Novo Governo (e Presidente) no adeus a Netanyahu

Oito partidos uniram-se para formar um “Governo da Mudança”. Em comum só têm a vontade de arredar Benjamin Netanyahu do poder

1 Israel conseguiu formar Governo?

Finalmente! Setenta e um dias após as eleições legislativas e a escassos 38 minutos de expirar o prazo de que dispunha por lei para formar uma coligação (meia-noite de quarta-feira, 22 horas em Portugal Continental), Yair Lapid, líder do segundo partido mais votado (Yesh Atid, centro), comunicou ao Presidente de Israel que reunira apoios suficientes para constituir Governo.

Antes dele, falhara nesse propósito Benjamin Netanyahu, o israelita que durante mais tempo exerceu o cargo de primeiro-ministro e líder do partido mais votado nas eleições de 23 de março (Likud, direita) — as quartas em menos de dois anos. Antes da tomada de posse, o Parlamento (Knesset) terá ainda de aprovar uma moção de confiança.

2 Quem integra o novo Executivo?

Oito dos 13 partidos com representação parlamentar — de direita, do centro e de esquerda, judeus e árabes, religiosos e seculares — acederam a negociar com Lapid. Além do seu Yesh Atid (centro), o “Governo da Mudança”, como lhe chamaram, envolve o Yamina (direita nacionalista), o Nova Esperança (dissidente do Likud), o Yisrael Beiteinu (nacionalista secular), o Azul e Branco (centro), o histórico Partido Trabalhista (centro-esquerda), o Meretz (esquerda) e a Lista Árabe Unida (Ra’am, islamita).

Todos os líderes partidários serão ministros, excetuando Mansour Abbas, do Ra’am, que fez história ao tornar-se o primeiro partido israelita árabe a integrar uma coligação governativa. Abbas garantiu outras compensações, como, por exemplo, a não demolição de algumas casas de cidadãos árabes.

Ao todo, os oito partidos totalizam 62 deputados — a maioria no Knesset garante-se com 61 num total de 120 —, mas a aprovação parlamentar do novo elenco executivo não está garantida. Pelo menos um deputado do Yamina (Nir Orbach) insurgiu-se contra as cedências feitas pelo seu partido e ameaça votar contra. Basta que mais um deputado se rebele desta maneira e o novo Governo não verá a luz do dia.

3 Será este um governo para durar?

Muito dificilmente. O único cimento a unir as oito fações que integram a aliança é a vontade de arredar Benjamin Netanyahu do poder.

As dificuldades de entendimento entre as partes começaram logo pela escolha de quem iria chefiar o Executivo, tendo ficado acordado que Naftali Bennett, líder do Yamina (direita nacionalista), será primeiro-ministro durante dois anos e Yair Lapid (que começará por ser ministro dos Negócios Estrangeiros) suceder-lhe-á nos restantes dois anos do mandato. Ambos têm, por exemplo, posições contrastantes em relação aos palestinianos: Bennett recusa a solução de dois Estados e Lapid tolera-a.

Igual alternância acontecerá, por exemplo, no Comité de Seleção Judicial — órgão que nomeia juízes para os tribunais —, onde o lugar de representante do Governo irá, em primeiro lugar, para a nº 2 do Yamina, Ayelet Shaked (que será ministra do Interior), e depois para a líder do Partido Trabalhista, Merav Michaeli (que ficará com a pasta dos Transportes).

Os 21 ministérios do “Governo da Mudança” estão divididos por sete partidos (o Ra’am é o único que não dirigirá um ministério). Entre os mais importantes, Benny Gantz (Azul e Branco) será ministro da Defesa, Avigdor Lieberman (Yisrael Beiteinu) será o titular das Finanças e Gideon Sa’ar (Nova Esperança) da Justiça.

4 Quem fará oposição ao “Governo da Mudança”?

O Likud, de Netanyahu, que tem 30 deputados, terá a maior bancada no Knesset. Outros quatro partidos também não integram a coligação: Shas (ultraortodoxo sefardita), Judaísmo da Torá Unida (ultraortodoxo ashkenaze), Sionistas Religiosos (extrema-direita) e Lista Árabe Unida, uma coligação de três partidos árabes. Estas cinco formações totalizam 58 deputados no Knesset. Netanyahu, que está a responder na justiça pelo crime de corrupção, corre o risco de ver o Parlamento, que agora lhe é adverso, aprovar legislação que o impeça de se recandidatar. Netanyahu chamou ao acordo de governo Lapid-Bennett “a fraude do Século”.

5 Que outra mudança aconteceu na política israelita?

A eleição do novo Presidente de Israel, quarta-feira. Isaac Herzog, que era até agora presidente da Agência Judaica, recebeu os votos de 87 dos 120 deputados do Knesset, naquela que foi a vitória mais folgada de sempre. Herzog, que assim se tornou no 11º Presidente, venceu a disputa com a professora Miriam Peretz, que teria sido a primeira mulher no cargo.

Nascido em 1960, em Telavive, Herzog foi o líder máximo do Partido Trabalhista entre 2013 e 2017. Filho de Chaim Herzog, sexto chefe de Estado de Israel (1983-1993), é o primeiro Presidente de segunda geração. Toma posse a 9 de julho.

(FOTO Fotografia de família do 36.º Governo de Israel, que ficou conhecido como “Governo da mudança”. Sentado, entre Naftali Bennett e Yair Lapid, o Presidente Reuven Rivlin AVI OHAYON / Government Press Office (Israel) / WIKIMEDIA COMMONS)

Artigo publicado no “Expresso”, a 4 de junho de 2021. Pode ser consultado aqui

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