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Finlandeses apostam na continuidade, e na amizade com a Rússia

Sauli Niinistö foi reeleito à primeira volta das eleições presidenciais com 62.7% dos votos. Próximo de Vladimir Putin, defende que uma eventual adesão da Finlândia à NATO deve ser objeto de referendo

Os finlandeses resolveram o assunto à primeira e, no domingo, reelegerem Sauli Niinistö para um segundo mandato presidencial de seis anos. Uma vitória sem contestação já que Niinistö, de 69 anos — antigo líder do Partido da Coligação Nacional (centro-direita) —, obteve uns esmagadores 62,7% dos votos, deixando o segundo candidato mais votado, Pekka Haavisto, 59 anos, da Aliança Verde (centro-esquerda), a mais de 50%, com 12,4%.

“Estou muito surpreendido com este tipo de apoio. Terei de pensar bem em como ser merecedor dele”, afirmou o Presidente reeleito. “Não tenho intenções de fazer mudanças apenas por fazer. Continuaremos a seguir de perto o que se passa fora da Finlândia, globalmente, e se necessário então reagiremos certamente.”

Para a agência Reuters, o segredo da vitória de Niinistö, a quem se atribui uma boa relação com o homólogo russo, Vladimir Putin, foi o facto de “o seu delicado equilíbrio de laços com a vizinha Rússia e com a aliança militar NATO liderada pelos EUA ter soado bem aos eleitores”.

A Finlândia é membro da União Europeia desde 1995, mas sempre optou por se manter à margem da Aliança Atlântica para não hostilizar a Rússia, com quem partilha uma fronteira de 1340 quilómetros e um passado histórico difícil — durante a II Guerra Mundial, a União Soviética invadiu e ocupou o país, por exemplo.

Em fevereiro de 2017, uma sondagem da rádio e televisão finlandesa Yle revelava que apenas 21% dos cidadãos apoiava a adesão à NATO, enquanto 51% opunha-se. Dos sete candidatos das presidenciais de domingo, apenas um, o eurodeputado Nils Torvalds, 72 anos, do Partido Popular Sueco da Finlândia (centro), defendeu a entrada do país na NATO.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 29 de janeiro de 2018. Pode ser consultado aqui

Finlândia aberta aos imigrantes

Mais de uma hora antes da partida do ferry para a capital da Estónia, Tallin, já a rua de acesso ao posto alfandegário na marina de Helsínquia tem uma fila de carros parados, todos de matrícula finlandesa, à espera de embarcar. «Vão às compras, lá é tudo mais barato», diz um jovem funcionário do terminal de mercadorias. Não é necessário visto para viajar entre a Finlândia e a Estónia, e Tallin está apenas a 70 quilómetros de Helsínquia, sendo o golfo da Finlândia percorrido, diariamente. por dezenas de navios.

A menos de quinze meses do alargamento da União Europeia a leste, há quem tente dramatizar dizendo que a Finlândia, um país de fraca imigração, irá, inevitavelmente, ser invadida por milhares de imigrantes oriundos do outro lado do Báltico, mas os finlandeses não parecem preocupados: «Também se dizia isso dos portugueses, espanhóis e gregos, quando entrámos para a UE, que seríamos invadidos por imigrantes. Onde é que eles estão?», questiona em entrevista ao EXPRESSO a Presidente da Finlândia, Tarja Halonen.

É inegável que o país — onde o salário médio ronda os dois mil euros — constitui uma tentação. Porém, há quem pense que a elevada carga fiscal — quase 50% do produto interno bruto — é suficientemente inibidora para abortar à nascença qualquer movimento migratório dos países do Báltico: «Eles teriam de pagar impostos tão altos que acabariam por achar que não compensa», afirma um taxista em serviço perto da marina de Helsínquia.

A Presidente finlandesa não acredita que «haja imigração em massa». O secretário de Estado para os Assuntos Europeus, Alec Aalto, não discorda: «Quando os salários aumentarem na Estónia com a entrada na UE, haverá menos probabilidade de virem imigrantes para a Finlãndia». E se vierem, tal não constituirá um drama: «Nos próximos anos, vamos precisar de mão-de-obra estrangeira, porque a população está a envelhecer. E já hoje precisamos de mais estrangeiros do que os que temos…»

Os finlandeses não parecem recear o alargamento a leste. Pelo contrário, preferem salientar os benefícios, designadamente as excelentes oportunidades de investimento que os países bálticos oferecem. Neste contexto, a relação com a Rússia — com quem a Finlândia partilha mais de 1300 quilómetros de fronteira — assume um papel vital. «As relações são melhores do que nunca, não temos qualquer disputa territorial em aberto, temos poucos problemas políticos e a Rússia não é mais uma ameaça militar», afirma Ari Heikkinen, chefe da Unidade para a Rússia do Ministério dos Negócios Estrangeiros. «Temos ameaças vindas da Rússia a que chamamos leves ameaças à segurança’ — os problemas ambientais e as doenças transmissíveis» — designadamente uma epidemia de sida em S. Petersburgo, cidade muito visitada pelos finlandeses — «e o tráfico de heroína», acrescenta. Por outro lado, o mercado russo está praticamente por desbravar: «A Nokia vende tantos telemóveis na China durante um dia como na Rússia num ano inteiro».

Sete anos após a adesão à UE, a Finlândia convive pacificamente com esse facto: «A UE trouxe-nos segurança económica e no combate ao crime organizado. Cuidar do bem-estar dos nossas cidadãos é mais fácil dentro da União», sublinha Alec Aalto. É, pois, esta Finlândia economicamente confiante e politicamente descomplexada que aguarda o Presidente português, Jorge Sampaio, que na próxima quarta-feira inicia uma visita oficial de três dias — a primeira de um chefe de Estado português ao país dos mil lagos.

Artigo publicado no “Expresso”, a 5 de outubro de 2002