Este fim de semana, algures na Europa, os chefes dos serviços secretos dos Estados Unidos, de Israel e do Egito irão reunir-se com o ministro dos Negócios Estrangeiros do Catar para tentar desbloquear uma pausa nos combates na Faixa de Gaza que permita uma troca de prisioneiros. Quase quatro meses após o início da guerra, ainda há 136 israelitas nas mãos do Hamas. A ofensiva de Israel já provocou mais de 26 mil mortos no território palestiniano

Vai haver uma trégua em Gaza?
É esse, pelo menos, o objetivo de conversações que estão previstas, este fim de semana, algures “na Europa”, noticiou o jornal digital “The Times of Israel”.
Por determinação do Presidente Joe Biden, o enviado dos Estados Unidos será o diretor da CIA, William J. Burns, com a missão expressa de “ajudar a mediar um acordo ambicioso entre o Hamas e Israel”, escreve “The Washington Post”.
Do lado israelita, irá igualmente o chefe dos serviços secretos, David Barnea, que lidera a Mossad.
Quem são os mediadores?
Há dois países empenhados na aproximação entre Israel e o Hamas. Um deles é o Egito, que foi o primeiro país árabe a celebrar um tratado de paz com Israel, em 1979, e que será representado por Abbas Kamel, chefe dos serviços de informação do país.
O outro é o Catar, um dos financiadores do Hamas, e que desde o início da guerra tem assumido o papel principal nos esforços de mediação. Nestas conversações, o pequeno reino do Golfo será representado pelo primeiro-ministro e simultaneamente ministro dos Negócios Estrangeiros Sheikh Mohammed bin Abdulrahman Al-Thani.
Al Thani deverá seguir depois para os Estados Unidos já que, na segunda-feira, tem prevista a participação num evento organizado pelo think tank Atlantic Council, em Washington D.C., onde, entre outros tópicos, vai falar sobre como inverter a escalada do conflito no Médio Oriente.
As partes aceitam os mediadores?
Nos últimos dias, a relação entre Israel e o Catar sofreu um abalo, após terem sido divulgadas palavras do primeiro-ministro de Israel, proferidas num encontro com familiares de reféns. “Vocês não me ouvem agradecer ao Catar. Essencialmente, o Catar não é diferente da ONU ou da Cruz Vermelha e, em certo sentido, é ainda mais problemático. Não tenho ilusões sobre eles”, afirmou Benjamin Netanyahu.
A divulgação da gravação destas declarações junto dos órgãos de informação israelitas foi autorizada pelo gabinete do próprio Netanyahu, o que revela uma intenção de que fossem tornadas públicas.
Em reação, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Catar considerou as palavras de Netanyahu “irresponsáveis” e “destrutivas”. Na rede social X, Majed Al Ansari escreveu que Netanyahu está “a obstruir e a minar o processo de mediação, por razões que parecem servir a sua carreira política, em vez de dar prioridade ao salvamento de vidas inocentes, incluindo reféns israelitas”.
O que poderá ganhar Israel com um acordo?
A principal reivindicação do Governo de Telavive é a libertação da totalidade dos 132 reféns levados pelo Hamas no dia do ataque e que Israel estima que estejam ainda em cativeiro.
Segundo a agência Reuters, em cima da mesa estará a possibilidade de todos serem libertados, por fases e por categorias — começando pelos civis e concluindo com os militares —, ao longo de uma pausa de um mês nos combates.
Para Israel, uma trégua significa também uma pausa naquela que já é a guerra mais duradoura em quase 76 anos de história do país.
E o Hamas, o que tem a ganhar?
O grupo islamita, que controla a Faixa de Gaza, garantiria, para além da trégua, a libertação de milhares de palestinianos detidos nas prisões israelitas.
Para a população de Gaza, uma pausa na guerra seria também sinónimo de um grande alívio, com a entrada no território de ajuda humanitária. Esta sexta-feira, as Nações Unidas alertaram para a explosão de casos de hepatite A nos acampamentos de deslocados.
Há alguém contrário a um acordo?
Desde logo, o primeiro-ministro de Israel que, não só se tem mostrado defensor da guerra em Gaza como opositor a um Estado palestiniano.
No domingo, na sequência de uma conversa telefónica com Joe Biden, Benjamin Netanyahu declarou ter dito ao Presidente norte-americano que rejeitava as exigências do Hamas considerando que um acordo significaria que outro ataque do género do de 7 de outubro “seria apenas uma questão de tempo”.
Por seu lado, o Hamas tem reiterado a rejeição a qualquer acordo que não conduza ao fim da guerra.
Esta trégua pode prenunciar um cessar-fogo definitivo?
Longe disso. Netanyahu não está sozinho na oposição ao fim da guerra. De forma consistente, governantes israelitas têm-se mostrado contrários a um cessar-fogo permanente sem que a capacidade militar do Hamas seja totalmente destruída.
Esta sexta-feira, o assunto foi objeto de comentário por parte de um antigo secretário-geral da NATO, em termos muito negativos e comprometedores para com o primeiro-ministro de Israel. Em entrevista ao diário espanhol “El País”. Javier Solana considerou que o fim da guerra é improvável “com este Netanyahu”.
“Quando [Josep] Borrell [o chefe da diplomacia da União Europeia] diz que o Hamas foi financiado por Israel, não está a mentir. Disse-o de uma forma muito crua. É verdade que tudo o que Netanyahu podia fazer para dividir os palestinianos, fê-lo.”
Uma trégua seria inédita nesta guerra?
Não. Em novembro, as partes respeitaram uma pausa nos combates que durou sete dias, que permitiu a entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza e a concretização de uma troca de prisioneiros: o Hamas libertou 105 reféns israelitas e Israel abriu as portas das suas cadeias a 240 mulheres e menores palestinianos.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 26 de janeiro de 2024. Pode ser consultado aqui








