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Terror com humor se paga

Várias televisões árabes emitem programas de animação gozando com os extremistas do Estado Islâmico e ridicularizando a sua ambição religiosa

A cena passa-se algures no Médio Oriente. Um jihadista entra num táxi e logo começa a reclamar porque o rádio está ligado. Para tentar acalmar o passageiro, o taxista oferece-se para ligar o ar condicionado, provocando ainda mais protestos. Afinal, nos primórdios do Islão, não havia nem rádios nem ar condicionado. O jihadista não abandona o registo e desanca no taxista quando este atende o telemóvel, outro objeto que o Alcorão não contempla.

Farto de aturar o cliente, o taxista entra no jogo e pergunta ao jihadista: “Nos primórdios havia táxis?” A resposta é pronta: “Não! Mil vezes não!” O taxista pontapeia o passageiro para fora da viatura e sugere-lhe que espere que passe um camelo.

Este é um dos sketches produzidos para o “Ktir Salbe Show”, da televisão libanesa, um dos programas que, por todo o Médio Oriente, satiriza com os jihadistas do Estado Islâmico e ridiculariza as suas pretensões religiosas. A 29 de junho, o grupo proclamou um Califado (um sistema de governo liderado por alguém que se reclama ser sucessor do Profeta) em vastas áreas da Síria e do Iraque.

“Esta gente não representa verdadeiramente o Islão. Ao ridicularizá-los, mostramos que estamos contra eles”, refere Nabil Assaf, produtor e argumentista do “Ktir Salbe Show”, à agência Associated Press. “Claro que é um tema sensível, mas esta é uma forma de rejeitarmos o extremismo e mostrarmos que as pessoas não têm medo.”

Rir é o melhor remédio

Num outro episódio, um jovem jihadista, com tiques de trapalhão, deixa cair o lança-roquetes no pé do seu chefe. Composta a situação, olha pela mira e dispara, aparentemente na direção de um posto militar, mas na realidade ao contrário, acertando no chefe. 

Na Síria, apresentadores de programas surgem nos ecrãs disfarçados, fingindo temer retaliações dos jihadistas. No Iraque, um programa na televisão estatal mostra uma grande quantidade de personagens a fugir dos militares iraquianos, incluindo jovens militantes Estado Islâmico e velhos funcionários do regime de Saddam Hussein.

“Estamos todos contra estas organizações terroristas”, diz Alaa al-Majedi, do canal estatal Al-Iraqiya. “A comédia é uma forma de consciencializar.” Para muitas populações, que veem o avanço dos jihadistas como uma ameaça imparável, é também uma forma de afastar receios.

Num outro sketch, um cristão jordano aproxima-se de dois jihadistas que se envolvem numa luta tentando definir qual deles iria matar o “infiel” e, com isso, receber a “bênção”. Aterrorizado, o cristão sofre um ataque cardíaco e morre. Os terroristas ficam devastados. 

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 2 de setembro de 2014. Pode ser consultado aqui