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Panda, o simpático embaixador da China

Os pandas são um barómetro das relações de Pequim. Empresta-os por amizade e reclama-os quando se zanga

Justin Trudeau, primeiro-ministro do Canadá, apresenta dois pandas nascidos em Toronto (2016) D.R.

“Ya Ya” regressou à China ao estilo de uma celebridade. Durante meses, milhões de chineses acompanharam, com angústia, a odisseia desta panda fêmea de 23 anos (equivalente a 80 num ser humano), que viveu 20 no jardim zoológico de Memphis, nos Estados Unidos. Desde notícias que lhe atribuíam saúde débil até à morte por ataque cardíaco do seu companheiro “Le Le”, em fevereiro passado, “Ya Ya” gerou grande comoção na China, onde se pediu que retornasse a casa. Quando o avião que a transportou tocou solo chinês, no fim de abril, a hashtag “‘Ya Ya’ aterrou em Xangai” explodiu na rede social Weibo (o Twitter chinês): foi partilhada 430 milhões de vezes.

“Ya Ya” foi para a América em 2003, quando o mundo vivia na sombra do 11 de Setembro, mas a relação entre Washington e Pequim atravessava um bom momento, confirmada pelo apoio dos Estados Unidos à adesão da China à Organização Mundial do Comércio, concretizada em dezembro de 2001. “Ya Ya” era a chancela dessa amizade.

“O panda sinaliza que o Estado chinês está de boas relações com outro Estado e valoriza-o. É uma espécie de marcador de livro”, diz ao Expresso Tiago André Lopes, professor de Relações Internacionais na Universidade Portucalense. “A diplomacia do panda é uma forma de soft power (projeção de poder por meios pacíficos) um pouco diferente, porque é um presente e uma obrigação. E é reversível, já que alguns pandas voltam para trás.”

Como um diplomata real

Foi o que sucedeu a “Ya Ya”, que deixou os Estados Unidos num contexto oposto ao da sua chegada, com uma guerra comercial, a questão de Taiwan, a disputa em torno do 5G e até o conflito na Ucrânia a encher de obstáculos a via do diálogo entre chineses e americanos. Ainda que de forma simbólica, a panda tornou-se rosto dessa degradação.

Ao lado do líder chinês Xi Jinping, o russo Vladimir Putin visita pandas, num zoo em Moscovo(2019) GETTY IMAGES

“A retirada de um panda é uma espécie de cartão amarelo aos regimes dos países que os recebem. Antes de fazer o que normalmente os Estados fazem — chamar o seu embaixador de volta e baixar o grau de importância da sua missão diplomática —, a China usa os pandas como primeira linha de aviso”, continua Tiago Lopes. “Quando era chanceler, Angela Merkel comparou os pandas a diplomatas. Se um país corta relações com outro, os diplomatas vão-se embora. Com os pandas é o mesmo”, acrescenta Paulo Duarte, especialista em Relações Internacionais das Universidades do Minho e Lusófona.

Os pandas gigantes são nativos da China. O seu habitat natural é nas montanhas de Sichuan, no sudoeste do país. São, por isso, um tesouro nacional que a China só partilha com quem lhe é especial.

A alemã Angela Merkel visita pandas no zoo de Berlim (2017) AXEL SCHMIDT / REUTERS

Na era moderna, a utilização do panda como instrumento de política externa começou a ser posta em prática em 1941 quando, a braços com a invasão japonesa, a República da China agradeceu o apoio dos Estados Unidos e ofereceu dois pandas ao zoo do Bronx (Nova Iorque). A estratégia ganhou visibilidade em 1972 quando da histórica visita à China de Richard Nixon, que desbravou caminho até ao restabelecimento da relação diplomática bilateral, em 1979. O Presidente americano presenteou Mao Tsé-Tung com dois bois-almiscarados e, em troca, o Zoo Nacional do Smithsonian, em Washington, recebeu dois pandas.

Mais longe da extinção

“O panda marca distintivamente a China. Trocar cavalos ou cães é muito comum. No mundo clássico, mesmo a troca de prisioneiros de alto nível ou de príncipes e princesas entre famílias nobres para garantir a paz era normal, mas não distintiva”, realça Tiago Lopes.

Se, antes, a China oferecia pandas, desde 1984 empresta-os, criticada por agir contra a Convenção de 1975 sobre Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Extinção. O empréstimo é enquadrado por contratos de longo prazo, que obrigam quem os acolhe ao pagamento de uma verba anual — o contrato padrão é de um milhão de dólares por par (€935 mil), ao ano. “A China pode, em qualquer momento, retirar os pandas e tem até missões para vigiar o seu estado”, diz Paulo Duarte.

Em 2010, a China fez regressar um panda que estava em Washington, depois de Barack Obama ter aberto as portas da Casa Branca ao Dalai Lama, o líder tibetano. No ano seguinte, não cumpriu a promessa de enviar pandas para um zoo norueguês, descontente com a atribuição do Nobel da Paz ao dissidente Liu Xiaobo.

Grande parte das receitas dos alugueres são investidas na conservação da espécie. A política tem dado frutos: em 2016, a União Internacional para a Conservação da Natureza, a autoridade global em matéria de espécies ameaçadas, passou os pandas de espécie “ameaçada” para “vulnerável”. Hoje, estima-se que haja quase 1900 exemplares na natureza e 600 em zoos e centros de reprodução.

Estes peluches de carne e osso são campeões de popularidade e muito contribuem para suavizar a imagem autoritária da China. Para Xi Jinping, são intermediários perfeitos para consolidar amizades.

DIÁLOGOS INFORMAIS

DIPLOMACIA DAS MEIAS Nasceu da irreverência do atual primeiro-ministro do Canadá, que não se inibe em usar meias coloridas em eventos públicos. Numa parada gay em Toronto, Justin Trudeau vestiu meias arco-íris, com a inscrição “Eid Mubarak” (alusiva a uma festa islâmica) e feitas numa empresa da cidade. Nesses preparos, homenageou duas comunidades e promoveu a indústria local. A moda fez escola. Em maio, o primeiro-ministro britânico compareceu num encontro com o homólogo japonês de meias vermelhas com o nome de um clube de basebol japonês. Disse Rishi Sunak a Fumio Kishida: “Espero que a sua equipa de basebol tenha tido uma época melhor do que a minha equipa de futebol.” Conversa para criar pontes.

DIPLOMACIA DO BASQUETEBOL Antes de Donald Trump ser Presidente e promover cimeiras até então impensáveis com Kim Jong-un, o excêntrico basquetebolista americano Dennis Rodman lançou-se numa cruzada para aproximar Estados Unidos e Coreia do Norte. Sem cobertura oficial, liderou delegações de antigas glórias da NBA àquele país totalitário, que realizaram “jogos de boa-vontade” com atletas norte-coreanos. A iniciativa não deu frutos políticos, mas Rodman provou que algum diálogo é possível.

DIPLOMACIA DO CRÍQUETE Índia e Paquistão já se enfrentaram em três guerras desde a partição da Índia britânica e, graças à ferida aberta chamada Caxemira, as duas potências nucleares estão permanentemente envoltos em tensão. Em várias ocasiões, o críquete — desporto mais popular nos dois países — tem sido usado para desanuviar, com jogos entre as duas seleções e dirigentes políticos dos dois lados na tribuna. Enquanto a paz não chega, o críquete cria essa ilusão.

DIPLOMACIA DO BASEBOL Barack Obama foi dos Presidentes americanos que mais tentaram aproximar-se de Cuba. Se há imagens que o provam, são as que o mostram no Estádio Latino-Americano de Havana, ao lado do homólogo Raúl Castro, a ver uma partida de basebol entre a seleção cubana e uma equipa da Florida. A conversa relaxada entre ambos foi puro ato político. Já o basebol, modalidade mais apreciada nos dois países, afirmou semelhanças entre ambos.

DIPLOMACIA DO PINGUE-PONGUE Em 1971, antes da histórica visita de Richard Nixon à China, Pequim convidou jogadores americanos de ténis de mesa para realizarem uma digressão no país. O grupo foi fotografado junto à Grande Muralha e foi capa da revista “Time”, com o título “China: um jogo totalmente novo”. Pouco tempo depois, EUA e China fizeram as pazes.

A AGENDA ESCONDIDA DA DIPLOMACIA DO IOGA

O dia 14 de dezembro de 2014 entrou para a História como a data em que a Índia levou a sua paixão pelo ioga ao palco da política internacional. Na Assembleia-Geral da ONU, apresentou uma resolução aprovada por 175 Estados-membros, a instituir o Dia Internacional do Ioga a cada 21 de junho. Ao fazê-lo, a Índia oficializou o ioga como instrumento de afirmação internacional. “Quando o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, subiu ao poder (em maio de 2014), tentou usar o ioga globalmente para afirmar o poder crescente da Índia, tal como a China faz com os pandas”, diz ao Expresso o indiano Amit Singh, que antes de ser investigador no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra foi professor de ioga durante anos. “Na ONU, quase nenhum país se opôs, porque o ioga existe em todo o lado e faz bem a toda a gente. O problema é a agenda escondida do Governo de Modi, a promoção do hindutva”, nacionalismo hindu, que tenta elevar o hinduísmo ao estatuto de religião superior da Índia. “E, infelizmente, o ioga faz parte disso.” Singh tem formação na área dos direitos humanos e do multiculturalismo. “Direitos humanos e ioga são basicamente o mesmo.” Com essa sensibilidade, o indiano desconstrói a centralidade do ioga no projeto de Modi. “Ao promover o ioga no estrangeiro, tenta esconder o que se passa na Índia ao nível da violação dos direitos humanos de muçulmanos, da minoria cristã e de laicos”, acusa. “Acho que o ioga deve ser para toda a gente, mas não deve ser imposto. Modi tenta impô-lo nas mesquitas e escolas muçulmanas.” Depois, “vai ao estrangeiro e fala do exemplo de Gandhi”.

Artigo publicado no “Expresso”, a 9 de junho de 2023. Pode ser consultado aqui ou aqui

ONU estabelece relações formais com o Governo talibã do Afeganistão

Uma resolução aprovada no Conselho de Segurança das Nações Unidas garante a continuidade da missão de assistência da ONU em território afegão. Não se cumpriram os receios de que a Rússia pudesse usar o direito de veto, em retaliação pelas sanções que enfrenta devido à invasão da Ucrânia

O Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou, esta quinta-feira, por larga maioria, uma resolução que formaliza a futura relação entre a organização e as autoridades talibãs do Afeganistão.

O documento, proposto pela Noruega, “redesenha as relações do organismo global com Cabul para corresponder à tomada do poder pelos talibãs, no ano pasado”, escreve a emissora Al-Jazeera, do Catar.

A Resolução 2626 garante também a continuidade das Nações Unidas em território afegão, ao prorrogar por um ano o mandato da Missão de Assistência das Nações Unidas ao Afeganistão (UNAMA), até 17 de março de 2023.

“Esta resolução envia uma mensagem clara de que o Conselho de Segurança está firmemente por trás do apoio contínuo da ONU ao povo afegão, que enfrenta desafios e incertezas sem precedentes”, regozijou-se a missão da Noruega na ONU, num post publicado no Twitter.

Os receios de que a Rússia poderia usar o seu poder de veto — por ser um dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança —, em retaliação pelas pesadas sanções que enfrenta devido à invasão da Ucrânia, não se confirmaram. Dos 15 votos, 14 foram favoráveis à resoluão e só um país, precisamente a Rússia, se absteve.

Esta posição da ONU constitui o primeiro reconhecimento diplomático internacional do Governo talibã. Apesar de delegações do grupo extremista religioso já terem sido recebidas em vários países, até ao momento nenhum país estabeleceu relações diplomáticas, a nível bilateral, com o novo Governo de Cabul.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 17 de março de 2022. Pode ser consultado aqui

Pode o diálogo salvar o acordo nuclear do Irão?

Seis países estão reunidos em Viena para tentar reativar o acordo sobre o programa nuclear iraniano. Os EUA, que se retiraram do entendimento, assistem à distância

1 Por que razão o acordo volta a ser discutido?

Assinado em 2015 por sete países, o acordo que colocou o programa nuclear do Irão sob supervisão internacional sofreu um duro golpe três anos depois. Donald Trump denunciou “um mau acordo”, retirou os Estados Unidos de forma unilateral e repôs sanções ao Irão, que afetaram duramente a exportação de petróleo.

A República Islâmica ripostou. Começou a violar limites assumidos no acordo, designadamente ao nível do enriquecimento de urânio, e dificultou o acesso total dos inspetores da ONU às suas instalações nucleares. Voltaram a soar alertas quanto a uma bomba nuclear em posse dos ayatollahs.

Esta semana, em Viena, foi retomado o diálogo para reativar o acordo.

2 Há pressa nestas conversações?

Muita, a atentar nas palavras de negociadores ocidentais. “Esta negociação é urgente”, defenderam, de forma inequívoca, representantes do Reino Unido, França e Alemanha, num comunicado. “Temos a certeza de que estamos a aproximar-nos do ponto em que a escalada do Irão ao nível do seu programa nuclear terá esvaziado completamente o JCPoA”, o acrónimo inglês do nome do acordo.

“Temos semanas, não meses, para concluir um acordo antes que os principais benefícios de não proliferação do JCPoA se percam.”

Mikhail Ulyanov, o negociador-chefe da Rússia, considerou esta jornada diplomática como “possivelmente a ronda final” das negociações.

3 Os EUA participam nestas negociações?

Apenas indiretamente. O diálogo que decorre no luxuoso hotel Palais Coburg — onde o acordo foi assinado há seis anos — está circunscrito ao Irão e ao grupo P4+1, ou seja, quatro membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Rússia, China, França e Reino Unido) e Alemanha.

A saída dos EUA, que pôs o acordo à beira do colapso, acentuou a desconfiança entre os dois países, que não têm relações formais, e levou Teerão a rejeitar conversas diretas com Washington, apesar de Joe Biden ser pró-acordo. “Pode ter havido algum progresso modesto”, admitiu esta semana, em Washington, Ned Price, porta-voz do Departamento de Estado, sobre o que se passa na Áustria.

4 Qual é a posição do novo Governo iraniano?

Se o acordo de 2015 foi negociado por uma equipa liderada por um Presidente reformista (Hassan Rohani), desde agosto que o Irão tem um Presidente conservador (Ebrahim Raisi). Na sua primeira conferência de imprensa após tomar posse, Raisi prometeu que não iria permitir que as negociações se arrastassem e reiterou que o programa de mísseis balísticos do Irão (que os EUA tentaram incluir no acordo de 2015) “não é negociável”.

“Incorporamos as sensibilidades do novo Governo iraniano”, garantiu o diplomata espanhol Enrique Mora, coordenador da União Europeia em Viena. “Estamos exatamente no ponto em que devíamos estar se quisermos obter um resultado final de sucesso.”

5 O que poderá levar o Irão a fazer cedências?

A grave situação económica. No início do ano, um relatório do Banco Mundial identificou um “triplo choque” que contribui para a destruição do país. “A economia iraniana entrou num terceiro ano consecutivo de recessão a seguir ao triplo choque provocado pelas sanções, pelo colapso do mercado petrolífero e pela covid-19”, lê-se no documento.

Em Viena, Teerão tem como principal exigência o levantamento total das sanções ocidentais. Mas também é verdade que para o novo Presidente o diálogo com o Ocidente não é uma prioridade. Numa mudança significativa em relação ao antecessor, Ebrahim Raisi tem no horizonte não EUA e União Europeia, mas antes China e Rússia.

(FOTO Bandeiras dos participantes nas negociações que conduziram à assinatura do JCPOA, a 14 de julho de 2015, em Viena EUROPEAN EXTERNAL ACTION SERVICE)

Artigo publicado no “Expresso”, a 30 de dezembro de 2021. Pode ser consultado aqui

Cimeira União Europeia-Israel: será desta?

Israel é Estado associado da União Europeia desde 1995, mas as partes não se reúnem, nesse contexto, há cinco anos. Prevista para fevereiro próximo, a cimeira foi adiada, garante a imprensa israelita, após vários países europeus se oporem à sua realização

Prevista para 28 de fevereiro, a cimeira entre a União Europeia e Israel foi adiada, escreve esta terça-feira o diário israelita “Haaretz”. Na origem da decisão europeia está a política de colonização do Governo liderado por Benjamin Netanyahu, à qual a União Europeia se opõe.

Entre as medidas israelitas que, nos últimos tempos, mais desafiaram a posição de Bruxelas estão planos para a construção de cerca de 6000 novas casas no território palestiniano da Cisjordânia e em Jerusalém Oriental — anunciados já após Donald Trump entrar na Casa Branca, nos EUA — e também a aprovação, no Parlamento de Israel (Knesset), na segunda-feira, de uma lei que irá possibilitar a expropriação de terrenos privados palestinianos com vista à legalização de colonatos ilegais.

A reunião entre israelitas e europeus seria uma espécie de degelo entre as partes, que se reuniram pela última vez, a este nível, a 24 de julho de 2012, em Bruxelas, naquele que foi o 11º encontro do género.

Sob anonimato, diplomatas europeus afirmaram ao “Haaretz”, à margem do Conselho dos Negócios Estrangeiros da UE de segunda-feira, em Bruxelas, que vários Estados membros expressaram reservas em relação à realização da cimeira nesta altura, que poderia ser interpretada como uma recompensa à conduta de Israel, que desaprovam.

No mesmo sentido, o negociador palestiniano Saeb Erekat afirmou que esta cimeira, a realizar-se, ajudaria a “enterrar” a solução de dois Estados. “O Governo israelita não deve ser recompensado pelas suas violações sistemáticas do direito internacional humanitário. Em vez disso, deve haver responsabilidade”, disse em entrevista ao “EUObserver”, publicada na segunda-feira.

“A falta de responsabilidade, a impunidade, é o que dá ao Governo israelita confiança suficiente para avançar com o seu plano de enterrar as perspetivas relativas à solução de dois Estados”, acrescentou Erekat.

Europeus unidos na defesa de dois Estados

Segundo o “Haaretz”, os países da UE que mais reservas expressaram em relação à realização do “Conselho de Associação” — o nome formal das cimeiras UE-Israel — foram a França, Irlanda, Holanda, Finlândia e Suécia. Esta última é o único membro da UE da Europa Ocidental a reconhecer o Estado da Palestina.

Na conferência de imprensa que se seguiu ao final do Conselho dos Negócios Estrangeiros, Federica Mogherini, Alta Representante da UE para os Assuntos Externos, anunciou o início dos trabalhos com vista à preparação da cimeira, sem concretizar uma data. “Será uma boa oportunidade, um bom instrumento, para trocarmos pontos de vista e encontrarmos terreno comum com uma das partes. Nós mantemos constantemente o nosso compromisso com os dois lados de uma forma intensa e a vários níveis” — da presidência à sociedade civil — “e isso continuará.”

Israel é um Estado associado da União Europeia, desde 1995. Nos últimos anos, a relação ressentiu-se de algumas decisões tomadas em Bruxelas (como a nova rotulagem de bens importados pela UE que são produzidos nos colonatos) e em várias capitais Europeias (como o reconhecimento do Estado da Palestina por parte de vários Parlamentos nacionais, nomeadamente o português).

O bloco europeu defende a solução de dois Estados para o conflito israelo-palestiniano e opõe-se à política de construção de colonatos levada a cabo por Israel. “Numa época em que observamos, na comunidade internacional, tantas mudanças em políticas já consolidadas, o que não muda é a posição da UE relativamente à solução de dois Estados, aos colonatos e a Jerusalém”, recordou Mogherini, na segunda-feira. “Bem sei que esta não é a mensagem que mais se ouve em todo o mundo, mas continuarão a ouvi-la consistentemente da Europa. É algo que une todos os europeus.”

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 7 de fevereiro de 2017. Pode ser consultado aqui

Acordo sobre nuclear iraniano na fase do ponto e vírgula

A versão em farsi tem 100 páginas. A inglesa será um pouco mais curta. Em Viena, as delegações que participam no diálogo sobre o programa nuclear iraniano passam a pente fico o rascunho de um possível acordo final. O último prazo acordado para a obtenção de um acordo final termina esta segunda-feira

O Irão e seis potências internacionais estão cada vez mais próximos de alcançar um acordo histórico sobre o programa nuclear iraniano. “Ninguém está a pensar numa nova extensão do prazo. Todos estão a trabalhar arduamente para conseguir o sim durante o dia de hoje, mas ainda é necessária vontade política”, escreveu no Twitter, ao final da manhã desta segunda-feira, Alireza Miryousefi, membro da delegação iraniana.

As conversações arrastam-se, ininterruptamente, há 17 dias, no Hotel Palais Coburg, em Viena, e o prazo para a obtenção de um acordo final já foi prorrogado por três vezes — o último expira esta segunda-feira.

Em cima da mesa está um acordo que, da perspetiva ocidental, irá limitar a capacidade do Irão produzir a bomba atómica e também, conforme exige Teerão, consagra o fim das sanções internacionais ao país dos ayatollahs.

Segundo o diário britânico “The Guardian”, diplomatas europeus presentes nas conversações confirmaram, no domingo, que os maiores obstáculos já foram ultrapassados. A delegação norte-americana, porém, revela mais cautelas insistindo que “grandes questões” continuam em aberto.

Igualmente no twitter, Alireza Miryousefi escreveu que a delegação persa está a analisar “um documento de 100 páginas”. Segundo “The Guardian”, a versão em língua inglesa tem “mais de 80 páginas, incluindo cinco anexos”. As delegações estarão a passar o texto a pente fino, certificando-se que nenhuma vírgula mal colocada dará azo a interpretações contraditórias.

Ministro à varanda, jornalistas na rua

Exibindo boa disposição, o ministro iraniano dos Negócios Estrangeiros, Mohammad Javad Zarif, tem surgido à varanda do hotel com frequência. Numa das vezes acenou com folhas de papel, presume-se que do texto em estudo, para os muitos jornalistas que já se encontram, em permanência, em frente ao hotel à espera de noticiar o histórico acordo.  

Participam nestas negociações, para além do Irão, os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (EUA, Reino unido, França, Rússia e China), todos países com capacidade nuclear, e ainda a Alemanha — o chamado P5+1. A União Europeia está presente através da sua Alta Representante para a Política Externa e de Segurança, a italiana Federica Mogherini.

Europeus e chineses parecem ser os mais apressados quanto ao anúncio de um documento final. “Acreditamos que nenhum acordo será perfeito e que já há condições para que seja alcançado um bom acordo”, disse o ministro chinês dos Negócios Estrangeiros, Wang Yi. “Não pode, nem deve, haver mais atrasos.”

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 13 de julho de 2015. Pode ser consultado aqui