Arquivo de etiquetas: Portugal

Um hospital com visão para reduzir a cegueira na Palestina

Fundação Champalimaud premeia centro oftalmológico mais antigo do Médio Oriente. Mais de metade do orçamento da instituição vem de donativos

Na sempre agitada região do Médio Oriente, o Hospital Oftalmológico São João de Jerusalém é, há décadas, um exemplo de resiliência. Com mais de 140 anos — vividos entre guerras, sublevações, disputas locais e o domínio de poderes externos —, esta unidade médica de Jerusalém Oriental apenas não funcionou entre 1914 e 1919. A Palestina era então uma região do Império Otomano, o qual, após entrar na Grande Guerra, transformou o hospital num depósito de munições.

A resistência às adversidades e como, em paralelo, se consolidou como um centro de referência ao nível do combate à cegueira numa região marcada pelo conflito valeu ao St. John of Jerusalem Eye Hospital (na designação internacional) a atribuição, esta semana, do Prémio António Champalimaud de Visão, no valor de um milhão de euros.

“Este generoso prémio chega no momento perfeito”, diz ao Expresso o CEO do hospital, Ahmad Ma’ali. “Somos a única instituição de beneficência prestadora de cuidados oftalmológicos a quem vive
na Terra Santa e dependemos de contribuições voluntárias, que re
presentam 55% a 60% do nosso orçamento operacional”, que supera
os 15 milhões de euros. “Dentro de seis a oito meses esperamos ter um hospital a funcionar no Norte da Cisjordânia”, ocupada por Israel.

Casamentos entre primos

Um estudo do St. John apurou que a taxa de cegueira e de deficiência visual entre os palestinianos é 10 vezes superior à verificada no Ocidente. “Há muitas razões. Decorre da falta de acesso a cuidados”, resultante de barreiras físicas e restrições à mobilidade. “Tem a ver também com pobreza e falta de conhecimento”, continua. “Outra causa são os casamentos entre primos em primeiro grau, que ocorrem em 38%-40% da população. Os filhos nascem geralmente com cataratas, glaucoma e outras doenças hereditárias.”

O hospital procurou dar resposta ao problema da consanguinidade e
dotou-se de um “laboratório de genética”, onde, a partir de uma análise ao sangue do paciente, determina a probabilidade de os filhos terem a doença. “Se informarmos as pessoas sobre a probabilidade de os seus filhos terem cegueira ou outras doenças, elas decidem com base na informação.”

Fundado em 1882, o St. John foi o primeiro hospital oftalmológico no Médio Oriente. “Devido à instabilidade política que dura há muitos anos, decidimos que, se as pessoas não conseguem vir até nós, temos de conseguir chegar a elas. Nesse sentido, estabelecemo-nos como um grupo de hospitais”, explica.

Além do hospital-mãe, em Jerusalém, o St. John tem antenas na
Faixa de Gaza (território palestiniano sob bloqueio) e em Hebron
(no Sul da Cisjordânia). Para precaver previsíveis longas esperas dos
pacientes nos postos de controlo (checkpoints), o hospital dispõe de
três unidades móveis que se deslocam para aldeias remotas e áreas
controladas por Israel.

Todos os centros têm desafios específicos. Situado na parte árabe
da cidade (ocupada por Israel em 1967, posteriormente anexada e reivindicada pelos palestinianos para capital do seu Estado), o hospital de Jerusalém está no olho do furacão, integrado no bairro de Sheikh Jarrah, palco com frequência de violência entre árabes e judeus.

Já na Faixa de Gaza, controlada pelo grupo islamita Hamas, o trabalho é mais complexo. Tudo o que entra no território é inspecionado por Israel, por receio de que possa ter dupla utilização e cair em mãos erradas. “Quando ali construímos o hospital, em 2016, tivemos de trabalhar em grande proximidade com as autoridades militares israelitas, porque tudo podia ter duplo uso. O cimento, por exemplo, podia servir para construir túneis”, usados de forma clandestina para infltrar no território produtos que não passariam na fronteira. “As inspeções originam atrasos. Mandar algo para Gaza pode demorar um mês a chegar. Temos muito cuidado em garantir que há stock suficiente em Gaza.”

Entre os cerca de 260 profissionais do St. John, há muçulmanos,
judeus e cristãos. Os pacientes judeus são ínfimos, “uma vez que eles
têm um serviço avançado e gratuito do lado israelita. Mas estamos abertos a toda a gente”. Ma’ali realça a “excelente colaboração com hospitais de Israel”, nomeadamente o prestigiado Hadassah, em Jerusalém Oriental. “Somos um local de formação para ortoptistas judeus enviados pelo Hadassah.”

Quem não paga nada perde

Mandado erguer pela rainha Vitória de Inglaterra, o St. John pertence à Ordem de São João e é “profundamente enraizado nos ensinamentos cristãos”, diz Ma’ali. “A missão é tratar toda a gente, independentemente de raça, religião, classe social ou posses para pagar.”

“Só 40%-45% dos palestinianos têm seguro de saúde. Quando nos são encaminhados, têm cobertura do Ministério da Saúde da AP. Após voltarem a casa, o hospital espera quatro ou cinco anos para ser reem bolsado”, segundo Ma’ali. “Neste momento, a AP deve-nos 3,5 milhões de dólares [3,2 milhões de euros].” Anualmente, a União Europeia desembolsa 13 milhões de euros para abater à dívida da AP aos hospitais de Jerusalém.

No St. John desde 1990, onde entrou como estudante de enfermagem, e CEO desde 2019, Ma’ali diz-se apreensivo com a degradação da segurança na Cisjordânia, onde vive. Para chegar ao trabalho tem
de passar um checkpoint. “Como qualquer CEO, tenho de pensar
de onde virá o próximo dólar, mas a minha grande preocupação é o
acesso de funcionários e doentes ao hospital de Jerusalém.”

DIMENSÃO DO PROBLEMA

10
vezes mais casos de cegueira e deficiência visual são registados
nos territórios palestinianos, por comparação aos países ocidentais

142
mil pessoas foram tratadas no Hospital Oftalmológico São João
de Jerusalém em 2022. Foram também realizadas 6900 cirurgias

80
por cento dos problemas oftalmológicos diagnosticados na
população palestiniana são curáveis, garante o hospital

(FOTO Ahmad Ma’ali, CEO do Hospital Oftalmológico São João de Jerusalém, fotografado na Fundação Champalimaud NUNO BOTELHO)

RELACIONADO: Prémio Champalimaud recompensa hospital empenhado no “combate à cegueira na Palestina”

Artigo publicado no “Expresso”, a 8 de setembro de 2023

Prémio Champalimaud recompensa hospital empenhado no “combate à cegueira na Palestina”

Com mais de 140 anos de vida e trabalho de qualidade na área da oftalmologia, o Hospital Oftalmológico São João de Jerusalém recebe, esta quarta-feira, o prémio anual atribuído pela Fundação Champalimaud. Em entrevista ao Expresso, um responsável do hospital explica por que razão este prémio, no valor de um milhão de euros, chega no momento certo. E também porque nos territórios palestinianos há dez vezes mais casos de cegueira e de deficiência visual do que em qualquer país europeu

O Prémio António Champalimaud de Visão, que anualmente reconhece trabalho desenvolvido na área da prevenção da cegueira, distinguiu, este ano, um projeto de excelência e de grande resiliência atendendo ao nível de conflitualidade na região em que se insere.

O galardoado é o Hospital Oftalmológico São João de Jerusalém (St. John of Jerusalem Eye Hospital, na designação internacional), localizado no bairro de Sheikh Jarrah, em Jerusalém Oriental. Esta é a parte árabe da cidade histórica anexada por Israel e onde, com frequência, irrompem atos de violência entre árabes e judeus.

A Fundação Champalimaud justificou o reconhecimento — e a atribuição de um prémio no valor de um milhão de euros — “pelo empenho na prestação de cuidados oftalmológicos essenciais numa região marcada pelo conflito”, e em especial “pelo combate à cegueira na Palestina”.

“Este generoso prémio chega num excelente momento. Fortalecerá a nossa determinação em estendermos os nossos braços amigos a mais pessoas marginalizadas que necessitam de cuidados oftalmológicos nesta parte tão problemática do mundo”, reagiu Ahmad Ma’ali, CEO do St. John, em entrevista ao Expresso.

“O nosso hospital é a única instituição de beneficência prestadora de cuidados oftalmológicos para as pessoas que vivem na Terra Santa, e dependemos muito de receitas voluntárias que representam 55% a 60% do nosso orçamento operacional”, que supera os 15 milhões de euros, diz o responsável. E anuncia: “Estamos prestes a lançar outro projeto, na parte norte da Cisjordânia [território palestiniano ocupado por Israel]. Nos próximos seis a oito meses, esperamos ter um hospital em funcionamento nessa região que forneça cuidados oftalmológicos de qualidade a quem aí vive. Por isso, o momento deste prémio é perfeito.”

As causas de um grande problema

Nos territórios palestinianos, os casos de cegueira e deficiência visual são cerca de dez vezes mais do que os registados em qualquer país europeu. “Há muitas razões para isso. Por vezes, decorre da falta de acesso a cuidados, outras têm que ver com pobreza e falta de conhecimento”, explica o responsável palestiniano.

Outras causas possíveis são “consanguinidade ou casamentos entre primos de primeiro grau, que ocorrem em cerca de 38-40% da população. Os filhos nascem geralmente com catarata, glaucoma e outras doenças hereditárias.” Tal decorrerá de questões sociais e culturais, mas também dos enormes desafios à mobilidade que enfrentam quem vive nos dois territórios palestinianos (Cisjordânia e Faixa de Gaza).

Unidades móveis para chegar a quem não se pode deslocar

Além do hospital-mãe em Jerusalém, o St. John tem instalações em Gaza (território sob bloqueio) e Hebron (no sul da Cisjordânia). Numa região onde ir à urgência de um hospital ou a uma normal consulta médica pode implicar longas esperas em postos de controlo, este hospital dispõe de equipas móveis que se deslocam para a área C — zonas da Cisjordânia controladas a 100% por Israel — e para aldeias remotas ou isoladas.

“Temos mais de 140 anos, fomos o primeiro hospital oftalmológico a estabelecer-se em todo o Médio Oriente. Devido à instabilidade, à insegurança política que atravessamos há muitos anos, decidimos que se as pessoas não conseguem chegar até nós, precisamos de chegar às pessoas. E por isso, tornámo-nos um grupo de hospitais. Com esta estratégia, quem precisar de nós poderá alcançar-nos.”

Ahmad Ma’ali
CEO do St. John of Jerusalem Eye Hospital

Em 2022, o St. John tratou quase 143 mil pacientes e realizou cirurgias em mais de 6900. “Fomos credenciados como hospital de qualidade pela Joint Commission International”, um organismo de acreditação de unidades de saúde, com sede nos Estados Unidos.

“Portanto, não se trata apenas da quantidade, mas também da qualidade do atendimento. De muitas formas, o hospital lidera ao nível da formação oftalmológica de médicos e enfermeiros, além de liderar na prestação de cuidados oftalmológicos”, realça Ma’ali.

Excelente colaboração com hospitais de Israel

Entre os cerca de 260 profissionais do hospital, há pessoal de todas as origens sociais e religiosas. A esmagadora maioria dos pacientes é árabe muçulmana, mas as portas estão abertas a cristãos e judeus.

“Temos muito poucos pacientes judeus, uma vez que eles têm um serviço avançado e gratuito do lado israelita. Mas estamos abertos a toda a gente, mesmo colonos e soldados que procurem cuidados médicos à nossa porta”, garante Ahmad Ma’ali, que trabalha no hospital há 30 anos. “Somos também um local de formação para ortoptistas judeus, que nos são enviados pelo Hadassah [hospital universitário israelita de referência, também em Jerusalém Oriental]. Temos uma excelente colaboração com hospitais de Israel.”

Um desejo da rainha Vitória de Inglaterra

Criado em 1882, por determinação da rainha Vitória de Inglaterra, o St. John, que pertence à Ordem de São João, é um hospital “profundamente enraizado nos ensinamentos cristãos. O próprio nome é um indicador disso”, diz o CEO da instituição. “A nossa missão é tratar a todos, independentemente da raça, religião, classe social ou capacidade para pagar” os cuidados médicos ou tratamentos.

“Ficamos felizes em fazer parcerias com quem quer que seja — judeus, muçulmanos, cristãos — que compartilhe o mesmo espírito. Atravessamos fronteiras, deixamos a política para os políticos e concentramo-nos na vertente humanitária do nosso trabalho”, prossegue o CEO do hospital.

O Prémio António Champalimaud de Visão é entregue esta quarta-feira, numa cerimónia realizada na Fundação Champalimaud, com a presença do Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa. Esta ligação disponibiliza a lista de vencedores das edições passadas, bem como a composição do júri.

(FOTO Ahmad Ma’ali, CEO do Hospital Olftalmológico São João de Jerusalém, fotografado na Fundação Champalimaud NUNO BOTELHO)

RELACIONADO: Um hospital com visão para reduzir a cegueira na Palestina

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 6 de setembro de 2023. Pode ser consultado aqui

Os talibãs não as deixam estudar, mas elas não se dão por vencidas: 50 afegãs vão frequentar universidades portuguesas

O regresso dos talibãs ao poder encurralou as afegãs em casa. Para as estudantes universitárias, em especial, as perspetivas de futuro caíram por terra, mas para 50 delas o sonho continuará em Portugal, onde têm garantidas bolsas de estudo para frequentar instituições do ensino superior. Nas 1424 candidaturas recebidas, “todas as raparigas usaram a expressão ‘poder continuar aquilo que eu estava a fazer’”, diz ao Expresso Ana Santos Pinto, responsável da Nexus 3.0, a organização não governamental que está na origem do projeto

FOTO Escola pública feminina, na província de Bamyan, no Afeganistão FLICKR CANADA IN AFGHANISTAN

A 15 de agosto de 2021, a retirada em contrarrelógio das tropas internacionais do Afeganistão e, em simultâneo, a avançada sem resistência dos talibãs sobre Cabul constituíram um enorme embaraço para quem acreditava que 20 anos de presença estrangeira no país tinham tornado a influência dos talibãs residual.

Nimroz, no sudoeste, foi a primeira província a cair, nove dias antes de as forças do Emirado Islâmico entrarem na capital. Nove dias depois, mais 32 regiões ficaram totalmente sob controlo talibã. Apenas a província do Panjshir, no nordeste, resistiu durante uns tempos.

Com igual rapidez, a autoridade dos talibãs impôs-se a todo o território, com o sector da educação a servir de montra do novo Afeganistão. Quatro dias após controlarem os edifícios governamentais em Cabul, as escolas secundárias reabriram para um novo ano letivo, mas apenas com professores e estudantes do sexo masculino.

A generalização da interdição do ensino às mulheres seria questão de tempo. A 20 de dezembro de 2022, foi proibido o acesso às universidades. Apenas as escolas primárias continuaram a ter estudantes do sexo feminino, uma cedência controversa num país tribal e conservador como é o Afeganistão.

Em junho passado, quase 80 meninas foram hospitalizadas na sequência de casos de envenenamento em duas escolas primárias do norte do país. Em causa estão raparigas nascidas já este século sem conhecimento nem memória do que é viver sob domínio talibã e andar invisível debaixo de uma burca.

Para muitas delas, agora sem direito a educação formal, resta correr riscos e procurar conhecimento em centros de aprendizagem clandestinos — ou então sair do país.

1424 candidaturas para vir para Portugal

É o que acontecerá a 50 universitárias afegãs que prosseguirão com os estudos em Portugal, ao abrigo de um programa que lhes garante uma bolsa com duração até três anos. “Recebemos 1424 candidaturas. Cada manifestação de interesse não é um número, é uma história, uma vida que está em causa”, explica ao Expresso Ana Santos Pinto, secretária-geral da Nexus 3.0, a organização não governamental (ONG) na origem do programa.

“A vida destas raparigas não parou, está fechada dentro de casa. Algumas delas continuam a ler e a procurar conhecimento, dentro dos limites que a casa e o regime lhes impõe. Isso é uma demonstração de resiliência e de esperança de que podem ter um futuro”, explica Santos Pinto.

Um primeiro grupo de 25 afegãs chegará a tempo de frequentar o ano letivo 2023/24. As restantes virão no próximo. “Bem sei que 25 é um número limitado, mas é aquilo que sabemos que conseguimos fazer com eficácia”, garante a responsável.

Todas as raparigas frequentavam universidades quando os talibãs as encurralaram dentro de casa. Em Portugal, tirarão o curso que escolherem, dentro das vagas disponibilizadas pelas instituições de ensino superior aderentes.

Duas rondas de entrevistas

“Elas candidatam-se àquilo que querem de acordo com uma listagem”, explica a fundadora da Nexus 3.0, realçando a recetividade “muito positiva” de universidades e politécnicos.

“Consoante as vagas que cada instituição disponibilizar, serão feitas duas rondas de entrevistas: uma mais pessoal, do ponto de vista da candidata, do seu percurso, das condições que dispõe e daquilo que já fez; e depois a própria instituição terá os seus critérios, do ponto de vista de exames e de provas de conhecimento.”

Desse trabalho cruzado entre as disponibilidades da academia portuguesa e os interesses pessoais das afegãs resultará a escolha dos 50 nomes. Selecionadas as estudantes, seguir-se-á uma etapa sensível.

Neste momento, a esmagadora maioria das candidatas está no Afeganistão. Outras já foram forçadas a sair do país e estão em países vizinhos, como o Paquistão e o Irão, “muito poucas ainda com o estatuto de proteção internacional”, diz a professora universitária.

As que estão no país terão de arranjar forma segura para atravessar a fronteira. “O primado é, naturalmente, a segurança destas raparigas. Temos de o fazer de uma forma o mais discreta possível, porque não se trata só da segurança delas, mas de toda a sua família”, que fica para trás.

“Estas raparigas nasceram após 2001”, o ano do 11 de Setembro, da subsequente invasão militar do Afeganistão e da deposição do primeiro governo talibã, punido por ter dado guarida à Al-Qaeda de Osama bin Laden.

“O que elas conhecem do país é um processo de presença internacional, dentro do qual houve uma abertura à educação, ao desenvolvimento de capacidades, uma esperança de construção de um futuro. E, subitamente, todo o planeamento de vida, tudo aquilo que imaginaram deixou de ser possível. As expectativas destas raparigas deixaram de poder ser concretizadas neste contexto”, diz Ana Santos Pinto.

“Os últimos 20 anos criaram uma noção de possibilidades diferentes daquela que existia há 40. Nas candidaturas, todas elas usaram a expressão ‘poder continuar aquilo que eu estava a fazer”, prossegue. Segundo a UNESCO, se em 2001 cerca de 5000 afegãs frequentavam o ensino superior, em 2021 esse número era de 100 mil.

CRONOLOGIA DE UM DESASTRE HUMANO

  • 19.09.2021 — Escolas secundárias reabrem só com professores e alunos do sexo masculino. Escolas femininas ficam encerradas indefinidamente.
  • 20.12.2022 — Mulheres são proibidas de frequentar as universidades.
  • 06.06.2023 — Talibãs dão 40 dias às ONG internacionais para transferirem as suas operações relativas à educação para organizações locais.

Este programa da Nexus 3.0 — organização fundada em 2022, por três mulheres, focada na promoção da educação, ciência, artes e cultura em contextos de fragilidade, violência e conflito — é também uma resposta a duas posições recentes da Assembleia da República.

  1. A 10 de fevereiro último, um projeto de resolução recomendou ao Governo que avaliasse com urgência a criação de um estatuto de estudante específico para refugiadas impedidas de frequentar o ensino superior, tendo como prioridade as afegãs. Apresentado pelo Livre, foi aprovado com votos favoráveis de todas as bancadas e abstenção do partido Chega.
  2. A 10 de março seguinte, outra resolução recomenda ao Governo que “incentive as instituições de ensino superior a implementarem programas de acolhimento e apoio a estudantes, investigadores e professores, provenientes do Afeganistão, que sejam impedidos de estudar, estejam em risco ou forçados à deslocação”. De iniciativa do PAN, foi aprovada por unanimidade.

“Não se pode apregoar a igualdade de género e não se tentar fazer alguma coisa quando no Afeganistão ocorre uma discriminação absoluta, um verdadeiro apartheid de género”, diz Ana Santos Pinto.

A expressão, que condensa a impossibilidade de exercício de direitos por razão de género, é usada atualmente pelas Nações Unidas para qualificar o tratamento dos talibãs às mulheres. “Com este nível de proibição absoluta não me ocorre outro exemplo” de regime político ao qual se possa aplicar este rótulo, diz a professora de Relações Internacionais.

CRONOLOGIA DO CERCO TALIBÃ ÀS MULHERES

  • 26.12.2021 — Proibição das mulheres viajarem a mais de 72 km sem a companhia de “um familiar masculino próximo”.
  • 07.05.2022 — Obrigatoriedade de as mulheres se cobrirem totalmente em público, incluindo o rosto. Doze dias depois, a medida é aplicada também às apresentadoras de televisão.
  • 10.11.2022 — Mulheres proibidas de usar banhos comunitários, ginásios e parques públicos.
  • 24.12.2022 — Proibição das mulheres trabalhar em organizações não governamentais. Cinco dias depois, os talibãs acedem a que continuem a trabalhar em ONG do sector da saúde.
  • 04.04.2023 — Afegãs proibidas de trabalhar para as Nações Unidas. A 5 de maio, o secretário-geral António Guterres anunciou que as operações da organização continuam no país, apesar das mulheres não poderem trabalhar para a ONU e ONG.
  • 05.07.2023 — Interdita a entrada em salões de beleza femininos, a quem é dado um mês para fecharem portas.

Outra frente do programa destinada a “criar capacidade no Afeganistão” será o ensino online. “Neste momento, o que as raparigas têm no Afeganistão para contactar com o exterior — seja da sua casa, seja do país — é essencialmente um telemóvel com acesso à Internet. É irregular e instável, mas existe. Gostaríamos de providenciar cursos de ensino superior com recurso ao online. Permitir-nos-ia chegar a mais raparigas”, diz a responsável.

Para garantir o financiamento do projeto, a Nexus 3.0 — que já coordena um programa de bolsas para refugiados oriundos da Ucrânia — bateu a várias portas, garantindo verbas públicas e comunitárias, bem como apoio de instituições particulares de solidariedade social (IPSS) e mecenas.

As bolsas estão garantidas, faltando ainda uma verba complementar, a ser angariada por recolha privada, para custear despesas com viagens e alojamento, a necessidade de equipamentos informáticos ou de uma consulta num dentista, por exemplo. Nesta ligação é disponibilizada informação sobre como contribuir.

“Independentemente da sua área científica, todas as raparigas que submeteram candidatura têm o desejo de transformar o contexto das mulheres no Afeganistão”, conclui Ana Santos Pinto, que participou no processo de análise das propostas. “Para elas, é aquilo que, obviamente, é mais sensível.”

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 22 de agosto de 2023. Pode ser consultado aqui

As expressões populares com Braga são “mais velhas que a Sé de Braga” e põem o país a “ver Braga por um canudo”

Braga inspira um conjunto de expressões de uso corrente de norte a sul do país. Qual a sua origem e em que circunstância galgaram as fronteiras do Minho? As respostas a estas dúvidas implicam uma viagem ao passado da “cidade dos arcebispos”

Arco da Porta Nova, em Braga WIKIMEDIA COMMONS

No quotidiano português, em ocasiões de aperto, é frequente o recurso a expressões com o topónimo Braga para reagir à situação. Se a alguém for dirigido um “és de Braga!”, o visado sabe que se esqueceu de fazer algo. Se não alcançou algo a que se propôs, diz que ficou a “ver Braga por um canudo”. E ninguém fica impávido se for mandado “abaixo de Braga”.

Seja-se oriundo do norte, centro, sul ou ilhas, dificilmente haverá alguém que não conheça o significado destas expressões e até as use no seu dia a dia.

Em entrevista ao Expresso, o linguista João Carlos Brito, autor do “Dicionário de Calão do Minho” (2019), aventa uma explicação para o facto de estas expressões, mais do que serem típicas de Braga, terem galgado as fronteiras minhotas e conquistado o resto do país.

“Há que perceber a importância de Braga num passado não muito distante. Braga era a cidade mais importante em termos litúrgicos e era para onde se deslocavam praticamente todos os filhos mais velhos das famílias mais humildes que tinham algumas possibilidades”, diz este professor-bibliotecário no agrupamento de escolas de Gondomar Nº 1. “A hipótese de ascender socialmente era pôr o filho mais velho a estudar para padre. Então iam para Braga.”

Bracara Augusta, a “Roma portuguesa”

Em termos administrativos, Braga é a cidade mais antiga de Portugal. Fundada durante o reinado do imperador Augusto (27 a.C. – 14 d.C.), Bracara Augusta tinha o estatuto de capital de província no Império Romano.

Igualmente, com mais de oito séculos de existência, a arquidiocese de Braga é a mais antiga do país. Algumas instituições religiosas do município são mesmo anteriores à nacionalidade, como a Sé de Braga, solenemente consagrada à Virgem Maria a 28 de agosto de 1089.

No léxico português, todo esse legado de prestígio sobrevive através dos epítetos “Roma portuguesa” e “cidade dos arcebispos”. E sustenta outra expressão muito popular no país: “mais velho que a Sé de Braga”, que qualifica, normalmente num tom hiperbólico, algo de extremamente velho.

Mas sendo a Sé de Braga a mais antiga do país não é, curiosamente, a estrutura religiosa mais velha de Braga já que datam de 1071 e 1077 as primeiras referências documentais ao Mosteiro de Tibães.

“A língua é algo que tem a ver também com a sociologia. Aquilo que algumas pessoas dizem tem mais força do que outras. Neste caso, eram pessoas bem formadas e que tinham influência, numa sociedade extremamente rural. As suas palavras, as suas expressões propagam-se muito mais rapidamente entre quem as ouvia”, diz João Carlos Brito. “Durante todo o Estado Novo, e mesmo antes, as figuras de referência eram o regedor, o padre e o professor. Os padres eram muito respeitados e muitos deles eram oriundos de Braga.”

Paralelamente às raízes históricas e ao contexto sociológico, “às vezes as palavras e expressões são de tal forma criativas que acabam, pelas trocas que se fazem entre os falantes, por ser usadas em todo o país”. Na sua origem, há sempre histórias locais, contadas sem rigor científico e, por vezes, com múltiplas versões.

“ÉS DE BRAGA!” — Diz-se para alguém que deixou a porta aberta. A explicação decorre, com forte probabilidade, do Arco da Porta Nova, uma das entradas na antiga muralha da cidade que nunca teve porta. Mandada rasgar em 1512, numa altura em que já não havia guerras com a frequência de séculos anteriores e a própria cidade já se estendia para fora dos seus muros, não se considerou necessário ali colocar uma porta, como nas restantes sete. Quem ali vive ficou conhecido como aqueles que não fecham a porta.

“VER BRAGA POR UM CANUDO” — Significa não alcançar o que se deseja. A expressão remete para o monóculo localizado junto ao Santuário do Bom Jesus do Monte que permite observar a cidade de Braga, criando a falsa sensação de proximidade. Foi imortalizada por Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905), num álbum ilustrado de 1872, intitulado “Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro sobre a Picaresca Viagem do Imperador do Rasilb [anagrama de Brasil] pela Europa”, realizada entre maio de 1871 e março de 1872, e registada em “quadradinhos”. Num deles, D. Pedro II visita o Mosteiro da Batalha de bicicleta, noutro recebe cartões de sócio de todas as filarmónicas de Portugal e, num terceiro, espreita Braga por um canudo.

“MANDAR ABAIXO DE BRAGA” — Em bom português, significa mandar alguém à merda. A expressão estará diretamente ligada a um campo localizado fora da antiga muralha para onde corriam águas residuais e se varriam os lixos. Por se encontrar num nível mais baixo relativamente à cidade, esta zona imunda e mal-cheirosa ficava “abaixo de Braga”.

Um bracarense “muito à frente”

Talvez menos conhecida e de uso mais regional comparativamente às restantes, “ser como o sapateiro de Braga” engorda o capítulo das expressões curiosas. Trata-se de uma observação que decorre “provavelmente” da história do sapateiro José da Cunha Alves de Sousa (1837-1902).

“Era um indivíduo muito à frente”, diz João Carlos Brito. “Além de fabricar os seus próprios sapatos, destinados à população, às vezes até sem custos, numa altura em que todos andavam de tamancos, já fabricava uns sapatos de muita qualidade. Foi reconhecido internacionalmente.”

Pelo seu trabalho inovador, de qualidade, bem como pela comodidade que procurou propiciar aos bracarenses, obteve medalhas de mérito na Europa e nos Estados Unidos.

Diz-me como falas, dir-te-ei se és bracarense

Licenciado em Línguas e Culturas Modernas, pela Universidade de Aveiro, João Carlos Brito estuda regionalismos há 35 anos. “É uma paixão”, diz.

No “Dicionário de Calão do Minho”, tem compiladas 1700 entradas — entre regionalismos, idiomatismos, provincialismos, localismos, gírias e outras linguagens marginais e informais, para além de calão — que revelam a riqueza dos falares minhotos.

Estes cinco vocábulos, em particular, identificam um bracarense, em qualquer parte do mundo.

Estes cinco vocábulos, em particular, identificam um bracarense, em qualquer parte do mundo.

  • Forrinhos: corresponde ao sótão, onde normalmente se guardam muitas coisas.
  • Borronas: são os marcadores, também chamados canetas de feltro, que borram o papel.
  • Basculho: especialmente usada para identificar uma mulher de má fama ou pessoa desagradável.
  • Begueiro: tanto pode identificar um jumento (animal) como uma pessoa má ou, em ambos os casos, uma besta.
  • Marrafas: também designadas repas ou franjas, noutras partes do país, são uma mecha de cabelo dividida ao meio sobre a testa. Na sua origem, estará o dançarino italiano Marrafi, que se apresentou em Lisboa em 1791 e que usava assim o cabelo. “Alguém de Braga terá ido a Lisboa ver o espetáculo dele e depois de voltar terá comentado: ‘Tens o cabelo como o Marrafi’”, arrisca João Carlos Brito. “E, tal como um vírus, a palavra nunca mais parou.”

Artigo publicado no “Expresso”, a 22 de junho de 2023. Pode ser consultado aqui e aqui

Guimarães tem uma “missão” e com ela quer guiar o país pela via verde

A “cidade berço” está empenhada em atingir a neutralidade carbónica até 2030. Para tal, lançou o Pacto Climático de Guimarães e tem já no terreno “brigadas verdes”, dos oito aos oitenta, que correm as freguesias com mensagens de sustentabilidade ambiental. Junto à zona histórica, um bairro funcionará como “laboratório” de projetos nas áreas da energia, mobilidade e tratamento de resíduos

O município de Guimarães arregaçou as mangas e quer sobressair como um bom exemplo, em Portugal e fora de portas, em matéria de combate às alterações climáticas. A “cidade berço” é uma de 100 cidades europeias que integra a “Missão Cidades”, uma iniciativa que emana da União Europeia e que tem como objetivo alcançar a neutralidade carbónica até 2030.

“Será uma espécie de laboratório onde se possa testar projetos e boas práticas que sirvam de exemplo a nível europeu”, explica ao Expresso Sofia Ferreira, vereadora do Ambiente na Câmara de Guimarães.

Em Portugal, Lisboa e Porto também fazem parte do desafio, mas como realça a autarca, dada a diferença de escala entre as três cidades, o esforço de Guimarães será redobrado. Ser selecionada para este projeto, “foi para nós um momento muito importante”.

Do caderno de encargos, consta a elaboração de um pacto climático com a comunidade (cidadãos, empresas e instituições), que o município vimaranense já lançou, no início do mês, aproveitando o 50º aniversário do Dia Mundial do Ambiente.

Pacto Climático de Guimarães conta com a adesão de mais de 70 entidades – do Vitória Sport Clube à Universidade do Minho, da Casais à Brisa, do Hospital da Senhora da Oliveira ao Instituto de Design.

“Os subscritores comprometem-se, juntamente com o município, a adotar estratégias de curto, médio e longo prazo, tendentes à descarbonização as suas atividades”, explica a vereadora. “É um compromisso em que todos nos revemos e todos nos envolvemos.”

Brigadas à solta nas freguesias

Um dos projetos mais curiosos e mobilizadores são as “Brigadas Verdes”. Tratam-se de grupos informais compostos por vimaranenses de diferentes gerações, vinculados a paróquias, grupos de escuteiros, coletividades, clubes desportivos, IPSS’s, que saem à rua de colete amarelo no corpo e um discurso verde na boca.

Tanto participam na limpeza de terrenos como plantam árvores, como identificam focos de poluição ou sensibilizam moradores para a importância de adotarem hábitos verdes e tornarem-se eles próprios, individualmente, agentes da mudança. “A peça-chave de todo o processo é o cidadão.”

Dinamizadas pelas juntas de freguesia, as “Brigadas Verdes” são já 25. “O nosso objetivo é cobrir as 48 freguesias de Guimarães”, diz a vereadora. “Quanto mais próximo estivermos da comunidade, mais facilitado estará o trabalho de envolvimento e de responsabilização.”

Distrito C, de climaticamente neutro

A “Missão Cidades” possibilita que os participantes acedam a financiamento para alguns projetos. Guimarães já tem verba garantida (€1 milhão) para aplicar no “Distrito C”.

Trata-se de uma área junto à zona histórica, que está, neste momento, em processo de classificação com vista ao alargamento da zona classificada pela Unesco. Irá funcionar como “laboratório” para uma série de iniciativas na área da sustentabilidade ambiental.

“Este projeto do Distrito C é um compromisso com o carbono zero. Visa uma abordagem integrada nos domínios da energia, mobilidade e tratamento de resíduos.”

Outrora uma zona de referência da indústria dos curtumes, esta área foi requalificada no sentido de abrigar espaços voltados para o conhecimento. Hoje, ali localizam-se a Universidade das Nações Unidas, polos da Universidade do Minho, o Teatro Jordão, a pousada da juventude e “um complexo multifuncional na área da solidariedade social, com respostas ao nível de creches e de centros de dia”, diz a autarca.

O município tem também em vista a requalificação de uma antiga fábrica têxtil, onde irá funcionar a Escola de Engenharia Aeroespacial.

“Se este é um bairro onde temos vindo a trabalhar no domínio da cultura, da ciência, do conhecimento e da criatividade, queremos trabalhá-lo agora no sentido de ser um bairro climaticamente neutro”, diz Sofia Ferreira.

“Os projetos que aqui testarmos depois poderão ser replicados no restante território e servir de boa prática, não só em Portugal como a nível europeu.”

Para os subscritores do Pacto Climático, a conclusão do desafio está à distância de menos de sete anos, O objetivo antecipa em 20 anos aquele que a União Europeia estabeleceu para si própria.

Na Lei Europeia do Clima, a meta da neutralidade carbónica está colocada em 2050. O documento prevê que, entre 1990 e 2030, haja uma redução líquida de emissões de gases de efeito de estufa em pelo menos 55%.

Neste esforço de descarbonização, o tecido empresarial desempenha um papel preponderante. Para a Mundifios, por exemplo, signatária do Pacto Climático, o desafio não intimida. Com sede em Guimarães, esta empresa que é o maior trader ibérico de fios têxteis tem uma estratégia de sustentabilidade há anos.

“Vamos continuar a convergir para um impacto a tender para o zero, em termos de neutralidade carbónica. O objetivo é sempre tentar fazer com que o impacto no clima daquilo que vamos fazendo seja o mais invisível possível”, diz ao Expresso Francisco Ribeiro, gestor de projetos da Mundifios.

O negócio de compra e venda de fios não é propriamente poluente, mas a empresa não relaxa na hora de optar por soluções. Quando da recente construção das novas instalações, recorreu a 16 mil pés de plantas, em vez de betão, para suster o talude. “Há uma filosofia de raiz de tentativa de conseguir criar o menos impacto possível no meio ambiente”, reforça Francisco Ribeiro.

Membro, desde 2019, da United Nations Global Compact, a maior iniciativa de sustentabilidade empresarial do mundo, a Mundifios está comprometida, neste âmbito, com uma carta de dez princípios relativos a quatro áreas: direitos humanos, trabalho, ambiente e combate à corrupção.

Foco em quatro “R’s”

Para qualquer município, o desafio da sustentabilidade implica fazer a espargata entre a diminuição da pegada ecológica e o desenvolvimento económico do território.

Guimarães, em concreto, optou por uma economia circular, assente nos conceitos “reduzir, reutilizar, recuperar e reciclar”, em detrimento do fim de vida dos materiais.

“Neste sentido, estamos a fazer o mapeamento dos resíduos têxteis, que permita servir de suporte ao sistema de recolha seletiva deste resíduo”, diz Sofia Ferreira.

A reconversão de têxteis pós-consumo é algo que faz sentido numa zona nobre da indústria têxtil como é Guimarães. Um projeto recente, deu frutos a vários níveis.

“Fizemos a recolha de têxteis pós-consumo junto das escolas — o que funcionou como uma forma de pedagogia para os miúdos — e depois, com o Centro de Valorização de Resíduos e com uma spin-off da Universidade do Minho, esses resíduos foram tratados e reconvertidos em mantas para esplanadas do Centro Histórico.”

Segunda vida para os têxteis

Este projeto já resultou também em mantas para os animais do Centro de Recolha Oficial de Animais de Companhia (CRO) e em sacos para serem distribuídos à população nas bancas do mercado municipal, num esforço tendente a eliminar o plástico. “Este é um projeto que iniciamos e vamos consolidar. Há muitos têxteis para recolher.”

Ao longo dos anos, o compromisso de Guimarães com o ambiente tem revelado uma atitude resiliente. Depois de perder a corrida a Capital Verde Europeia 2020 (ganha por Lisboa), o município já voltou a apresentar candidatura, este ano, com vista à edição de 2025.

“Há uma vontade efetiva de transformar o território”, conclui Sofia Ferreira. “Uma vontade de fazermos o caminho no sentido de um futuro sustentável de carbono zero.”

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 22 de junho de 2023. Pode ser consultado aqui