Arquivo de etiquetas: Donald Trump

Mundo ansioso à espera de um mestre na arte de agitar águas

Donald Trump tem à espera problemas herdados e outros criados por si após ser eleito

Donald Trump venceu as eleições há mais de dois meses e, apesar de só na segunda-feira se tornar o 47º Presidente dos Estados Unidos, parece estar em funções há muito tempo. O cessante Joe Biden já pouco se ouve e muito do que Trump diz assume importância de Estado.

A imprevisibilidade com que governou entre 2017 e 2021 — que o levou a aproximar-se da Coreia do Norte, mas também a ameaçar desproteger aliados da NATO — gera agora ansiedade, potenciada pela sua tendência para simplificar a abordagem de problemas complexos. Da invasão russa da Ucrânia à cobiça do Canal do Panamá, tem-se revelado um mestre na arte de agitar águas à custa de argumentos pouco consistentes, que ele vai adaptando ao sabor da maré.

UCRÂNIA

Em março de 2023 Trump começou a dar sinais de que tencionava voltar à Casa Branca e escolheu a guerra na Ucrânia para puxar dos galões. Em entrevista à Fox News disse que resolveria o conflito “em 24 horas”, sem revelar como. Garantiu também que as negociações com Vladimir Putin e Volodymyr Zelensky seriam “fáceis”. A 7 de janeiro, numa conferência de imprensa em Mar-a-Lago, refez o calendário: “Espero ter… seis meses.” A determinação em acabar com a guerra mantém-se, o que obrigou Zelensky a mudar de discurso. Se o seu Plano de Paz de 10 Pontos omitia qualquer negociação, com Trump em cena o ucraniano passou a admitir a necessidade de “meios diplomáticos” para alcançar “uma paz duradoura”. Em Moscovo, a 19 de dezembro, na sessão anual com jornalistas e cidadãos, Putin disse estar disposto a reunir-se com Trump: “Estamos prontos, mas o outro lado precisa de estar pronto para negociar e para um compromisso.”

GAZA

Com o anúncio do cessar-fogo entre Israel e o Hamas (ver texto nesta edição), Trump averbou uma vitória antes mesmo de entrar na Casa Branca. Depois de ganhar as eleições, ameaçara fazer “rebentar o inferno no Médio Oriente” se os reféns não fossem libertados antes da tomada de posse. O acordo deveria entrar em vigor na véspera. Nas negociações em Doha, no Catar, além da equipa de Biden, participou Steve Witkoff, empresário judeu que Trump nomeou enviado especial para o Médio Oriente. Foi ele quem voou de Doha até Jerusalém e forçou Benjamin Netanyahu a quebrar o shabbat para discutir o acordo. A imprensa israelita diz que a conversa foi “tensa”.

CHINA

O primeiro Governo de Trump foi marcado por uma guerra comercial e tecnológica com a China. A disputa foi tal que durante a pandemia Trump substituiu “coronavírus” por “vírus da China”. O convite a Xi Jinping para a tomada de posse (não estará) pode indiciar predisposição diferente, apesar de Trump ter escolhido um forte crítico de Pequim, Marco Rubio, para chefe da diplomacia. Em campanha, prometeu impor taxas de 10% a 60% sobre os produtos chineses. Questionado sobre o que faria se a China invadisse Taiwan, descartou a resposta militar: “Diria: se forem para Taiwan, peço desculpa, mas vou tributar-vos entre 150% e 200%.”

MÉXICO

Dos mais de 11 milhões de migrantes em situação irregular nos Estados Unidos, uma larga fatia vem do México. Após um primeiro mandato marcado pela questão do muro na fronteira sul, Trump volta à carga e promete castigar o vizinho com mais taxas aduaneiras se não apresentar serviço a conter os fluxos de migrantes e de drogas. Mas não só: “Vamos mudar o nome do golfo do México para golfo da América. É um anel lindo e cobre muito território”, propôs Trump. Há cerca de 100 dias no poder, a Presidente, Claudia Sheinbaum, respondeu sugerindo que o continente passasse a designar-se “América Mexicana”, como consta num documento antigo. “O México é um país livre, independente e soberano. Coordenámos, colaborámos, mas nunca nos subordinámos.”

CANADÁ

Trump repetiu a fórmula com o vizinho do Norte e ameaçou taxar em 25% todos os produtos importados do Canadá. “Esta tarifa permanecerá em vigor até que as drogas, em particular o fentanilo, e todos os estrangeiros ilegais deixem de invadir o nosso país!”, justificou. Justin Trudeau, o demissionário primeiro-ministro canadiano, retaliou: “Nenhum americano quer pagar mais 25% pela eletricidade, petróleo e gás vindos do Canadá.” Trump sugeriu que “a linha traçada artificialmente” na fronteira desaparecesse e o Canadá se tornasse o 51º estado da federação. Retorquiu Trudeau: “Os canadianos são extraordinariamente orgulhosos de ser canadianos. Uma das formas mais fáceis de nos definirmos é: ‘Não somos americanos’.”

IRÃO

Em 2018, Trump rasgou o acordo internacional sobre o programa nuclear do Irão. Questionado sobre um putativo ataque preventivo às instalações nucleares irania­nas, respondeu: “Não falo sobre isso, é estratégia militar. Só uma pessoa estúpida responderia.” Volta ao poder numa altura em que dois pivôs regionais do Irão estão enfraquecidos: o palestiniano Hamas e o libanês Hezbollah. “Espero que Trump conduza a região e o mundo à paz e não contribua para o derramamento de sangue ou a guerra”, disse à NBC, esta semana, o Presidente iraniano, Masoud Pezeshkian. “Vamos reagir a qualquer ação. Não tememos a guerra, mas não a procuramos.”

NATO

“Há anos, quando comecei com isto, não sabia muito sobre a NATO, mas acertei. Disse que eles estavam a aproveitar-se”, recordou Trump recentemente. O magnata sempre se insurgiu contra os membros que não gastavam 2% do PIB em defesa. Chegou a dizer que encorajaria a Rússia a atacar os incumpridores. Há dias, defendeu que a percentagem deveria ser de 5% (ver texto nestas páginas).

PANAMÁ

“É uma vergonha o que aconteceu no Canal do Panamá. Jimmy Carter deu-lho por 1 dólar e eles deveriam tratar-nos bem”, acusou Trump. “A China está nas duas extremidades do Canal do Panamá. A China está a gerir o Canal do Panamá.” Para o Panamá, esta via de cerca de 80 km é o seu principal ativo económico. José Raúl Mulino, na presidência desde 2024, não quer reagir até Trump ser investido. Com sorte, este contentar-se-á com um tratamento mais favorável para os seus navios.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 16 de janeiro de 2025, e no “Expresso”, a 17 de janeiro de 2025. Pode ser consultado aqui

Problemas na justiça afastam Trump do combate político: “O público sabe quem sou”

Ex-Presidente, que lidera as sondagens, faltou ao primeiro debate entre candidatos às primárias republicanas

Foto de BRENDAN SMIALOWSKI / Getty Images. Ilustração fotográfica de LINDSEY BAILEY / AXIOS

Se em 234 anos, tantos quantos passaram desde a criação da presidência dos Estados Unidos, nunca um titular do órgão tinha sido acusado criminalmente pela Justiça do país, Donald Trump levou essa distinção ao exagero. Só este ano, o 45º chefe de Estado já foi indiciado em quatro processos criminais, abertos noutros tantos estados. Em dois deles, o início do julgamento já tem data.

Um dos casos é especialmente mais grave do que os restantes — a acusação de interferência eleitoral na Georgia, após as presidenciais de 2020, que Trump perdeu para Joe Biden por menos de 12 mil votos. Este mês, um grande júri desse estado do sueste implicou Trump e 18 aliados na constituição de uma “empresa criminosa” visando subverter a derrota do republicano naquele estado crucial para as contas finais.

DeSantis respondeu que os Estados Unidos “estão em declínio” e que tal “não é inevitável, é uma escolha”. E acrescentou: “Precisamos de mandar Joe Biden de volta para o seu porão e reverter o declínio americano.”

A acusação tem por base a Lei das Organizações Corruptas e Influenciadas por Extorsionistas (RICO, na sigla inglesa) da Georgia, que possibilita à Justiça o agrupamento daquilo que possam parecer crimes não relacionados, cometidos por pessoas diferentes, mas percecionados como tendo objetivo comum — neste caso, manter Donald Trump na Casa Branca a partir de 20 de janeiro de 2021, à revelia da vontade do eleitorado.

Rendições até ao meio-dia

Foi graças a uma lei deste género que, na década de 1980, Rudy Giuliani, à época procurador do Distrito Sul de Nova Iorque, combateu a máfia da cidade, de que mais tarde seria presidente da Câmara. Agora, o ex-advogado de Trump é um dos acusados ao abrigo da mesma lei. Quarta-feira, entregou-se às autoridades numa prisão de Atlanta, a capital da Georgia. Saiu em liberdade após pagar uma fiança de 150 mil dólares (€138 mil).

Se for condenado no caso de interferência eleitoral na Georgia, o ex-Presidente incorre numa pena de prisão de entre 5 e 20 anos

Os 19 implicados neste processo têm até ao meio-dia de hoje (17 horas em Portugal Continental) para se renderem, incluindo Trump, que aceitou entregar-se mediante o pagamento de uma fiança fixada em 200 mil dólares (€184 mil). O acordo proíbe-o explicitamente de usar as redes sociais para atingir ou abordar réus e testemunhas do caso. Se for condenado, o ex-Presidente incorre numa pena de prisão de entre 5 e 20 anos.

Os inúmeros e graves problemas com a Justiça afastaram Trump do combate político. Quarta-feira à noite, o Fiserv Forum, em Milwaukee (Wisconsin), acolheu o primeiro debate entre candidatos às primárias republicanas com vista às presidenciais de 5 de novembro de 2024. O ex-Presidente faltou e esbanjou confiança na hora de justificar a ausência. “O público sabe quem sou e que presidência bem-sucedida tive”, afirmou, domingo passado, na sua rede social Truth Social. “Portanto, não participarei nos debates.”

Favoritismo esmagador

No mesmo dia, uma sondagem da televisão CBS creditava-o com 62% das preferências de voto. Dos inquiridos, 77% consideravam as acusações na Justiça contra Trump motivadas por razões políticas e 99% dos que escolhiam ou consideravam votar em Trump defendiam que “as coisas estavam melhores” com ele na Casa Branca.

O seu adversário mais próximo, o governador da Florida, Ron DeSantis, ficava à distância de quase 50 pontos percentuais (16%). Os restantes sete candidatos analisados não atingiam a fasquia dos 10%. Mike Pence, o antigo vice-presidente de Trump, não ia além dos 5%.

Entrevista para ofuscar

Apesar da vantagem esmagadora nas sondagens, bem ao seu estilo, Trump não deu de barato todo o tempo de antena aos oito adversários que foram a debate. Cinco minutos antes de arrancar a discussão em Milwaukee, começou a ser transmitida na rede social X (antigo Twitter) uma entrevista de Trump concedida a Tucker Carlson, polémico apresentador despedido há tempos da Fox News.

A conversa de cerca de 45 minutos, pré-gravada no clube de golfe de Trump em Bedminster, Nova Jérsia, não fez manchetes, mas roubou audiência ao debate republicano, com mais de 80 milhões de visualizações nas duas horas que se seguiram à sua divulgação. Ao mesmo tempo que desviou atenções dos antagonistas, Trump fez uma provocação à Fox News, que transmitiu o debate em direto, e com quem Trump já teve melhores dias.

E se Trump for condenado…

Em Milwaukee, o assunto Trump apenas surgiu na segunda metade da discussão (que durou duas horas), porventura para dar tempo a que quem acorreu a ouvir o ex-Presidente na rede social voltasse a sintonizar a Fox. O moderador referiu-se a Trump como “o elefante que não está na sala” e perguntou aos oito candidatos se tencionam apoiá-lo na eventualidade de ele ganhar a nomeação republicana às eleições de 2024 e for também condenado na Justiça.

Quatro foram rápidos a levantar a mão — Doug Burgum (governador do Dacota do Norte), Tim Scott (senador pela Carolina do Sul), Nikki Haley (ex-governadora da Carolina do Sul e antiga embaixadora dos EUA na ONU) e Vivek Ramaswamy (empresário). Outros dois foram lentos a fazê-lo — Ron DeSantis e Mike Pence (também ex-governador do Indiana). Um demonstrou relutância (Chris Christie, antigo governador da Nova Jérsia) e apenas um assumiu que não o apoiaria (Asa Hutchinson, ex-governador do Arkansas).

Num debate em Milwaukee, oito republicanos disputaram o título de ‘melhor candidato alternativo’ a Trump

A pergunta não foi inocente, já que um dos critérios previamente estabelecidos pelo Comité Nacional Republicano para selecionar os participantes no debate foi a assinatura do “Compromisso Vencer Biden”, com o qual os candidatos prometeram apoiar o vencedor da nomeação republicana, fosse quem fosse, no duelo contra Biden, previsível vencedor incontestado da nomeação democrata. Duas outras exigências foram a obtenção de pelo menos 1% das intenções de voto em três sondagens nacionais e já terem angariado um mínimo de 40 mil doadores únicos para a sua campanha.

Durante duas horas, e perante uma audiência ao vivo de 4 mil pessoas (que reagia a cada resposta e não se inibia de vaiar quem criticasse Trump), os oito republicanos — com idades entre os 38 anos (Vivek Ramaswamy) e os 72 (Asa Hutchinson) — disputaram o título de ‘melhor candidato alternativo’ a Trump, o mais velho de todos (77 anos). Para alcançá-lo, o alvo preferencial foi Joe Biden, que tem mais quatro anos do que Trump.

O significado da canção

Consistente no segundo lugar das preferências de voto republicanas, DeSantis apontou ao atual Presidente quando confrontado sobre o porquê de o grande êxito musical do momento no país (‘Rich Men North of Richmond’, em português homens ricos a norte de Richmond) ser um tema country interpretado por um artista desconhecido (Oliver Anthony) que discorre sobre os problemas e as frustrações da classe trabalhadora e aponta o dedo aos poderosos de Washington.

OS CASOS QUE ATRAPALHAM TRUMP

O ex-Presidente enfrenta 91 acusações em quatro processos abertos em estados diferentes. Dois julgamentos já têm data

SUBORNO COMO DESPESA LEGAL
A campanha para as presidenciais de 2016, que Donald Trump venceu, estava nas últimas semanas quando saíram das suas contas 130 mil dólares para evitar um escândalo. A verba foi usada para comprar o silêncio de Stormy Daniels, atriz de filmes pornográficos com quem Trump se terá envolvido. A transação configura possível violação da lei estadual de Nova Iorque, não pelo pagamento em si, mas por ser registada como despesa legal. Trump enfrenta 34 acusações sobre falsificação de registos comerciais, num julgamento agendado para 25 de março de 2024. Sendo o crime estadual, só o governador de Nova Iorque poderá perdoar-lhe.

POSSE DE DOCUMENTOS SECRETOS
Na Florida, onde vive no luxuoso resort de Mar-a-Lago, Trump responde por 40 acusações de posse de documentos confidenciais, alguns classificados como “ultrassecretos”, que terá levado quando deixou a Casa Branca, em janeiro de 2021. Devolveu caixas de documentação, mas subsistiram suspeitas de que mantinha na propriedade registos importantes, o que lhe valeu uma acusação de obstrução aos esforços das autoridades para reavê-los. O início do julgamento está agendado para 20 de maio de 2024. Estando em causa crimes federais, se Trump for reeleito Presidente poderá absolver-se a si próprio.

REVERTER A DERROTA DE 2020
O 45º Presidente enfrenta quatro acusações de crimes federais relativas a uma ampla campanha destinada a reverter o resultado oficial da eleição presidencial de 2020, que Trump perdeu para Joe Biden. Em causa estão disseminação de informação falsa sobre fraude eleitoral ou pressão sobre autoridades estaduais republicanas para minar resultados vitoriosos de Biden. O último esforço culminou com a invasão ao Capitólio, a 6 de janeiro de 2021, por uma multidão de apoiantes que tentou abortar a transferência de poder. O processo decorre em Washington. Se reeleito e condenado, Trump poderá perdoar-se.

INTERFERÊNCIA ELEITORAL
É o caso mais grave e pode valer ao ex-Presidente entre 5 e 20 anos de prisão. Trump enfrenta 13 acusações de tentativa de interferência eleitoral na Georgia, estado crucial para o desfecho das eleições de 2020. A 2 de janeiro de 2021, ao telefone, incitou o secretário de estado da Georgia (republicano) a “encontrar” 11.780 votos, necessários para ganhar a Biden. Várias recontagens confirmaram a vitória do democrata. Além de Trump, estão acusados 18 aliados, ao abrigo de legislação estadual usada para acusar máfias e gangues do crime. Os perdões são concedidos por um painel de cinco membros nomeado pelo governador.

Artigo publicado no “Expresso”, a 25 de agosto de 2023. Pode ser consultado aqui e aqui

‘Impeachment’ traz Trump de volta ao palco da política numa altura em que a América precisa de esquecê-lo

Donald Trump começa a ser julgado esta terça-feira, no Senado, pelo papel que teve na invasão ao Capitólio. Ao Expresso, o americanólo José Gomes André defende que o processo, nesta altura, é um erro. “Num momento em que a América precisa de superar o trauma Trump e virar a página, vai-se falar dele”, diz. Será o quinto impeachment da História dos EUA. Nenhum dos anteriores resultou na condenação do Presidente, e este não deverá ser diferente

A caminho de cumprir 245 anos de vida, os Estados Unidos já sujeitaram quatro presidentes a processos de impugnação (impeachment). Metade dos casos aconteceu nos primeiros 200 anos; os outros dois nos últimos 25. Esta terça-feira, começa no senado o julgamento de Donald Trump, o único Presidente norte-americano a ser impugnado duas vezes.

“Em pouco mais de um ano, e com um só Presidente, houve tantos impeachments como nos primeiros 200 anos da História americana. Isto significa que podemos estar a entrar numa fase em que o impeachment deixa de ser considerado um recurso de última instância para se vulgarizar e banalizar como arma política”, comenta ao Expresso o americanófilo José Gomes André, professor na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

“O que começa a acontecer é que de cada vez que a maioria que controla o Congresso desgosta ou não concorda com quem está na Casa Branca, inicia um impeachment. Um dia destes o impeachment passa a equivaler a um protesto, um desagrado. É assim, também, que se desvalorizam as instituições.”

Emoções à solta

Vinte dias apenas após deixar a Casa Branca, Trump volta a ter sobre si o foco da política norte-americana para se defender das acusações de incitamento à insurreição que levou à invasão do Capitólio. “A meu ver, é uma opção política errada. Vamos continuar a falar de Trump, vamos ter mais Trump no palco político, vamos ter outra vez as emoções à solta e a sociedade norte-americana confrontada com uma decisão maniqueísta — ‘Condenação ou absolvição?’ —, quando o que os Estados Unidos precisam rapidamente é de superar este trauma”, defende o académico.

O facto de o ex-Presidente enfrentar um processo de destituição numa altura em que já não pode ser destituído (deixou o cargo a 20 de janeiro, na sequência de derrota eleitoral) levanta dúvidas em relação à oportunidade desta medida. “O argumento a favor da inevitabilidade do impeachment a Trump [atendendo à gravidade dos factos naquele que foi um evento sem precedentes na História americana] está muito relacionado com a dimensão moral do que se passou. Trump não só foi conivente como esteve ligado, mesmo que tacitamente, a um certo incitamento, sublinhando a necessidade de um protesto veemente”, recorda José Gomes André.

O investigador de Filosofia Política acrescenta, porém: “Aquilo que me parece ser má ideia tem sobretudo que ver com o facto de o impeachment surgir numa altura em que Trump já não é Presidente”.

“Isto significa que o que está por trás deste impeachment é muito mais um fenómeno de vingança e punição do próprio Trump e uma tentativa de precaver uma recandidatura presidencial. É nesta segunda dimensão que este impeachment me parece bastante criticável e questionável, porque a dimensão moral é indiscutível.”

As reservas de José Gomes André — autor de uma tese de doutoramento sobre o pensamento de James Madison, o 4.º Presidente dos EUA (1809-1817), considerado “o Pai da Constituição” — decorrem do contexto histórico em que tudo acontece.

“Num momento em que o próprio Presidente Joe Biden fala em reconciliação, na necessidade de curar as feridas, de todo um processo de divisão crescente, de uma América quase traumatizada, de manhã apela-se à reconciliação e à tarde discute-se o impeachment”, critica o investigador.

“Isto vai voltar a colocar Trump no núcleo da discussão política. Num momento em que a América precisa de superar o trauma Trump e virar a página, vai-se falar dele. Vai-se alimentar ainda mais, inclusive, a convicção dos seus apoiantes de que ele é perseguido pelos adversários, de que é uma vítima, um mártir. Parece-me um erro enorme da parte dos democratas, que só vai dividir ainda mais o país. Ainda por cima, tudo isto é reforçado pelo facto de este impeachment ter muito poucas hipóteses de vingar.”

Para Trump ser condenado, o impeachment tem de ser aprovado nas duas câmaras do Congresso: na Câmara dos Representantes por maioria simples e no Senado por maioria de dois terços dos seus membros.

A votação na Câmara dos Representantes aconteceu a 13 de janeiro, ainda antes do final do mandato do 45.º Presidente. A destituição foi então aprovada por 232 votos, contra 197. Dez republicanos tiraram o tapete a Trump e votaram ao lado dos democratas.

No Senado, a aprovação requer a anuência de pelo menos 67 senadores. Isso significa que, além dos 50 democratas (incluindo neste total dois independentes alinhados com o partido de Biden), 17 republicanos terão de votar contra Trump. Isso não está garantido nesta altura.

“Há várias maneiras de sancionar os atos de Trump. Umas já foram usadas, como uma condenação política pública. Outra é um caminho judicial tradicional” nos tribunais, que tem uma carga de neutralidade que o Congresso não tem.

“Outra é o impeachment. Tem de haver uma escala”, explica o americanófilo. “O impeachment é uma figura de última instância, fundamentalmente de condenação política. Não tem outra dimensão além dessa.”

Impeachment… a Joe Biden

A febre dos impeachments poderá, no entanto, não ficar por aqui. A 21 de janeiro, no dia seguinte a Joe Biden tomar posse como 46.º Presidente, Marjorie Taylor Greene, deputada na Câmara dos Representantes, eleita pelo estado da Georgia, e simpatizante do movimento QAnon (que espalha teorias infundadas sobre uma rede de pedófilos canibais patrocinada pelo Partido Democrata), avançou com um pedido de destituição do novo Presidente.

A congressista fundamentou o pedido dizendo que Biden, enquanto vice-Presidente, “permitiu suborno e outros crimes graves e contravenções, ao autorizar o seu filho [Hunter Biden] a influenciar a política interna de um país estrangeiro [Ucrânia] e aceitar vários benefícios — incluindo compensação financeira — de estrangeiros em troca de certos favores”.

José Gomes André não acredita que o atual Presidente saia minimamente beliscado deste processo. “É símbolo apenas da tal radicalização do discurso e da invocação do impeachment por tudo e por nada, mas não tem impacto possível, nem pouco mais ou menos.”

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 9 de fevereiro de 2021. Pode ser consultado aqui

Quatro anos de Donald Trump em 40 imagens

No seu primeiro ano na Casa Branca, Donald Trump subiu à tribuna das Nações Unidas para falar de guerra. No segundo, deu um impulso ao muro na fronteira com o México. No ano seguinte, foi alvo de um processo de impugnação no Congresso, o primeiro. E no último ano, obcecado com a reeleição, negligenciou o combate a uma pandemia mortífera. Uma presidência única em 40 imagens

O 45º Presidente dos Estados Unidos, que cessa funções esta quarta-feira, fica para a História como um líder único a vários níveis. Instável, impreparado e egocêntrico, foi o candidato derrotado que mais votos teve numas eleições presidenciais e foi também o único Presidente a ser impugnado duas vezes. Após quatro anos de uma presidência turbulenta, deixa um país mais dividido do que nunca.

1º ANO Ameaça de guerra na casa da paz

Há precisamente quatro anos, a 20 de janeiro de 2017, Donald Trump sucedeu a Barack Obama na presidência dos EUA. Nesse dia, a cordialidade que foi possível testemunhar no contacto entre os Obama e os Trump não deixaria antever a “guerra” que o republicano declararia ao legado do seu antecessor: criticou-o de forma rude, reverteu uma série de decisões importantes, retirando o país de compromissos internacionais (como o Acordo de Paris ou o acordo sobre o programa nuclear do Irão), e empenhou-se até à última em destruir o sistema de saúde que ficou conhecido como Obamacare.

Aos quatro meses de presidência, Trump realizou a sua primeira visita oficial ao estrangeiro. O tour por seis territórios levou-o prioritariamente à Arábia Saudita, num claro sinal de preferência pelo gigante sunita no braço de ferro com o rival Irão, que Trump haveria de castigar com sucessivas sanções.

Durante o primeiro ano na Casa Branca, Trump privou com os pesos-pesados da geopolítica mundial. Realizou uma visita de Estado à China e, na cimeira do G7, em Hamburgo, reuniu-se à margem do evento com o homólogo russo, Vladimir Putin.

Ao longo do mandato, Trump manteria com a Rússia uma trégua que levantou suspeitas — não reagindo a relatos de interferência de hackers russos em instituições americanas, a notícias de que Moscovo pagava aos talibãs para matar soldados americanos no Afeganistão ou não condenando o Kremlin no caso Navalny.

Inversamente, com a China, a relação pegaria fogo: numa primeira fase sob a forma de uma guerra comercial e depois responsabilizando a China pela pandemia que tomou o mundo de assalto.

Num registo nunca antes visto num Presidente dos EUA, a 19 de setembro de 2017, Trump aproveitou o púlpito da Assembleia-Geral das Nações Unidas para quase declarar guerra à Coreia do Norte, que vinha criando tensão com sucessivos testes nucleares.

“Os EUA têm muita força e paciência, mas se forem forçados a defenderem-se ou aos seus aliados, não teremos escolha a não ser destruir totalmente a Coreia do Norte. ‘Rocket Man’ [Kim Jong-un] está numa missão suicida para consigo mesmo e para o seu regime”, disse Trump. Menos de um ano depois, esta relação daria uma reviravolta.

20.01.2017 — Os Obama e os Trump, no dia da tomada de posse do republicano. A aparente harmonia duraria pouco JIM WATSON / AFP / GETTY IMAGES
28.01.2017 — Ao telefone com o homólogo russo, Vladimir Putin, Trump está acompanhado pelos seus assessores mais próximos, entre eles o supremacista Steve Bannon DREW ANGERER / GETTY IMAGES
21.05.2017 — Em Riade, na inauguração de um centro de combate à ideologia extremista. Acompanha-o Melania, o rei saudita, Salman al-Saud, e o Presidente egípcio, Abdel Fattah el-Sisi BANDAR ALGALOUD / GETTY IMAGES
22.05.2017 — Donald, Melania e Ivanka Trump recebidos em audiência, no Vaticano, pelo Papa Francisco GETTY IMAGES
22.05.2011 — De visita ao Muro das Lamentações, o lugar mais sagrado para os judeus, em Jerusalém, a cidade disputada que Trump reconheceria como capital de Israel RONEN ZVULUN / AFP / GETTY IMAGES
07.07.2017 — Aos segredos com o homólogo da Rússia, Vladimir Putin, num encontro à margem da cimeira do G20, em Hamburgo SAUL LOEB / AFP / GETTY IMAGES
21.08.2017 — Na varanda da Casa Branca, em Washington, Trump tenta vislumbrar o eclipse solar… sem óculos de observação MARK WILSON / GETTY IMAGES
19.09.2017 — De saída do púlpito da Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque, após proferir um discurso violentíssimo, ameaçando de guerra a Coreia do Norte DREW ANGERER / GETTY IMAGES
03.10.2017 — Trump atira um pacote de papel higiénico. Seria divertido não fosse num centro de distribuição de bens de primeira necessidade para vítimas de um furacão, em San Juan, Porto Rico JONATHAN ERNST / REUTERS
09.11.2017 — Na companhia de Xi Jinping, durante uma cerimónia de boas-vindas, em Pequim. EUA e China viviam um braço de ferro comercial que evoluiria para uma verdadeira guerra THOMAS PETER / GETTY IMAGES

2º ANO O apoio ao ‘Brexit’ e a visita de Marcelo

Foi só no seu segundo ano na Casa Branca que Trump visitou pela primeira vez o Reino Unido, o principal aliado dos EUA do outro lado do Atlântico. O processo de saída dos britânicos da União Europeia (‘Brexit’) já estava em curso e Trump nunca se conteve em tomar parte, incentivando Londres a cortar o cordão umbilical com Bruxelas.

Ainda antes da deslocação ao Reino Unido, Trump recebeu na Casa Branca Marcelo Rebelo de Sousa. O chefe de Estado português recordou-lhe que Portugal esteve entre as primeiras nações a reconhecer a independência dos EUA e que os fundadores assinalaram esse momento com vinho da Madeira.

Trump demonstrou curiosidade por Cristiano Ronaldo e perguntou a Marcelo se o futebolista não teria hipótese de lhe ganhar numas eleições. “Tenho de lhe dizer que Portugal não é como os Estados Unidos”, respondeu o chefe de Estado português.

No segundo ano de Trump na presidência, uma das suas principais promessas eleitorais levou um impulso — a construção de “um muro grande e lindo” na fronteira com o México. O projeto foi iniciado nos tempos da Administração Clinton, mas Trump defendeu-o como se fosse seu.

Na semana passada, a uma semana de deixar em definitivo a Casa Branca, foi um troço deste muro, na região de Alamo, no estado do Texas, que Trump visitou para mostrar obra feita.

13.03.2018 — Trump discursa junto a um protótipo de muro, durante uma visita a San Diego, Califórnia, junto à fronteira com o México KEVIN LAMARQUE / REUTERS
08.05.2018 — O anúncio faz manchetes em todo o mundo: Trump retira os EUA do acordo internacional sobre o programa nuclear iraniano e repõe sanções contra o regime de Teerão CHIP SOMODEVILLA / GETTY IMAGES
09.06.2018 — Na cimeira do G7, em Charlevoix (Canadá), Trump parece ser aquele que todos querem ouvir JESCO DENZEL / GETTY IMAGES
12.06.2018 — Trump concretiza aquilo que nenhum antecessor conseguira e protagoniza, com Kim Jong-un, a primeira cimeira entre um Presidente dos EUA e um líder da Coreia do Norte, em Singapura ANTHONY WALLACE / AFP / GETTY IMAGES
27.06.2018 — Trump recebe Marcelo Rebelo de Sousa, na Sala Oval da Casa Branca, em Washington ALEX EDELMAN / GETTY IMAGES
13.07.2018 — Boa disposição entre a primeira-ministra britânica Theresa May e Donald Trump, durante a primeira visita oficial do norte-americano ao Reino Unido BRENDAN SMIALOWSKI / AFP / GETTY IMAGES
15.07.2018 — Amante do golfe, Trump é proprietário de vários campos, nos EUA e no estrangeiro, como o da imagem, em Turnberry, Escócia LEON NEAL / GETTY IMAGES
11.10.2018 — Um batalhão de jornalistas cobre a visita do ‘rapper’ Kanye West à Casa Branca. À época, o artista apoiava Trump, em 2020 disputou as presidenciais com o republicano RON SACHS / GETTY IMAGES
05.12.2018 — Junto a três antigos Presidentes (Barack Obama, Bill Clinton e Jimmy Carter), no funeral de George H. Bush, na Catedral Nacional de Washington CHRIS KLEPONIS / GETTY IMAGES
14.01.2019 — Sob o olhar de Lincoln, Trump apresenta uma mesa com ‘fast food’, a sua comida favorita, para banquetear a equipa dos Clemson Tigers, campeã de futebol americano CHRIS KLEPONIS / GETTY IMAGES

3º ANO A pressa e a fé na reeleição

Em 2019 o tradicional discurso sobre o Estado da União, com o qual o Presidente dos EUA toma o pulso ao país, foi para os norte-americanos uma montra da desunião que se vivia entre destacados responsáveis políticos. Quando Trump acabou de falar, a líder da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, aplaudiu o Presidente de forma sarcástica, numa imagem que correu mundo.

No ano seguinte, na mesma cerimónia, Pelosi rasgaria uma cópia do discurso do Presidente, após Trump ignorar a sua mão estendida para o cumprimentar. Pelosi iniciara o processo de destituição do Presidente, com base em suspeitas de que Trump pedira ajuda à Ucrânia para interferir na eleição presidencial de 2020 de forma a favorecer a sua reeleição. Trump não lhe perdoou.

Neste terceiro ano de mandato, Trump teve o seu ‘momento Bin Laden’ a 26 de outubro de 2019, ao acompanhar desde a situation room da Casa Branca uma operação militar, a milhares de quilómetros de distância, que haveria de neutralizar Abu Bakr al-Baghdadi, o líder do Daesh (autodenominado “Estado Islâmico”), na Síria.

Dezoito anos após o 11 de Setembro, o terrorismo internacional estava mais complexo, com o Daesh a juntar-se à Al-Qaeda na criação do caos. Obama eliminara Bin Laden, Trump provava estar à altura do seu antecessor.

A 18 de junho de 2019, a mais de um ano das presidenciais onde iria tentar a reeleição, Trump lança-se oficialmente na corrida com um comício em Orlando, na Florida, repetindo o slogan de 2016 — “Make America Great Again” (Tornar a América Grande de Novo).

05.02.2019 — Nancy Pelosi, a líder democrata da Câmara dos Representantes, aplaude Trump de forma sarcástica, no Congresso DOUG MILLS / GETTY IMAGES
12.02.2019 — John Bolton, conselheiro de Trump para a Segurança Nacional, escuta-o numa intervenção na Casa Branca. Os dois entrariam em rutura e Bolton tornar-se-ia um detrator do Presidente CHIP SOMODEVILLA / GETTY IMAGES
02.03.2019 — Trump abraça a ‘Stars and Stripes’, durante um encontro de conservadores, em National Harbor, Maryland TASOS KATOPODIS / GETTY IMAGES
22.04.2019 — Acompanhado por um Coelho da Páscoa, Trump dá as boas-vindas aos participantes no Easter Egg Roll, uma tradição na Casa Branca que data de 1878 WIN MCNAMEE / GETTY IMAGES
05.06.2019 — Divertidos, Donald Trump e a rainha Isabel II assistem às comemorações do Dia D, em Portsmouth, Inglaterra DAN KITWOOD / GETTY IMAGES
18.06.2019 — Quase ano e meio antes das eleições presidenciais, Trump lança a campanha pela sua reeleição, com um grande comício em Orlando, Florida MANDEL NGAN / AFP / GETTY IMAGES
19.07.2019 — Na Casa Branca, em declarações à imprensa, de quem chegou a dizer ser “inimigo do povo”. Para Trump, órgãos como a CNN e “The New York Times” são “fake news media” JABIN BOTSFORD / GETTY IMAGES
26.10.2019 — Na ‘situation room’ da Casa Branca, o Presidente acompanha a operação militar na Síria de captura de Abu Bakr al-Baghdadi, o líder do “Estado Islâmico” SHEALAH CRAIGHEAD / GETTY IMAGES
28.11.2019 — Na base de Bagram, no Afeganistão, em visita às tropas norte-americanas em missão naquele país OLIVIER DOULIERY / AFP / GETTY IMAGES
03.01.2020 — Momento de oração no evento “Evangélicos por Trump”, num centro religioso em Miami, na Florida JIM WATSON / AFP / GETTY IMAGES

4º ANO Da absolvição à segunda impugnação

Após cinco meses de inquéritos e investigações, o processo de impugnação de Trump chegou ao fim no Congresso com a absolvição do Presidente pelo Senado. O governante mostrou-se vitorioso, mas menos de um ano depois, na reta final do seu mandato, tornou-se o primeiro Presidente dos EUA a ser alvo de um processo de destituição por duas vezes.

Ao recusar reconhecer a sua derrota eleitoral e ao ver goradas as tentativas de vencer as eleições nos tribunais, precipita o seu mandato para o descontrolo. A uma semana de sair de cena, promoveu um comício em Washington, onde apela a uma marcha até ao Capitólio onde, naquele dia, ia ser confirmada a vitória de Joe Biden e Kamala Harris. O apelo resultou no assalto ao Capitólio, por parte de apoiantes seus. Morreram cinco pessoas.

Toda a turbulência política aconteceu no meio de uma pandemia mortífera, cujo combate Trump negligenciou e que já matou mais de 400 mil cidadãos no seu país. Ainda assim, mais de 74 milhões de norte-americanos confiaram nele o seu voto nas presidenciais de 3 de novembro, alimentando-lhe o sonho do regresso em 2024.

06.02.2020 — “Absolvido”, titula “The Washington Post”, na edição em que noticia o fim do primeiro processo de impugnação a Trump DREW ANGERER / GETTY IMAGES
25.02.2020 — De visita à Índia, Donald Trump lança pétalas de rosa junto ao memorial de Mahatma Gandhi, em Nova Deli MANDEL NGAN / AFP / GETTY IMAGES
19.03.2020 — Nas notas para um ‘briefing’ sobre a pandemia, na Casa Branca, Trump risca a palavra “coronavírus” e substitui-a por “vírus chinês” JABIN BOTSFORD / GETTY IMAGES
20.03.2020 — A preocupação de Anthony Fauci, o principal epidemiologista da Casa Branca, durante um ‘briefing’ de Trump sobre a covid-19, tantas vezes desfasado da realidade JABIN BOTSFORD / GETTY IMAGES
01.06.2020 — Trump segura uma Bíblia, à entrada da Igreja de S. João, perto da Casa Branca, após ordenar a repressão dos protestos desencadeados pela morte do afroamericano George Floyd, asfixiado por um polícia BRENDAN SMIALOWSKI / AFP / Getty Images
03.07.2020 — No Monte Rushmore, no Dakota do Sul, onde estão esculpidos os rostos de quatro antigos Presidentes. Assessores de Trump sondaram a governadora acerca do processo necessário para adicionar novos rostos ao monumento… SAUL LOEB / AFP / GETTY IMAGES
15.09.2020 — Os protagonistas dos Acordos de Abraão, mediados pela Administração Trump, pelos quais Emirados Árabes Unidos e Bahrain normalizaram a relação diplomática com Israel ALEX WONG / AFP / GETTY IMAGES
05.10.2020 — Regressado do hospital onde esteve internado após acusar positivo ao novo coronavírus, Trump assoma-se à varanda da Casa Branca e retira a máscara em sinal de desafio WIN MCNAMEE / GETTY IMAGES
08.01.2021 — Uma foto tirada a um telemóvel, na sala de imprensa da Casa Branca, mostra a conta de Trump suspensa no Twitter, o seu meio de comunicação preferido JOSHUA ROBERTS / REUTERS
13.01.2021 — “Impugnado”, escreve em manchete o jornal “The New York Times”, junto a uma foto onde se vê militares a proteger o Capitólio. Donald Trump abandona o poder após um só mandato e dois processos de impugnação ROBERT NICKELSBERG / GETTY IMAGES

(FOTO PRINCIPAL Trump discursa num comício em Jacksonville, na Florida, a 24 de setembro de 2020. Cego com a reeleição, negligenciou o combate à pandemia TOM BRENNER / REUTERS)

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 20 de janeiro de 2021. Pode ser consultado aqui

Trump: 25 tweets polémicos

Escolheu o Twitter como megafone para os seus mais de 87 milhões de seguidores. Em menos de 280 carateres, Trump ameaçou países, insultou adversários e demitiu colaboradores

No lindo Midwest, as temperaturas geladas estão a chegar aos 60 graus negativos, o mais frio alguma vez registado. Nos próximos dias, é esperado ainda mais frio. As pessoas não podem ficar fora mesmo durante minutos. Que raio se passa com o Aquecimento Global? Por favor, volta depressa, nós precisamos de ti!

Devíamos ter um concurso para saber qual das estações de televisão, incluindo a CNN mas não a Fox, é a mais desonesta, corrupta e/ou distorcida na sua cobertura política ao vosso Presidente favorito (eu). São todas más. A vencedora recebe o TROFÉU NOTÍCIAS FALSAS!

Mike Pompeo está a fazer um grande trabalho, tenho muito orgulho nele. O seu antecessor, Rex Tillerson, não tinha a capacidade mental necessária. Era burro como uma pedra e eu não consegui livrar-me dele suficientemente rápido. Ele também era preguiçoso. Agora é todo um novo jogo, grande espírito no Departamento de Estado!

Quem consegue descobrir o verdadeiro significado de “covfefe”??? Divirtam-se!

Contexto:
Ninguém sabe ao certo o que significa, mas Trump aproveitou o sururu desencadeado nas redes sociais para voltar à carga. Num primeiro tweet, cuja escrita parece ter ficado a meio, ele digitou: “Apesar da constante covfefe negativa da imprensa.” Pensa-se que “covfefe” seja “coverage” (cobertura), escrito de forma atabalhoada. Trump apagaria o tweet inicial, mas “covfefe” já se tornara meme na internet. Na Wikipedia, há uma entrada sobre o assunto.

A Dinamarca é um país muito especial com pessoas incríveis, mas com base nos comentários da primeira-ministra, Mette Frederiksen, de que não teria interesse em discutir a compra da Gronelândia, eu adio o nosso encontro marcado para dentro de duas semanas para outra altura…

LIBERTEM A VIRGÍNIA, e salvem a grande segunda Emenda. Está em perigo!

Contexto:
Em quatro minutos, Trump disparou três tweets a defender a ‘libertação’ dos estados do Minnesota, Michigan e Virgínia, todos liderados por governadores democratas. As publicações são uma referência às medidas restritivas, então em vigor em vários estados por causa da pandemia de covid-19, que contrariavam a intenção do Presidente de reabrir a economia de todo o país. A segunda emenda da Constituição protege o direito do indivíduo ao porte de arma.

https://twitter.com/realDonaldTrump/status/1313186529058136070

Vou deixar o grande Centro Médico Walter Reed hoje às 18h30. Estou a sentir-me mesmo bem! Não tenham medo da covid. Não deixem que ela domine a vossa vida. Sob a Administração Trump, temos desenvolvido alguns medicamentos e conhecimento realmente ótimos. Sinto-me melhor do que há 20 anos!

Para o Presidente iraniano Rohani: NUNCA MAIS VOLTE A AMEAÇAR OS ESTADOS UNIDOS OU IRÁ SOFRER CONSEQUÊNCIAS COMO POUCOS AO LONGO DA HISTÓRIA SOFRERAM ANTES. JÁ NÃO SOMOS UM PAÍS QUE APOIA AS VOSSAS PALAVRAS DEMENTES DE VIOLÊNCIA & MORTE. TENHA CUIDADO!

Parabéns a Boris Johnson pela sua grande VITÓRIA! A Grã-Bretanha e os Estados Unidos agora estarão livres para fechar um novo Acordo Comercial maciço após o BREXIT. Este acordo tem o potencial para ser muito maior e mais lucrativo do que qualquer acordo que pudesse ser feito com a União Europeia. Comemore Boris!

Tenho grande confiança no Rei Salman e no Príncipe Herdeiro da Arábia Saudita, eles sabem exatamente o que estão a fazer…

A revista Time ligou a dizer que PROVAVELMENTE eu iria ser nomeado “Homem (Pessoa) do Ano”, como no ano passado, mas que eu teria de concordar com uma entrevista e uma sessão fotográfica. Eu disse que provavelmente não é uma boa ideia e declinei. Obrigado de qualquer forma!

O louco do Joe Biden está a tentar agir como um durão. Na realidade, ele é fraco, tanto mental como fisicamente, e mesmo assim ameaça-me, pela segunda vez, com agressão física. Ele não me conhece, mas seria derrotado depressa e duramente, chorando todo o tempo. Não ameace pessoas, Joe!

Rússia, Rússia, Rússia! É tudo o que se ouvia no início deste Embuste de Caça às Bruxas… E agora a Rússia desapareceu porque eu não tive nada a ver com a ajuda da Rússia para que fosse eleito. Foi um crime que não existiu.

Estamos unidos nos nossos esforços para derrotar o Vírus Invisível da China, e muitas pessoas dizem que é Patriótico usar máscara quando não se pode manter distância social. Não há ninguém mais Patriota do que eu, o vosso Presidente favorito!

Uma tendência em alta (no Google) desde imediatamente a seguir ao segundo debate é POSSO MUDAR O MEU VOTO? Isto refere-se a mudá-lo para mim. A resposta na maioria dos estados é SIM. Vão fazê-lo. A mais importante Eleição das vossas vidas!

Contexto:
É falso que a maioria dos estados permita mudar o voto: só acontece no Alasca, Michigan, Minnesota, Mississípi e Wisconsin. Em Nova Iorque, não há uma disposição específica, mas os eleitores que já tenham votado podem voltar a votar presencialmente no dia das eleições (só conta o voto presencial).

Ser simpático com o Rocket Man não funcionou durante 25 anos, porque haveria de funcionar agora? Clinton falhou, Bush falhou, e Obama falhou. Eu não vou falhar.

Muito interessante ver congressistas democratas “progressistas”, que vieram de países cujos governos são uma catástrofe completa e total, os piores, mais corruptos e ineptos em qualquer parte do mundo (se é que têm um governo funcional), dizerem agora ruidosa e maldosamente ao povo dos Estados Unidos, a melhor e mais poderosa nação da Terra, como o nosso governo deve ser gerido. Porque não voltam e ajudam a consertar os lugares destruídos e infestados de crime de onde vieram?

Contexto:
As congressistas democratas a que Trump se refere são Alexandria Ocasio-Cortez, Ayanna Pressley, Ilhan Omar e Rashida Tlaib. Deste quarteto apenas Omar não nasceu nos EUA, tendo chegado ao país com oito anos como refugiada de guerra da Somália. O ataque presidencial foi motivado pelo testemunho das congressistas na Câmara dos Representantes em que falaram das condições desumanas que presenciaram durante visitas a instalações de detenção de migrantes no Texas.

Precisamos do Muro para segurança e proteção do nosso país. Precisamos do Muro para ajudar a parar a entrada maciça de droga a partir do México, agora classificado como o país mais perigoso do mundo. Se não houver Muro, não há Acordo!

Por que razão haveria Kim Jong-un de me insultar chamando-me “velho”, quando eu NUNCA lhe chamaria “baixo e gordo”? Ah bem, eu tento tanto ser amigo dele — e talvez um dia isso aconteça!

TORNE A AMÉRICA GRANDE OUTRA VEZ!

De que serve a NATO se a Alemanha paga milhares de milhões de dólares à Rússia por gás e energia? Porque é que só há cinco de 29 países que honram o seu compromisso? Os EUA pagam pela proteção da Europa e depois perdem milhares de milhões em comércio. Têm de pagar 2% do PIB IMEDIATAMENTE, não até 2025.

Estes BANDIDOS estão a desonrar a memória de George Floyd e eu não vou deixar que isso aconteça. Acabei de falar com o governador Tim Walz e disse-lhe que os militares estão totalmente com ele. Qualquer dificuldade e assumo o controlo mas, quando a pilhagem começa, o tiroteio começa. Obrigado!

NOTÍCIAS FALSAS SÃO O INIMIGO DO POVO!

Começamos a ter avaliações MUITO boas da nossa gestão do coronavírus (o vírus da China), especialmente quando comparadas com outros países e áreas do mundo. Agora as vacinas estão a chegar e depressa!

Obama tem sorte por ter concorrido contra Mitt Romney, um homem com muito pouco talento ou capacidade política, por oposição a alguém que sabe como lutar e vencer!

Artigo publicado no “Expresso”, a 31 de outubro de 2020. Pode ser consultado aqui