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Estado da União. Discursos já houve 232 mas a maior parte chegou por carta

Donald Trump cumpre, na madrugada desta quarta-feira, uma tradição com mais de 200 anos e faz o seu terceiro discurso sobre o Estado da União. Dos 45 Presidentes norte-americanos, só dois nunca o fizeram. O recorde do discurso mais longo pertence a um dos cinco estadistas ainda vivos

Na Câmara dos Representantes, Richard Nixon faz o discurso sobre o “Estado da União”, em 1972 US CAPITOL / WIKIMEDIA COMMONS

O discurso sobre o Estado da União que Donald Trump irá proferir esta terça-feira à noite (2h de quarta em Portugal Continental), perante o Congresso dos Estados Unidos, é uma prática quase tão antiga quanto a própria federação norte-americana. Foi George Washington (Presidente entre 1789 e 1797) quem, a 8 de janeiro de 1790 — tinha o país apenas 14 anos —, primeiro se dirigiu a uma sessão conjunta do Congresso. “Caros cidadãos do Senado e Câmara dos Representantes”, assim iniciou ele a sua alocução, dando o mote para uma tradição política que só em 1947 — quando começou a ser transmitido pela televisão — passaria a ser oficialmente designada “Estado da União”.

Três anos antes, em 1787, “o povo dos Estados Unidos” dotara-se de uma Constituição, a qual, no seu artigo II, enumerava as obrigações do Presidente. “Ele deve de tempos a tempos dar ao Congresso informação sobre o Estado da União, e pôr à sua consideração medidas que considere necessárias e convenientes”, era uma delas.

Assim apressou-se a fazer George Washington, no Federal Hall, na cidade de Nova Iorque. À época, Washington D.C. ainda não existia, a Casa Branca só começaria a ser construída em 1792 e a primeira sessão conjunta no atual Capitólio só ocorreria a 11 de novembro de 1800. Neste dia, John Adams (1797-1801) entraria para a História como o primeiro Presidente norte-americano a discursar na atual capital.

A George Washington deve-se também o caráter anual desta intervenção, ainda que nem todos os seus sucessores se tenham dignado comparecer pessoalmente no Congresso. Se os dois primeiros Presidentes fizeram-no — George Washington, de forma generosa, com uma média de 2080 palavras por discurso e John Adams, mais comedido, com apenas 1790 (a mais baixa de sempre) —, os chefes de Estado seguintes optaram por enviar mensagens escritas.

Entre 1801 e 1913 — período em que a Casa Branca teve 25 inquilinos —, a mensagem chegou ao Congresso de forma escrita. A Thomas Jefferson (1801-1809), em particular, incomodava-o a semelhança entre a aparição do Presidente diante dos representantes do povo, no início de cada sessão, e a prática monárquica dos britânicos, que discursavam a cada novo Parlamento. Por isso, optou por não discursar “in loco”.

A tradição do discurso presencial foi recuperada em 1913 por Woodrow Wilson — que faltaria em 1919 e 1920 por razões de saúde. Ao longo dos anos, essa passaria a ser a fórmula preferencial dos Presidentes, ainda que, de forma intermitente, mensagens escritas continuassem a chegar ao Congresso — a última das quais em 1981, com Jimmy Carter a submeter um discurso quatro dias antes de Ronald Reagan lhe suceder no cargo.

O formato atual estabilizou a partir de 1934, com Franklin Delano Roosevelt (1933-1945). Mas no total, desde 1790, já foram feitos mais discursos por escrito do que oralmente: 130 contra 102.

Se John Adams foi o Presidente mais sucinto, já William Howard Taft (1909-1913) foi o mais palavroso, com uma média de 22.614 palavras por texto. A esta discrepância não será alheio o facto de o primeiro ter sempre discursado de viva voz e o segundo ter sempre enviado mensagens escritas.

Individualmente, o discurso mais curto foi o primeiro, de George Washington, em 1790, com um total de 1089 palavras. O mais longo foi feito em 1995, por Bill Clinton (1993-2001), com 9190. Já a comunicação escrita mais comprida foi a de 1981, assinada por Jimmy Carter, totalizando 33.667 palavras.

Entre aqueles que sempre optaram pelo discurso presencial, Bill Clinton foi quem mais falou, com uma média de 7426 palavras em oito discursos — superior à do tribuno Barack Obama (2009-2017) com uma média de 6824 palavras em igual quantidade de alocuções.

Ainda no capítulo das curiosidades, desde 1964, o discurso que mais tempo demorou a ser lido — exatamente 1h 28m 49s — foi o último proferido por Bill Clinton, a 27 de janeiro de 2000. Em muito menos tempo — 47m 49s —, George W. Bush (2001-2009) ‘despachou’ uma das intervenções mais importantes dos últimos anos. A 29 de janeiro de 2002 — três meses após o 11 de Setembro —, traçou o “eixo do mal” (Irão, Iraque e Coreia do Norte) que haveria de orientar a guerra ao terrorismo internacional que se seguiria.

Vencedor das eleições presidenciais em 1932, 1936, 1940 e 1944, Franklin D. Roosevelt foi quem mais vezes se dirigiu presencialmente ao Congresso. Fe-lo por 10 vezes em 12 possíveis: em 1944, adoentado, falou aos microfones desde a Casa Branca e em 1945 dirigiu-se por escrito, três meses antes de morrer. Em contraponto, dois Presidentes nunca fizeram qualquer discurso no Congresso: William Henry Harrison (1841) morreu de pneumonia exatamente um mês após tomar posse como 9º Presidente e James Garfield (1881) foi assassinado seis meses após iniciar funções.

Pouco dado à História e a tradições, Donald Trump já discursou por duas vezes, repetindo, em ambas, uma nuance inédita: “Sr. Presidente [do Congresso], Sr. Vice-presidente, Membros do Congresso, Primeira Dama dos Estados Unidos, meus caros americanos”. Nunca antes, naquele contexto, um Presidente tinha distinguido a mulher.

Esta madrugada, Trump cumprirá a tradição pela terceira vez. Inicialmente previsto para 29 de janeiro último, o discurso foi cancelado por Nancy Pelosi, a democrata que preside ao Congresso, dada a persistência do “shutdown” — o mais longo encerramento parcial do Governo federal de sempre —, provocado por um braço de ferro entre Presidente e Congresso a propósito do financiamento do muro junto à fronteira com o México. O convite foi reendereçado após Trump aceitar reabrir o Governo — só até 15 de fevereiro.

Artigo publicado no Expresso Diário, a 5 de fevereiro de 2019. Pode ser consultado aqui

Trump: Os dois primeiros anos de um Presidente único

Donald Trump está a meio caminho do seu mandato presidencial. Sobressai um temperamento difícil e um estilo de governação turbulento com consequências no país e no mundo

Donald Trump atinge, amanhã, metade do mandato. Cumpre-o num momento de tensão no país, com mais de 800 mil funcionários públicos parados em casa, há quase um mês, sem receber. Assim continuarão enquanto durar o braço de ferro entre o Presidente e a maioria democrata no Congresso, que não dá a Trump os milhões que ele quer para o muro do México.

Esta semana, Trump reagiu ao impasse de forma bizarra. Num jantar na Casa Branca em homenagem aos Clemson Tigers, campeões universitários de futebol americano, banqueteou a equipa com uma mesa coberta de embalagens de hambúrgueres, nuggets de frango, batatas fritas e pizza. Numa cedência à fast food, havia também saladas. “Se é americano, eu gosto. São tudo coisas americanas”, disse. Trump justificou o buffet com a ausência do pessoal da cozinha, vítima do encerramento parcial do Governo (shutdown).

Do evento, uma foto destacou-se. Sozinho, de pé, no topo da mesa, Trump sorri. Num retrato atrás dele, Abraham Lincoln — para muitos o melhor Presidente de sempre — “observa” todo o espetáculo. “Essa foto vai ficar como uma espécie de postal destes primeiros dois anos. Está lá tudo o que é a Casa Branca na era Trump”, comenta ao Expresso Germano Almeida, autor do livro “Isto não é bem um Presidente dos EUA”. O título é deliberadamente provocador: “Não consigo ver, em tudo o que Trump faz, a dignidade da função presidencial”.

Em 24 meses na Casa Branca, Trump cunhou tudo o que disse e fez com traços de personalidade que fazem dele um Presidente único. Como os dez que se seguem.

MENTIROSO
Factos só atrapalham
Trump mente descaradamente. “The Washington Post” fez contas e, nos primeiros nove meses, o político mais influente do mundo mentiu uma média de cinco vezes por dia, num total de “1318 alegações falsas ou enganosas”. Nas sete semanas que antecederam as eleições para o Congresso de 6 de novembro passado, a média disparou para 30 mentiras por dia.
Catapultado por uma narrativa assente em “notícias falsas” e “factos alternativos”, Trump declarou guerra aos media tradicionais rotulando-os “inimigos do povo”. Quebrou a tradição e tem faltado ao jantar anual dos correspondentes na Casa Branca.
Trump diz coisas que gostava que fossem verdade e acredita que podem tornar-se verdade se não parar de as repetir. Numa das mentiras mais persistentes, diz que venceu o voto popular “porque milhões de ilegais votaram em Hillary”. Os factos dizem que teve 63 milhões de votos e Hillary 66.
“Para a sua narrativa, os factos só atrapalham”, diz Germano Almeida. “Usa e abusa dos exageros, da falta de rigor, das falácias e das mentiras objetivas para gerar perceções e provocar emoções — sobretudo, o medo.”

MANIPULADOR
Vale tudo para mobilizar
Entre os poucos ataques terroristas ocorridos nos EUA após o 11 de Setembro, os mais mortíferos não foram realizados por estrangeiros chegados de países muçulmanos, como Trump quis fazer crer quando proibiu a entrada no país a cidadãos de Irão, Iraque, Líbia, Somália, Sudão, Síria e Iémen. “A grande ameaça à segurança dos americanos chama-se posse de armas e tem nos próprios americanos os principais autores dos maiores massacres dos últimos anos.” A medida é pois demagógica. Não impediria os atentados mais graves, “liberta demónios e explora medos primários”, diz o analista. “Trump manipula para manter mobilizada a sua base de apoio. Se perde, declara vitória. Se perde estrondosamente, anuncia um tremendo êxito”, mesmo contra factos.

SUPREMACISTA
Ku Klux Klan dá jeito
A 11 de agosto de 2017, Trump foi posto à prova. Em Charlottesville (Virgínia), uma marcha da extrema-direita saiu à rua, empunhando armas de fogo e gritando slogans racistas. Um protesto de sinal contrário foi ao seu encontro e a violência fez manchetes. Trump manteve-se equidistante, criticando “os dois lados”. Ao não condenar o racismo, foi condescendente em relação ao Ku Klux Klan (KKK).
“No essencial, Trump não é um extremista, mas usa o extremismo por motivos instrumentais. Sem admitir que é racista e que vê a maioria branca (em regressão nos EUA) como o ‘poder dominante’, sustentou toda a sua narrativa de campanha numa América branca, rural, avessa à diversidade, que vê com maus olhos a ascensão das minorias. Não tendo pedido o apoio do KKK, também não o rejeitou.”
Duas semanas após Charlottesville, Trump concedeu o primeiro indulto presidencial. O beneficiário foi um antigo xerife, Joe Arpaio, preso por discriminação racial e violação dos direitos civis dos latinos no Arizona.

EGOCÊNTRICO
Ver o mundo pelo umbigo
A 25 de setembro passado, quando discursou na Assembleia Geral da ONU, Trump pôs o plenário a rir. “Em menos de dois anos, a minha Administração realizou mais do que quase todas as Administrações na história do nosso país.” A gargalhada revelou que o mundo não o leva a sério e que o 45º Presidente chega a ser um embaraço para o país mais poderoso do mundo.
Com Trump, a política americana parece ser um universo paralelo em que mais importante do que a realidade o que conta é a perceção que o Presidente tem dela — um Presidente com tiques ditatoriais e instintos vingativos. O autor recorda outro episódio egocêntrico: “A quem agradeceu Trump no Dia de Ação de Graças? Aos militares em missão? Aos veteranos de guerra? A quem pratica ação social? Nada disso: agradeceu… a si próprio”.

INSTÁVEL
Colaboradores às aranhas
Trump não tem aliados nem inimigos fixos. Tem interlocutores com quem negoceia e, para o empresário, até a política internacional é negociável. Exemplo disso foi a cambalhota na relação com a Coreia do Norte. “Mesmo que da Cimeira de Singapura [12 de junho de 2018] tenha saído uma mão-cheia de nada, foi uma vitória simbólica de Trump”. Nove meses antes, o mundo parecia à beira de uma guerra nuclear, com ele a ameaçar “destruir totalmente” o país de Kim Jong-un.
Trump não tem problema em passar de isolacionista a intervencionista quando lhe convém. Essa instabilidade desnorteia quem o acompanha. “Já perdeu todos os elementos que conferiam alguma credibilidade à sua Administração. Disse que ia mandar retirar do Afeganistão, depois voltou atrás. Disse que ia retirar imediatamente da Síria e agora John Bolton [conselheiro para a segurança] e Mike Pompeo [diretor da CIA] andam no terreno, às aranhas, a tentar explicar que afinal não é bem assim.”

IMPREPARADO
Aversão a briefings
Nos primeiros 100 dias, Trump deu 33 entrevistas, 13 delas à conservadora Fox News, o seu briefing matinal. “Ele não tem paciência para ler papers. Atira números e sentenças que não correspondem à realidade. À custa disso, foi alvo de ira, crítica ou chacota de líderes internacionais.” No mesmo período, publicou 507 tweets — apagou 11. Perante 57 milhões de seguidores, repete até à exaustão que a “América está primeiro” e que a via é o protecionismo comercial e o reforço de fronteiras.
Trump despreza tudo o que é direito e ordem internacional. Retirou os EUA de vários tratados — o de Paris sobre as Alterações Climáticas e o acordo sobre o programa nuclear iraniano originaram mais barulho —, elogiou o ‘Brexit’, desvalorizou a ONU e a NATO e mostrou-se avesso a grandes acordos comerciais. Sobre a Parceria Transpacífico (de onde saiu) disse que revertê-la era “um exercício digno de grandes mestres do xadrez, e nos EUA não temos nenhum”. Ora, os EUA têm mais do que 90 — só a Rússia tem mais.

ILUSTRAÇÃO JOHN KACHIK

INFANTIL
Sem “adultos” por perto
Segundo um estudo da Universidade Carnegie Mellon (Pensilvânia), Trump é o Presidente com vocabulário mais básico. Ao nível da complexidade gramatical, só perde para George W. Bush. Para ele, tudo é “fantastic”, “disaster”, “great”, “bad”. Tem uma visão maniqueísta do mundo e atitudes de bullying perante rivais políticos. São exemplos “Crooked Hillary” (“Hillary desonesta”), “Little Marco” (Marco Rubio não é alto). Do herói de guerra John McCain, disse ser um “falhado” por ter sido capturado no Vietname.
“Está documentado nos livros de Bob Woodward e Michael Wolff e foi referido no artigo de opinião anónimo publicado, em setembro, em “The New York Times” (“I am part of the resistance inside the Trump Administration”): Trump não consegue manter o foco por mais de cinco minutos. Faz birras. Não revela bom senso ou grande empatia. Tem um temperamento irascível. Parece uma criança. O pior é que tendo saído o general James Mattis [ex-secretário da Defesa], já não há adultos na sala para o travar.”

RUDE
Sem sentido de Estado
O Partido Republicano, que deu cobertura política a Trump, é também o partido de Abraham Lincoln, Theodore Roosevelt, Dwight Eisenhower e Ronald Reagan. Mas ao contrário destes, Trump não tem sentido de Estado. Revelou informação secreta, “mandou palpites” no Twitter sobre acontecimentos noutros países e desrespeitou quem fez a História do país.
Na receção a Mauricio Macri, em abril de 2017, tentou convencer o homólogo argentino a não condecorar Jimmy Carter, pela promoção dos direitos humanos durante a ditadura militar. “Uma atitude destas vai totalmente contra a tradição de respeito entre Presidentes, independentemente de ideologias”, recorda Germano Almeida. Bill Clinton amnistiou Richard Nixon. George W. Bush chamou Clinton em alturas dramáticas, como o furacão “Katrina” ou o terramoto no Haiti. Já Trump é obcecado em destruir o legado de Barack Obama.

OBAMAFÓBICO
Obsessão pessoal
É uma certeza de Trump desde o primeiro dia na Casa Branca: a presidência Obama foi “um desastre”, o futuro será “maravilhoso”. A própria cerimónia de tomada de posse, em Washington D.C., foi objeto de disputa com Trump a insistir que foi o evento com mais público de sempre e as fotos a provarem que, em frente ao Capitólio, havia mais gente a aplaudir Obama. “É muito mais do que uma divergência política, é uma obsessão pessoal”, comenta o analista. “O Sistema de Saúde é o melhor exemplo: Trump não é contra a existência de um plano federal. O que quer é deitar abaixo o ObamaCare e fazer um TrumpCare.”

ENTERTAINER
Na política como na TV
Os norte-americanos já tinham eleito um ator de westerns: Ronald Reagan. Trump chegou lá após 15 anos a apresentar um reality show. Com a mesma facilidade com que despedia concorrentes no “The Apprentice”, despediu membros do Governo e da estrutura do Estado. “Trump é uma espécie de artista de variedades que vende a banha da cobra em forma de receita populista sexy pronta a enganar eleitores vulneráveis e mal informados”, conclui Germano Almeida.

Dito tudo isto, nada fez Trump de positivo? “A economia. Os EUA estão com o desemprego mais baixo do último meio século. A tendência começou no final de 2010, no primeiro mandato de Obama, e Trump manteve-a.”

Artigo publicado no “Expresso”, a 19 de janeiro de 2019

O dia em que americanos e sauditas firmaram um acordo para toda a vida

O assassínio do jornalista saudita Jamal Khashoggi abalou a aliança de décadas entre Estados Unidos e Arábia Saudita, mas não ao ponto de a ferir de morte. Petróleo, armamento e inimigos comuns contribuem para a solidez de uma relação especial em que os dois países têm muito a perder um sem o outro

Na vertigem com que rasga tratados internacionais, há um acordo, porém, que Donald Trump não se atreve a questionar. Data de 14 de fevereiro de 1945 e foi celebrado a bordo do USS Murphy, atracado no Grande Lago Amargo, no Egito. A caminho de casa — oriundo da Conferência de Ialta, onde se reuniu com o britânico Winston Churchill e o soviético José Estaline —, o Presidente norte-americano Franklin D. Roosevelt recebeu, no contratorpedeiro, Abdulaziz Ibn Saud, pai de Salman, o atual monarca da Arábia Saudita, e avô de Mohammad bin Salman (MBS), o príncipe herdeiro que hoje surge como o líder ‘de facto’ do país.

Na década anterior a este encontro histórico, tinha sido descoberto petróleo na Arábia Saudita. Em 1945, o reino vivia sobre um autêntico mar de “ouro negro” e empresas americanas controlavam a Arabian Oil Company (Aramco), a petrolífera saudita criada em 1933. Roosevelt e Saud constataram essa realidade e firmaram um acordo para a vida: os sauditas continuariam a produzir petróleo e os norte-americanos jamais deixariam de o comprar. Com o tempo — e sucessivas crises e conflitos no Médio Oriente —, esta aliança passou a incluir uma dimensão militar, que transformou a Arábia Saudita num cliente vip do mercado de armas dos EUA.

Mais de 70 anos depois, a aliança Washington-Riade está posta à prova por força do “caso Khashoggi”. O príncipe herdeiro saudita é suspeito de ter dado pessoalmente a ordem para a execução do jornalista, crítico do regime de Riade, no interior do consulado da Arábia Saudita em Istambul (Turquia). Em Washington, o Congresso e a Casa Branca já defenderam medidas penalizadoras se ficar provado o seu envolvimento no crime.

Esta sexta-feira, MBS e Donald Trump estão na Argentina para participar na cimeira do G20, que termina sábado. Washington já fez saber que não está previsto um “encontro formal” entre os dois líderes, mas quer a História quer palavras recentes do Presidente dos EUA mostram que jamais este caso levará a uma rutura entre os dois países.

Num comunicado publicado no sítio da Casa Branca, a 20 de novembro, Trump defendeu acerrimamente a aliança com os sauditas, recordando os lucros que resultaram da sua visita ao país, em maio de 2017. “O reino concordou em gastar e investir 450 mil milhões de dólares (398 mil milhões de euros) nos Estados Unidos. É uma quantia recorde. Vai criar centenas de milhar de empregos, um desenvolvimento económico tremendo, e muita riqueza adicional para os EUA. Desses 450 mil milhões de dólares, 110 mil milhões de dólares (97 mil milhões de euros) serão gastos na compra de equipamento militar à Boeing, Lockheed Martin, Raytheon e muitas outras grandes empresas americanas da área da Defesa. Se nós estupidamente cancelarmos esses contratos, a Rússia e a China seriam os enormes beneficiários — e ficariam muito felizes em ficar com todo esse novo negócio. Seria, para eles, um presente maravilhoso enviado diretamente dos Estados Unidos!”

Ainda que analistas recordem que as verbas chorudas de que Trump fala não decorram de contratos efetivamente já assinados, as estatísticas dizem que os sauditas são, de longe, o maior comprador de armamento americano. Segundo um relatório do Instituto Internacional de Pesquisas para a Paz de Estocolmo (SIPRI), entre 2013 e 2017, a Arábia Saudita comprou 18% (quase um quinto) de todo o armamento vendido pelos Estados Unidos, que é o maior exportador mundial de armas.

Para Riade, os equipamentos militares americanos são fundamentais à segurança do reino e aos seus esforços de contenção do arquirrival Irão — em alta na Síria, no Iraque, no Líbano e no Iémen. Para Washington, os milhões sauditas injetam saúde na sua indústria de armamento.

A atestar o estatuto especial de que os sauditas beneficiam, o Pentágono tem, a cerca de 20 quilómetros para sudeste de Riade, uma missão de treino militar (USMTM), liderada por um general de duas estrelas, que funciona como canal de comunicação entre os fabricantes de armamento e a hierarquia militar saudita.

A missão está instalada na “Eskan Village”, uma área habitacional construída em 1983 para albergar tribos beduínas, que recusaram mudar para ali. O espaço manteve-se desocupado até agosto de 1990, quando estalou a Guerra do Golfo e as tropas norte-americanas destacadas para participar na Operação Tempestade do Deserto foram ali instaladas, para ajudar a conter os ímpetos do Iraque de Saddam Hussein sobre as jazidas do Kuwait.

Hoje, o país que tanto norte-americanos como sauditas querem conter é o Irão. A 5 de novembro, os EUA repuseram as sanções à indústria petrolífera iraniana que tinham sido suspensas após a assinatura do acordo internacional sobre o programa nuclear do Irão, em maio passado. Com menos petróleo iraniano a jorrar no mercado internacional, a Arábia Saudita é chamada a garantir a sua estabilidade.

A aliança EUA-Arábia Saudita aproxima o país que mais petróleo consome à face da Terra e aquele que mais exporta. Por dia, os norte-americanos importam 800 mil barris de crude dos sauditas, o que corresponde a 5% do total das necessidades norte-americanas. Até um passado recente, os EUA compravam diariamente mais 600 mil barris, para além dos 800 mil. O corte justifica-se com a chamada ‘revolução do xisto’, que levou a um significativo aumento da produção energética norte-americana e à queda do preço do petróleo no mercado internacional. Nada que abalasse a relação.

A interdependência entre EUA e Arábia Saudita estende-se também ao sector financeiro. A Arábia Saudita ocupa o décimo lugar no ranking dos detentores estrangeiros de dívida americana, com 166,8 mil milhões de dólares em obrigações do Tesouro. Em Silicon Valley, “unicórnios” como a Uber ou a Tesla — “unicórnios” são startups tecnológicas avaliadas em mais de mil milhões de dólares — beneficiam, direta ou indiretamente, de investimentos provenientes do Fundo de Investimento Público Saudita.

No discurso de Washington, a Arábia Saudita é também um aliado precioso no combate ao terrorismo. No comunicado de 20 de novembro, em que coloca os EUA incondicionalmente ao lado da Arábia Saudita, Donald Trump inicia a mensagem com um forte ataque ao Irão. “Os iranianos mataram muitos americanos e outros inocentes por todo o Médio Oriente. O Irão declara abertamente , e a plenos pulmões, ‘Morte à América!’ e ‘Morte a Israel!’ O Irão é considerado ‘o principal patrocinador mundial do terrorismo’.”

O outro lado da moeda revela que 15 dos 19 terroristas que sequestraram os quatro aviões que realizaram o 11 de Setembro eram de nacionalidade saudita, como o eram cerca de 140 dos 790 homens que passaram pelos calabouços de Guantánamo — apenas três eram iranianos. No 11 de Setembro, foram mortas 2977 pessoas, a esmagadora maioria cidadãos norte-americanos. A relação Washington-Riade sobreviveu, e continuou especial como sempre.

(IMAGEM Bandeiras dos Estados Unidos e da Arábia Saudita EMBAIXADA E CONSULADOS DOS EUA NA ARÁBIA SAUDITA)

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 30 de novembro de 2018. Pode ser consultado aqui

Bolsonaro não é Trump. É pior?

Elegem a mentira como arma política e valorizam mais a perceção que têm do mundo do que os factos. Donald Trump e Jair Bolsonaro parecem alunos da mesma escola. O Expresso ouviu três estudiosos da governação do norte-americano e confrontou-os com o fenómeno Bolsonaro. Há mais diferenças do que semelhanças, concordam. Mas as frases de ambos são parecidas

Jair Bolsonaro, o lambe-botas de Donald Trump CARLOS LATUFF

Exploração do ódio e de notícias falsas (“fake news”) para fins eleitorais, narrativa anti-media e anti-sistema, discurso intolerante, populista e demagógico. As semelhanças entre Donald Trump e Jair Bolsonaro são óbvias, mas há mais diferenças do que, à primeira vista, se pode pensar.

“Trump é um extremista sonso: insulta, depois diz que não insultou e culpa os media por terem deturpado o que disse de forma inequívoca”, explica Germano Almeida, autor do livro “Isto não é bem um Presidente dos EUA” (Prime Books), que chegará às bancas na segunda semana de novembro. “Bolsonaro é pior: mais gráfico na violência, mais assumido na rejeição do sistema e das regras democráticas, mais demagógico no populismo, ainda mais primário no discurso.”

Recentemente, numa entrevista à BBC Brasil, Steve Bannon, que liderou a campanha de Donald Trump e foi o grande mentor do discurso nacionalista do magnata, não poupou nos adjetivos a Bolsonaro: “líder”, “brilhante”, “sofisticado”. “Muito parecido” com Trump.

Durante meses, no Brasil, especulou-se sobre se Bannon iria integrar a equipa de Bolsonaro. Para esse ruído muito contribuiu um tweet de um dos filhos do ex-militar, após um encontro em Nova Iorque. “Foi um prazer conhecer Steve Bannon, estratega na campanha presidencial de Donald Trump. Tivemos uma ótima conversa e partilhamos a mesma visão do mundo. Ele afirmou-se um entusiasta da campanha de Bolsonaro e ficamos em contacto para unir esforços, especialmente contra o marxismo cultural.”

É o próprio Bolsonaro quem diz ser “uma espécie de discípulo de Donald Trump”, recorda Diana Soller, autora do livro “O método no caos” (Dom Quixote), juntamente com Tiago Moreira de Sá. “Ele é o primeiro a dizer que está a seguir as pisadas de Trump para conquistar a presidência do Brasil. Diz, inclusive, que está disposto a mudar profundamente a política externa brasileira no sentido de uma aliança com os Estados Unidos.”

Aproveitando momentos de fragilidade social nos respetivos países, Trump e Bolsonaro, dois estranhos à política — o segundo um deputado federal desde 1991 sem trabalho digno de nota —, lançaram-se numa escalada do poder, “dizendo aos respetivos povos que vão fazer as mudanças por que eles verdadeiramente anseiam”, diz Diana Soller. “No fundo, dizem às pessoas aquilo que elas querem ouvir”, independentemente da honestidade com que o fazem.

“Trump pintou os EUA muito piores do que, na realidade, eles são. A América não precisa de ser ‘grande outra vez’ porque nunca deixou de o ser. Bolsonaro só precisou de surfar a onda do medo e da raiva, porque, na verdade, a coisa no Brasil ‘está mesmo preta’”, acrescenta Germano Almeida. “Trump assusta porque é Presidente da maior potência do mundo. Mas o sucesso de Bolsonaro é ainda mais assustador e difícil de compreender.”

Eduardo Paz Ferreira, autor do livro “Os anos Trump — O mundo em transe” (Gradiva), recentemente editado, não se alarga nas parecenças entre o chefe de Estado norte-americano e o candidato da extrema-direita brasileira. “Muitas táticas eleitorais, das ‘fake news’ à manipulação das redes sociais, foram comuns, mas eu não levaria muito mais longe as semelhanças.”

E explica porquê: “O Brasil [uma democracia desde 1985] é um país castigado pela mais profunda miséria, onde os coronéis foram sempre o rosto da democracia ou então os generais nos tempos da ditadura. Nos Estados Unidos [uma democracia desde a Declaração da Independência, em 1776] há uma tradição democrática, que passa por um período especialmente mau, mas que é difícil admitir que possa ser totalmente extinta.”

A consolidação dos valores democráticos num e noutro país pesam no perfil dos dois líderes. “Trump, apesar de ser um conservador de uma espécie populista muito diferente que responde a um eleitorado que costumava ter pouca expressão, não deixa de ser um democrata”, constata Diana Soller. “Bolsonaro, por várias vezes, disse sentir uma grande nostalgia da ditadura militar. Tendo em conta a tradição da América Latina, não será surpreendente se Bolsonaro tentar transformar as instituições brasileiras de forma a ter cada vez mais poder. E isto Trump não tem tentado fazer.”

“A vida dos ditadores está muito facilitada”, conclui Eduardo Paz Ferreira. “Veja-se o exemplo de Rodrigo Duterte, nas Filipinas, e outros amigos do Presidente norte-americano”. O mais recente deles é o norte-coreano Kim Jong-un. Poderá Jair Bolsonaro ser o próximo?

Este domingo, Diogo Freitas do Amaral – fundador do CDS – classificou Jair Bolsonaro com “fascista”, numa entrevista ao Diário de Notícias e à TSF, depois de questionado sobre o que está a passar no Brasil. “Acho que é altura sem excessivo alarmismo, sem excessiva precipitação, de começar a chamar os bois pelos nomes: isto é fascismo. Não lhe chamem populismo, que até pode parecer uma coisa simpática. É extremismo, sim. Extremismo de direita, sim. Logo, é fascismo. São autoritários, elogiam a violência, condenam os direitos das mulheres…” E alertou para os três fatores que podem contribuir para o regresso das ditaduras: debilidade dos governos democráticos, crise económica e medo do comunismo.

“Tive uma conversa muito boa com o novo Presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, que ganhou a sua corrida com uma margem substancial. Concordamos que o Brasil e os Estados Unidos trabalharão proximamente juntos nas áreas do Comércio, Militar e todo o mais! Telefonema excelente, desejei-lhe parabéns!”

O QUE ELES DISSERAM DE…

Apesar das diferenças apontadas pelos especialistas, há frases dos dois candidatos que os aproximam nas opiniões e nas atitudes.

MULHERES

Trump — “Agarra-las pela vagina”, disse quando lhe perguntaram como gosta de lidar com mulheres bonitas.

Bolsonaro — “Não vou estuprar você porque você não merece”, afirmou na Câmara dos Deputados à ex-ministra Maria do Rosário.

IMIGRANTES

Trump — “Por que todas essas pessoas desses países merdosos vêm parar aqui?”

Bolsonaro — “A escória do mundo tá chegando aqui no nosso Brasil como se nós já não tivéssemos problemas demais para resolver.”

ARMAS

Trump — “Não quero armar todos os professores. Quem nunca pegou numa arma não o vai fazer. Podem ser 10 ou 20%.”

Bolsonaro — “Todo o vagabundo tá armado! Só falta o cidadão de bem!”

IMPRENSA

Trump  “Vocês são fake news!”, dirigindo-se a um repórter da CNN.

Bolsonaro  “A Folha de S. Paulo é o maior fake news do Brasil. Vocês não terão mais verba publicitária do Governo.”

Artigo publicado no Expresso Online, a 28 de outubro de 2018. Pode ser consultado aqui

Cortar com a Rússia para amarrar a China

Donald Trump denunciou mais um tratado, este sobre armas nucleares assinado com a União Soviética. O Presidente dos EUA está aberto à renegociação, mas quer a China dentro

Donald Trump e Vladimir Putin têm encontro marcado a 11 de novembro, em Paris. À margem das comemorações do 100º aniversário do fim da I Guerra Mundial, os Presidentes dos EUA e da Rússia irão abordar a última rutura decidida pelo primeiro, que alvejou o segundo como um míssil teleguiado: o rasgar do Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermédio (INF, sigla inglesa), assinado por Ronald Reagan (EUA) e Mikhail Gorbatchov (URSS) na reta final da Guerra Fria.

“Não estou certa de que seja uma rutura. Trump quer negociar com a Rússia um novo acordo. Não devemos ver este rasgar de tratado como um fim em si, mas o princípio de outra coisa”, comenta ao Expresso a investigadora Diana Soller, do Instituto Português de Relações Internacionais. “O Tratado é muito menos abrangente do que possamos pensar, só contempla armas nucleares de alcance intermédio. Mas Trump conseguiu o que queria: dar um passo simbólico relativamente à Rússia numa tentativa de desfazer tratados que considera nocivos para os EUA.”

A desconfiança de Washington em relação ao incumprimento por parte de Moscovo não resulta de descobertas recentes. Em fevereiro, o documento “Nuclear Posture Review”, do Departamento de Defesa, já alertava para a “decisão da Rússia de violar o Tratado INF”, através da “produção, posse e teste de um míssil de cruzeiro lançado do solo” (ver infografia). Trump explodiu agora. Porquê?

Ameaças e incentivos

“Trump quer um novo tratado não só com a Rússia, mas que inclua a China”, que considera ser o principal rival dos EUA, descodifica Soller. Por um lado, o americano quer conter a Rússia do ponto de vista nuclear, por outro considera que não faz sentido, no sistema internacional de hoje, ter um tratado a dois quando o futuro é a três: EUA, Rússia e China são os atores do futuro.

Pequim reagiu através de Hua Chunying, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que defendeu que a retirada americana do INF “terá um efeito multilateral negativo”. Caberá a Trump “atrair a China com ameaças e incentivos”, diz a investigadora, para que Pequim saiba o que esperar se decidir ficar fora ou alinhar num novo tratado.

“As suspeitas levantadas por Trump sobre um alegado desrespeito de Moscovo não serão totalmente infundadas, mas o modo como o anúncio foi feito foi tudo menos tranquilizador”, diz ao Expresso o analista de política americana Germano Almeida. “Gorbatchov chamou-lhe ‘um erro que revela falta de sabedoria’. Mas depois do modo submisso e, para muitos, humilhante como Trump se apresentou ao lado de Putin em Helsínquia, esta demarcação terá sido estratégica.”

A 16 de julho, na capital finlandesa, a cimeira entre ambos causou desconforto nos EUA por Trump ter posto em causa a competência dos seus próprios serviços secretos na investigação à interferência russa nas eleições de 2016. Mas se dali Trump saiu diminuído, em Paris será ele a bater as cartas.

INFOGRAFIA DE JAIME FIGUEIREDO

TRUMP E A ARTE DE RASGAR TRATADOS

Para o 45º Presidente, os Estados Unidos andam a ser enganados há décadas. Acordos que não beneficiem o país são para romper

Donald Trump não vai a meio do mandato e já atirou para o lixo cinco tratados internacionais. “Ele não se revê na ordem liberal que promove grandes acordos e se funda em organizações multinacionais como a ONU e a NATO”, diz o analista Germano Almeida. “Vê as relações internacionais como um jogo de soma zero em que para os EUA saírem a ganhar outros têm de ficar a perder.”

O mote foi dado logo ao terceiro dia de presidência, 23 de janeiro de 2017, quando os EUA saíram da Parceria Transpacífica. O projeto seguiu sem os americanos, mas com 11 países a bordo. “Em vez de colocar os EUA como jogador crucial na região, abriu via verde para acelerar o crescimento da China”, comenta Almeida. “Trump teve vistas muito curtas”, complementa a investigadora Diana Soller. “Este era também um tratado de segurança que isolava a China.”

Mentalidade nova e coerente

Outro acordo rompido este ano foi o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio, da era Bill Clinton. México e Canadá aceitaram uma nova versão, nascendo uma espécie de NAFTA 2.0. “Terá sido a jogada mais bem conseguida de Trump dentro do seu ‘mantra’ de que é preciso renegociar os ‘maus acordos’ feitos pelos antecessores democratas Obama e Clinton”, diz Almeida.

Obcecado por destruir o legado de Obama, Trump reverteu duas grandes conquistas do 44º Presidente. A 1 de julho de 2017, saiu do Acordo de Paris relativo às alterações climática. “Terá sido o gesto mais perturbador e potencialmente danoso para o prestígio da América no mundo”, diz o analista. A 8 de maio deste ano, retirou os EUA do acordo sobre o programa nuclear do Irão. “Foi o ato mais definidor desta Administração. A partir de agora, como acreditar naquilo em que os governos americanos assinam?”

Compreender Trump implica aceitar que na Casa Branca há hoje uma mentalidade assente em duas coerências. Soller descreve-as: “Uma: qualquer acordo que não esteja a beneficiar os EUA está sujeito a ser rasgado. Outra: a unidade mais importante da política internacional voltou a ser o Estado e não as organizações ou o multilateralismo”.

(Foto: Mikhail Gorbachov (à esquerda) e Ronald Reagan, chefes de Estado da União Soviética e dos Estados Unidos, assinam o Tratado INF, a 8 de dezembro de 1987, na East Room da Casa Branca, em Washington D.C. WHITE HOUSE PHOTO OFFICE)

Artigo publicado no Expresso, a 27 de outubro de 2018 e republicado parcialmente no “Expresso Online” no mesmo dia. Pode ser consultado aqui