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Ainda há protestos nas ruas do Irão?

O enforcamento de quatro manifestantes espalhou o medo. Há pelo menos mais 20 no corredor da morte

Milhares de pessoas dirigem-se ao cemitério onde está enterrada Mahsa Amini, em Saqez, no Curdistão, em outubro de 2022 UGC / AFP / GETTY IMAGES

1 Continua a haver manifestações?

Não, pelo menos com a dimensão de há semanas. As razões para protestar não esmoreceram e o ressentimento pode até ter aumentado perante a repressão do regime à maior vaga de contestação desde a Revolução Islâmica. Mas o enforcamento de manifestantes e a exibição dos cadáveres em guindastes na praça pública incutiram medo. Para a teocracia, é prova de que a violência é uma arma eficaz para silenciar a dissidência.

2 Quantas pessoas já foram executadas?

Há notícia de quatro enforcamentos, um dos quais de um karateca com títulos de campeão nacional. Há mais 20 no corredor da morte e pelo menos 42 enfrentam acusações puníveis com a pena capital.

3 Que outros meios usa o regime para reprimir?

Penas de prisão pesadas, por exemplo. Segundo a Agência Noticiosa de Ativistas de Direitos Humanos (HRANA), durante os protestos foram detidas quase 20 mil pessoas, entre as quais 164 menores. Entre os detidos há figuras públicas, como o futebolista Amir Nasr-Azadani, que esta semana viu a sua condenação à morte ser substituída por 26 anos de prisão. Taraneh Alidoosti, atriz, foi libertada sob fiança.

4 A repressão visa estrangeiros?

Sim. Um trabalhador humanitário belga foi condenado a 40 anos de prisão e 74 chicotadas e um ex-vice-ministro da Defesa iraniano-britânico à morte, acusados de espionagem. Outros casos, porém, são um embaraço para os ayatollahs: uma sobrinha do Líder Supremo foi presa após apelar à comunidade internacional que expulse os representantes do Irão e uma filha do ex-Presidente Akbar Hashemi Rafsanjani foi condenada a cinco anos de prisão por incitar aos protestos.

Artigo publicado no “Expresso”, a 13 de janeiro de 2023. Pode ser consultado aqui e aqui

Alarme do terrorismo voltou a soar na Europa

Três atentados recentes fizeram subir o nível de alerta. A França quer mexer em Schengen

1 Porque se fala de novo de terrorismo?

Porque o Velho Continente voltou a ser alvo da violência jiadista. Na terça-feira, em Viena, quatro pessoas morreram e 15 ficaram feridas num ataque com arma branca realizado por um austríaco de 20 anos, de origem macedónia. O homem tinha cumprido pena de prisão após ser detido quando se preparava para ir para a Síria e juntar-se ao autodenominado “Estado Islâmico” (Daesh). Este grupo terrorista reivindicou o ataque.

2 Este atentado foi caso único?

Não. A 16 de outubro, na cidade francesa de Conflans-Sainte-Honorine, Samuel Paty, um professor de 47 anos, foi decapitado por um refugiado de 18 anos de origem chechena, por ter mostrado caricaturas do profeta Maomé numa aula sobre liberdade de expressão. E a 29 seguinte, também em França, um tunisino esfaqueou mortalmente três pessoas, dentro da Basílica de Notre-Dame de l’Assomption, em Nice. Uma das vítimas, uma mulher de 60 anos, foi degolada (a intenção do terrorista era decapitá-la).

3 Como reagiu a Europa?

Esta semana, o Reino Unido elevou o nível de alerta para “grave”. Já antes a França decretara alerta máximo. “Sou favorável a uma revisão profunda de Schengen para repensar a sua organização e fortalecer a segurança da nossa fronteira comum com uma força fronteiriça adequada”, defendeu na quinta-feira o Presidente francês, durante uma visita a um ponto fronteiriço com Espanha. Emmanuel Macron anunciou a duplicação do número de agentes nas fronteiras francesas.

4 Macron questiona Schengen porquê?

Quer o agressor de Viena quer o de Nice circularam livremente pela área Schengen antes de atacarem. O tunisino Brahim Aouissaoui entrou na Europa pela ilha italiana de Lampedusa, onde chegou a 20 de setembro num barco de pesca, e viajou de comboio para França, onde chegou horas antes de matar em Nice. Já Fejzulai Kujtim, o jiadista de Viena, viajou até à vizinha Eslováquia, em julho, para tentar comprar munições.

5 Porquê matar por decapitação?

Por uma questão de propaganda. Decapitar é um ato bárbaro que revela poder e induz medo. O Daesh decapitava pessoas, filmava e punha a circular nas redes sociais. Mas também devido a uma dimensão espiritual. Muitos movimentos religiosos acreditam que, para o Juízo Final ter lugar — e o defunto ganhar a Eternidade —, o corpo tem de estar inteiro.

Artigo publicado no “Expresso”, a 7 de novembro de 2020. Pode ser consultado aqui