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Arábia Saudita e Qatar ‘unidos’ em nome de um perigo maior

Na próxima quinta-feira, na cidade santa de Meca, duas cimeiras árabes irão abordar a tensão no Golfo Pérsico. Por momentos, a Arábia Saudita “esqueceu” o bloqueio que impôs ao Qatar e convidou o Emir a estar presente

A escalada da tensão no Golfo Pérsico, protagonizada por Estados Unidos e Irão, está a aproximar “irmãos árabes” desavindos. No domingo, o Rei da Arábia Saudita convidou o Emir do Qatar a participar em duas cimeiras convocadas com caráter de urgência que terão lugar na próxima quinta-feira, na cidade saudita de Meca.

À mesa do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) — organização regional que integra as seis monarquias ribeirinhas àquele curso marítimo — e da Liga Árabe (composta por 22 países), estarão as recentes “agressões e respetivas consequências” na região, noticiou a agência de notícias saudita.

Arábia Saudita e Qatar estão de costas voltadas desde junho de 2017 quando os sauditas (apoiados por Emirados Árabes Unidos, Bahrain e Egito) impuseram ao Qatar um bloqueio económico e diplomático. A resolução do conflito está dependente da aceitação do Qatar de uma lista de 13 exigências — entre as quais o corte de relações diplomáticas com o Irão — que Doha não parece inclinada a acatar.

Riade “não quer a guerra”

O convite de Riade para o Qatar se fazer representar ao mais alto nível nos encontros de Meca foi entregue em Doha pelo secretário-geral do CCG, Abdullatif bin Rashid Al Zayani, lê-se num comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Qatar.

Para a Arábia Saudita, o estender de mão ao pequeno Emirado justifica-se em nome de um perigo maior: a rivalidade com o Irão, com quem o Qatar tem boa relação.

Riade acusa o Irão de estar na origem de recentes ataques com drones a instalações petrolíferas sauditas (reivindicados pelos rebeldes iemenitas huthis, aliados do Irão) bem como de atos de sabotagem a quatro navios comerciais ao largo dos Emirados Árabes Unidos (que ainda não divulgaram as conclusões da investigação aos casos).

Os incidentes levaram a um reforço do dispositivo militar norte-americano na região e a um agravamento da habitual retórica de confrontação entre a República Islâmica e os Estados Unidos. E levaram a Arábia Saudita a tentar deitar água na fervura assumindo que Riade “não quer uma guerra, não a procura e fará tudo para a impedir”, assegurou o ministro saudita dos Negócios Estrangeiros, Adel al-Jubeir.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 27 de maio de 2019. Pode ser consultado aqui

Golfo cada vez mais revolto

Refém do bloqueio ao Qatar, decretado, há meio ano, por três dos seus membros, o Conselho de Cooperação do Golfo realizou a sua cimeira anual esta terça-feira. Sem brilho e com um anúncio preocupante: Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos estabeleceram uma parceria em separado

Não há como esconder — ou remendar — a crise no Golfo Pérsico. Reunido esta terça-feira, no Kuwait, para a sua cimeira anual, o Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) exibiu brechas que fazem temer pelo seu futuro.

Previsto para durar dois dias, o encontro entre seis países ribeirinhos ao Golfo esgotou a agenda — não tornada pública — em apenas um, “com todos os delegados a deixarem o Kuwait após uma sessão à porta fechada”, reporta a Al-Jazeera.

Fundado em 1981, o CCG vive a sua pior crise de sempre. Há precisamente meio ano, a 5 de junho, três dos seus membros cortaram relações diplomáticas e decretaram um bloqueio por terra, mar e ar contra um quarto membro. De um lado, Arábia Saudita, Bahrain e Emirados Árabes Unidos (EAU), a que se junto o Egito (todos Estados árabes sunitas), do outro o Qatar, acusado de apoiar o terrorismo e de ter uma relação próxima com o arqui-inimigo Irão (país persa xiita).

Esta divergência agravou-se nesta cimeira, no Kuwait, país que tem tentado servir de mediador nesta crise. Segundo um comunicado emitido pelo ministério dos Negócios Estrangeiros dos Emirados Árabes Unidos, este país juntamente com a Arábia Saudita celebraram uma nova parceria militar e comercial, à margem da organização regional.

A nova aliança entre Riade e Abu Dabi visa “a cooperação e coordenação” entre os dois países “em todos os campos a nível militar, político, económico, comercial e cultural”. Teme-se, porém, que contribua para esvaziar a organização e intensificar, ainda mais, os antagonismos nesta região estratégica.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 5 de dezembro de 2017. Pode ser consultado aqui

Iranianos? Nem pintados!

Separados pelo Golfo, árabes e iranianos não morrem de amores uns pelos outros. Em Abu Dhabi, a cimeira do Conselho de Cooperação do Golfo espelha essa inimizade. Reportagem nos Emirados Árabes Unidos

No centro de imprensa, jornalistas de todo o mundo assistem, pela televisão, à chegada dos chefes de Estado participantes na cimeira MARGARIDA MOTA

Khalid não gosta de iranianos. Nunca visitou o Irão nem tem curiosidade. Basta-lhe o contacto com os iranianos que trabalham no seu país os Emirados Árabes Unidos , sobretudo em oficinas de reparação de automóveis, e o interesse esgota-se. “Bem, no fundo, eles devem ser como qualquer povo”, diz condescendente. “Há boas e más pessoas…”

Natural de Sharjah e a trabalhar como motorista em Abu Dhabi dois dos sete territórios que constituem os Emirados Árabes Unidos , Khalid prefere os passeios de carro com a mulher e os quatro filhos até qualquer um dos países vizinhos a atravessar o Golfo e dar uma saltada ao Irão. Para além da antipatia, trata-se também de uma questão prática…

Para um cidadão dos Emirados Árabes Unidos, um fim de semana passado no vizinho Qatar, por exemplo, é apenas uma questão de quilometragem. Os dois países juntamente com a Arábia Saudita, o Kuwait, Omã e o Bahrain formam o Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) que, à semelhança da União Europeia, é uma organização que visa a integração regional e que, nesse sentido, privilegia a circulação de cidadãos dos seus Estados membros. Chegado à fronteira, Khalid apenas terá de mostrar o bilhete de identidade não precisa de passaporte, muito menos de visto.

WikiLeaks ateia a chama

Esta terça-feira, termina em Abu Dhabi, a 31ª cimeira anual do Conselho de Cooperação do Golfo, ao nível dos chefes de Estado. A reunião foi dominada por preocupações de segurança regionais, que vão desde o terrorismo interno na Arábia Saudita até ao aumento do extremismo no Iémen.

A recente revelação, pela WikiLeaks, de que os sauditas, em privado, ter-se-iam mostrado favoráveis a um ataque militar contra o Irão veio aumentar a tensão entre as duas margens do Golfo Arábico, para os países da margem ocidental (árabes); chamado de Pérsico pelos iranianos.

Aproveitando a presença em solo emirati, o emir do Kuwait não perdeu a oportunidade para recordar disputas antigas e, na sessão de inauguração da cimeira, apelou ao “fim da ocupação iraniana” de três ilhas reclamadas pelos Emirados Árabes Unidos desde 1971.

As conclusões finais da cimeira serão conhecidas esta terça-feira. Com uma nova ronda de conversações em curso, em Genebra, entre o Irão e o grupo dos 5+1 (os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança e a Alemanha) sobre o programa nuclear de Teerão, o Conselho de Cooperação do Golfo não deixará de tomar posição.

Artigo publicado no Expresso Online, a 7 de dezembro de 2010. Pode ser consultado aqui

Cimeira em dia de… “noite seca”

Na passagem de ano islâmica, seis países ribeirinhos ao Golfo Pérsico reuniram-se em Abu Dhabi. Querem fazer da região um exemplo de desenvolvimento. Reportagem nos Emirados Árabes Unidos

Sala da cimeira, no Hotel Intercontinental, em Abu Dhabi MARGARIDA MOTA

Sempre que se realiza uma cimeira destas, fala-se destes assuntos todos. No entanto, a situação não pára de piorar, sofremos com a crise, a pobreza está a aumentar… Na conferência de imprensa que assinalou o fim da 31ª cimeira do Conselho de Cooperação do Golfo (CCG), um jornalista árabe expressou-se nestes termos para questionar a quantidade de assuntos que constavam da Declaração de Abu Dhabi.

Do Irão às redes de transportes, da segurança alimentar aos direitos aduaneiros, da água ao terrorismo, as conclusões finais da reunião do CGG foram férteis e diversificadas. (ver caixa no fim do texto) Todos estes assuntos são discutidos a pensar nos cidadãos, respondeu-lhe o ministro dos Negócios Estrangeiros dos Emirados Árabes Unidos (EAU), sheikh Abdullah bin Zayed Al-Nahyan. Os países do CCG têm grandes conquistas nestes domínios. Se não tivesse confiado no Qatar, acham que a FIFA lhe teria atribuído o Mundial de 2020?

Durante pouco mais de 24 horas, o sumptuoso Emirates Palace foi a residência de quatro monarcas da região do Golfo (Arábia Saudita, Bahrain, Qatar e EAU). Faltaram ao encontro o sultão Qaboos de Omã e o monarca saudita, Abdullah, a recuperar de uma intervenção cirúrgica em Nova Iorque, que se fizeram representar.

“Lei seca” chega por email

Coincidente coma a passagem da realeza árabe por Abu Dhabi, os restaurantes emiratis estavam proibidos de vender álcool aos clientes. Num restaurante brasileiro, um empregado explica que, em três, quatro vezes ao ano, os bares e restaurantes têm de observar a noite seca, não podendo nesses dias servir álcool.

Desta vez, ele não sabia qual era a razão para a proibição (desde as 18 horas de segunda-feira até às 18 horas de ontem). Seria por causa da cimeira? Seria uma forma de não ferir a suscetibilidade religiosa dos monarcas visitantes? Perante a curiosidade, o empregado predispõe-se a consultar o computador de serviço para ler o email que as autoridades municipais enviaram para o restaurante. Já sei, é por causa do Ano Novo islâmico!, explica depois.

Esta terça-feira, os Emirados — e todo o mundo muçulmano — celebraram o primeiro dia do ano 1432 do calendário da Hégira: a fuga do Profeta Maomé de Meca para Medina. Não fosse o tal email municipal e, porventura, o empregado nem teria dado pela entrada do novo ano. O evento é assinalado com um feriado, mas não é celebrado. Não há fogo de artifício, iluminações públicas a preceito, animações populares nem desejos para o novo ano. E mesmo nos bares e restaurantes, os hábitos rapidamente retomam a normalidade. Ontem à noite, se algum restaurante de Abu Dhabi se recusasse a servir cerveja, vinho ou whisky, só podia ser por rutura de stock.

“Líderes unidos na estabilidade, titula o jornal emirati de língua inglesa The National” MARGARIDA MOTA

TRÊS ASSUNTOS EM DESTAQUE 

Água — Os países do Golfo são ricos em petróleo e gás, mas pobres em recursos hídricos. Ainda assim, os EAU possuem um dos mais altos consumos per capita de água, com uma média de 550 litros por dia. De Abu Dhabi, saiu um apelo à necessidade de consumos moderados e de colocar a tecnologia ao serviço de projetos de reciclagem e de dessalinização.

Irão — O CCG reconhece o direito do Irão desenvolver um programa nuclear para fins pacíficos, desejo que eles próprios, por várias ocasiões, também já o expressaram. Exigem, porém, que o vizinho persa cumpra com as suas obrigações no âmbito da Agência Internacional de Energia Atómica, bem como das Resoluções do Conselho de Segurança da ONU.

Mercado Comum — Enquanto organização de integração regional, o CCG estuda os passos a dar para a sua concretização. Em 2011, as empresas oriundas de qualquer um dos seis Estados membros deverá beneficiar de igualdade de tratamento comparativamente às empresas nacionais. Num encontro com Sultan bin Nasser al-Suwaidi, governador do Banco Central dos EAU, à margem da cimeira, este reafirmou duas ideias fortes do atual momento económico dos EAU e da região. Primeiro: O dólar americano ainda é a melhor escolha para o nosso país. (O dirham emirati está indexado ao dólar.) Segundo: Uma moeda única deve ser o último passo. Há que esperar, pois tudo tem o seu tempo! É uma lição que estamos a aprender o que se passa na Europa.

Artigo publicado no Expresso Online, a 7 de dezembro de 2010. Pode ser consultado aqui