Em Hong Kong, a repressão policial e a demora do Governo de Carrie Lam em corresponder às exigências dos manifestantes radicalizaram os protestos. Algumas “armas” que passaram a ser usadas são reflexo disso
Prestes a cumprir seis meses — a primeira grande manifestação realizou-se a 9 de junho —, os protestos em Hong Kong conquistam cada vez mais e novos palcos. Após mega manifestações de rua que chegaram a mobilizar dois milhões de pessoas (16 de junho), os protestos irromperam de forma violenta pelo edifício do Conselho Legislativo (1 de julho), transformaram estações de metro em arenas de confronto com a polícia e obrigaram ao cancelamento de centenas de voos após manifestantes ocuparem o principal terminal do Aeroporto Internacional de Hong Kong.
Este mês, os protestos transferiram-se para dentro do campus, tomando várias universidades. A situação mais crítica viveu-se dentro do Politécnico, que se encontra cercado pela polícia desde o passado dia 17. Do seu interior, na semana passada, chegaram imagens de verdadeira guerra com manifestantes armados com arcos e flechas, fisgas e “cocktails molotov” como quem se prepara para uma dura batalha.
Se em julho passado, o Expresso realçava “25 armas não letais” usadas pelos manifestantes de Hong Kong, o episódio no Politécnico obriga a uma atualização desse arsenal, ainda que, como dizia ao Expresso um cidadão de Hong Kong no início desta semana, “a franja violenta [de manifestantes] corresponde maioritariamente a pessoas tomadas pela raiva contra a polícia. Esse número [de radicais] não irá aumentar”.
Desde segunda-feira que a direção do Politécnico tem apelado ao fim do cerco policial ao edifício. Equipas da universidade percorreram o Politécnico para procurar manifestantes que pudessem estar escondidos e convencê-los a abandonarem o local. Encontraram apenas uma mulher, na terça-feira.
Esta quinta-feira, a polícia entrou no Politécnico com o objetivo de “restaurar a segurança” e reabri-lo assim que possível. Para além de provas de vandalismo, a polícia recolheu substâncias perigosas. “Alguns produtos que encontramos são inflamáveis à temperatura de 36 graus [Celsius]”, afirmou o superintendente da polícia Li Kwai-wah. “Temos de retirá-los do local o mais rapidamente possível.”
FOTOGALERIA
BASTÃO. Com um taco de beisebol na mão, e vontade de dormir, um manifestante não baixa a guarda dentro da Universidade Chinesa de Hong Kong ATHIT PERAWONGMETHA / REUTERSARCO E FLECHA. Perto da Universidade Politécnica, um manifestante mais parece uma personagem de um filme sobre Robin Hood ANTHONY WALLACE / AFP / GETTY IMAGES“COCKTAIL MOLOTOV”. Uma arma inimaginável nos primeiros tempos dos protestos, quando faziam notícia mega manifestações totalmente pacíficas ANTHONY WALLACE / AFP / GETTY IMAGESARMA DE BB. Este tipo de pistola permite o disparo de pequenas bolas metálicas. BB corresponde a “Ball Bullets” CHRIS MCGRATH / GETTY IMAGESRAQUETE. Um manifestante tenta intercetar cartuchos de gás lacrimogéneo, durante confrontos com a polícia CHRIS MCGRATH / GETTY IMAGESFISGA. Brincadeiras de infância, hoje com propósitos muito mais sérios e perigosos TYRONE SIU / REUTERSFISGA HUMANA. Dentro do Politécnico, três manifestantes dão corpo a uma fisga humana para atirar pedras à polícia ANTHONY WALLACE / AFP / GETTY IMAGESCATAPULTA. Estudantes da Universidade Batista de Hong Kong improvisam uma catapulta com que arremessam bolas de ténis por cima de uma barricada THOMAS PETER / REUTERSESCADA. A necessidade de subir mais alto para localizar onde está o perigo THOMAS PETER / REUTERSPEDRA. Os guarda-chuvas não deixaram de ser usados nos protestos, mas perderam protagonismo THOMAS PETER / REUTERSTIJOLO. Mais do que arma de arremesso, é usado em quantidade para obstruir caminhos, como este acesso à Universidade Politécnica ISAAC LAWRENCE / AFP / GETTY IMAGESCARRINHO DE CARGA. Transporte de tijolos para construir muros de proteção, no interior do Politécnico ADNAN ABIDI / REUTERSCIMENTO. Tudo serve para erguer e solidificar estruturas de defesa perante possíveis investidas dos agentes de segurança DALE DE LA REY / AFP / GETTY IMAGESBALIZA. Na Universidade Chinesa de Hong Kong, a melhor defesa é o ataque SHANNON STAPLETON / REUTERSGÁS E QUÍMICOS. Manifestantes preparam “cocktails molotov” dentro do edifício do Politécnico DALE DE LA REY / AFP / GETTY IMAGESFOGO. Cria uma barreira entre manifestantes e polícias e denuncia o caos que resulta das situações mais intensas CHRIS MCGRATH / GETTY IMAGESESCUDO. Proteção reforçada no interior da Universidade Chinesa de Hong Kong SHANNON STAPLETON / REUTERSPRIMEIROS-SOCORROS. A radicalização dos protestos e o aumento da repressão por parte da polícia fez jorrar sangue NICOLAS ASFOURI / AFP / GETTY IMAGESPASSA-MONTANHAS. Um jovem de cara tapada junto a um posto de abastecimento alimentar dentro do Politécnico, durante o cerco da polícia THOMAS PETER / REUTERSPASSA-MONTANHAS. Um jovem de cara tapada junto a um posto de abastecimento alimentar dentro do Politécnico, durante o cerco da polícia THOMAS PETER / REUTERSVASSOURA. Um estudante solitário limpa o fundo da piscina do Politécnico, danificado por testes com os “cocktails molotov” ali fabricados ADNAN ABIDI / REUTERSCADEIRA. O inevitável cansaço após dias e noites em missão nos protestos de Hong Kong THOMAS PETER / REUTERSTENDA. O conforto possível dentro da Universidade Politécnica, enquanto se espera por uma nova jornada de luta THOMAS PETER / REUTERSCORDA. Com o edifício do Politécnico cercado pela polícia, um manifestante arrisca uma manobra perigosa para tentar fugir dali ANTHONY WALLACE / AFP / GETTY IMAGESFLOR. Os protestos em Hong Kong já fizeram dois mortos, um dos quais um estudante de 22 anos. Estes ramos foram deixados no Tamar Park em sua memória PHILIP FONG / AFP / GETTY IMAGES
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 5 de fevereiro de 2019. Pode ser consultado aqui
Jornalista de Internacional no "Expresso". A cada artigo que escrevo, passo a olhar para o mundo de forma diferente. Acho que é isso que me apaixona no jornalismo.