Com Trump a norte e Bolsonaro a sul, a América está cada vez mais agitada. Este ano, seis países poderão ter novos líderes

ARGENTINA — Que fazer com a dívida externa?
Mais do que saber quem será o inquilino da Casa Rosada, está em causa a estabilidade fiscal da terceira economia latino-americana (a seguir ao Brasil e ao México). “Dado o peso demográfico [44 milhões de habitantes], a eleição na Argentina é a mais relevante”, diz ao Expresso o politólogo Andrés Malamud, do Instituto de Ciências Sociais, em Lisboa. “É também a que terá mais impacto sistémico, em virtude da dívida externa grande e insustentável.” O próximo governo terá de optar: renegociar ou não pagar, o que pode “alimentar turbulências financeiras globais”. O Presidente Mauricio Macri (centro-direita) lidera as sondagens, seguido pela antecessora Cristina Kirchner (esquerda peronista). Em dezembro, a senadora viu ser confirmada uma sentença de prisão preventiva por corrupção. Chegará ao dia 27 de outubro em liberdade?
BOLÍVIA — Evo Morales tenta o quarto mandato
Previstas para outubro, as presidenciais na Bolívia terão impacto regional, como as argentinas. “Os dois governos encarnam, respetivamente, o centro moderado e a esquerda democrática na América Latina. A sua derrota significaria um fim de época”, defende Malamud. O país é governado desde 2006 pelo primeiro indígena a ocupar o cargo. “A Bolívia enfrenta o ‘dilema Evo Morales’”, diz ao Expresso Marcelo Moriconi, investigador no ISCTE. “Ele deseja continuar no poder embora os cidadãos tenham votado contra uma reeleição em referendo.” A 21 de fevereiro de 2016, os bolivianos rejeitaram o fim das restrições ao número de mandatos presidenciais introduzidas na Constituição de 2009. Há um mês, porém, o Tribunal Eleitoral deu “luz verde” à candidatura do cocalero a um quarto mandato. Se acontecer, a Bolívia poderá ver consolidada “uma continuidade marcada pela centralização dos poderes e pelo pragmatismo, legitimada pela sobrevalorização do indigenismo”, diz ao Expresso Nancy Gomes, da Universidade Autónoma de Lisboa. E continuará a ser o bastião da esquerda na América do Sul.
URUGUAI — Farol da esquerda no continente americano
Pequeno em tamanho e importância económica, o Uruguai é relevante para os países com governos de esquerda, numa altura em que os ventos da direita, com Trump e Bolsonaro ao leme, sopram sobre o continente. “Tem havido um redesenho político (com a exceção do México) que coincide com um momento de redução do crescimento económico”, diz Nancy Gomes. O Presidente é, desde 2015, Tabaré Vázquez, que ocupara o cargo de 2005 a 2010. Como o seu antecessor, o popular José Mujica, pertence à Frente Ampla (esquerda), que enfrenta “a sua eleição mais difícil”, defende Moriconi. “O Governo do Uruguai — que, com o Chile, é a democracia mais estável da região — poderá mudar de cor.” Tabaré não pode disputar as eleições de 27 de outubro. A Frente tem de se reinventar.
PANAMÁ — A importância do Canal, hoje e sempre
Vota a 5 de maio, finda uma campanha com novas regras que visam reduzir o impacto do financiamento privado no processo eleitoral. O Presidente Juan Carlos Varela (direita) é inelegível, e as sondagens dão ligeiro favoritismo a Laurentino Cortizo (esquerda). “O Panamá é geopoliticamente estratégico dada a importância do Canal, onde China e EUA apostam forte a sua influência na região”, explica Moriconi.
EL SALVADOR / GUATEMALA — O flagelo da corrupção
Na América Central, são países de origem de muitos migrantes que partem em caravana rumo aos EUA. Sem peso político, sofrem o flagelo da corrupção. Na Guatemala, o Presidente Jimmy Morales, impedido de se recandidatar a 19 de junho, declarou “guerra” à Comissão Internacional Contra a Impunidade na Guatemala (ONU), que investiga crimes graves. Em El Salvador, pela primeira vez desde o acordo de paz (1992), o favorito a 3 de fevereiro não emana da ARENA (direita) ou da Frente Farabundo Martí (esquerda), desacreditadas pela corrupção: é Nayib Bukele, 37 anos, empresário, ex-autarca de San Salvador. Foi expulso da Frente.
Artigo publicado no “Expresso”, a 5 de janeiro de 2019






























