A época do Natal é das mais procuradas pelos emigrantes portugueses na África do Sul para virem a Portugal. Com a perspetiva de as fronteiras se fecharem a voos desse país, os planos complicam-se. Ao Expresso, emigrantes no país, alguns com viagem marcada, contam o que pensam fazer
A presidente da Comissão Europeia defendeu esta sexta-feira, no Twitter, a suspensão de voos entre o espaço europeu e um conjunto de países da África Austral. Na origem da decisão está o surgimento de uma nova variante do vírus SARS-CoV-2, especialmente agressiva, designada por ómicron.
“A Comissão Europeia vai propor, em estreita coordenação com os Estados-membros, a ativação do travão de emergência para parar viagens aéreas provenientes da região da África Austral, devido à preocupante variante B.1.1.529”, explicou Ursula von der Leyen.
O Reino Unido adiantou-se à União Europeia (UE) e proibiu a entrada no país de voos provenientes de seis países africanos, entre os quais a África do Sul. Para cidadãos portugueses emigrados neste país africano — onde se estima que vivam 250 mil portugueses e lusodescendentes — há que aguardar para ver se os 27 vão atrás, e em que moldes. Entretanto, Alemanha e Itália, pelo menos, já anunciaram que vão proibir a entrada nos seus territórios de viajantes da África Austral.
“Se o Governo disser que deixa entrar quem tenha passaporte português, as vacinas e um teste de covid negativo, mesmo que obrigue a quarentena, muitas pessoas que têm casa em Portugal, ou mesmo família que os hospede, irão na mesma”, comenta ao Expresso Hélio Sá, de 33 anos, residente em Joanesburgo. “Mas quem for para hotéis vai pensar duas vezes.”
Turistas e emigrantes
Este português tem esperança que, a confirmar-se o encerramento das fronteiras aos passageiros vindos da África do Sul, haja uma distinção entre turistas (necessitados de visto) e emigrantes (detentores de passaporte português), e que as portas se abram a quem cumpra as normas de segurança exigidas.
A 8 de dezembro, o pai de Hélio tem viagem marcada para Portugal, através de Luanda, a bordo da TAAG (Linhas Aéreas de Angola). “Ainda estamos à espera de perceber o que a UE e Portugal vão fazer, se fecham só para turistas ou se fecham também para quem tem passaporte português. Não sabemos qual vai ser a lei.”
Este Natal, Hélio, que trabalha na área dos seguros financeiros, não tinha planos para visitar a família, que vive na zona de Santa Maria da Feira. A última vez que visitou o país foi em 2014, e desde então a vida mudou: casou-se, teve dois filhos e, além de as prioridades terem mudado, deixou de poder pagar os bilhetes de avião, que encareceram muito.
Não há voos diretos entre Portugal e África do Sul
“Os nossos voos para Portugal nunca são diretos. Fazem sempre escala em qualquer lado, Dubai, Paris, Frankfurt”, e também Londres para onde havia vários voos diários. “A TAP, infelizmente, não está a voar para aqui”, lamenta ao Expresso o fotógrafo Carlos Silva, de 66 anos, a trabalhar na África do Sul desde 1974. “Antes deste vírus, eu ía a Portugal no mínimo duas vezes por ano. Este Natal não tenho intenções de ir, tenho coisas a fazer por aqui.”
Nelson Reis, de 69 anos e emigrante na África do Sul há 50, já tem viagem marcada para Portugal. Ao Expresso, diz estar disposto a estudar alternativas para tentar passar o Natal com a família. “Estão aí à minha espera para passarmos a consoada juntos. Já marquei e já paguei o bilhete”, diz a partir de Joanesburgo. Tem as duas doses da vacina tomadas e, apesar de ter origens em Cantanhede, é para Cascais que quer viajar, onde vive a filha. Viajante experiente, costuma vir a Portugal três, quatro vezes por ano. Se as fronteiras europeias se fecharem a voos da África do Sul, “vou procurar alternativas”.
A viver na África do Sul desde 1985, Vasco de Abreu, de 66 anos, é conselheiro das Comunidades Portuguesas e uma das portas a quem muitos portugueses batem para tentar buscar orientação. “Ainda hoje, uma série de pessoas me telefonaram porque estão com receio”, diz ao Expresso. “Têm passagens marcadas para este mês e para o princípio de dezembro, para irem passar o Natal e Ano novo com as famílias, e estão todos um bocado em pânico, sem saber que fazer, se cancelar, se manter as reservas…”
Arejar a casa e ir à caixa
A época do Natal e Fim de Ano (onde na África do Sul é verão) é das favoritas dos emigrantes para regressarem a Portugal, juntamente com os meses do (nosso) verão. Hélio Sá prevê que os portugueses que mais insistirão em viajar sejam os mais velhos, “pessoas que têm casa em Portugal, e querem arejar o espaço, ou que têm de ir à Caixa tratar de burocracias.”
Para os mais jovens, é mais fácil aceitar as circunstâncias. É o caso de Fátima Piedade, de 33 anos, administrativa numa empresa em Joanesburgo. A última vez que veio a Portugal foi há seis anos e tem tudo marcado para vir este ano. “Muitas pessoas vão a Portugal no Natal. Em dezembro, a minha empresa fecha, temos férias, é boa época para irmos a Portugal”, diz ao Expresso. “Neste momento, a única coisa a fazer é aguardar, e esperar pelo reembolso da viagem se não der para ir. E depois ir noutra altura.”
Conhecedor da sensibilidade portuguesa na África do Sul, Vasco de Abreu considera que essa será a decisão a prevalecer, se a fronteira portuguesa se fechar. “A grande maioria prefere ir noutra altura, porque não está para se sujeitar a ter de ficar de quarentena em Portugal”, diz. “Não faz sentido gastar esse dinheiro todo [com a viagem] e não poder estar com a família e ter de ficar em quarentena.”
(IMAGEM Grafismo de um vírus sobre a bandeira da África do Sul DELOITTE.)
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 26 de novembro de 2021. Pode ser consultado aqui