Extremistas islâmicos tomaram de assalto duas explorações petrolíferas no centro da Líbia. Com o país controlado, e disputado, por grupos armados, a ONU tenta sentar à mesa do diálogo os dois Parlamentos líbios
Forças afetas ao autodenominado Estado islâmico (Daesh) capturaram duas explorações petrolíferas no centro da Líbia. “Os extremistas assumiram o controlo dos campos petrolíferos de Bahi e Mabruk e dirigem-se agora para o campo de Dahra após a retirada das forças que guardavam essas instalações”, disse o coronel Ali al-Hassi, porta-voz dos serviços de segurança da indústria petrolífera líbia, citado pela BBC.
A cadeia britânica acrescenta que as forças de segurança retiraram dos locais após terem ficado sem munições. Segundo a Reuters, Mabruk tinha sido alvo de um ataque jiadista no mês passado, de que resultou pelo menos 12 mortos.
Bahi e Mabruk encontravam-se encerradas desde há algumas semanas em virtude da queda das exportações de petróleo e da violência que caracteriza o país desde a revolução que depôs Muammar Kadhafi, em 2011, no contexto da Primavera Árabe.
Conversações em Marrocos Presentemente, a Líbia é disputada por vários grupos armados. As autoridades reconhecidas internacionalmente estão acantonadas na cidade de Tobruk, a cerca de 1600 quilómetros para leste da capital, junto ao Egito, enquanto Tripoli é controlada pela Alvorada Líbia, uma aliança que agrupa várias milícias, algumas delas islamitas, que instalou os seus próprios órgãos de Governo.
Na terça-feira, os dois lados atacaram-se através de bombardeamentos aéreos. Os islamitas tentaram, sem sucesso, atingir um terminal de exportação de petróleo junto ao porto de Sidra. Em resposta, forças leais ao Governo reconhecido internacionalmente bombardearam o aeroporto de Mitiga, em Tripoli, não provocando vítimas nem danos materiais.
As Nações Unidas, através da Missão da ONU de Apoio à Líbia (UNSMIL), estão a tentar mediar um acordo de paz. Na quinta-feira, Marrocos acolhe uma ronda de conversações entre a Casa dos Representantes (ou seja, o Parlamento instalado em Tobruk) e o Congresso Geral Nacional (sedeado em Tripoli e dominado pelos islamitas) e em que participam 23 partidos políticos. A ronda seguinte está prevista para a próxima semana, na Argélia.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 4 de março de 2015. Pode ser consultado aqui
Outrora unidas na luta contra Kadhafi, muitas milícias líbias combatem, hoje, umas contra as outras. O Expresso falou com um líbio apoiante de uma milícia e pediu a um especialista que explique por que razão, quase três anos após a morte de Muammar Kadhafi, a Líbia tarda em estabilizar
Desapareceram onze aviões do Aeroporto Internacional de Tripoli e nos Estados Unidos já há quem recorde que está próximo mais um aniversário do 11 de setembro. “Há uma série de aviões comerciais na Líbia que estão desaparecidos. Nós descobrimos no 11 de Setembro o que pode acontecer com aviões sequestrados”, alertou na semana passada um responsável norte-americano não identificado, citado pelo sítio noticioso “The Washington Free Beacon”.
Os serviços secretos norte-americanos já entregaram ao Governo dos EUA relatórios sobre os aparelhos em falta, referindo a hipótese de poderem ser usados em ataques por alturas do aniversário do 11 de Setembro, que se assinala na próxima quinta-feira.
“Não há aviões no aeroporto que estejam funcionais”, diz ao Expresso o líbio Bassit Habara, 33 anos. “Quando as milícias fugiram do aeroporto queimaram-nos todos.”
A milícia de que Bassit fala é a Zintan que, até 23 de agosto, ocupava o aeroporto da capital líbia. Nesse dia, após confrontos, o controlo mudou de mãos, passando para a milícia Despertar da Líbia, uma coligação de grupos em que se incluem fações tão distintas quanto a Ansar al-Sharia (salafita) e as Brigadas de Misrata, uma das milícias mais poderosas após a revolução contra Kadhafi e que Bassit — natural dessa cidade, onde trabalha num banco — apoia.
Unidos durante a luta contra o ditador líbio — que foi assassinado em outubro de 2011 —, muitos grupos armados lutam hoje uns contra os outros. “Há uma fraca identidade nacional”, explica ao Expresso Manuel Almeida, ex-editor da edição inglesa do jornal árabe “Asharq Al-Awsat”. “Os vários grupos armados que ajudaram a derrubar Kadhafi mantiveram as suas armas e postura agressiva como única via para garantirem os seus interesses e os das suas regiões. Há um conjunto de grupos de interesse que diferem e que chocam a nível social, económico e regional e cujas divisões não se definem apenas pela tribo ou pelo caráter islamista ou não-islamista.”
O que querem então estas milícias? “Não existe um único objetivo ou plano linear”, continua Manuel Almeida. “Na ausência de um poder central forte e principalmente legítimo aos olhos de alguns dos principais grupos e perante o agravar da violência e anarquia, as milícias pretendem, acima de tudo, garantir a sua própria segurança e os seus interesses específicos que podem não passar pela tomada do poder. Além de que o poder na Líbia está tão disperso que o objetivo de o conquistar não parece estar ao alcance de um só grupo.”
Guerrilheiros na piscina
Outra estrutura tomada, recentemente, pela milícia Despertar da Líbia foi um edifício anexo à embaixada dos Estados Unidos em Tripoli, que tinha sido evacuada a 26 de julho. Um vídeo colocado no Youtube mostra homens a saltar de um primeiro andar para uma piscina, em clima de grande animação. Segundo a agência Reuters, pensa-se que façam parte de “uma milícia maioritariamente originária de Misrata”.
Na Líbia, as clivagens entre regiões e o sentimento de pertença tribal de muitos grupos levantam dúvidas sobre o futuro da Líbia como um país unido num território só. “A noção de que as fronteiras formais da Líbia, assim como as do Iraque e da Síria, não correspondem à realidade tribal e étnica é, muitas vezes, referida em debates sobre a possibilidade de se redesenhar essas fronteiras, como uma possível solução para a instabilidade nestes países”, explica Manuel Almeida, especialista em questões do Médio Oriente e Estados falhados.
“No entanto, embora o elemento tribal (e não sectário, pois a esmagadora da população líbia é sunita) seja ainda um fator forte de identidade na Líbia, não me parece que seja o principal elemento que explica as atuais tensões e violência. Existe uma grande clivagem entre islamistas e não-islamistas, que também não explica tudo. A atual crise deve-se principalmente ao vácuo de poder que se sucedeu à queda de Kadhafi. O novo sistema parlamentar revelou-se incapaz, não foi alcançado um consenso político mínimo para uma transição suave e os novos líderes e o pequeno exército líbio não conseguiram assumir o controlo.”
Dois Parlamentos em funções
Três anos e meio após a revolução de 17 de fevereiro, a Líbia tem hoje dois Parlamentos. A 7 de julho de 2012, foi eleito o Congresso Geral Nacional (200 lugares), dominado por fações islamitas, com a tarefa de elaborar uma Constituição, num prazo de 18 meses — o que não aconteceu.
A 25 de junho de 2014, os líbios foram novamente a votos, para eleger, desta vez, os 200 deputados à Casa dos Representantes. Os candidatos eram independentes e não personalidades inscritas em listas partidárias. Num ato eleitoral pouco participado (a afluência ficou-se pelos 10%), venceram correntes liberais e nacionalistas.
A confusão política instalou-se após o general Khalifa Haftar — dissidente do regime de Kadhafi e regressado do exílio nos EUA após a revolução — ter desencadeado, em maio, na região de Bengasi, uma ofensiva militar contra forças islamitas. O Parlamento em funções (ou seja, a Casa dos Representantes) apoiou a operação, levando as fações islamitas a pressionaram o Parlamento anterior (ou seja, o Congresso) a retomar funções, o que aconteceu a 25 de agosto. Nem todos os deputados estiveram presentes.
O Congresso trabalha em Tripoli. Para escapar à violência da capital, a Casa dos Representantes reúne-se em Tobruk, junto à fronteira com o Egito. “Um Parlamento em Tobruk?”, questiona Bassit. “Mas Tobruk é a cidade de onde descolam os aviões que estão a bombardear as populações de Bengasi. Como é que esse Parlamento pode ser legal?”
Todas estas cisões têm facilitado a implantação na Líbia de grupos jihadistas — muitos deles expulsos do norte do Mali pela intervenção militar francesa (Operação Serval), desencadeada em janeiro de 2013. Algumas notícias dão também conta que jihadistas líbios que combateram na Síria e no Iraque estão a regressar ao país natal para lutar contra as forças do general Haftar.
Para Manuel Almeida, a Líbia é permeável ao jihadismo por várias razões: “A fraqueza do Estado, a permeabilidade das suas fronteiras, o desemprego, o ambiente de anarquia e violência (que é perfeito para o germinar do extremismo e radicalismo) e ainda o longo historial de atividade jihadista de milhares de líbios no Médio Oriente e na Ásia Central”. No entanto, alerta, “é importante relembrar que os jihadistas e os radicais continuam a ser uma minoria muito pequena”.
Artigo publicado no “Expresso Diário”, a 8 de setembro de 2014. Pode ser consultado aqui
Forças islamitas conquistam o aeroporto internacional de Tripoli e acusam Egito e Emirados de bombardearem a capital
Os Estados Unidos terão sido apanhados de surpresa. Segundo quatro responsáveis norte-americanos citadas pelo diário “The New York Times”, duas séries de bombardeamentos, na semana passada contra milícias islamitas líbias em Tripoli, foram levadas a cabo pelo Egito e pelos Emirados Árabes Unidos.
Os dois países árabes terão agido sem consulta prévia às autoridades norte-americanas, de quem são aliados e parceiros militares.
“Os responsáveis afirmaram que os Emirados Árabes Unidos – que ostentam uma das forças aéreas mais eficazes do mundo árabe, graças a equipamento e treino americanos – forneceram os pilotos, os aviões de guerra e os aviões de reabastecimento necessários aos caças para o bombardeamento a Tripoli, a partir de bases no Egito”, escreveu o jornal norte-americano. “Não ficou claro se os aviões ou munições eram de fabrico americano.” Internamente, os regimes egípcios e emiratis têm reprimido as forças islamitas. Mas ambas as capitais negam este envolvimento.
A polémica estalou após a força islamita Fajr Libya (Amanhecer da Líbia) ter anunciado, no fim de semana, a conquista do aeroporto internacional de Tripoli. Desde a queda do regime de Muammar Kadhafi, em 2011, que o aeroporto estava nas mãos de uma milícia rival, a Zintan.
Mohamed al-Ghariani, porta-voz da milícia islamita reconheceu que os islamitas sofreram um ataque aéreo que provocou dez mortos entre os seus combatentes. “Os Emirados e o Egito estão envolvidos nessa agressão”, disse.
Dois Parlamentos e dois Governos
À instabilidade das ruas soma-se o caos político. Segunda-feira, o Congresso Geral Nacional – o Parlamento eleito em 2012 (onde os islamitas tinham voz forte) e que foi entretanto dissolvido – voltou a reuniu-se e escolheu um primeiro-ministro, Omar al-Hasi, apoiado pelos islamitas.
Isto coloca a Líbia com duas lideranças e duas assembleias, cada qual apoiada por diferentes fações armadas. Em junho passado, tinha sido eleito um novo Parlamento, a Casa dos Representantes (dominada por liberais e federalistas), cuja legitimidade os islamitas não reconhecem.
A Casa reúne na cidade de Tobruk (leste), longe das confusões em Tripoli e Bengasi. “A Casa dos Representantes é o único órgão legítimo na Líbia”, reagiu o primeiro-ministro Abdullah al-Thinni, um dos dois chefes de Governo líbios.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 26 de agosto de 2014. Pode ser consultado aqui
As milícias que fizeram a revolução contra Muammar Kadhafi são as forças que hoje garantem a segurança do país. Em entrevista ao Expresso, o embaixador de Portugal em Tripoli, Rui Lopes Aleixo, mostra-se otimista em relação ao futuro da nova Líbia
Rui Lopes Aleixo, embaixador de Portugal em Tripoli JORGE SIMÃO
A revolução líbia está refém das milícias? Se a revolução está refém das milícias, as milícias também estão reféns da revolução. As milícias, com o decorrer do tempo, assumiram o papel de forças armadas e são, na prática, a polícia e o exército do país, neste momento. Não é possível dispensar as milícias sem criar um vazio de segurança. De certo modo, as milícias também estão reféns da revolução. Não é possível dissolve-las subitamente. O projeto do governo é, a pouco e pouco, desarmar, dissolver, dar formação a alguns elementos das milícias e integra-los no futuro exército e na futura polícia. Esse processo está a ser muito lento.
Estas milícias têm uma base tribal? Não têm qualquer base tribal nem territorial. Em Tripoli, por exemplo, há duas brigadas. Uma tem origem em Zindan, que é uma cidade nas montanhas a ocidente de Tripoli, e a outra na cidade de Misurata, que fica a 200 quilómetros para leste de Tripoli. Elas integram pessoas oriundas de toda a Líbia, embora com alguma coincidência oriundas dessas áreas. Porque é que se chamam “de Zindan” e “de Misurata”? Porque os comandantes são daí. As brigadas englobam pessoas de várias origens e etnias, mas o comando é daquelas zonas. Presentemente, já há uma pirâmide hierárquica: há o ministro do Interior, o ministro da Defesa, o conselheiro nacional de segurança, o chefe de Estado-Maior das Forças Armadas… Os comandantes destas brigadas já estão enquadrados numa estrutura de comando. E quando desenvolvem ações, como por exemplo “checkpoints”, fazem-no em cumprimento de ordens que chegam dos seus chefes
Recentemente, o líder do Conselho Nacional de Transição (CNT), Mustafa Abdul-Jalil, admitiu alguma lentidão no processo de controlo das milícias… Não estou certo que o processo pudesse ter sido mais rápido. Nós, ocidentais, temos uma visão das coisas à semelhança do que se passa nos nossos países. Nem sempre o ritmo, na Líbia, pode ser esse. Estamos a falar de um país muito extenso onde, por exemplo, as cidades do leste (a zona a que se chama Cirenaica) estão em paz há muitos mais meses do que Tripoli e as cidades do ocidente (da chamada Tripolitânia), onde a guerra acabou há pouco mais de quatro meses. A situação de segurança nestas regiões é muito diferente. Se formos a Bengazi (no leste), que foi o berço da revolução, a cidade está tranquila, a vida normalizou, iniciaram a recuperação e a integração de todas as grandes forças que participaram na revolução.
Ajustes de contas próprias do pós-guerra
Um relatório recente da Amnistia Internacional denunciou abusos a suspeitos kadhafistas por parte de milícias. Há zonas da Líbia onde a segurança ainda é vulnerável? Há, efetivamente. Esses casos foram pontuais. Passaram-se numa prisão, em Misurata. O governo já reconheceu que houve abusos e está aberto à cooperação sobretudo com as ONG humanitárias internacionais. E até agradeceu publicamente o terem denunciado esses abusos. Por vezes, há conflitos localizados. Por exemplo, disputas relacionadas com reivindicações de casas, terras ou alguns ajustes de contas que são inevitáveis depois de um conflito interno. Não são generalizados, de maneira alguma. Infelizmente, causam vítimas com frequência, porque há um grande número de armas nas mãos da população.
O que querem as milícias? A maior parte dos membros das milícias são muito jovens, têm entre 18 e 30 anos. O desemprego entre os jovens ultrapassava os 30%. Julgo que o problema relativo à integração não passa tanto pela sua distribuição pelo exército e pela polícia. É antes um problema de qualificação, de formação profissional e de criação de empregos para que estas pessoas tenham um futuro. Não digo que a revolução teve origem em questões sociais. Não foi, como noutros países, uma questão de marginalização social que levou à revolução. Acho que foi uma ânsia de liberdade e a vontade de criar um país moderno e aberto. Agora, há este problema de integração destas pessoas numa sociedade estável, em que todos tenham emprego e consigam sobreviver sem depender de subsídios estatais, que era o que acontecia antes.
Os saudosistas de Kadhafi são a grande ameaça à estabilidade da Líbia? Haverá, com certeza, pessoas descontentes com a revolução. Mas não vejo uma massa significativa de gente que queira voltar atrás, se isso fosse possível. Por outro lado, também não há uma figura simbólica ou alguém que possa aglutinar alguns simpatizantes do antigo regime.
Nem mesmo o filho de Muammar Kadhafi que está no Níger, Saadi Kadhafi? Não. Os filhos não tinham prestígio. O regime era o pai, não os seus descendentes.
Aprender com os erros dos outros
A 21 de junho, haverá eleições para a assembleia constituinte. Estão a ser criados partidos políticos? Ainda não há uma lei dos partidos. Às eleições concorrerão listas nominais. As pessoas votarão em candidatos e não em partidos políticos. Essa assembleia, de 200 membros, vai aprovar a Constituição e um novo governo que terá como encargo, esse sim, publicar a lei dos partidos políticos e preparar as eleições parlamentares, que terão lugar cerca de um ano depois.
Será um sufrágio universal? Toda a gente vota, mas nem toda a gente pode ser eleita. Estão excluídos de capacidade eleitoral passiva todos os colaboradores do regime anterior. É um dos pontos controversos deste processo eleitoral. Ainda não foi possível ao governo publicar uma lei de amnistia. Está em preparação e se vier a ser publicada, o número de excluídos será menor.
Quem é visado por este impedimento? Todas as pessoas que foram ministros, governadores, membros das forças de segurança e de polícias secretas, pessoas que tiveram um papel ativo no regime anterior e que, nalguns casos, são culpados de repressão. Enquanto não começarem os julgamentos no âmbito daquilo que se designa por “justiça de transição” — ou seja os julgamentos de pessoas que estão presas e outras que podem vir a ser acusadas de crimes económicos ou políticos — não há um critério objetivo e claro de quem é culpado e de quem não é.
A nova Líbia está a funcionar de acordo com a estrutura administrativa anterior? Ou houve a tentação de, como no Iraque após a queda de Saddam, destruir as estruturas do regime anterior? As autoridades líbias têm estado a evitar os erros cometidos noutros sítios. Houve mudanças de chefias, mas não houve uma desarticulação completa da administração. Gradualmente, as autoridades têm procurado que a administração funcione com outras pessoas à frente.
Momento é bom para as empresas portuguesas
O elemento islamita está a manifestar-se de alguma forma? Há correntes islâmicas. Em geral, o Islão na Líbia é moderado. Haverá alguns elementos mais radicais. Uma vez que não há partidos, é difícil quantificar. Não me parece que haja o perigo de um movimento radical. Não tenho dúvidas de que vão aparecer partidos islâmicos. Mas julgo que não constituem um perigo para a abertura do país e para a democracia.
Dizia-se que a Líbia iria demorar muitos anos a recuperar os seus níveis de produção de petróleo… A produção de petróleo recuperou muito mais depressa do que aquilo que se esperava. Há uma retoma da vida económica e social, o que é notável para um país que saiu de uma guerra civil há apenas quatro meses.
As empresas portuguesas a operar na Líbia já regressaram? Já regressaram algumas empresas e praticamente todas as que aqui estavam já restabeleceram os seus contactos. Mas para começarem a trabalhar, em muitos casos, as condições ainda não estão completamente criadas. Mas o momento é bom. Portugal tem uma ótima imagem e, neste momento, a concorrência não é tão feroz como era antes. Há muitos países que ainda não voltaram. Não há razão nenhuma para as pessoas não virem. Às vezes, o discurso político e, sobretudo, as informações das agências noticiosas não coincidem com a situação real no terreno. Este é o momento para os empresários portugueses procurarem aqui contactos.
Muitas vezes, diz-se que a sociedade líbia, por ser tribal, vai ter dificuldade em fazer vingar um sentimento de unidade nacional… Não concordo que a Líbia seja uma sociedade tribal. É um país onde há tribos, as pessoas sentem-se parte de uma tribo, mas as tribos estão dispersas por todo o país. Não há uma coincidência territorial. Eu acho que há um sentimento nacional e de unidade. E a revolução reforçou esse sentimento. Esse elemento tribal existe sobretudo como um laço de família e como um laço cultural, mas não como um elemento político que vá ter influência no desenvolvimento do país.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 25 de fevereiro de 2012. Pode ser consultado aqui
Três jornalistas ocidentais foram detidos pelas autoridades líbias. Outros quatro foram ontem libertados. Repórter do Expresso relata como os jornalistas se tornaram um alvo
Foram ontem libertados os quatro jornalistas do diário norte-americano “The New York Times”, detidos seis dias antes pelas autoridades líbias, enquanto cobriam o conflito na cidade de Ajdabiya, no leste do país.
Os repórteres foram entregues à custódia da embaixada da Turquia, que atuou como intermediário, e posteriormente conduzidos para a fronteira com a Tunísia. Os Estados Unidos encerraram a sua representação diplomática na Líbia no mês passado.
Paulo Nunes dos Santos, um dos repórteres na Líbia em serviço para o Expresso, relata, a partir de Bengasi, a situação em Ajdabiya. “Os rebeldes diziam ontem de manhã ter o controlo da cidade, mas quando la cheguei a história era bem diferente.”
Deitados no chão, com balas a centímetros
O fotojornalista português conta que Bengasi — o coração rebelda da insurreição contra Muammar Kadhafi — “está a tornar-se um palco de guerrilha urbana”. “Na segunda-feira à noite, quando me dirigia para o hotel, fui atacado por um sniper. Estava com mais quatro jornalistas. Deitámo-nos no chão, com as balas a passarem a centímetros de nós. Finalmente, chegaram os rebeldes para nos acudir. Ao fim de 15 minutos, conseguimos correr para uma casa ali ao lado.”
Segundo a agência noticiosa francesa AFP, três jornalistas ocidentais continuam em posse das forças leais ao Muammar Kadhafi. Foram detidos pelo exército no passado sábado, na região de Tobruk, igualmente no leste da Líbia. Dois são jornalistas da AFP e o terceiro é um fotógrafo da agência Getty Images.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 22 de março de 2011. Pode ser consultado aqui
Jornalista de Internacional no "Expresso". A cada artigo que escrevo, passo a olhar para o mundo de forma diferente. Acho que é isso que me apaixona no jornalismo.