobilizados militares para o efeito. Na Índia, aldeãos percorrem os campos tentando afugentar os insetos batendo em panelas.

No início do surto de coronavírus, quando a China era ainda o epicentro do problema, um artigo publicado num jornal local correu mundo: Pequim ia enviar para o Paquistão um exército de 100 mil patos para impedir que os gafanhotos atravessassem a fronteira.

“Os patos têm sido usados como uma solução criativa na China, e até certo ponto bem sucedida, mas não seriam uma solução viável dada a imensa escala geográfica do surto de gafanhotos”, diz Rick Overson. Além disso, “seriam necessários muitos patos e teriam de ser levados para o lugar certo, o que não seria tarefa fácil”.

Na aldeia indiana de Miyal, habitantes tentam assustar os gafanhotos fazendo barulho com utensílios de cozinha FOTO SAM PANTHAKY / AFP / GETTY IMAGES

Atualmente, no sistema de alerta da FAO, a praga de gafanhotos está na fase da “ameaça”, “mas as coisas podem e provavelmente irão piorar”, diz Rick Overson. Prever até onde podem chegar os gafanhotos não é um exercício impossível. “Os surtos de gafanhotos do deserto passam por fases de recessão e pragas. Ambas podem ocorrer ao longo de escalas de anos e décadas”, explica o investigador.

“Durante anos de recessão [períodos calmos], é possível encontrar gafanhotos do deserto numa área de 16 milhões de km2 cobrindo 30 países”, uma faixa que se estende do deserto do Sara ao noroeste da Índia.

“Mas durante os anos da praga a área afetada pode expandir-se por 29 milhões de km2 afetando 60 países. Porém, em qualquer surto (como o atual), o diabo está nos detalhes que levam a que conjuntos de países acabem por ser afetados. O Corno de África, que é atualmente o destino dos principais enxames, viu surtos de magnitude ainda maior em meados da década de 1950, embora este surto vá continuar a piorar”, conclui Rick Overson.

“Qualquer aumento da desestabilização da infraestrutura [montada no terreno] provocada pelo coronavírus tornará o desafio assustador da luta contra os gafanhotos ainda mais assustador.”

(FOTO PRINCIPAL: Envolto numa nuvem de gafanhotos, este queniano tenta abrir caminho com um pau, numa herdade perto da cidade de Nanyuki FOTO Baz Ratner / Reuters)

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 30 de março de 2020. Pode ser consultado aqui

Coronavírus “ressuscitou” Netanyahu de uma “morte” anunciada

Aquele que era o principal opositor do primeiro-ministro de Israel está disposto a aliar-se a Benjamin Netanyahu num governo de unidade nacional. Benjamin Gantz, líder da aliança centrista Azul e Branco, justifica a reviravolta com a necessidade de combater o coronavírus

Se o coronavírus infetasse também partidos políticos, a coligação israelita Kahol Lavan entraria para as estatísticas como a primeira vítima mortal. A formação de centro-esquerda, que tinha em mãos a tarefa de formar Governo em Israel ruiu, quinta-feira à noite, depois de o seu líder, o antigo general Benjamin Gantz, se ter proposto para a presidência do Parlamento (Knesset).

Ao fazê-lo, deixou de ser hipótese para chefiar um futuro Executivo e mostrou-se disponível para participar num Governo de unidade nacional ao lado do primeiro-ministro cessante, Benjamin Netanyahu, contra quem sempre se bateu desde que chegou à fila da frente da política.

“Acima de tudo, creio que não devemos arrastar Israel para uma quarta eleição neste momento tão desafiador, em que o país está a lidar com a crise do coronavírus e suas consequências”, escreveu “Benny” Gantz na rede social Twitter. Refere-se ao facto de o país ter votado em abril e setembro de 2019 e março de 2020, sem conseguir solução governativa. Em seguida Gantz dirigu-se diretamente aos seus parceiros de coligação: “Discordamos sobre esse ponto”.

A revolta dos antigos parceiros

Os visados por Gantz são Yair Lapid e Moshe Ya’alon, números 2 e 3 da Kahol Lavan (Azul e Branco, como a bandeira de Israel), não se contiveram nas críticas ao volteface protagonizado por Gantz.

“A crise do coronavírus não nos dá direito ou permissão para abandonarmos os nossos valores”, reagiu Yair . “Prometemos não nos sentarmos às ordens de um primeiro-ministro que enfrenta três acusações criminais [por corrupção]. Prometemos não fazer parte de uma coligação de extremistas e chantagistas [extrema-direita e religiosos ultraortodoxos]. Dissemos que não permitiríamos que ninguém minasse a democracia de Israel. E nesta semana de todas as semanas, em que os ataques ao sistema judicial foram do pior, é dado um prémio àqueles que desobedecem à lei. Um prémio à criminalidade.”

Na quarta-feira Yuli Edelstein, aliado de Netanyahu (do partido conservador Likud), demitiu-se da presidência do Knesset, onde estava há sete anos. A renúncia foi apresentada horas antes de terminar o prazo estabelecido pelo Supremo Tribunal de Israel para que se procedesse à eleição do seu sucessor.

A deliberação judicial foi desencadeada por uma petição da Azul e Branco, que tencionava pôr um dos seus no cargo e acabar com o domínio do Likud de Netanyahu. Para tal, contava beneficiar da existência de 61 deputados (num total de 120) afetos à oposição. “Penso que a decisão do Supremo Tribunal é errada e perigosa”, acusou Edelstein. “O nosso povo precisa de união e de um governo de unidade nestes dias.”

Separar as águas no Parlamento

Fundada em fevereiro de 2019, a aliança Azul e Branco (centro-esquerda) era composta por três fações: o Yesh Atid, do ex-jornalista Lapid, que já tinha experiência política e eleitoral acumulada; o Resiliência de Israel, de Gantz, chefe de Estado-Maior das Forças de Segurança de Israel entre 2011 e 2015; e o recém-criado Telem, de Moshe Ya’alon, ex-ministro da Defesa de Netanyahu.

Criada a tempo de disputar as legislativas de abril de 2019 — as primeiras de três (inconclusivas) em menos de um ano —, tinha como objetivo primordial arredar do poder Netanyahu, que é hoje o israelita com mais tempo à frente do Governo de Israel.

Conhecida a reviravolta de Gantz, os seus parceiros de coligação formalizaram um pedido no sentido de separar águas entre os deputados eleitos pelo Kahol Lavan: as duas fações ignoradas por Gantz seguirão juntas, numa formação que manterá o nome Kahol Lavan.

Após ver o início do seu julgamento — previsto para 17 de março — adiado para 24 de maio, por causa da pandemia de coronavírus, Netanyahu saca de mais uma vida que já se pensava que não tivesse.

(FOTO Benjamin Netanyahu, no Forum de Davos de 2018 FLICKR WORLD ECONOMIC FORUM)

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 29 de março de 2020. Pode ser consultado aqui

22 fotos de camas de hospital em locais improváveis

Os hospitais não têm espaço para todas as pessoas infetadas com o coronavírus e que necessitam de assistência. Por todo o mundo, da Guatemala às Filipinas, improvisam-se estruturas de saúde em recintos culturais e desportivos, feiras e centros comerciais. Onde antes havia sorrisos e aplausos, há agora médicos, doentes e material médico

ESPANHA. O Centro de Feiras e Congressos de Madrid (IFEMA) está transformado num grande hospital de campanha para doentes com covid-19 REUTERS
BULGÁRIA. Militar da Marinha participa num exercício no interior do Palácio da Cultura e Desporto, da cidade de Varna PETKO MOMCHILOV / GETTY IMAGES
ARGENTINA. Um funcionário municipal de La Plata prepara camas nas instalações do parque de diversões infantil República de los Niños RONALDO SCHEMIDT / AFP / GETTY IMAGES
ALEMANHA. Este antigo abrigo para refugiados foi convertido num centro de atendimento a doentes infetados com o coronavírus, na cidade de Muehlheim LARS BARON / GETTY IMAGES
GUATEMALA. Funcionários do Ministério da Saúde montam um hospital temporário no Parque Industrial da Cidade da Guatemala JOHAN ORDONEZ / AFP / GETTY IMAGES
INDONÉSIA. Militares adaptam um navio-hospital mobilizado para participar na operação de resgate de indonésios a bordo de um cruzeiro, na cidade de Surabaya JUNI KRISWANTO / AFP / GETTY IMAGES
FILIPINAS. Camas e cadeiras instaladas num salão de eventos para acomodar pessoas à espera de fazer o teste ao coronavírus ROLEX DELA PENA / EPA
SÉRVIA. Pessoal militar trabalha para adaptar o recinto da Feira de Belgrado VLADIMIR ZIVOJINOVIC / AFP / GETTY IMAGES
IRÃO. Camas montadas numa zona do centro comercial Iran Mall, a noroeste de Teerão AFP / GETTY IMAGES
POLÓNIA. Este hospital da cidade de Wroclaw necessitou de montar um espaço exterior para acolher pacientes KRZYSZTOF CWIK / REUTERS
ÁUSTRIA. Quartos para dois pacientes, num hospital improvisado em Viena GEORG HOCHMUTH / REUTERS
ÍNDIA. Início dos trabalhos de montagem de um espaço para cumprimento de quarentena, nos arredores da cidade de Calcutá RUPAK DE CHOWDHURI / REUTERS
No Chile, as eleições para a Assembleia Constituinte foram adiadas para outubro EPA
CHINA. As camas vazias dentro do pavilhão de desportos de Wuhan indiciam boas notícias, na cidade de onde partiu o surto de coronavírus AFP / GETTY IMAGES
EUA. Apesar da resistência do Presidente Donald Trump em atacar o problema, em Nova Iorque, a cidade mais afetada no país, arregaça-se as mangas para instalar um hospital no Centro de Convenções Javits SPENCER PLATT / GETTY IMAGES
ITÁLIA. Neste hospital de Bréscia, na martirizada província da Lombardia, aproveita-se todos os cantos para assistir doentes, mesmo os espaços não equipados para tal MIGUEL MEDINA / AFP / GETTY IMAGES
BRASIL. No Palácio das Convenções do Anhembi, em São Paulo, começa-se a montar uma estrutura de emergência com capacidade para 2000 camas MIGUEL SCHINCARIOL / GETTY IMAGES
COLÔMBIA. Civis e militares colocam camas no interior de uma tenda, em Bogotá, antes do país iniciar 20 dias de quarentena, decretados pelo governo GUILLERMO LEGARIA SCHWEIZER / GETTY IMAGES
MYANMAR. Este jovem voluntariou-se para trabalhar nesta unidade para cidadãos regressados do estrangeiro, que ficarão em quarentena, no Estádio Indoor Thein Phyu, em Rangum SHWE PAW MYA TIN / GETTY IMAGES
FRANÇA. Estas camas instaladas dentro do Palácio de Festivais de Cannes não acolhem doentes, mas antes sem-abrigo e outras pessoas vulneráveis à pandemia ERIC GAILLARD / REUTERS
ESLOVÉNIA. Tendas com capacidade para 120 camas, erguidas pelo Exército, no Quartel Edvard Peperko, em Liubliana IGOR KUPLJENIK / EPA
SÍRIA. Num país onde as armas ainda não se calaram e onde já há casos de covid-19, um membro dos chamados Capacetes Brancos desinfeta uma cama, na cidade de Idlib ANAS ALKHARBOUTLI / GETTY IMAGES

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 27 de março de 2020. Pode ser consultado aqui

Covid-19 pôs o mundo a viver à janela

O coronavírus disseminou-se pelo mundo empurrando as pessoas para dentro de casa. Às janelas, há expressões de preocupação mas manifestações de festa, gritam-se palavras de esperança e outras de protesto contra líderes que parecem estar em negação. Da China ao Brasil, 22 imagens da quarentena à janela

ITÁLIA. Fechada em casa, a pequena Bianca observa pelo vidro de casa a sua galinha “Cocca Bella”, em San Fiorano, região da Lombardia MARZIO TONIOLO / REUTERS
FRANÇA. Confinado entre quatro paredes, este homem não esconde a sua frustração, em Paris CHESNOT / GETTY IMAGES
ALEMANHA. Após a paróquia local ter suspendido a celebração da eucaristia, esta católica começou a acender uma vela à janela de casa, em Oberhausen FABIAN STRAUCH / GETTY IMAGES
TURQUIA. Este turco está de quarentena em Istambul, após ter regressado de uma viagem ao estrangeiro UMIT BEKTAS / REUTERS
ESPANHA. Vestido a rigor, este homem anima os dias da vizinhança, tocando trompete à janela de casa, em Valência JOSE JORDAN / AFP / GETTY IMAGES
RÚSSIA. Uma mulher olha para o exterior de um centro médico de Novomoskovsky, que acolhe pacientes suspeitos de estarem afetados com a Covid-19 SERGEI BOBYLEV / GETTY IMAGES
PORTUGAL. Há sol em Cascais, mas esta moradora tem de ficar em casa HORACIO VILLALOBOS / GETTY IMAGES
BULGÁRIA. Uma mulher abre ligeiramente a sua janela, em Sófia, para aplaudir e incentivar o pessoal médico, um tributo que correu toda a Europa DIMITAR KYOSEMARLIEV / REUTERS
BÉLGICA. Pai e filha, com tempo de sobra para brincarem juntos, nesta moradia em Bruxelas YVES HERMAN / REUTERS
OCEANO PACÍFICO. Ao largo de São Francisco, na Califórnia, o paquete Grand Princess transporta alguns passageiros que testaram positivo ao coronavírus KATE MUNSCH / REUTERS
BRASIL. As janelas de muitas cidades brasileiras têm servido de palco a panelaços, uma forma de protesto com recurso a utensílios domésticos, contra a inação e displicência do Presidente Jair Bolsonaro RICARDO MORAES / REUTERS
Mensagens escritas pelos utentes de um lar de idosos em Bromsgrove, Inglaterra, dirigidas aos familiares CARL RECINE / REUTERS
EUA. Por todo o mundo, milhões de crianças como Lydia, que vive em Brooklyn, Nova Iorque, deixaram de poder ir à escola CAITLIN OCHS / REUTERS
ÁUSTRIA. Em Innsbruck, dois homens tomam banhos de sol e tocam música, como quem está numa esplanada no verão JAN HETFLEISCH / GETTY IMAGES
CROÁCIA. Pessoal médico faz uma pausa na azáfama de um hospital universitário de Dubrava para apanhar um pouco de ar pela janela DENIS LOVROVIC / AFP / GETTY IMAGES
CHINA. O pior parece já ter passado no país onde primeiro o coronavírus surgiu, mas este residente de Pequim ainda se resguarda em casa KEVIN FRAYER / GETTY IMAGES
REPÚBLICA CHECA. Um cigarro à janela não é uma situação surpreendente, mas o governo checo está no lote dos executivos que decretaram restrições à liberdade de circulação DAVID W CERNY / REUTERS
ÍNDIA. No interior deste hospital de Srinagar, todos usam máscara WASEEM ANDRABI / GETTY IMAGES
COLÔMBIA. A partir da próxima terça-feira, o país entrará em quarentena durante 20 dias. Esta mulher de Bogotá antecipou-se e optou por isolar-se já faz dias JUANCHO TORRES / GETTY IMAGES
HOLANDA. Regressada de Itália, esta mulher foi diagnosticada com Covid-19. Na sua casa, em Haia, a cumprir a quarentena, acede em posar para a fotografia ROBIN UTRECHT / GETTY IMAGES
VENEZUELA. Na debilitada Caracas, a braços com graves problemas políticos, uma mulher com máscara desinfeta os sapatos MANAURE QUINTERO / REUTERS
VATICANO. Desde a mítica janela voltada para a Praça de São Pedro, em Roma, o Papa Francisco faz a tradicional bênção do Angelus para um espaço vazio REUTERS

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 21 de março de 2020. Pode ser consultado aqui

Coreia do Sul, um modelo de combate de sucesso mas falível

O regresso a casa de sul-coreanos que viviam no estrangeiro está a contribuir para a inflexão da curva de casos de coronavírus na Coreia do Sul, que estava em queda. A China, que registou esta quinta-feira zero casos de contágio interno, enfrenta o mesmo problema

O surto de Covid-19 parecia estar controlado na Coreia do Sul, mas esta semana um aumento contínuo do número de casos positivos voltou a fazer disparar os alarmes. Esta quinta-feira registaram-se 152 novos casos, ontem mais 93 e na véspera mais 84.

“À luz do recente aumento rápido do número de casos de Covid-19 na Europa, nos Estados Unidos e na região do Médio Oriente, bem como do aumento do número de casos importados encontrados tanto em quarentenas nos aeroportos como em comunidades, o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da Coreia (KCDC) anunciou que o Procedimento Especial de Entrada [no país] foi alargado a todos os viajantes”, decretou esta quinta-feira a KCDC, num comunicado publicado no seu sítio na Internet.

Desde a meia-noite desta quinta-feira quem tenta entrar na Coreia do Sul tem de responder a um questionário, medir a febre, fornecer um endereço no país e informações de contacto. Nos 14 dias seguintes, terá de reportar diariamente os seus sintomas através de uma aplicação de autodiagnóstico no telemóvel.

As novas medidas visaram já o voo charter com 80 sul-coreanos a bordo, que aterrou esta quinta-feira à tarde no Aeroporto Internacional de Incheon, em Seul, vindo do Irão — o terceiro país mais afetado em termos globais. Os passageiros foram transportados para uma unidade de isolamento, em Seongnam, a sul da capital sul-coreana, “onde passarão dois dias em testes ao coronavírus. Se derem negativo, será pedido a essas pessoas que se isolem voluntariamente nas suas casas”, noticiou o jornal “The Korea Herald”.

Normalidade aparente

Desde o início desta crise, a Coreia do Sul — que chegou a ter o pior surto fora da China — tem vindo a aplicar um modelo de combate assente na transparência e na cooperação dos cidadãos, em contexto de uma aparente normalidade. Seul optou por realizar testes em massa à população, abdicando de medidas de bloqueio como o encerramento de fronteiras ou o isolamento domiciliário, como têm sido adotadas na maioria dos países.

Hoje a Coreia do Sul tem uma das mais baixas taxas de mortalidade por Covid-19: apenas 1,06%.

“Fizemos o nosso melhor para armazenarmos recursos e trabalhamos com esforço para fazer testes em massa a pessoas e realizar quarentenas”, diz o epidemiologista Hwang Seung-sik, professor na Universidade Nacional de Seul, citado pela televisão árabe Al-Jazeera. “Mas o coronavírus anda por aí há três meses e não é muito claro quais os preparativos que fizeram os Estados Unidos e os países europeus.”

China ainda não canta vitória

Tal como na Coreia do Sul, atualmente a maior preocupação na China prende-se com o regresso a casa de chineses que vivem no estrangeiro. Esta quinta-feira, Pequim anunciou, pela primeira vez desde dezembro, zero casos de contágio interno. Em compensação, foram detetados 34 casos importados do estrangeiro.

No presente contexto, os chineses que vivem no exterior sentem-se mais protegidos pelas medidas de vigilância e controlo impostas pelo seu Governo do que pela resposta dos sobrecarregados serviços de saúde ocidentais.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 19 de março de 2020. Pode ser consultado aqui