A existência de casos de covid-19 na Faixa de Gaza motivou 240 artistas a publicar uma carta aberta. “O bloqueio de Israel impede a entrada de medicamentos e material médico, pessoal e ajuda humanitária fundamental”, alertam. “A pressão internacional é urgentemente necessária para tornar a vida em Gaza viável e digna”
A pandemia que tomou o planeta de assalto levou um pouco daquilo que é ‘a normalidade de Gaza’ aos quatro cantos do mundo: cidades confinadas, restrição de movimentos, encerramento de fronteiras, desemprego em alta, colapso económico, ansiedade, medo e incerteza em relação ao futuro.
Na origem da situação estão a ocupação israelita (1967-2005) e o bloqueio fronteiriço que dura desde 2007 – quando o grupo islamita Hamas tomou de assalto o poder –, com consequências dramáticas para quem lá vive: o desemprego entre os jovens ronda os 60% e mais de 80% da população vive dependente da ajuda internacional.
A isto se somam três guerras desencadeadas por Israel (2008/2009, 2012 e 2014) e agora a pandemia de covid-19, a que Gaza também não escapa, apesar do isolamento. Desde 21 de março foram contabilizados 20 casos positivos.
“Os relatos dos primeiros casos de coronavírus na densamente povoada Gaza são profundamente perturbadores”, alertam 240 artistas, portugueses e estrangeiros, numa carta aberta divulgada na quarta-feira. “O bloqueio de Israel impede a entrada de medicamentos e material médico, pessoal e ajuda humanitária fundamental. A pressão internacional é urgentemente necessária para tornar a vida em Gaza viável e digna. O cerco de Israel deve acabar.”
Entre os signatários portugueses estão o músico Sérgio Godinho, o rapper Chullage, a escritora Patrícia Portela, a pintora Teresa Cabral, o dramaturgo Tiago Rodrigues e o coreógrafo Rafael Alvarez.
Os subscritores internacionais incluem os músicos Peter Gabriel e Roger Waters, a banda Massive Attack, o compositor Brian Eno, a ativista Naomi Klein, o escritor Irvine Welsh e o ator Viggo Mortensen.
Ameaça mortal na maior prisão ao ar livre
“Bem antes da crise em curso, os hospitais de Gaza já estavam no ponto de rutura devido à falta de recursos essenciais negados pelo cerco israelita. O seu sistema de saúde não conseguiu dar resposta aos milhares de ferimentos por bala, obrigando a muitas amputações.”
A carta não se limita a expor a fragilidade de Gaza e do seu sistema de saúde. Vai mais longe e apela a um embargo militar internacional a Israel, “até que este país cumpra todas as suas obrigações à luz do direito internacional”.
“As epidemias (e pandemias) são desproporcionalmente violentas para as populações atormentadas pela pobreza, ocupação militar, discriminação e opressão institucionalizada”, alertam. “Com a pandemia, os quase dois milhões de habitantes de Gaza, predominantemente refugiados, enfrentam uma ameaça mortal na maior prisão ao ar livre do mundo.”
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 15 de maio de 2020. Pode ser consultado aqui