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Coreia do Sul votou (de máscara e luvas) e premiou Governo pelo combate à covid-19

Os sul-coreanos foram a votos quarta-feira em contexto de pandemia. O escrutínio, que registou a mais alta taxa de afluência dos últimos 28 anos, realizou-se sob rigorosas medidas de proteção. Mas se o uso de máscaras e desinfetante foi tranquilo, a distribuição de luvas descartáveis causou polémica

Medidas sanitárias a observar nas assembleias de voto sul-coreanas

Os sul-coreanos desafiaram o medo e, esta quarta-feira, afluíram às urnas em massa para eleger o próximo Parlamento. De um universo de quase 44 milhões de eleitores, votaram mais de 29 milhões (66,2%) — um recorde de participação desde 1992.

Segundo dados preliminares, o Partido Democrático (PD, centro-esquerda) do Presidente Moon Jae-in foi o grande vencedor, tendo assegurado a eleição de 180 dos 300 deputados da Assembleia Nacional, portanto. Não só garante a maioria absoluta como granjeia a vitória partidária mais expressiva desde que o país começou a ter eleições livres, em 1987.

Entre os 103 deputados eleitos pelo derrotado Partido Futuro Unido (conservador), na oposição, está um desertor norte-coreano. Thae Yong Ho, de 55 anos, era nº 2 na embaixada da Coreia do Norte em Londres quando, em 2016, fugiu para o Sul. Foi agora eleito por Gangnam, o bairro chique de Seul retratado no tema do rapper Psy que correu mundo, Gangnam Style.

Efeito covid

“Os resultados do partido do Governo refletem o nível de aprovação do público em relação à liderança de Moon após a pandemia”, analisa o diário “The Korea Times”.

A Coreia do Sul é identificada como um caso de sucesso ao nível da contenção do coronavírus. Recorrendo a uma estratégia de realização de testes em massa e de aplicação de períodos de quarentena — em detrimento de medidas de confinamento como as que vigoram na maioria dos países europeus —, a Coreia do Sul conseguiu controlar a situação com números relativamente baixos, tendo em conta a sua proximidade geográfica à China.

Esta quinta-feira, pelo quarto dia consecutivo, o país registou menos de 30 novos casos de covid-19. Tem agora um total de 10.613 infetados e 229 mortos, números que Portugal já ultrapassou. Os recuperados são quase 8000.

“Espera-se que os resultados aumentem a confiança de Moon para avançar com políticas importantes a nível da economia, diplomacia, reforma judicial e outras áreas durante o que resta do seu mandato, que termina em maio de 2022”, escreve o jornal coreano.

As luvas da polémica

foram as primeiras eleições legislativas em todo o mundo em época de pandemia e o ambiente em torno das mesas de voto refletiu esses tempos extraordinários.

Após superarem filas de espera por vezes na ordem de dezenas de metros de comprimento — agravadas pela distância física de um metro aconselhada pelas autoridades —, os eleitores, com máscara no rosto, encontravam à entrada das 14.330 assembleias de voto, dispersas por todo o país, um posto de controlo onde lhes era medida a temperatura corporal. Quem superasse os 37.5ºC era encaminhado para uma secção especial para fazer um teste à covid-19.

À entrada, os cidadãos tinham também de desinfetar as mãos antes de calçarem um par de luvas de plástico, que, embora sejam hoje uma arma de defesa contra o coronavírus, não geraram consenso entre os sul-coreanos.

Segundo o jornal “The Korea Herald”, antes das eleições, várias petições apelaram à proibição do uso das luvas por questões… ambientais. “Como votaram mais de 29 milhões de cidadãos, estima-se que mais de 58 milhões de luvas descartáveis tenham sido usadas. Segundo uma ONG local, Movimento Desperdício Zero da Coreia, empilhar as luvas usadas nas eleições podia atingir a altura de sete KLI 63 Building [arranha-céus de 60 andares em Seul] ou 1,7 km de comprimento”. Para os críticos desta medida, os eleitores deveriam ter levado as suas próprias luvas de casa.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 16 de abril de 2020. Pode ser consultado aqui

Afegãos escolhem o próximo Presidente, apoiados por tecnologia… e burros

As quartas eleições presidenciais após a queda do regime talibã, em finais de 2001, realizam-se numa altura em que os fundamentalistas islâmicos controlam mais território do que nunca desde então. Nas urnas, a disputa-se trava-se entre os dois homens que, nos últimos cinco anos, protagonizaram uma liderança bicéfala no Afeganistão: o Presidente Ashraf Ghani e o seu chefe executivo Abdullah Abdullah

“Não vou votar nas eleições. Não voto porque os boletins vão ser preenchidos [de forma fraudulenta]”, diz ao Expresso o afegão Habib, a partir de Cabul. Este é um sentimento comum a muitos outros afegãos que se habituaram a ver cada ato eleitoral envolto em polémica e acusações de corrupção.

Para as eleições deste sábado — as quartas presidenciais desde a deposição dos talibãs, em finais de 2001 —, estão mobilizados, segundo o Ministério do Interior, quase 72 mil agentes das forças de segurança para garantir a segurança do ato eleitoral.

À volta de 9,6 milhões de afegãos registaram-se para votar, em assembleias de voto montadas em escolas, mesquitas, instalações hospitalares e edifícios públicos, e equipadas com dispositivos de identificação biométrica.

Cerca de 100 mil pessoas contratadas pela Comissão Eleitoral Independente prestam apoio à boca das urnas. “Não aceitaremos os votos sem leitura biométrica”, alertou a presidente do organismo Hawa Alam Nuristani.

Liderança bicéfala

Esta aposta na tecnologia visa minimizar os casos de corrupção, num país que ocupa o 172º lugar (em 180 países) no último Índice de Corrupção da organização Transparência Internacional.

Em virtude da geografia agreste do país, o transporte do material eleitoral faz-se, em muitos sítios, às costas de homens e de burros, por entre caminhos sinuosos em direção a aldeias perdidas entre montanhas.

Dos 18 candidatos registados inicialmente, cinco abandonaram a corrida. Este sábado, como há cinco anos, a disputa trava-se principalmente entre os mesmos dois homens: o economista pashtune Ashraf Ghani, de 70 anos, e o médico Abdullah Abdullah, de 59, filho de pai pashtune e de mãe tadjique. Num país tribal como o Afeganistão, a origem étnica não é um pormenor.

Ambos cantaram vitória nas eleições de 2014 e, após meses de impasse político, tornaram-se protagonistas num governo de unidade: Ashraf como Presidente e Abdullah como “chefe executivo”, um posto criado propositadamente para ele. Esta liderança bicéfala viria a paralisar o país várias vezes em virtude de divergências inultrapassáveis no interior do executivo.

Talibãs em alta

Quem quer que vença as presidenciais deste sábado terá pela frente o desafio da paz com os talibãs. Os “estudantes”, que pugnam por um Estado fundamentalista islâmico, controlam hoje mais território do que alguma vez dominaram desde que foram derrubados do poder, em finais de 2001.

Há cerca de três semanas, o Presidente norte-americano, Donald Trump, pôs um ponto final às conversações diretas entre EUA e talibãs que decorriam desde outubro, no Qatar. A rutura seguiu-se a um ataque suicida talibã que provocou 12 mortos, em Cabul, entre os quais um romeno que trabalhava para o exército americano.

Numa entrevista divulgada na terça-feira passada, Hamid Karzai, Presidente afegão entre 2001 e 2014, pôs o dedo na ferida que vem sangrando o país há décadas e defendeu que estas eleições podem provocar (ainda mais) violência no país. “Primeiro devíamos alcançar a paz no Afeganistão e depois realizar eleições“, disse. “Não é possível haver eleições num país que atravessa um conflito imposto a partir do estrangeiro. Nós estamos numa guerra que tem objetivos e interesses estrangeiros. Este conflito não era nosso. Nós apenas morremos nele.”

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Comício eleitoral em Bamiyan. O buda gigante, detonado pelos talibãs durante a sua governação, continua por reconstruir PAULA BRONSTEIN / GETTY IMAGES
Segurança reforçada junto a um poster de Ashraf Ghani, o atual Presidente, em Cabul MOHAMMAD ISMAIL / REUTERS
Abdullah Abdullah é o principal adversário do chefe de Estado, nas urnas de voto JALIL AHMAD / REUTERS
Uma ação de campanha a céu aberto, em Bamiyan PAULA BRONSTEIN / GETTY IMAGES
Outra em Herat, a terceira cidade mais populosa do Afeganistão JALIL AHMAD / REUTERS
PAULA BRONSTEIN / GETTY IMAGES
Um comício em Cabul, com direito a interpelação popular OMAR SOBHANI / REUTERS
Um debate na Tolo TV entre Abdullah Abdullah e o antigo senhor da guerra Gulbuddin Hekmatyar. Ao centro, o lugar reservado a Ashraf Ghani ficou vazio OMAR SOBHANI / REUTERS
Os indispensáveis cartazes de propaganda com as fotos dos candidatos… HOSHANG HASHIMI / AFP / GETTY IMAGES
… para encher as avenidas das cidades, como esta em Cabul… SAYED KHODABERDI SADAT / ANADOLU AGENCY / GETTY IMAGES
… ou para distribuir pelo povo. HOSHANG HASHIMI / AFP / GETTY IMAGES
A Comissão Eleitoral Independente contratou mais de 100 mil pessoas para distribuir pelos centros de votação e apoiar, em especial, a utilização dos dispositivos biométricos WAKIL KOHSAR / AFP / GETTY IMAGES
Neste armazém em Cabul, dezenas de tomadas são utilizadas para carregar as máquinas de leitura biométrica WAKIL KOHSAR / AFP / GETTY IMAGES
Segurança apertada junto aos caixotes com material eleitoral prestes a serem despachados para os quatro cantos do país… HOSHANG HASHIMI / AFP / GETTY IMAGES
… transportados em camiões… FARID ZAHIR / AFP / GETTY IMAGES
… carregados por burros… MOHAMMAD ISMAIL / REUTERS
MOHAMMAD ISMAIL / REUTERS
… e por homens. MOHAMMAD ISMAIL / REUTERS
À frente do cortejo, homens armados garantem que o material eleitoral chega intacto ao seu destino, sem cair em mãos corruptas MOHAMMAD ISMAIL / REUTERS
… por vezes, aldeias perdidas entre montanhas inóspitas do Afeganistão MOHAMMAD ISMAIL / REUTERS

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 28 de setembro de 2019. Pode ser consultado aqui

Os rostos e as sensibilidades de quem vai a votos em Israel

Quase 40 partidos disputam, esta terça-feira, os 120 lugares do Parlamento de Israel. Mas só 14 têm reais possibilidades de eleger deputados

Seis meses antes do previsto, Israel vota esta terça-feira para escolher um novo Parlamento (Knesset). A última sondagem prevê uma corrida apertada entre o Likud, o partido de direita do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, e o partido de centro-esquerda Kahol Lavan (Azul e Branco), atribuindo 28 deputados a cada.

Parece confirmar-se, pois, uma constante da política israelita desde a fundação do país, em 1948: nunca um partido conseguiu uma maioria suficiente — ou seja, 61 dos 120 assentos no Knesset — para governar sozinho. A formação de coligações é, pois, o exercício que se segue a qualquer eleição legislativa.

Segundo a sondagem do Channel 13, o conjunto dos partidos de direita terá votos suficientes para eleger 66 deputados, o que, a confirmar-se, lhe dará folga para formar um executivo sem concessões à esquerda.

Nestas eleições, participam 39 partidos — para eleger um deputado, há que ultrapassar a fasquia dos 3,25%. Mas apenas 14 têm reais possibilidades de conseguir representação parlamentar.

LIKUD

Liderado pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, 69 anos, o Likud (Consolidação) é um partido histórico de Israel, aquele de onde saíram mais chefes de Governo. Defensor da privatização da economia, opõe-se a um Estado palestiniano e incentiva a construção de colonatos. Atualmente, tem 30 deputados (25% do Knesset).

À procura de um quarto mandato consecutivo, Netanyahu pode fazer história: se for reconduzido no cargo, a 17 de julho próximo cumprirá 13 anos e 128 dias em funções (não consecutivos), ultrapassando por um dia David Ben Gurion como o israelita que mais tempo ocupou o cargo de primeiro-ministro.

No sábado, Netanyahu sacou de um trunfo de última hora para tentar angariar votos e, assim, disparar nas intenções de voto. Numa entrevista ao Channel 12, afirmou: “Um Estado palestiniano colocará em perigo a nossa existência. Eu resisti a uma grande pressão nos últimos oito anos, nenhum outro primeiro-ministro resistiu a tal pressão. Temos de controlar o nosso destino”, disse. “Não dividirei Jerusalém, não evacuarei nenhuma comunidade [de colonos] e garantirei que controlaremos o território a ocidente do [rio] Jordão”, ou seja, o território palestiniano ocupado da Cisjordânia.

KAHOL LAVAN

Fundada a 21 de fevereiro passado, a aliança Kahol Lavan (Azul e Branco, como as cores da bandeira de Israel) tem dado luta ao veterano Likud nas sondagens.

A coligação reúne três fações: o Partido Resiliência de Israel, o Yesh Atid (Há um Futuro, que tem 11 deputados) e o Telem (do ex-ministro da Defesa Moshe Ya’alon).

A liderança é repartida entre o general Benjamin Gantz, de 59 anos, chefe do Estado-Maior entre 2011 e 2015, e o jornalista e ex-ministro das Finanças Yair Lapid (2013-2014), de 55 anos. Por acordo entre ambos, em caso de vitória, Gantz será primeiro-ministro nos primeiros dois anos e Lapid na segunda metade do mandato.

A aliança define-se como uma formação pluralista e representativa de todos os cidadãos de Israel, independentemente de ideologias políticas, crenças religiosas e identidades étnicas.

Entre as propostas do Kahol Lavan estão a introdução de limites aos mandatos de primeiro-ministro, a proibição de políticos acusados na justiça servirem no Parlamento, a alteração à polémica lei do Estado-Nação — que concede o direito de autodeterminação apenas aos judeus — para incluir as minorias e também o relançamento das negociações de paz com os palestinianos.

PARTIDO TRABALHISTA

Dominou a política israelita durante as primeiras décadas de vida do Estado de Israel e é hoje, juntamente com o Likud, o único partido em atividade que já liderou vários governos. Mas nas últimas eleições não foi além dos 18 deputados.

É liderado por Avi Gabbay, de 52 anos, que debutou na política apenas em 2014 após ter sido CEO (presidente executivo) da empresa de telecomunicações Bezeq de 2007 a 2013. Foi ministro de Netanyahu entre 2015 e 2016, com a pasta da Proteção Ambiental.

Os trabalhistas vão a votos com um programa que consagra a intenção de sarar feridas étnicas que excluíram alguns sectores da sociedade e de investir economicamente nas comunidades árabes. Talvez não seja suficiente: a última sondagem atribui-lhe uma perda de sete deputados.

KULANU

“Todos nós” foi fundado em finais de 2014, pelo atual ministro das Finanças, Moshe Kahlon (ex-Likud) que definiu o projeto como “a direita sã”.

Nas legislativas do ano seguinte, o partido conquistou 10 deputados. Hoje, a última sondagem diz que pode ficar com menos de metade.

O partido tem como prioridade as questões económicas, em especial a erradicação da pobreza e o combate à desigualdade. Apoia a solução de dois Estados para o conflito israelo-palestiniano.

BALAD-RA’AM E HADASH-TA’AL

Em Israel, cerca de 20% da população é de cultura árabe, com direito à cidadania israelita. Em sua representação, há quatro partidos árabes no Knesset: Hadash, Ra’am, Balad e Ta’al. Para os judeus mais fervorosos, primeiro-ministro incluído, são uma ameaça à existência de Israel.

Em 2015, concorreram juntos, na Lista Unida, e elegeram 13 parlamentares. Quatro anos depois, essa unidade deu mostras de ser, circunstancialmente, uma necessidade política que se desmoronou obrigando o eleitorado israelita árabe, nestas eleições, a optar entre dois blocos: o Balad-Ra’am e o Hadash-Ta’al. O que os separa?

A aliança Hadash-Ta’al é vista como uma formação que, de alguma forma, procura participar no sistema. Os seus principais rostos são Ahmad Tibi — líder do Ta’al (secular) e antigo conselheiro do líder histórico palestiniano, Yasser Arafat — e Ayman Odeh, líder do Hadash (comunista).

Inversamente, a coligação Balad-Ra’am é considerada uma frente empenhada em rejeitar e que nega a legitimidade de Israel. O Balad é um partido nacionalista pan-árabe radical. Já Ra’am é o acrónico hebraico de Lista Árabe Unida (islamita).

A sondagem do Channel 13 diz que o Hadash-Ta’al pode aumentar de cinco para seis deputados e o Balad-Ra’am pode cair de oito para quatro. Se, há quatro anos, a união fez a força, a dispersão pode levar a uma alta abstenção entre a minoria árabe.

SHAS E JUDAISMO DA TORAH UNIDA

Na origem da antecipação destas eleições, esteve um braço de ferro entre o Governo de Netanyahu e os judeus ultraortodoxos, que se estima correspondam a cerca de 10% da população. Os haredi pautam a sua vida pelo cumprimento rigoroso dos preceitos religiosos e sempre rejeitaram cumprir o serviço militar, exceção que desagrada à restante população.

Um recente diploma legislativo prevendo a extensão do serviço militar aos homens ultraortodoxos desencadeou uma crise no seio da coligação parlamentar que apoia o Governo levando à antecipação das eleições.

No Knesset. há duas bancadas que refletem a sensibilidade haredi: o Shas e o Judaismo da Torah Unida.

Com sete deputados, o Shas é liderado por Ariye Deri, o atual ministro do Interior e dos Assuntos Religiosos. A sua base eleitoral é composta sobretudo por judeus ultra-ortodoxos com ascendência no Médio Oriente ou na Península Ibérica (sefarditas).

Por seu lado, o Judaismo da Torah Unida tem seis deputados, entre os quais Yakov Litzman, o atual ministro da Saúde. Representa em especial a sensibilidade asquenaze — judeus oriundos da Europa Central e Oriental.

Segundo a última sondagem, o Shas deverá perder dois deputados e o Judaismo da Torah Unida manter os seis.

YISRAEL BEITENU

“Israel é o nosso lar” é um partido ultranacionalista liderado por Avigdor Lieberman, ministro da Defesa de Netanyahu entre 2016 e 2018. Lieberman bateu com a porta em novembro passado após o primeiro-ministro ter optado por assinar um cessar-fogo com o grupo islamita Hamas em vez de bombardear a Faixa de Gaza, como o seu ministro defendia.

Apologista de uma linha dura com os palestinianos, Lieberman é um protagonista na primeira pessoa da ocupação israelita da Palestina já que vive, com a mulher e três filhos, no colonato de Nokdim, a sul de Belém (Cisjordânia).

As sondagens dizem que Yisrael Beitenu pode perder um dos seus cinco deputados.

MERETZ

Membro da Internacional Socialista, o Meretz defende a retirada israelita dos territórios palestinianos ocupados na Guerra dos Seis Dias (1967) e o estabelecimento de um Estado palestiniano com Jerusalém como capital partilhada pelos dois povos.

A degradação do processo de paz e o reforço dos partidos de direita em Israel contribuíram para o desgaste do Meretz que, nos anos 1990, chegou a ter 12 deputados. As projeções dizem que conservará os cinco deputados que tem agora.

É liderado por uma mulher, Tamar Zandberg, de 42 anos. Vai a votos com um programa assente na redução do custo de vida dos israelitas, numa reforma tributária e no combate à corrupção.

UNIÃO DE PARTIDOS DE DIREITA

Fundada em fevereiro passado, agrupa três partidos de direita e extrema-direita: Lar Judaico (religioso, ortodoxo e sionista), União Nacional (que é em si uma aliança de quatro partidos) e o polémico Poder Judeu (Otza Yehudit).

A inclusão deste último tem colocado a União de Partidos de Direita sob fogo já que o Poder Judeu reclama-se herdeiro ideológico do controverso rabino Meir Kahane. Nascido em Nova Iorque em 1932, foi um supremacista judeu que fundou a Liga de Defesa Judaica nos EUA e o radical Kach em Israel. Foi assassinado em 1990, na cidade onde nasceu.

Michael Ben Ari, o líder do Poder Judeu de 55 anos, foi impedido pelo Supremo Tribunal de Israel de se candidatar a um lugar no Knesset em virtude das suas opiniões racistas. Ainda assim, a sondagem do Channel 13 atribui à União um aumento de deputados dos cinco (eleitos pelo Lar Judaico) para sete.

A NOVA DIREITA

É mais uma formação política que tenta tirar partido do desgaste do partido no poder (Likud). A sondagem prevê que duplique a sua representação no Knesset, de três para seis deputados.

Foi lançada em dezembro passado por dois membros do Governo de Netanyahu, até então militantes do Lar Judaico: o ministro da Educação, Naftali Bennett, de 47 anos, e a titular da Justiça, Ayelet Shaked, de 42 anos.

Bennett quer limitar os poderes do Supremo Tribunal sobre os soldados israelitas para que não se sintam constrangidos durante as operações militares. Já Shaked é uma acérrima defensora da maioria judaica de Israel mesmo que à custa dos direitos humanos das populações árabes.

A Nova Direita opõe-se à criação de uma Palestina independente e advoga anexação das áreas dos colonatos na Cisjordânia.

GESHER

Orly Levy-Abekasis é uma antiga manequim e apresentadora de televisão que, em 2015, conseguiu um lugar no Knesset, como independente, prometendo defender os mais desfavorecidos.

Aos 45 anos, casada, com quatro filhos e a viver num kibbutz no norte de Israel, tenta renovar o mandato de deputada, desta vez nas fileiras de um partido que o pai — o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros David Levy — chegou a liderar: o Gesher (centro-direita), que derivou do Likud.

Orly Levy-Abekasis diz querer romper com a tradicional divisão entre direita e esquerda. Mas nas sondagens surge com vida difícil, aquém dos 3,25% necessários para entrar no Knesset.

ZEHUT

O “Identidade” não tem qualquer deputado no Knesset, mas pode vir a ser um dos vencedores destas eleições: as sondagens dão-lhe seis deputados. Foi fundado em 2015, por Moshe Feiglin, de 56 anos, um antigo vice-presidente do Parlamento.

O Zehut é um partido sionista e libertário que, no seu manifesto, propõe a legalização da canábis, condição “sine qua non” para entrar numa coligação governamental.

Apologista da solução de um Estado único para o conflito israelo-palestiniano, defende a anexação da Cisjordânia, com o mesmo vigor com que, no passado, se opôs aos Acordos de Oslo de 1993 e tentou boicotá-los. A 8 de agosto de 1995, chefiou uma espetacular ação não-violenta de desobediência civil que bloqueou 80 cruzamentos por todo o país. Foi condenado pelo Supremo Tribunal a seis meses de prisão por sedição — sentença depois comutada para serviço comunitário. Esta terça-feira, poderá ser a grande surpresa do novo xadrez político em Israel.

(FOTO Boletins de voto dos partidos israelitas que participaram nas eleições de 9 de abril de 2019 LALIV G/WIKIMEDIA COMMONS)

Relacionado: “Judeus e árabes escolhem o futuro de Israel” (fotogaleria)

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 9 de abril de 2019. Pode ser consultado aqui

Judeus e árabes escolhem o futuro de Israel

As assembleias de voto abriram às sete da manhã e estarão abertas até às 10 da noite. Até às duas da tarde, já votaram 35,8% dos cerca de 6,3 milhões de eleitores

Esta terça-feira, é feriado em Israel para que cerca de 6,3 milhões de israelitas possam escolher a composição do próximo Parlamento (Knesset) com toda a tranquilidade.

As assembleias de voto abriram às sete da manhã e assim continuarão até às 10 da noite. Até ao meio-dia (mais duas horas do que em Portugal Continental), já tinham votado 35,8% dos leitores — em 2015, por esta hora a taxa de afluência às urnas era de 36,6%.

Nos boletins de voto, surgem os nomes de 39 partidos, ainda que apenas 14 tenham reais hipóteses de eleger deputados. As sondagens dão uma vitória folgada ao conjunto dos partidos da direita e extrema-direita — um dado importante já que em Israel os governos são sempre de coligação.

Mas na corrida individual entre partidos, há uma luta acesa entre o Likud (direita), do primeiro-ministro Benjamin Netahyanu, e o recém criado Kahol Lavan (centro), liderado por Benjamin Gantz, um ex-chefe do Estado-Maior, e pelo jornalista Yair Lapid.

O “Masbaha” na mão deste eleitor israelita denuncia a sua crença religiosa: muçulmano AMIR COHEN / REUTERS
Judeu ultraortodoxo, reconhecível pela sua forma tradicional de vestir, numa assembleia de voto de Jerusalém RONEN ZVULUN / REUTERS
Uma israelita árabe deposita o voto, em Daliyat al-karmel, norte do país JALAA MAREY / AFP / GETTY IMAGES
Judias acompanhadas pelos filhos esperam vez para votar, em Jerusalém MENAHEM KAHANA / AFP / GETTY IMAGES
Um cego experimenta um sistema de votação para invisuais, durante uma sessão de formação com um assistente, em Jerusalém RONEN ZVULUN / REUTERS
Numa assembleia de voto da capital de Israel, Telavive CORINNA KERN / REUTERS
Duas crianças acompanham o pai, em Jerusalém MENAHEM KAHANA / AFP / GETTY IMAGES
Uma família árabe cumpre o dever cívico, na aldeia de Taibe, região da Galileia (norte) ILIA YEFIMOVICH / GETTY IMAGES
De fato de treino e jornal debaixo do braço, esta israelita prepara-se para um dia descontraído, em Rosh Ha’ayin (centro) AMIR LEVY / GETTY IMAGES
A minoria árabe, que corresponde a 20% da população israelita, vive sobretudo no norte do país AHMAD GHARABLI / AFP / GETTY IMAGES
Estima-se que os judeus ultraortodoxos correspondam a cerca de 10% da população israelita MENAHEM KAHANA / AFP / GETTY IMAGES
Participam nestas eleições 39 partidos FAIZ ABU RMELEH / ANADOLU AGENCY / GETTY IMAGES

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 9 de abril de 2019. Pode ser consultado aqui

Finlandeses apostam na continuidade, e na amizade com a Rússia

Sauli Niinistö foi reeleito à primeira volta das eleições presidenciais com 62.7% dos votos. Próximo de Vladimir Putin, defende que uma eventual adesão da Finlândia à NATO deve ser objeto de referendo

Os finlandeses resolveram o assunto à primeira e, no domingo, reelegerem Sauli Niinistö para um segundo mandato presidencial de seis anos. Uma vitória sem contestação já que Niinistö, de 69 anos — antigo líder do Partido da Coligação Nacional (centro-direita) —, obteve uns esmagadores 62,7% dos votos, deixando o segundo candidato mais votado, Pekka Haavisto, 59 anos, da Aliança Verde (centro-esquerda), a mais de 50%, com 12,4%.

“Estou muito surpreendido com este tipo de apoio. Terei de pensar bem em como ser merecedor dele”, afirmou o Presidente reeleito. “Não tenho intenções de fazer mudanças apenas por fazer. Continuaremos a seguir de perto o que se passa fora da Finlândia, globalmente, e se necessário então reagiremos certamente.”

Para a agência Reuters, o segredo da vitória de Niinistö, a quem se atribui uma boa relação com o homólogo russo, Vladimir Putin, foi o facto de “o seu delicado equilíbrio de laços com a vizinha Rússia e com a aliança militar NATO liderada pelos EUA ter soado bem aos eleitores”.

A Finlândia é membro da União Europeia desde 1995, mas sempre optou por se manter à margem da Aliança Atlântica para não hostilizar a Rússia, com quem partilha uma fronteira de 1340 quilómetros e um passado histórico difícil — durante a II Guerra Mundial, a União Soviética invadiu e ocupou o país, por exemplo.

Em fevereiro de 2017, uma sondagem da rádio e televisão finlandesa Yle revelava que apenas 21% dos cidadãos apoiava a adesão à NATO, enquanto 51% opunha-se. Dos sete candidatos das presidenciais de domingo, apenas um, o eurodeputado Nils Torvalds, 72 anos, do Partido Popular Sueco da Finlândia (centro), defendeu a entrada do país na NATO.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 29 de janeiro de 2018. Pode ser consultado aqui