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A galeria de imagens que faltava: Kim e Trump nas horas que antecederam o encontro histórico

Donald Trump e Kim Jong-un foram recebidos em Singapura como estrelas. Muita gente nas ruas com os telemóveis prontos a filmar à passagem das suas caravanas, muita segurança em redor dos locais da cimeira e muita inspiração nos menus dos restaurantes e bares locais. A expectativa era grande em todo o mundo: corresponderiam os imprevisíveis líderes de Estados Unidos e Coreia do Norte? E não é que corresponderam mesmo?

Enquanto os líderes de Coreia do Norte e Estados Unidos se preparavam para se encontram pessoalmente, Howard e Dennis Alan, sósias de Kim Jong-un e Donald Trump, faziam as delícias de quem passava pelo Parque Merlion, em Singapura EDGAR SU / REUTERS
Kim Jong-un foi o primeiro a chegar a Singapura, a bordo de um avião da Air China TIM CHONG / REUTERS
KCNA / REUTERS
Kim Jong-un foi também o primeiro dos dois líderes a ser recebido por Lee Hsien Loong, o primeiro-ministro de Singapura KCNA / REUTERS
Nas imediações da estação ferroviária de Pyongyang, norte-coreanos pararam junto a um ecrã eletrónico para ouvir as últimas de Singapura KYODO / REUTERS
Como habitualmente, Donald Trump viajou a bordo do Air Force One até Singapura, onde chegou no domingo à noite, horas após o homólogo norte-coreano LIU ZHEN / GETTY IMAGES
No exterior do Hotel Shangri-La, onde Donald Trump está hospedado, duas mulheres entoaram o hino norte-americano à chegada do seu Presidente EDGAR SU / REUTERS
À semelhança do que aconteceu com o homólogo norte-coreano, também o Presidente dos EUA foi recebido pelo primeiro-ministro de Singapura REUTERS
Esta segunda-feira, delegações dos EUA e de Singapura reuniram-se num almoço de trabalho GETTY IMAGES
No exterior do Hotel St. Regis, onde fica hospedado Kim Jong-un, liam-se as últimas sobre a cimeira TYRONE SIU / REUTERS
Por onde quer que as delegações passassem, foi um alvoroço nas ruas de Singapura TYRONE SIU / REUTERS
“Apelos à paz” um pouco por todo o lado, como neste canhão da II Guerra Mundial, decorado com flores, na ilha de Sentosa, onde teve lugar a cimeira Trump-Kim ROSLAN RAHMAN / AFP / GETTY IMAGES
Segurança reforçada junto ao palácio presidencial de Singapura, como em vários outros pontos da cidade ATHIT PERAWONGMETHA / REUTERS
Para os locais, todo o aparato à volta da cimeira (na imagem, jornalistas em frente ao Hotel St. Regis) abalroou-lhes o quotidiano LIU ZHEN / GETTY IMAGES
Já os menus dos restaurantes e bares de Singapura ganharam alguma criatividade graças à cimeira EDGAR SU / REUTERS
Shots no bar Escobar EDGAR SU / REUTERS
Tacos “Rocket Man” e “El Trumpo”, no restaurante Lucha Loco FELINE LIM / REUTERS
No bar do Empire Sky Lounge FELINE LIM / REUTERS
O OSG Bar criou um prato especial para a ocasião, o “Make harmony great again” WIN MCNAMEE / GETTY IMAGES
A cimeira entre Donald Trump e Kim Jong-un realizou-se, esta terça-feira, no Hotel Capella, na ilha de Sentosa REUTERS
A cimeira foi seguida com especial atenção na Coreia do Sul, onde milhares de pessoas foram saindo à rua em manifestações pacíficas, desejando o sucesso do encontro JUNG YEON-JE / AFP / GETTY IMAGES
Sul-coreanas pedindo “paz” e a reunificação da península coreana (implícito no mapa azul), em frente à embaixada dos Estados Unidos em Seul JUNG YEON-JE / AFP / GETTY IMAGES
Estava tudo a postos para a cimeira, faltava apenas a entrada em cena de Donald Trump e Kim Jong-un (na foto, em CDs distribuídos aos jornalistas acreditados para cobrir o encontro) KIM KYUNG HOON / REUTERS
Ambos os líderes deram mostras que o sucesso da cimeira muito dependeria da sua personalidade… e imprevisibilidade KIM KYUNG HOON / REUTERS

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 12 de junho de 2018. Pode ser consultado aqui

Cimeira Trump-Kim: O que fica deste encontro histórico?

Esteve tremida até realizar-se, efetivamente. A cimeira de Singapura marca o início de uma nova relação entre Estados Unidos e Coreia do Norte. E pouco mais

Cimeira: Anunciada como “histórica”, a efetiva realização da cimeira de Singapura — que decorreu no Hotel Capella, na ilha de Sentosa — cumpriu esse desígnio: Donald Trump e Kim Jong-un tornaram-se os primeiros chefes de Estado norte-americano e norte-coreano de sempre a encontrarem-se. Tal como a 27 de abril passado, Kim Jong-un fizera história com um pequeno passo, ao atravessar a linha de fronteira, para participar, em solo sul-coreano, na cimeira entre as duas Coreias, o aperto de mão entre Trump e Kim abriu um novo capítulo da história entre os dois países, da península coreana e do mundo.

Confiança: O intempestivo Presidente dos EUA tinha dito que bastaria um minuto para perceber quais as reais intenções do homólogo norte-coreano. O facto dos dois líderes se terem reunido, a sós (na companhia apenas de dois tradutores), durante 40 minutos revela uma vontade mútua de ganharem com este encontro histórico. Trump e Kim, que há meses esgrimiam ameaças apocalípticas, quiseram mostrar com esse encontro demorado que são homens de paz.

Declaração: Os dois líderes assinaram uma declaração conjunta que pouco mais é do que um processo de intenções. O documento prevê “a desnuclearização completa da península coreana”, deixando a dúvida sobre se para além do desmantelamento do arsenal nuclear da Coreia do Norte também está em causa um eventual recuo dos Estados Unidos em matéria de defesa da Coreia do Sul. Trump garante que não: “Não vamos reduzir nada”, disse quando perguntado se iiria reduzir o contingente de 32 mil militares destacados. “Isso não faz parte da equação, de momento.” Resta saber se os norte-coreanos interpretaram de igual forma.

Sanções: De Singapura, Kim Jong-un sai sem certezas de que o tão desejado levantamento das sanções económicas à Coreia do Norte seja concretizado. Na conferência de imprensa final de Donald Trump, que durou uma hora, o Presidente dos EUA garantiu que as sanções continuarão em vigor até ao desmantelamento do arsenal nuclear.

Coreia do Sul: Seul ouviu Trump referir-se aos exercícios militares conjuntos anuais entre EUA e Coreia do Sul como “jogos de guerra provocadores” e a equacionar o seu fim. “Isso vai poupar-nos muito dinheiro, a não ser que vejamos que as negociações futuras não estejam a ir para onde queremos”, disse Trump. Com estas palavras lança nervosismo em Seul e insinua que sai de Singapura sem grande confiança em relação às negociações que se seguirão.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 12 de junho de 2018. Pode ser consultado aqui

Cimeira Trump-Kim já tem medalha… e cocktail

A uma semana do histórico encontro entre os líderes dos Estados Unidos e da Coreia do Norte, Singapura vai-se engalanando para o evento. O local da reunião é, ainda, um mistério

Cocktails “Kim” e “Trump”, criadas pelo Escobar, um bar de Singapura, para assinalar a cimeira entre os líderes de EUA e Coreia do Norte EDGAR SU / REUTERS

Em acelerada contagem decrescente para a cimeira de Singapura, a 12 de junho, entre Donald Trump e Kim Jong-un, os pormenores do encontro são, porém, divulgados a conta-gotas.

Esta terça-feira, Singapura apresentou uma medalha comemorativa do histórico encontro. Num dos lados, uma pomba estilizada com um ramo de oliveira no bico surge entre a inscrição “Paz Mundial” e um ramo de rosas e magnólias, as flores nacionais de Estados Unidos e Coreia do Norte, respetivamente.

No verso, duas mãos de homem cumprimentam-se com as bandeiras dos dois países em pano de fundo. A medalha foi concebida em três metais preciosos (ouro, prata e zinco), oscilando o seu preço entre os 1380 e os 36 dólares (1180 e 31 euros).

Medalha em prata comemorativa da cimeira entre Donald Trump e Kim Jong-un, a 12 de junho, em Singapura REUTERS
REUTERS

No mês passado, a Casa Branca já tinha apresentado a sua moeda comemorativa da cimeira, onde o encontro surge descrito como “conversações de paz”. Curiosamente, a moeda foi posta à venda após Trump cancelar a sua reunião com Kim.

Tradição de neutralidade

Singapura orgulha-se de ser uma plataforma neutral de promoção da paz, uma espécie de Suíça asiática, em matéria diplomática. Em 2015, acolheu uma cimeira histórica entre os líderes da China e de Taiwan, o primeiro desde a vitória dos comunistas na guerra civil que terminou em 1949 e que confinou os nacionalistas à ilha de Taiwan.

Então, o Hotel Shangri-La acolheu a cimeira chinesa. Três anos depois, é opção para o encontro Trump-Kim de dia 12. O exato local ainda não foi anunciado, mas uma área especial, que terá segurança apertada e acesso condicionado entre os dias 10 e 14, já foi circunscrita em Singapura. No seu interior, localizam-se várias embaixadas e hotéis, entre os quais o Shangri-La.

Aos poucos, Singapura vai-se preparando para o histórico encontro. No pub Escobar, já se pode pedir um “Trump” ou um “Kim”, cocktails confecionados, respetivamente, à base de bourbon e de soju, um licor de arroz destilado originário da Coreia.

Já o Hopheads, um bar de tapas, criou o “Bromance” — palavra que combina “brother” (irmão) e “romance” —, feito com cerveja preta, tequila, soju e Coca Cola diet, esta última a bebida favorita de Donald Trump.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 5 de junho de 2018. Pode ser consultado aqui

Kim ao ataque, Trump à defesa

O encontro entre os líderes da Coreia do Norte e dos EUA está tremido. Pyongyang está sem paciência para pressões e provocações

Os Estados Unidos não fazem mais ameaças vazias. Quando prometo uma coisa, cumpro-a.” No dia em que rasgou o acordo internacional sobre o programa nuclear do Irão, a 8 de maio passado, Donald Trump invocou — como exemplo contrário ao extremar de posições entre EUA e Irão — o processo de aproximação à Coreia do Norte. “Tenho esperança de que se vá celebrar um acordo e, com a ajuda da China, da Coreia do Sul e do Japão, alcançaremos um futuro de grande prosperidade e segurança para todos.”

Ao devolver a relação com o Irão aos tempos de tensão e de desconfiança, o chefe de Estado norte-americano pode, inadvertidamente, ter gerado receios junto dos norte-coreanos. “Pessoalmente, acredito que foi dada uma mensagem muito problemática em termos de credibilidade e confiança nos Estados Unidos”, afirmou, quarta-feira, o sul-coreano Ban Ki-moon, ex-secretário-geral das Nações Unidas, numa entrevista à televisão norte-americana CNBC. “Que tipo de mensagem tirará a Coreia do Norte disto? Posso confiar no Presidente dos Estados Unidos? Esta poderá ser a primeira pergunta que se coloca ao líder da Coreia do Norte.”

Esta semana, os preparativos para a anunciada cimeira entre os líderes dos Estados Unidos e a Coreia do Norte — a 12 de junho, em Singapura — sofreram um revés, quando Pyongyang cancelou “indefinidamente” as conversações com os sul-coreanos visando a organização do encontro. A decisão apanhou de surpresa os meandros diplomáticos, já que, ainda na semana passada, Pyongyang dera mostras de boa vontade ao libertar três cidadãos norte-americanos detidos no país por “atividades hostis”. Estes foram recebidos por Trump numa base militar do Estado de Maryland.

Exercícios provocadores

Na origem deste endurecimento da posição norte-coreana está a realização de exercícios militares conjuntos entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos, iniciados segunda-feira e que se prevê que durem duas semanas. Habitual entre os dois aliados, por alturas da primavera, o exercício Max Thunder envolve cerca de 100 aeronaves de ambos os países, em manobras que o Pentágono qualifica de “defensivas”.

Também caíram em Pyongyang afirmações de altos responsáveis norte-americanos a pressionar a Coreia do Norte no sentido de uma “desnuclearização unilateral”. “Se os Estados Unidos estão a tentar pôr-nos a um canto para nos forçarem a abandonar o nuclear de forma unilateral, deixaremos de estar interessados nesse diálogo e não poderemos deixar de reconsiderar o nosso compromisso em relação à cimeira Coreia do Norte-Estados Unidos”, afirmou, quarta-feira, Kim Kye-gwan, o vice-ministro norte-coreano dos Negócios Estrangeiros.

“Já declarámos a nossa posição favorável à desnuclearização da península coreana”, acrescentou o governante. “Já deixámos claro, em várias ocasiões, que as condições prévias para a desnuclearização são o fim da política hostil à Coreia do Norte, das ameaças nucleares e da chantagem por parte dos Estados Unidos.”

“Kim Jong-un pretende afirmar a sua posição na mesa das negociações. Pretende mostrar que não vai a Singapura numa atitude de total submissão a Trump e aos Estados Unidos”, explica ao Expresso Rui Saraiva, professor de Ciência Política na Universidade de Hosei, Japão. “Simultaneamente, tendo em conta as recentes declarações de John Bolton, conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, o líder norte-coreano está a rejeitar veementemente o modelo líbio de desnuclearização [ver descodificador nesta página]. A mensagem de Pyongyang é que o nível de cedências norte-coreanas tem o seu limite.”

Esta posição de força tem, naturalmente, consequências internas. “A lógica que guia o líder norte-coreano é a sobrevivência do regime e da sua liderança. As recentes ameaças de cancelamento da cimeira podem servir também para consumo interno”, acrescenta Saraiva. “Se a imagem externa de Kim saiu beneficiada a nível internacional com o recente clima de desanuviamento, não sabemos ao certo que impacto teve junto das elites e da população.”

Um país, dois sistemas

Esta semana Moon Jae-in, Presidente da Coreia do Sul, irá a Washington para transmitir a Trump as fronteiras negociais do Norte e articular uma posição conjunta que volte a sentar os norte-coreanos à mesa do diálogo. Para o professor de Ciência Política, a China — o grande aliado da Coreia do Norte e sua porta de saída para o mundo — tem um papel fundamental na resolução deste impasse.

“O que está em causa é a integração da Coreia do Norte no sistema internacional e a transformação da Coreia do Norte de um sistema totalitário num sistema autoritário, através da sua ‘dengxiaopingzação’: um país, dois sistemas, em conjunto com a desnuclearização. Se isso se concretizar, passamos de um ‘jogo de soma zero’ [o ganho de um jogador representa a perda do outro] para um jogo onde todos ganham (win-win) a nível local, regional e global.”

Teorias e jogos à parte — aos quais Trump não parece ser sensível —, o Presidente dos Estados Unidos parece já ter tido rédea mais folgada no processo de diálogo com a Coreia do Norte. É que depois de retirar os EUA do acordo com o Irão e de provocar o mundo árabe transferindo a embaixada dos Estados Unidos em Israel de Telavive para Jerusalém — com consequências trágicas na Faixa de Gaza (ver páginas seguintes) —, Trump precisa de um sucesso diplomático para provar que, contra tudo e quase todos, a sua América está no caminho certo.

DESCODIFICADOR

Como desnuclearizar?

O fim do programa nuclear norte-coreano está no coração do processo de aproximação entre Washington e Pyongyang

1. Que poder tem o Norte?
A Coreia do Norte é uma das nove potências nucleares em todo o mundo. É também uma das quatro que não fazem parte do Tratado de Não-Proliferação Nuclear — as restantes são Índia, Paquistão e Israel. Pyongyang chegou a assinar o documento, em 1985, mas retirouse em 2003. Na era de Kim Jong-un (no poder desde 2011), sucessivos testes com mísseis balísticos, cada vez mais ameaçadores, desvendaram uma capacidade bélica para atingir território norte-americano. Para o nervosismo global que se seguiu, muito contribuiu o profundo
desconhecimento sobre o país, último reduto marxista-leninista e onde se vive segundo a ideologia juche (autossuficiência), introduzida por Kim Il-sung, o “pai fundador” do Estado e avô do líder atual.

2. O que é o modelo líbio?
Quando, em 2003, na Líbia, um embrionário programa de armas de destruição em massa causava dores de cabeça, o ditador Muammar Kadhafi aceitou eliminá-lo em troca do levantamento de sanções e do fim do estatuto de pária na comunidade internacional. O material perigoso seguiu para o Laboratório Nacional de Oak Ridge, no Tennessee. Recentemente, John Bolton, conselheiro de Segurança Nacional de Trump, defendeu um “modelo líbio” para pôr fim à ameaça norte-coreana. Quinta-feira, o jornal japonês “Asahi Shimbum” noticiou que os EUA exigiram que a Coreia do Norte envie ogivas nucleares, um míssil balístico intercontinental e material nuclear, dentro de seis meses, para tirarem Pyongyang da lista negra do terrorismo.

3. Os EUA têm alternativas?
Perante a repugnância que provocou, em Pyongyang, a possibilidade de uma solução “à líbia” para o nuclear norte-coreano — até pelo fim trágico que teve Kadhafi, anos depois, em 2011, assassinado nas ruas na sequência de um bombardeamento ocidental ao país —, os Estados Unidos apressaramse a desvalorizar essa fórmula. “Não vi [o modelo líbio] ser discutido, por isso não estou consciente de que seja aquele que estamos a usar”, disse esta semana Sarah Sanders, porta-voz da Casa Branca, preferindo falar num “modelo Trump”, sem concretizar em que consiste. Citado pelo jornal “The Korea Herald”, Kim Yeol-su, do Instituto para os Assuntos Militares da Coreia, comentou: “A ideia de um modelo Trump é como oferecer um kit de primeiros socorros à cimeira EUACoreia do Norte”.

Artigo publicado no “Expresso”, a 19 de maio de 2018. Pode ser consultado aqui