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Perfil de Yoon Suk-yeol. Novo Presidente promete inverter o rumo

Novato e conservador, quer ser duro com o vizinho do Norte. A 21 de maio recebe Joe Biden em Seul

O Presidente sul-coreano Yoon Suk-yeol e a primeira dama Kim Keon-hee de partida para uma viagem ao Cambodja, a 11 de novembro de 2022 FLICKR REPUBLIC OF KOREA

A tomada de posse do conservador Yoon Suk-yeol como Presidente da Coreia do Sul, terça-feira, augura uma nova era. O sucessor do liberal Moon Jae-in (impedido por lei de se recandidatar) venceu as eleições de 9 de março com um discurso anticorrupção e assumindo um tom duro face à Coreia do Norte.

Na política há menos de um ano, Yoon venceu com menos de 1% de vantagem sobre o adversário mais direto, Lee Jae-myung, do partido de Moon. Com 61 anos, Yoon formou-se em Direito e só entrou na Ordem dos Advogados à nona tentativa. Promotor de justiça durante muitos anos, procurador-geral do país entre 2019 e 2021, enfrentou pesos pesados da política e magnatas dos negócios, incluindo membros do Executivo de Moon e ainda a ex-Presidente Park Geun-hye, que acabou impugnada e condenada a 25 anos de cadeia (entretanto foi indultada).

Para desanuviar, o novo Presidente tem como prazer pessoal a culinária. Católico, casado e sem filhos, é doido por animais, possuindo quatro cães e três gatos.

Estimular a economia na era pós-pandémica com menos intervenção estatal, combater os altos preços da habitação e o desemprego persistente entre os jovens, abolir o salário mínimo e a semana laboral de 52 horas (defende que “os trabalhadores devem poder trabalhar 120 horas”) foram algumas das suas promessas de campanha. Mais polémica foi a ideia de abolir o Ministério da Igualdade de Género e Família e a associação que traçou entre feminismo e baixa natalidade.

Maior desafio reside em Pyongyang

Há desafios à agenda do novo Presidente, nomeadamente o facto de o seu Partido do Poder Popular só ter 113 dos 300 deputados da Assembleia Nacional e a realização de eleições locais em junho, que já levaram Yoon a um périplo pelo país.

Mas será a relação com o imprevisível vizinho do Norte a ditar muito do êxito da sua governação. “Yoon prometeu continuar os esforços diplomáticos com a Coreia do Norte e apoiou o envio de ajuda humanitária. Ao mesmo tempo, defendeu o reforço da [relação de] dissuasão entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos contra as ameaças/provocações da Coreia do Norte e a continuação das sanções internacionais até que Pyongyang registe uma desnuclearização substancial”, diz ao Expresso Jong Eun Lee, professor na Universidade Americana, em Washington. “Enquanto a Coreia do Norte continuar com testes com mísseis [desde janeiro já fez pelo menos 15], é provável que a Administração Yoon adote uma atitude de linha dura. É previsível que responda com iniciativas com vista ao fortalecimento do sistema de defesa antimíssil da Coreia do Sul e a realização de exercícios de defesa em larga escala com os EUA.”

Em campanha, Yoon defendeu ataques preventivos contra a Coreia do Norte como única forma de conter o perigo dos novos mísseis hipersónicos, testados com êxito por Pyongyang. Prometeu pedir aos EUA que colocassem no país armas nuclea­res táticas. Dentro de dias saberá o que pensa o homólogo americano. Entre 20 e 24 de maio, Joe Biden fará o seu primeiro périplo asiático: Coreia do Sul e Japão. O encontro Yoon-Biden será a 21.

Jong Eun Lee antecipa “o fortalecimento da aliança entre os dois países”, formalizada em 1949, após a divisão da península. “A Administração Yoon defende uma ‘aliança estratégica abrangente’, que passe pela expansão das áreas de cooperação com os EUA, em concreto a participação na estrutura de segurança do Indo-Pacífico — como o Diálogo de Segurança Quadrilateral (Quad, na sigla inglesa) —, a cooperação tecnológica nas áreas biológica, nuclear, cibernética e espacial e a parceria Coreia do Sul-EUA-Japão.”

O desejo de ser parte ativa no Quad insere-se na vontade de Yoon de projetar o país como “Estado-pivô global”, não exclusivamente focado na Coreia do Norte. Isso terá impacto na relação com a China — o maior parceiro comercial da Coreia do Sul, que absorve mais de 25% das suas exportações —, já que o Quad (EUA, Austrália, Índia e Japão) visa conter a influência de Pequim na região. “É inquestionável que [Coreia do Sul e China] não podem negligenciar-se ou ignorar-se”, disse Yoon ao “The Washington Post”. “Ao nível da política e da segurança, a China tem uma aliança com a Coreia do Norte, e nós com os EUA. Mas há 40 divisões militares ao longo da DMZ [zona desmilitarizada entre as Coreias]. É essa a nossa realidade no terreno.”

Versão integral do perfil aqui.

Artigo publicado no “Expresso”, a 13 de maio de 2022. Pode ser consultado aqui

Viragem na presidência após campanha para esquecer

Yoon Suk-yeol venceu as eleições por menos de 1%. Ex-procurador-geral, propõe política mais dura com a Coreia do Norte

A democracia sul-coreana assinala, este ano, 35 anos de vida. Quarta-feira, o país foi a votos para escolher novo Presidente e, a atentar no perfil dos principais candidatos que disputaram as eleições até ao último voto, talvez não seja exagerado dizer que os sul-coreanos estão fartos de políticos. Pela primeira vez na era democrática, nenhum dos candidatos mais votados tem experiência parlamentar ou governamental.

O nome a memorizar é Yoon Suk-yeol. Representante do Partido do Poder Popular (conservador), até agora na oposição, recebeu mais de 16,4 milhões de votos (48,56%). Em segundo lugar ficou Lee Jae-myung, do Partido Democrático (liberal, no poder) e veterano da administração pública (até há pouco, governador da província de Gyeonggi). Foi o preferido de 16,1 milhões de eleitores (47,83%). A afluência foi de 77,1%, entre 44 milhões de eleitores.

Os dois candidatos terminaram a corrida à Casa Azul separados por menos de 1% dos votos. Na Coreia do Sul, o chefe de Estado só pode exercer um mandato de cinco anos e as presidenciais ficam concluídas numa volta só, ou seja, ganha o candidato mais votado, independentemente da robustez do seu resultado. “Considerarei a unidade nacional a minha prio­ridade de topo”, disse o vencedor.

O novo Presidente, de 61 anos, dedicou 26 à justiça, onde exerceu como promotor. Entre 2019 e 2021, Yoon Suk-yeo foi procurador-geral do país, tendo ganho prestígio ao liderar investigações relativas a escândalos de corrupção que implicavam assessores do Presidente Moon Jae-in.

Durante a campanha eleitoral, Yoon ganhou fama de ser antifeminista, depois de ter dito que a discriminação de género não existe no país de forma estrutural, e de prometer abolir o Ministério da Igualdade de Género e da Família.

Votar no “mal menor”

Esta foi uma de muitas polémicas, escândalos e insultos que marcaram o período pré-eleitoral. Os dois principais aspirantes atacaram a esposa um do outro, Lee acusou Yoon de ser bêbado e denunciaram “xamãs” (pessoas com poderes especiais) na campanha adversária. A alta taxa de reprovação de ambos levou a que este escrutínio fosse visto como a escolha “do mal menor” ou rotulado de “eleição desagradável” ou “eleição ‘Squid Game’” (por analogia com uma violenta série sul-coreana de grande sucesso na Netflix), pelo nível de agressividade entre os principais nomes em liça. Numa reportagem do jornal “Korea Times” realizada junto de jovens que votavam pela primeira vez, um deles afirmava: “Alguns candidatos parecem umas cabeças ocas, a julgar pelas suas palavras e ações.”

Na hora da vitória, Yoon prometeu “prestar atenção aos meios de subsistência das pessoas”, “fornecer serviços de bem-estar aos necessitados”, acabar com a corrupção e fazer o máximo para que a Coreia do Sul “sirva como membro orgulhoso e responsável da comunidade internacional e do mundo livre”.

A estratégia de Yoon à frente da quarta maior economia da Ásia (a seguir à China, Japão e Índia) passa por redefinir a relação com a China e endurecer a posição do país para com a Coreia do Norte. Nos últimos meses, Pyongyang lançou um número recorde de mísseis.

Artigo publicado no “Expresso”, a 11 de março de 2022. Pode ser consultado aqui ou aqui

Do topo do poder para trás das grades

Em quatro dias uma ex-chefe de Estado foi condenada a 24 anos de prisão e outro foi preso. País corrupto ou democracia madura?

Três dos oito presidentes que conduziram os destinos da Coreia do Sul desde 1987, ano em que ascendeu ao clube dos países democráticos, foram presos e condenados por corrupção. Um quarto suicidou-se quando viu o seu nome, e o de familiares, envolvido num escândalo de corrupção. Um quinto aguarda julgamento.

Preso a 26 de março, Lee Myung-bak (2008-2013), foi formalmente acusado de corrupção na segunda-feira passada. Três dias antes, a sua sucessora na Casa Azul, Park Geun-hye (2013-2017), fora condenada a 24 anos de prisão por abuso de poder, suborno, coação e divulgação de segredos de Estado.

“Não estou certa de que se possa provar que a Coreia do Sul é um país corrupto ao mais alto nível. Uma coisa é clara: o Presidente, apesar de democraticamente eleito, possui um poder considerável que pode ser explorado por parentes próximos ou amigos pessoais”, diz ao Expresso a professora Young-Key Kim-Renaud, que ensina Língua e Cultura Coreana na Universidade George Washington, nos EUA.

Foi o que aconteceu com Park Geun-hye. Filha do ex-ditador Park Chung-hee (1963-1979), aquela que foi a primeira mulher a ocupar a presidência permitiu que uma amiga e confidente, Choi Soon-sil, se aproveitasse desse estatuto para solicitar subornos e intrometer-se nos assuntos de Estado. Park foi impugnada pelo Parlamento a 9 de dezembro de 2016, presa a 31 de março seguinte e, agora, condenada. Quanto à ‘Rasputina’ Choi, cumpre 20 anos de prisão.

“A sociedade coreana é cada vez menos corrupta e tem avançado no sentido de limpar a corrupção e aperfeiçoar as condições de direitos humanos herdadas dos períodos pós-colonial e pós-guerra. As gerações jovens consideram a corrupção um grande mal, que não deve ser tolerado pelos valores democráticos. Uma forte prova foram as impressionantes manifestações pacíficas de milhões de pessoas, todos os fins de semana, que levaram à impugnação de Park Geun-hye” — a “revolução das velas”, maior movimento de contestação social da era democrática, iniciado no final de 2016.

“Um paradoxo interessante é que Park Geun-hye foi provavelmente dos titulares mais bem preparados” para o cargo, continua a professora. “Mas não compreendeu as expectativas dos coreanos de hoje. Uma questão importante, em evidência durante a sua destituição, foi o desejo quase unânime dos coreanos de controlar a influência política das grandes empresas. A prisão [segunda-feira] do ex-presidente Lee Myung-bak foi mais um passo nessa limpeza.”

Laços demasiado estreitos

Ex-presidente da Câmara de Seul entre 2002 e 2006, Lee foi acusado de ter recebido subornos no valor de 11 mil milhões de won (€8 milhões), incluindo da Samsung. O escândalo à volta de Park também arrastou “para a lama” Lee Jae-yong, herdeiro da gigante dos telemóveis, condenado a cinco anos de prisão por crimes de corrupção. Estes casos expõem a relação promíscua entre a elite política e os famosos conglomerados sul-coreanos (chaebol), normalmente controlados por famílias e que tiraram o país da pobreza. Antes de entrar na política, o ex-presidente Lee Myung-bak liderou a Hyundai.

“Os coreanos tentam livrar-se do último obstáculo importante ao seu desenvolvimento, erradicando a corrupção de todos os sectores, não apenas da política”, comenta a professora. “As pessoas estão fartas desta grande proximidade entre Governo e grandes conglomerados”, à custa dos mais pequenos, “e do fosso crescente entre ricos e pobres”.

A 10 mil quilómetros de distância, Byung Goo Kang, sul-coreano de 60 anos a viver em Portugal há 33, acompanha a saga dos poderosos a contas com a justiça com um sentimento agridoce. “Este fenómeno revela que a democracia está a funcionar. Antigamente era quase impossível imaginar políticos ou empresários poderosos a serem julgados”, diz ao Expresso este professor de língua e cultura coreanas na Universidade Nova de Lisboa. “É muito triste ver antigos presidentes presos, mas fico contente com a evolução da democracia na Coreia.”

O país não tem, porém, apenas ex-governantes problemáticos. Kim Dae-jung (1998-2003) ganhou o Nobel da Paz em 2000 e o atua líder, Moon Jae-in — protagonista da cimeira intercoreana de 27 de abril —, pode ir a caminho disso.

(Foto: Casa Azul, residência do Presidente sul-coreano, em Seul WIKIMEDIA COMMONS)

Artigo publicado no Expresso Online, a 14 de abril de 2018. Pode ser lido aqui. A tradução em inglês pode ser lida aqui

Discretos e unidos: eis os fãs portugueses do K-Pop

Com origem na Coreia do Sul, o K-Pop é um género musical que conquistou milhões de fãs em todo o mundo. Portugal não está imune ao fenómeno. Este sábado, realiza-se em Lisboa a eliminatória portuguesa do K-Pop World Festival. A competição é também um momento de convívio entre uma comunidade pequena, mas unida, diz uma participante

Pouco presente nos noticiários portugueses e a mais de 10 mil quilómetros de distância, a Coreia do Sul é, para a generalidade dos portugueses, um somatório de conhecimentos avulsos.

Os mais atentos à política internacional saberão que a península coreana parece viver permanentemente à beira de um conflito, com o Norte governado pela dinastia Kim a testar, com frequência, mísseis cada vez mais ameaçadores. E talvez também que o secretário-geral das Nações Unidas que antecedeu a António Guterres foi um sul-coreano, Ban Ki-moon.

Quem se interessa por indústria e tecnologia associará o país a marcas globais como a Samsung, a KIA ou a LG. E os amantes de desporto recordarão que foi em Seul que Rosa Mota conquistou o ouro olímpico e talvez que, não há muito tempo, passou pelo plantel portista um futebolista sul-coreano chamado Suk, do qual já terão perdido o rasto.

Para um número crescente de jovens portugueses, porém, a Coreia do Sul é bastante mais especial do que tudo isso. É a pátria do K-Pop (lê-se “Kei Pop”, ou seja, Korea Pop), um género musical que combina diferentes sonoridades e estilos musicais, elementos coreográficos, efeitos audiovisuais e eleva ao patamar de ídolos jovens intérpretes que ditam tendências de moda.

Semanalmente, o programa interativo “After School Club”, transmitido na televisão sul-coreana Arirang, é dedicado ao mundo do K-Pop. Na imagem, os convidados são os B.I.G. MARGARIDA MOTA

Este sábado, o Museu do Oriente, em Lisboa, acolhe, pelas 17 horas, a pré-eliminatória portuguesa do K-Pop World Festival 2017. O evento, que se realiza desde 2012, visa selecionar um vencedor na categoria de Canto (há seis candidatos) e outro na de Performance (concorrem sete grupos) que, posteriormente, serão avaliados pela organização da grande final, na cidade coreana de Changwon (sudeste), a 29 de setembro próximo.

Em cinco edições já realizadas, apenas por uma vez Portugal foi escolhido para disputar a final. Em 2014, então com 19 anos, a lisboeta Filipa Cardoso venceu a categoria de Canto e, com isso, ganhou um bilhete para uma experiência inesquecível. “A vitória deu-me oportunidade para pôr os pés num lugar novo, cuja cultura (para além da música pop) muito aprecio e de fazer algo com que sempre sonhei — pisar um palco e cantar num estádio, com 25 mil pessoas a assistir!” (Veja abaixo o vídeo da atuação de Filipa Cardoso em Changwon.)

Filipa conheceu a K-Pop em 2011 quando “passeava” pelo Youtube. “Na coluna das recomendações surgiu um vídeo de umas raparigas com umas calças muito coloridas”, as Girls’ Generation. “Atraída pelas cores e pela curiosidade, abri o vídeo e gostei imenso da música e do conceito — música pop animada, estilo hiper-feminizado, coreografia. Nunca tinha visto um grupo com tantos membros (algo muito comum no K-Pop) e isso também me fascinou.”

Filipa tinha alguns conhecimentos musicais, tinha tido aulas de guitarra e cantava num coro. Sozinha, cantava apenas em casa — até conhecer o K-Pop e decidir-se a aventurar no festival português. “Hoje em dia, continuo a cantar K-Pop, mas não tanto como na fase da descoberta. Oiço K-Pop mas ao contrário do pop extremo, colorido, mega comercial que me aliciou no início, agora ouço artistas mais ‘folk’/‘indie’, que se aproximam mais do que gostaria de fazer caso tivesse oportunidade de ser artista.” Ouve principalmente AkmuLim Kim e Eddy Kim.

As portuguesas E-DEN, vencedoras do K-Pop Festival Portugal em 2016 na categoria Performance EMBAIXADA DA REPÚBLICA DA COREIA EM PORTUGAL

Vencedoras no ano passado na categoria Performance — mas sem direito a ir à final na Coreia —, as E-DEN não desistem desse sonho. “Termos ganho foi das melhores sensações de sempre. Lutamos pelo título desde 2013 e, apesar de altos e baixos, finalmente conseguimos um dos nossos objetivos”, conta Natacha Costa, 23 anos. “Mas ainda falta outro… Portugal não foi apurado para a final na Coreia. Este ano vamos mesmo tentar que seja!”

Natacha é a “Sasha” deste grupo de quatro amigas e a única com formação em dança. Acompanham-na a Susana (23 anos), a Cathia (22) e a Mariah (20). Conheceram-se num evento em Odivelas, em agosto de 2012, “numa espécie de matiné/discoteca de K-pop”, e ali se inspiraram para um grupo de “covers”.

“Foi algo criado com base numa amizade super espontânea” e do interesse despertado pelos animes [animações japonesas] que passavam na televisão. “Os animes ajudaram bastante os curiosos a irem mais longe e a acompanharem também o J-pop [pop japonês] e a chegarem ao K-Pop e à restante cultura da Coreia.”

A língua é uma barreira? Nem por isso

Uma das características do K-Pop é a existência de pequenas frases em inglês no meio das letras em coreano. Os trechos ajudam à internacionalização das músicas, mas em pouco facilitam a vida de quem as quer interpretar do princípio ao fim. Mas arranhem ou não o coreano, nenhum fã português do K-Pop encara a língua como uma barreira intransponível.

“Nunca aprendi coreano e não foi por isso que deixei de desfrutar da música”, diz Filipa Cardoso. “Gostava do K-Pop não pelo significado das palavras em si (que nunca soube, a maior parte das vezes) mas pelo conceito como um todo. É extremamente pop. Nenhum outro país explorou este género desta maneira. São as cores, os cenários, o estilo, a batida, as coreografias… Sempre me preocupei mais em sentir a batida e aprender as coreografias. Quando tinha muito interesse em saber o significado das letras, ia ao Google. Mas era raro. Mais depressa pesquisava simplesmente a versão romanizada do hangeul (alfabeto coreano). Resultado: acabava por ter uma pronúncia ótima sem fazer a mínima ideia do que estava a dizer.”

Foto de conjunto do K-Pop Festival Portugal, no ano passado, no Teatro Maria Matos, em Lisboa EMBAIXADA DA REPÚBLICA DA COREIA EM PORTUGAL

Se Filipa chegou ao K-Pop pelos vídeos na internet e Natacha pelos animes japoneses na televisão, o cantor e ator Rui Andrade — o apresentador do espetáculo pelo segundo ano consecutivo — mergulhou nesse mundo por força da curiosidade artística. “Como músico e como curioso, já conhecia algumas canções, mas não propriamente o mundo K-Pop. Quando fiz a pesquisa para apresentar o evento, fiquei completamente rendido”, diz o artista, que aprecia, em especial, a cantora Ailee e o grupo 2NE1.

“As músicas são muito apelativas e os instrumentais muito sonantes, mas principalmente a imagem dos vídeos é extremamente cuidada, têm muita qualidade. É isso que caracteriza o k-Pop. A nossa música pop ocidental, até mesmo a música americana das Beyoncés e Lady Gagas inspira-se no K-Pop.”

Rui Andrade nunca teve um projeto nesta área, mas já teve um contacto com um produtor coreano. “A primeira coisa que ele me perguntou não foi se eu sabia cantar… foi qual era a minha altura! E explicou-me que seria muito difícil encontrar bailarinos com a minha altura para fazerem parte de vídeoclips…”

Captura de ecrã do vídeoclip “Gangnam Style”, de Psy

Há cinco anos, um artista de K-Pop arrebatou o nº 1 das listas de músicas mais ouvidas em todo o mundo: o rapper Psy, com o tema “Gangnam Style”. (Por curiosidade, Gangnam é um bairro chique de Seul.) O sul-coreano correu mundo e foi convidado por Barack Obama para atuar num evento natalício na Casa Branca. Foi o expoente máximo daquilo que muitos artistas K-Pop são, na realidade, a todo o tempo: embaixadores da Coreia do Sul um pouco por todo o mundo.

Não por acaso, a final do K-Pop World Festival é organizada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros sul-coreano e as eliminatórias nacionais, realizadas em mais de 60 países, pelas missões diplomáticas sul-coreanas.

Jin Sun Lee, assessora cultural na Embaixada da República da Coreia em Portugal, diz que os participantes no festival português têm vindo a aumentar “em quantidade e em qualidade”. E que “o objetivo do evento é divertir os fãs do K-Pop em Portugal”. A repetente Natacha confirma que assim é: “Apesar de serem eventos discretos, o K-pop vai tendo os seus momentos nesta comunidade pequena mas unida!”

(Foto principal: Girls’ Generation é um dos mais populares grupos femininos sul-coreanos de K-Pop KOREA.NET / KOREAN CULTURE AND INFORMATION SERVICE (JEON HAN) / WIKIMEDIA COMMONS)

Artigo publicado no Expresso Online, a 29 de julho de 2017. Pode ser consultado aqui