Oito partidos uniram-se para formar um “Governo da Mudança”. Em comum só têm a vontade de arredar Benjamin Netanyahu do poder
1Israel conseguiu formar Governo?
Finalmente! Setenta e um dias após as eleições legislativas e a escassos 38 minutos de expirar o prazo de que dispunha por lei para formar uma coligação (meia-noite de quarta-feira, 22 horas em Portugal Continental), Yair Lapid, líder do segundo partido mais votado (Yesh Atid, centro), comunicou ao Presidente de Israel que reunira apoios suficientes para constituir Governo.
Antes dele, falhara nesse propósito Benjamin Netanyahu, o israelita que durante mais tempo exerceu o cargo de primeiro-ministro e líder do partido mais votado nas eleições de 23 de março (Likud, direita) — as quartas em menos de dois anos. Antes da tomada de posse, o Parlamento (Knesset) terá ainda de aprovar uma moção de confiança.
2 Quem integra o novo Executivo?
Oito dos 13 partidos com representação parlamentar — de direita, do centro e de esquerda, judeus e árabes, religiosos e seculares — acederam a negociar com Lapid. Além do seu Yesh Atid (centro), o “Governo da Mudança”, como lhe chamaram, envolve o Yamina (direita nacionalista), o Nova Esperança (dissidente do Likud), o Yisrael Beiteinu (nacionalista secular), o Azul e Branco (centro), o histórico Partido Trabalhista (centro-esquerda), o Meretz (esquerda) e a Lista Árabe Unida (Ra’am, islamita).
Todos os líderes partidários serão ministros, excetuando Mansour Abbas, do Ra’am, que fez história ao tornar-se o primeiro partido israelita árabe a integrar uma coligação governativa. Abbas garantiu outras compensações, como, por exemplo, a não demolição de algumas casas de cidadãos árabes.
Ao todo, os oito partidos totalizam 62 deputados — a maioria no Knesset garante-se com 61 num total de 120 —, mas a aprovação parlamentar do novo elenco executivo não está garantida. Pelo menos um deputado do Yamina (Nir Orbach) insurgiu-se contra as cedências feitas pelo seu partido e ameaça votar contra. Basta que mais um deputado se rebele desta maneira e o novo Governo não verá a luz do dia.
3 Será este um governo para durar?
Muito dificilmente. O único cimento a unir as oito fações que integram a aliança é a vontade de arredar Benjamin Netanyahu do poder.
As dificuldades de entendimento entre as partes começaram logo pela escolha de quem iria chefiar o Executivo, tendo ficado acordado que Naftali Bennett, líder do Yamina (direita nacionalista), será primeiro-ministro durante dois anos e Yair Lapid (que começará por ser ministro dos Negócios Estrangeiros) suceder-lhe-á nos restantes dois anos do mandato. Ambos têm, por exemplo, posições contrastantes em relação aos palestinianos: Bennett recusa a solução de dois Estados e Lapid tolera-a.
Igual alternância acontecerá, por exemplo, no Comité de Seleção Judicial — órgão que nomeia juízes para os tribunais —, onde o lugar de representante do Governo irá, em primeiro lugar, para a nº 2 do Yamina, Ayelet Shaked (que será ministra do Interior), e depois para a líder do Partido Trabalhista, Merav Michaeli (que ficará com a pasta dos Transportes).
Os 21 ministérios do “Governo da Mudança” estão divididos por sete partidos (o Ra’am é o único que não dirigirá um ministério). Entre os mais importantes, Benny Gantz (Azul e Branco) será ministro da Defesa, Avigdor Lieberman (Yisrael Beiteinu) será o titular das Finanças e Gideon Sa’ar (Nova Esperança) da Justiça.
4 Quem fará oposição ao “Governo da Mudança”?
O Likud, de Netanyahu, que tem 30 deputados, terá a maior bancada no Knesset. Outros quatro partidos também não integram a coligação: Shas (ultraortodoxo sefardita), Judaísmo da Torá Unida (ultraortodoxo ashkenaze), Sionistas Religiosos (extrema-direita) e Lista Árabe Unida, uma coligação de três partidos árabes. Estas cinco formações totalizam 58 deputados no Knesset. Netanyahu, que está a responder na justiça pelo crime de corrupção, corre o risco de ver o Parlamento, que agora lhe é adverso, aprovar legislação que o impeça de se recandidatar. Netanyahu chamou ao acordo de governo Lapid-Bennett “a fraude do Século”.
5 Que outra mudança aconteceu na política israelita?
A eleição do novo Presidente de Israel, quarta-feira. Isaac Herzog, que era até agora presidente da Agência Judaica, recebeu os votos de 87 dos 120 deputados do Knesset, naquela que foi a vitória mais folgada de sempre. Herzog, que assim se tornou no 11º Presidente, venceu a disputa com a professora Miriam Peretz, que teria sido a primeira mulher no cargo.
Nascido em 1960, em Telavive, Herzog foi o líder máximo do Partido Trabalhista entre 2013 e 2017. Filho de Chaim Herzog, sexto chefe de Estado de Israel (1983-1993), é o primeiro Presidente de segunda geração. Toma posse a 9 de julho.
Os israelitas foram a votos a 23 de março e ainda não têm Governo. Os palestinianos, cujas últimas legislativas datam de há 15 anos, viram adiar as eleições agendadas para 22 de maio. No Médio Oriente, até votar pode ser complicado
1 Israel já conseguiu formar Governo?
Passaram 45 dias e ainda não há Governo. À meia-noite de terça-feira passada esgotou-se, sem êxito, o prazo dado ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, líder do partido mais votado (Likud, direita, 31 deputados em 120), para formar uma coligação. O senhor que se segue na tarefa, indicado pelo Presidente Reuven Rivlin, é Yair Lapid, líder da segunda força mais votada (Yesh Atid, centro, 17 deputados). Lapid tem 28 dias para obter o apoio de pelo menos 61 parlamentares. Sabe-se que ele e Naftali Bennett (líder do Yamina, direita radical, 7 deputados) negociaram um “governo de mudança” (sem Netanyahu) onde alternariam no cargo de primeiro-ministro (Bennett seria o primeiro). Falta convencer mais partidos.
2 E os palestinianos, vão realizar eleições?
Já não. Estavam marcadas legislativas para 22 de maio, a comissão eleitoral tinha aprovado 36 listas candidatas, mas há uma semana o Presidente Mahmud Abbas anunciou a suspensão do ato eleitoral, alegando que os eleitores de Jerusalém Oriental (anexada por Israel) não tinham condições para votar. Para muitos palestinianos, a justificação soou a desculpa. “Surpreendeu-me que Abbas concordasse em fazer eleições”, diz ao Expresso o ativista Issa Amro. “Ele não ia aceitar eleições livres. É idoso [85 anos], está incapacitado e incapaz. Ia perder a presidência e a sua Fatah deixaria de ser o principal partido. A liderança da Autoridade Palestiniana é muito má, tornou-se subempreiteira da ocupação, quer manter o statu quo.”
3 Que importância teria este escrutínio?
Muita. Seriam as primeiras legislativas desde 2006. “O anúncio destas eleições causou uma imensa onda de expectativa e esperança junto dos palestinianos, visível no número de eleitores que se registaram, na multiplicação de listas eleitorais e até no número crescente de mulheres nessas listas”, diz ao Expresso Marta Silva, investigadora na área dos estudos da sociedade israelita. O escrutínio seria o início de um ‘arrumar de casa’ que os palestinianos vêm exigindo desde que o mandato presidencial de Abbas expirou, a 15 de janeiro de… 2009. A 31 de julho haveria presidenciais e a 31 de agosto eleições para o Conselho Nacional Palestiniano, órgão da Organização de Libertação da Palestina, que representa o povo a nível internacional.
4 Que consequências terá este adiamento?
À luz dos últimos 15 anos, é realista interpretar o adiamento das eleições como um cancelamento, que acontece em contexto delicado. “Muitos elementos fomentam raiva e violência contra os palestinianos, como se viu na manifestação da extrema-direita nacionalista e supremacista israelita em Jerusalém, na semana passada”, diz ao Expresso Giulia Daniele, do Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa. Não fazer eleições “só vai aumentar a frustração dos palestinianos que acreditavam numa nova unidade nacional, em contraste com a política de ocupação e apartheid israelita e com a divisão intrapalestiniana Hamas-Fatah”.
Artigo publicado no “Expresso”, a 7 de maio de 2021. Pode ser consultado aqui
A formação de um Executivo é um quebra-cabeças tal que nem o Presidente do país acredita que seja possível. Ainda assim, encarregou alguém da tarefa
1 Quem vai tentar formar Governo?
Benjamin Netanyahu. Ao fim de um acumulado de mais de 15 anos como primeiro-ministro (entre 1996 e 1999, e desde 2009), continua a ser o político em quem os israelitas mais confiam para governar. O seu partido (Likud, direita) venceu as legislativas de 23 de março com 24,2% dos votos, o que lhe garantiu 30 deputados no Parlamento (Knesset, de 120 lugares). Tem de conseguir o apoio de mais 31 para continuar no cargo. Após terminar as reuniões com as várias forças políticas, no início da semana, o Presidente Reuven Rivlin deixou antever uma tarefa quase impossível: “Nenhum candidato tem uma hipótese realista de formar um governo que tenha a confiança do Knesset.”
2 Quem quer ‘Bibi’ a primeiro-ministro?
Dos 13 partidos que elegeram deputados, quatro defenderam, na audiência com o Presidente, que o primeiro-ministro deve ser Netanyahu (conhecido por ‘Bibi’). Cinco outros preferem nomear Yair Lapid, líder do segundo partido mais votado (Yesh Atid, de centro). O Yamina (direita) quer ver o seu líder, Naftali Bennett, à frente do Governo. E três partidos não indicaram preferência, deixando margem a negociações: são eles a Nova Esperança (uma cisão do Likud) e as duas formações árabes.
3 Que contas é possível fazer?
Os quatro partidos que defendem Netanyahu — três partidos religiosos, além do Likud — garantem-lhe o apoio de 52 deputados, insuficiente para suportar uma coligação de governo. Mesmo que Netanyahu consiga atrair para o seu lado o Yamina, ficará ainda assim a dois deputados da maioria de 61. As cinco forças políticas que não o aceitam no cargo de primeiro-ministro totalizam 45 deputados. Resta pois a ‘Bibi’ sacar de um trunfo que seduza um dos três partidos que não anunciaram apoio a qualquer candidato.
4 Quão realista é essa hipótese?
Em política tudo é possível, mais ainda tendo Netanyahu o talento negocial que se lhe reconhece. Mas à partida é difícil antever qualquer das três fações a dar-lhe a mão. O Nova Esperança (direita) foi fundado em dezembro passado a pensar nas eleições e com o foco de tirar Netanyahu do poder. É liderado por um seu antigo ministro, Gideon Sa’ar, e elegeu seis deputados. Esta semana, a número dois do partido, Yifat Shasha-Biton, outra ex-ministra de Netanyahu, expôs o assédio do Likud para que deserte da bancada do Nova Esperança e se junte a Netanyahu: “Ofereceram-me o Ministério da Educação e, em geral, ofereceram o mundo a todos os membros do nosso partido, mas não vai acontecer, por isso parem de telefonar. Somos um grupo muito coeso atrás de Gideon Sa’ar e dissemos explicitamente que não nos sentaremos numa coligação de Netanyahu. Não haverá qualquer deserção”.
5 Os partidos árabes farão a diferença?
O Ra’am (islamita), que elegeu quatro deputados, deixou aberta a possibilidade de viabilizar um Governo de Netanyahu. Mas o apoio a ‘Bibi’ do partido Sionismo Religioso (extremismo judaico), que elegeu seis deputados, pode revelar-se um obstáculo a essa aliança. Já a outra formação árabe, a Lista Conjunta (seis deputados), não parece ser opção. Na tomada de posse do novo Knesset, terça-feira, alguns dos seus deputados invocaram o problema palestiniano e afirmaram-se comprometidos com a luta contra a “ocupação”, o “apartheid” e o “racismo”. Nunca um partido árabe integrou uma coligação de Governo em Israel, apesar dos 20% de cidadãos árabes.
6 E se não houver Governo?
Netanyahu tem 28 dias (até 5 de maio) para obter o apoio da maioria dos deputados. Se não o conseguir, pode pedir mais duas semanas, mas o Presidente não é obrigado a aprovar o que sair desse período extra. Sem coligação, o Presidente pode atribuir a tarefa a outra pessoa, que terá 28 dias (mais 14), ou enviar o processo para o Parlamento, que disporá de 21 dias para reunir apoio suficiente à volta de um candidato. Se o Presidente optar por outro candidato e de novo não resultar, o processo vai automaticamente para o Knesset. Aí, durante 21 dias, qualquer deputado será elegível para formar Governo. Terminado o prazo, se ninguém reunir condições, o Parlamento é dissolvido e haverá eleições, as quintas em pouco mais de dois anos.
7 É este o assunto do momento em Israel?
Longe disso. Netanyahu é notícia também pelo seu julgamento por corrupção. No mesmo dia em que o Presidente de Israel ouvia os partidos, o primeiro-ministro voltava a tribunal para o início da fase de apresentação de provas. “Conheço a posição de muitos, de que o Presidente não devia dar o cargo a um candidato que enfrenta acusações criminais”, disse Reuven Rivlin, acrescentando não ter sido “uma decisão fácil”. Quarta-feira, Netanyahu marcou presença numa homenagem, em Jerusalém, aos 900 sobreviventes do Holocausto que morreram de covid-19. “Numa altura em que avançamos, há coisas que podem levar-nos para trás. O acordo nuclear com o Irão está na mesa outra vez”, disse. Na véspera, Estados Unidos e Irão iniciaram conversações indiretas, em Viena, com vista à reativação daquele pacto. “O acordo com o Irão, que representa para nós uma ameaça de destruição, não nos obriga”, garante ‘Bibi’.
Contados cerca de 90% dos votos nas legislativas de terça-feira em Israel, nem o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu nem quem se lhe opõe tem garantidos apoios suficientes para formar uma coligação de Governo. Nesta reta final do processo, a expectativa reside nos sufrágios por escrutinar, bem como no posicionamento de um partido islamita que não fecha as portas a Netanyahu
Se é chavão dizer-se que em eleições todos os votos contam, em Israel essa máxima é levada ao extremo. Os resultados finais das legislativas de terça-feira não deverão ser conhecidos antes de sexta-feira, pelo que só então será possível pegar na calculadora e perceber se alguma das forças políticas que foram a votos tem condições para formar Governo.
O partido do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu (Likud, direita) foi de longe o mais votado, mas com cerca de 90% dos votos escrutinados, não tem garantido o apoio de pelo menos 61 deputados, de que precisará para continuar a mandar no país.
BLOCO QUE APOIA NETANYAHU
Likud (direita conservadora): 30 deputados
Shas (religioso ultraortodoxo): 9
Yamina (direita sionista): 7
Judaismo da Torá Unida (religioso ultraortodoxo): 7
Esta contagem integra o partido Yamina, liderado por Naftali Bennett. Este foi ministro da Defesa de Netanyahu em 2019 e 2020 e, durante a campanha eleitoral, posicionou-se como desafiador do primeiro-ministro, deixando em aberto um eventual apoio.
Dando como certo esse apoio, a esperança de Netanyahu está em cerca de 450 mil votos, depositados por diplomatas, militares, presos, residentes em lares, doente com covid-19 e pessoas a cumprir quarentena, que só serão abertos após terminar a contagem dos votos em urna. Normalmente, estes envelopes contêm mais votos de direita.
Quanto aos partidos que querem ver Netanyahu fora do poder, também não totalizam o número de deputados suficientes para se lançarem a formar o futuro Executivo. Ainda que matematicamente esse cenário fosse possível, na prática implicaria um entendimento entre sensibilidades políticas difíceis de compatibilizar.
BLOCO ANTI-NETANYAHU
Yesh Atid (centro): 17
Azul e Branco (centro): 8
Yisrael Beiteinu (direita nacionalista): 7
Partido Trabalhista (centro-esquerda): 7
Nova Esperança (direita): 6
Lista Conjunta (árabe): 6
Meretz (esquerda): 5 TOTAL: 56 deputados
De fora do bloco que deseja o afastamento de Netanyahu do poder está, para já, a Lista Árabe Unida (Ra’am), partido árabe (islamita) que desde 2003 tem ido a votos em coligação com outras formações árabes mas que nestas eleições decidiu concorrer ‘a solo’.
Para já, os votos contados atribuem ao Ra’am cinco deputados no Knesset. Esta quarta-feira, em entrevista à televisão pública Kan, o seu líder, Mansour Abbas, afirmou que o partido “não está obrigado em relação a nenhum bloco ou candidato. Não estamos no bolso de ninguém, nem à direita nem à esquerda”.
Se for opção para Netanyahu, será a primeira vez que um partido árabe fará parte de um Governo em Israel.
(FOTO Um militar participa nas eleições de 23 de março IDF SPOKESPERSON’S UNIT / WIKIMEDIA COMMONS)
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 24 de março de 2021. Pode ser consultado aqui
Esta terça-feira, Israel realiza as quartas eleições legislativas em menos de dois anos. A fadiga eleitoral parece não afetar a dinâmica política do país, já que se apresentam a votos 39 partidos. Treze deles têm reais possibilidades de eleger deputados e será junto desses que Benjamin Netanyahu, o grande favorito à vitória, terá de procurar apoio para conseguir formar Governo. Sob pena de Israel seguir para a quinta ida às urnas
Líderes partidários nas eleições de 23 de março de 2021. De cima para baixo e da esquerda para a direita: Itamar Ben Gvir (do Otzma Yehudit, que integra o Sionismo Religioso); Bezalel Smotrich (Sionismo Religioso); Naftali Bennett (Yamina); Aryeh Deri (Shas); Moshe Gafni (Judaísmoda Torá Unida); Avigdor Liberman (Yisrael Beytenu); Gideon Sa’ar (Nova Esperança); Benjamin Netanyahu (Likud); Yair Lapid (Yesh Atid); Merav Michaeli (Partido Trabalhista); Benny Gantz (Azul e Branco); Nitzan Horowitz (Meretz); Ayman Odeh (Lista Conjunta); Mansour Abbas (Ra’am); Yaron Zelekha (Nova Economia) MONTAGEM FOTOGRÁFICA PUBLICADA NO THE TIMES OF ISRAEL
Desde a criação do Estado de Israel, em 1948, perto de 200 partidos políticos já participaram em eleições. A maioria deles durou poucos anos, mas pelo menos 110 conseguiram representação no Parlamento (Knesset). Esta fragmentação parlamentar — que espelha a complexidade da sociedade israelita — explica o porquê de, em Israel, os governos serem sempre de coligação.
É o que vai acontecer também após as eleições legislativas desta terça-feira, as quartas em menos de dois anos, após escrutínios em abril e setembro de 2019 (de onde não saiu Governo) e em março de 2020 (de onde saiu um Governo, mas que não conseguiu ver aprovado o orçamento no Parlamento).
As urnas fecham às 22 horas locais (20 horas em Portugal Continental), após 6.578.084 eleitores terem a possibilidade de escolher um de 39 partidos que se apresentam a votos.
13 partidos têm reais possibilidades de eleger deputados. Para que isso aconteça, têm de garantir pelo menos 3,25% dos votos
Benjamin Netanyahu, o atual primeiro-ministro, está no centro de todas as equações possíveis. O seu partido (Likud, de direita) lidera, destacado, as sondagens publicadas até sexta-feira, podendo angariar um quarto dos 120 lugares do Knesset.
As formações de direita são, no seu conjunto, largamente maioritárias, mas o impacto daquele que já é o israelita que durante mais tempo ocupou o cargo de primeiro-ministro (está no poder há 12 anos, depois de um período de três anos no século XX) fragmentou esse campo político entre forças pró-Netanyahu e outras que não aceitam que ele continue a liderar o Executivo.
É nesta complexa teia política que Netanyahu terá de procurar o apoio de pelo menos 61 deputados para continuar no poder, sob pena de Israel ter de avançar para as quintas eleições.
LIKUD (direita): Com Netanyahu até ao fim
É um dos partidos históricos de Israel. Teve na liderança nomes como Menachem Begin, Yitzhak Shamir ou Ariel Sharon. Foi fundado em 1973 e governa de forma ininterrupta desde 2009. De ideologia conservadora e visão económica liberal, fez duas grandes promessas durante esta campanha: a recuperação económica pós-pandemia e o aumento de tratados bilaterais com países árabes.
Os estudos de opinião foram-lhe atribuindo, de forma constante, entre 27 e 29 deputados, mas no passado fim de semana — enquanto muitos israelitas celebravam, com festas e ajuntamentos ao ar livre, o regresso à normalidade após uma campanha de vacinação à covid-19 bem-sucedida —, as previsões para o Likud deram um pulo até aos 32 deputados.
NOVA ESPERANÇA (direita): Já chega de Netanyahu
O partido Nova Esperança é a novidade destas eleições. Resulta de uma cisão dentro do Likud, encabeçada por um antigo ministro de Netanyahu, Gideon Sa’ar. A prioridade deste partido passa por afastar do poder “Bibi” (como também é conhecido Netanyahu) e “restaurar uma liderança respeitosa e responsável para Israel”.
O Nova Esperança promete ainda uma reforma judicial e a limitação a oito anos do mandato de primeiro-ministro. O partido diz-se comprometido com a “concretização dos direitos naturais e históricos do povo judeu na Terra de Israel”, opõe-se a um Estado palestiniano e promete dar prioridade aos colonatos no território palestiniano ocupado da Cisjordânia.
Sa’ar espera ter votos suficientes para liderar uma coligação de direita sem o Likud de Netanyahu: “Precisamos de um Governo que não dependa de extremistas”. Quando foi fundado, em dezembro passado, as sondagens atribuíam-lhe 21 lugares no Knesset. Ao longo da campanha perdeu gás e as últimas previsões dão-lhe entre 9 e 10 deputados.
YAMINA (direita): Contra Netanyahu, mas…
De matriz sionista, religiosa, conservadora e liberal, é outro partido recente, fundado em julho de 2019, por outro ex-ministro de Netanyahu. Naftali Bennett orientou a sua mensagem durante a campanha em especial para os israelitas que ficaram desempregados durante a pandemia.
Bennett já se declarou candidato ao cargo de primeiro-ministro, mas é apontado como uma provável muleta de Netanyahu na hora de somar apoios com vista à formação de Governo. Atualmente, o Yamina tem seis deputados no Knesset, as sondagens dão-lhe 10.
YISRAEL BEITEINU (direita): Tudo contra Netanyahu e os religiosos
“Israel é a Nossa Casa” é um partido nacionalista secular que, nos últimos anos, se tem assumido contra a influência dos partidos religiosos na sociedade israelita e a dependência política de Netanyahu em relação às fações ultraortodoxas.
Defende, nomeadamente, a instituição do casamento civil e a obrigatoriedade do serviço militar também para os israelitas ultraortodoxos, o que não acontece atualmente.
O partido nasceu em 1999, tem sólida base de apoio entre os judeus originários da antiga União Soviética e é liderado desde então por Avigdor Lieberman. Tem um discurso antiárabe e defende uma solução para o conflito israelo-palestiniano com base no intercâmbio de populações e a criação de dois Estados etnicamente homogéneos.
O Yisrael Beiteinu recusa participar numa coligação de Governo liderada por Netanyahu ou que inclua os partidos religiosos haredi. As sondagens preveem um aumento dos atuais sete para oito deputados.
SHAS E JUDAÍSMO DA TORÁ UNIDA (religiosos): Com fé em Netanyahu
São dois partidos religiosos ultraortodoxos (haredi), defensores da subordinação do Estado à lei de Deus, que têm integrado os últimos executivos de Netanyahu. Concentram as suas prioridades nas áreas da Educação e da Saúde.
Nos primeiros meses da pandemia, o ministro da Saúde de Israel era Yaakov Litzman, líder do Judaísmo da Torá Unida (JTU), o que se revelou uma incongruência, dado o comportamento desafiador da comunidade ultraortodoxa em relação às restrições decretadas pelo Governo para combater a covid-19, nomeadamente a oposição ao encerramento das sinagogas e das yeshivas (escolas religiosas).
Nas eleições de 2020, o Shas (acrónimo de “Guardiões sefarditas”) foi multado pela Comissão Eleitoral por distribuir junto a assembleias de voto amuletos protetores contra a covid-19.
Em fevereiro, os dois partidos reafirmaram lealdade a Netanyahu, prometendo não participar em nenhum Governo saído destas eleições que não seja liderado pelo Likud. O Shas e o JTU têm, respetivamente, nove e sete deputados no Knesset. As sondagens preveem que mantenham essa representação.
SIONISMO RELIGIOSO (Extrema-direita): Com a bênção de Netanyahu
Partido de extrema-direita, tem uma aliança com fações neo-Kahanistas (extremismo judaico) e anti-LGBT (homofóbicas). Esta fusão foi incentivada por Netanyahu para impedir que votos em pequenos partidos da direita sejam desperdiçados.
Nas últimas eleições, esta formação concorreu integrada no Yamina, mas nestas participa por conta própria, focada na união do sionismo religioso e em ser a voz ideológica da direita no Knesset. No decorrer da campanha, o Sionismo Religioso esteve aquém dos 3,25% de votos necessários para obter representação parlamentar, mas as últimas sondagens atribuem-lhe cinco assentos.
YESH ATID (Centro): Oposição a Netanyahu
Projeta-se como o partido mais votado a seguir ao Likud, com 18 deputados. Yesh Atid (“Há um Futuro”, em hebraico) reclama a defesa da classe média secular israelita. Foi fundado em 2012 e é, desde então, liderado por Yair Lapid, ex-jornalista e antigo ministro das Finanças, filho de um antigo ministro da Justiça que chefiou o partido Shinui, secular e ferozmente anti-ultraortodoxos.
Em 2019, o Yesh Atid aderiu à aliança Azul e Branco (formada por fações de centro), que desde então se tornou principal adversário eleitoral do Likud (ver abaixo). Abandonou-a após uma das fações ter aceitado viabilizar um Governo liderado por Netanyahu, a seguir às eleições de 2020.
No seu programa, constam medidas como o reforço da supervisão do Parlamento sobre o Governo, o limite à quantidade de ministros, a limitação de mandatos de primeiro-ministro, a instituição do casamento civil, incluindo entre pessoas do mesmo sexo, o funcionamento parcial dos transportes ao sábado (shabbat) e a retoma das negociações com os palestinianos.
AZUL E BRANCO (Centro): O poder depois da queda?
Nasceu da aliança de três partidos de centro e, presentemente, apenas a Resiliência de Israel, a fação liderada pelo ex-chefe de Estado-Maior das Forças de Defesa de Israel Benny Gantz, continua a responder por esse nome.
A coligação nasceu para derrotar Netanyahu e desfez-se após Gantz ter aceitado um esquema rotativo de partilha de poder, na sequência das últimas eleições, em março de 2020, viabilizando com isso mais um Governo liderado por Netanyahu.
Fundado em fevereiro de 2019, o Azul e Branco obteve 35 deputados nas eleições de abril de 2019 e 33 nos sufrágios de setembro de 2019 e de março de 2020. Agora, as sondagens atribuem-lhe entre quatro e cinco lugares no Knesset.
Ironicamente, se destas eleições não sair um Executivo e o impasse político continuar, Gantz assumirá em novembro a chefia do Governo atual, graças ao acordo celebrado com Netanyahu.
PARTIDO TRABALHISTA (Esquerda): Em nome de uma ‘revolução cor-de-rosa’
De matriz sionista e social-democrata, é um partido histórico de Israel, fundado em 1968. Teve primeiros-ministros carismáticos como Golda Meir, Yitzhak Rabin e Shimon Peres, mas desde 2001 deixou de ser opção para chefiar o Governo.
Merav Michaeli, feminista e antiga jornalista de 54 anos, lidera o partido desde 24 de janeiro passado. Prometeu “uma revolução dos trabalhadores de colarinho rosa” e algumas medidas do seu programa eleitoral refletem esse propósito: um ano de licença de maternidade/paternidade paga e uma reforma legal da forma como as autoridades lidam com crimes sexuais, abuso infantil e assédio sexual.
Nas eleições de abril de 2019, o “Labor” perdeu 13 deputados, não conseguindo mais de seis. Para não correr o risco de desaparecer do Parlamento, nas eleições seguintes coligou-se com o centrista Gesher e manteve os seis deputados. Em março de 2020, juntou-se ao Gesher e ao Meretz (esquerda) e subiu para sete. Nestas eleições, apresenta-se ‘a solo’ e deverá ter entre cinco e seis deputados.
MERETZ (Esquerda): Remar contra a extinção política
Social-democrata, verde e abertamente de esquerda, é um partido com quase 30 anos de vida e perto da extinção política. Fundado em 1992, aquela que é atualmente a única força política israelita filiada na Internacional Socialista tem quatro deputados no Knesset (já teve o triplo) e, segundo as sondagens, deverá mantê-los. Apoia uma Palestina independente, os direitos das minorias, a liberdade religiosa e a separação de religião e Estado.
É mais um partido encabeçado por um antigo jornalista, Nitzan Horowitz, de 56 anos, primeiro político assumidamente gay a assumir uma liderança partidária. O Meretz é o único a defender mais impostos para os salários mais altos. Pugna também por um forte aumento dos orçamentos para a saúde e educação. Não aceita participar num Governo liderado por Netanyahu.
LISTA CONJUNTA E RA’AM (Árabes): Falta de união
Cerca de 20% da população israelita é culturalmente de origem árabe. Cidadãos de pleno direito como qualquer judeu, têm direito ao voto e a constituírem partidos políticos. Três concorrem coligados na Lista Conjunta: Hadash (comunista árabo-judeu), Balad (nacionalista) e Ta’al (nacionalista). Um quarto, o Ra’am (islâmico conservador), vai a votos separadamente pela primeira vez desde 2003.
A Lista organizou-se em 2015, quando a percentagem de votos necessária para garantir a eleição de deputados subiu para os 3,25%. Para todos, o combate ao aumento da violência e do crime organizado nas comunidades árabes é prioritário. Igualmente, querem ver revogada a Lei da Nacionalidade de 2018, que consagra Israel como Estado-nação do povo judeu e secundariza o estatuto das populações árabes.
Nas duas últimas legislativas, os quatro partidos concorreram juntos e conquistaram 13 deputados (em setembro de 2019) e 15 (em 2020). Agora as sondagens atribuem oito à Lista Conjunta e três ao Ra’am, um partido forte entre as populações beduínas. Este último não descarta participar numa coligação liderada por Netanyahu. Uma desunião que fragiliza ainda mais a minoria árabe israelita.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 23 de março de 2021. Pode ser consultado aqui
Jornalista de Internacional no "Expresso". A cada artigo que escrevo, passo a olhar para o mundo de forma diferente. Acho que é isso que me apaixona no jornalismo.