A formação de um Executivo é um quebra-cabeças tal que nem o Presidente do país acredita que seja possível. Ainda assim, encarregou alguém da tarefa
1 Quem vai tentar formar Governo?
Benjamin Netanyahu. Ao fim de um acumulado de mais de 15 anos como primeiro-ministro (entre 1996 e 1999, e desde 2009), continua a ser o político em quem os israelitas mais confiam para governar. O seu partido (Likud, direita) venceu as legislativas de 23 de março com 24,2% dos votos, o que lhe garantiu 30 deputados no Parlamento (Knesset, de 120 lugares). Tem de conseguir o apoio de mais 31 para continuar no cargo. Após terminar as reuniões com as várias forças políticas, no início da semana, o Presidente Reuven Rivlin deixou antever uma tarefa quase impossível: “Nenhum candidato tem uma hipótese realista de formar um governo que tenha a confiança do Knesset.”
2 Quem quer ‘Bibi’ a primeiro-ministro?
Dos 13 partidos que elegeram deputados, quatro defenderam, na audiência com o Presidente, que o primeiro-ministro deve ser Netanyahu (conhecido por ‘Bibi’). Cinco outros preferem nomear Yair Lapid, líder do segundo partido mais votado (Yesh Atid, de centro). O Yamina (direita) quer ver o seu líder, Naftali Bennett, à frente do Governo. E três partidos não indicaram preferência, deixando margem a negociações: são eles a Nova Esperança (uma cisão do Likud) e as duas formações árabes.
3 Que contas é possível fazer?
Os quatro partidos que defendem Netanyahu — três partidos religiosos, além do Likud — garantem-lhe o apoio de 52 deputados, insuficiente para suportar uma coligação de governo. Mesmo que Netanyahu consiga atrair para o seu lado o Yamina, ficará ainda assim a dois deputados da maioria de 61. As cinco forças políticas que não o aceitam no cargo de primeiro-ministro totalizam 45 deputados. Resta pois a ‘Bibi’ sacar de um trunfo que seduza um dos três partidos que não anunciaram apoio a qualquer candidato.
4 Quão realista é essa hipótese?
Em política tudo é possível, mais ainda tendo Netanyahu o talento negocial que se lhe reconhece. Mas à partida é difícil antever qualquer das três fações a dar-lhe a mão. O Nova Esperança (direita) foi fundado em dezembro passado a pensar nas eleições e com o foco de tirar Netanyahu do poder. É liderado por um seu antigo ministro, Gideon Sa’ar, e elegeu seis deputados. Esta semana, a número dois do partido, Yifat Shasha-Biton, outra ex-ministra de Netanyahu, expôs o assédio do Likud para que deserte da bancada do Nova Esperança e se junte a Netanyahu: “Ofereceram-me o Ministério da Educação e, em geral, ofereceram o mundo a todos os membros do nosso partido, mas não vai acontecer, por isso parem de telefonar. Somos um grupo muito coeso atrás de Gideon Sa’ar e dissemos explicitamente que não nos sentaremos numa coligação de Netanyahu. Não haverá qualquer deserção”.
5 Os partidos árabes farão a diferença?
O Ra’am (islamita), que elegeu quatro deputados, deixou aberta a possibilidade de viabilizar um Governo de Netanyahu. Mas o apoio a ‘Bibi’ do partido Sionismo Religioso (extremismo judaico), que elegeu seis deputados, pode revelar-se um obstáculo a essa aliança. Já a outra formação árabe, a Lista Conjunta (seis deputados), não parece ser opção. Na tomada de posse do novo Knesset, terça-feira, alguns dos seus deputados invocaram o problema palestiniano e afirmaram-se comprometidos com a luta contra a “ocupação”, o “apartheid” e o “racismo”. Nunca um partido árabe integrou uma coligação de Governo em Israel, apesar dos 20% de cidadãos árabes.
6 E se não houver Governo?
Netanyahu tem 28 dias (até 5 de maio) para obter o apoio da maioria dos deputados. Se não o conseguir, pode pedir mais duas semanas, mas o Presidente não é obrigado a aprovar o que sair desse período extra. Sem coligação, o Presidente pode atribuir a tarefa a outra pessoa, que terá 28 dias (mais 14), ou enviar o processo para o Parlamento, que disporá de 21 dias para reunir apoio suficiente à volta de um candidato. Se o Presidente optar por outro candidato e de novo não resultar, o processo vai automaticamente para o Knesset. Aí, durante 21 dias, qualquer deputado será elegível para formar Governo. Terminado o prazo, se ninguém reunir condições, o Parlamento é dissolvido e haverá eleições, as quintas em pouco mais de dois anos.
7 É este o assunto do momento em Israel?
Longe disso. Netanyahu é notícia também pelo seu julgamento por corrupção. No mesmo dia em que o Presidente de Israel ouvia os partidos, o primeiro-ministro voltava a tribunal para o início da fase de apresentação de provas. “Conheço a posição de muitos, de que o Presidente não devia dar o cargo a um candidato que enfrenta acusações criminais”, disse Reuven Rivlin, acrescentando não ter sido “uma decisão fácil”. Quarta-feira, Netanyahu marcou presença numa homenagem, em Jerusalém, aos 900 sobreviventes do Holocausto que morreram de covid-19. “Numa altura em que avançamos, há coisas que podem levar-nos para trás. O acordo nuclear com o Irão está na mesa outra vez”, disse. Na véspera, Estados Unidos e Irão iniciaram conversações indiretas, em Viena, com vista à reativação daquele pacto. “O acordo com o Irão, que representa para nós uma ameaça de destruição, não nos obriga”, garante ‘Bibi’.
(FOTO Boletins de voto usados nas eleições de 23 de março FLICKR DAS FORÇAS DE DEFESA DE ISRAEL)
Artigo publicado no “Expresso”, a 9 de abril de 2021. Pode ser consultado aqui