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Aceita um vinho do Porto? O brinde é pelo Douro, que é património da Humanidade há 20 anos

A mais antiga região vitivinícola demarcada do mundo é, simultaneamente, uma lição. É a prova viva e duradoura da capacidade e determinação do ser humano perante a necessidade de rentabilizar recursos em ecossistemas agrestes, como o são as escarpas do Alto Douro Vinhateiro. Há 20 anos, as Nações Unidas reconheceram o seu “valor universal excecional” e elevaram-no ao patamar dos lugares especiais em todo o mundo. 2:59 JORNALISMO DE DADOS PARA EXPLICAR O PAÍS

Vai um Porto?

Há 20 anos, este foi um gesto que marcou o dia em Portugal. A 14 de dezembro de 2001, a UNESCO reconhecia o “valor universal excecional” do Alto Douro Vinhateiro e atribuía-lhe o selo de Património da Humanidade.

Quatro argumentos foram cruciais para essa distinção:

A região produz vinho há quase dois mil anos.

O território, marcado por declives acentuados e escassez de água, é uma lição sobre a capacidade e determinação do ser humano na otimização dos recursos naturais.

As componentes da sua paisagem são representativas de todas as atividades associadas à produção de vinho.

E, por fim, é um exemplo notável de uma região vinícola tradicional europeia.

A região do Douro tornou-se, então, o 11º sítio em Portugal a merecer a distinção de Património da Humanidade, a par com o Centro Histórico de Guimarães.

Em anos seguintes, mais cinco bens patrimoniais obteriam esse galardão.

Hoje, são 17 as referências portuguesas na Lista da UNESCO, que conta com mais de 1100 inscrições. Este reconhecimento cria neste locais um sentimento de pertença a uma lista exclusiva e uma chancela de qualidade para atrair turismo.

Mas para os países que os promovem, além de prestígio, esta distinção traz obrigações. A UNESCO está atenta ao estado de preservação dos locais e, em caso de degradação, pode mesmo retirar-lhes o título.
No caso específico do Alto Douro, os alarmes soaram a propósito da construção da Barragem do Tua, o que motivou uma visita à região de uma missão da organização que atribui estes galardões para avaliar o impacto da estrutura e decidir se manteria a classificação de património mundial da humanidade. Felizmente foi o que veio a acontecer.

Por todo o mundo, as barragens estão identificadas como uma potencial ameaça ao património. Mas muitos outros perigos já foram inventariados pela UNESCO.

Neste momento, esta organização cultural das Nações Unidas tem 52 exemplos identificados de “património em perigo”. São disso exemplo sítios tão distintos quanto os Budas de Bamyan, no Afeganistão, o Parque Nacional Virunga, na República Democrática do Congo, ou o Centro Histórico de Viena, a capital da Áustria. Portugal está ausente deste rol de preocupações.

Mas voltemos ao Douro.

A área distinguida pela UNESCO é uma estreita franja integrada numa área mais vasta que é a Região Demarcada do Douro.

Esta é uma das 14 regiões vitivinícolas existentes em Portugal e a mais antiga região demarcada do mundo.

Foi em meados do século XVIII que a primeira delimitação territorial das ‘Vinhas do Alto Douro’ definiu o primeiro modelo institucional de organização de uma região vinícola em todo o mundo. Um passo crucial para a projeção internacional do néctar a que também chamam… “vinho fino”.

Winston Churchill, o mais famoso primeiro-ministro britânico e um grande apreciador de vinhos e charutos, costumava terminar as suas jornadas diárias com um cálice de vinho do Porto.

Episódio gravado por Pedro Cordeiro.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 28 de dezembro de 2021. Pode ser consultado aqui

Hitler não queria matar os judeus, defende o primeiro-ministro de Israel

A violência entre israelitas palestinianos passou dos atos às palavras. Netanyahu afirmou que o responsável pelo Holocausto foi o Mufti de Jerusalém, enquanto na UNESCO os palestinianos lutam para que o Muro das Lamentações seja “parte integrante” da Esplanada das Mesquitas

O primeiro-ministro israelita defendeu, esta terça-feira, que Adolf Hitler não tinha intenção de matar os judeus durante o Holocausto. Segundo Benjamin Netanyahu, o responsável pelo extermínio de seis milhões de judeus foi Haj Amin al-Husseini, o Mufti de Jerusalém (líder religioso muçulmano), que sugeriu a ideia ao líder nazi alemão.

“Hitler não queria exterminar os judeus naquela altura, ele queria expulsá-los”, afirmou Netanyahu num discurso perante o Congresso Mundial Sionista, que decorre em Jerusalém entre terça e quinta-feiras. Descreveu, de seguida, o que se passou no histórico encontro entre as duas personalidades, a 28 de novembro de 1941, na Alemanha: “Haj Amin al-Husseini visitou Hitler e disse: ‘Se os expulsar, todos eles irão para lá [para a Palestina]’.” Segundo Netanyahu, Hitler terá perguntado: “O que devo fazer com eles?” O Mufti respondeu: “Queime-os”.

Não é a primeira vez que o primeiro-ministro israelita responsabiliza Al-Husseini pelo Holocausto. Em 2012, diante do Parlamento de Israel (Knesset), referiu-se ao Mufti como “um dos principais arquitetos” da “solução final”.

“Em nome dos milhares de palestinianos que combateram ao lado das tropas aliadas na defesa da justiça internacional, o Estado da Palestina denuncia estas declarações moralmente indefensáveis e inflamatórias”, reagiu Saeb Erekat, secretário-geral da Organização de Libertação da Palestina (OLP). “É um dia triste da história que o líder do Governo israelita odeie tanto o seu vizinho que esteja na disposição de absolver o criminoso de guerra mais reconhecido na história, Adolf Hitler, pelo assassínio de seis milhões de judeus durante o Holocausto. Netanyahu devia parar de usar esta tragédia humana para marcar pontos com fins políticos”.

Palestinianos ao ataque na UNESCO

As palavras de Netanyahu surgem no mesmo dia em que se espera que a UNESCO se pronuncie sobre uma polémica proposta de resolução apresentada por um grupo de países árabes. Nela pede-se que o Muro das Lamentações — o lugar mais sagrado do judaísmo — seja designado “parte integrante” do complexo onde se situa a Mesquita de Al-Aqsa — o terceiro lugar mais sagrado dos muçulmanos, em Jerusalém.

A iniciativa, que devia ter sido votada na terça-feira, foi adiada e desencadeou fortes críticas não só em Israel, mas também ao mais alto nível da organização. A diretora-geral da UNESCO, a búlgara Irina Bokova, lamentou a proposta, defendendo que a alteração do estatuto da Cidade Velha de Jerusalém e dos seus Muros, património da Humanidade reconhecido por aquela organização cultural, poderá “incitar a novas tensões”.

Fisicamente, o Muro das Lamentações (também chamado Muro Ocidental) e a Mesquita de Al-Aqsa estão integrados num complexo conhecido por Esplanada das Mesquitas — em rigor, os muçulmanos chamam ao espaço Al-Haram al-Sharif (literalmente Santuário Nobre) e os judeus Monte do Templo. Localiza-se na Cidade Velha de Jerusalém, na parte leste do município, anexada por Israel durante a Guerra dos Seis Dias (1967).

A atual vaga de violência entre israelitas e palestinianos foi agravada por rumores que davam conta de que Israel se preparava para controlar todo o Monte do Templo, incluindo a Mesquita de Al-Aqsa. Israel negou as acusações, afirmando não ter quaisquer planos para alterar o “status quo” do local — que os judeus podem visitar, mas não usar para orações.

Artigo publicado no “Expresso Online”, a 21 de outubro de 2015. Pode ser consultado aqui

Novas maravilhas

À entrada do milénio, todos os cidadãos do mundo são convidados a eleger as “7 Novas Maravilhas. Na Internet, 25 belos monumentos disputam o título

Cidade perdida de Machu Picchu, no Peru MARGARIDA MOTA

Bernard Weber é um exemplo vivo de como o sonho pode comandar a vida. A sua paixão pela aviação, pelas viagens à volta do mundo e pela produção de filmes colocaram este suíço, há 15 anos, num dilema: Que tema para o meu próximo documentário?

A resposta está acessível a todos e é hoje uma das iniciativas mais interessantes em curso na Internet — a eleição das “7 Novas Maravilhas do Mundo”. “Não se trata de substituir as antigas sete maravilhas, mas sim de usar o mesmo conceito levando a população mundial a eleger sete símbolos da unidade do Mundo Moderno no que diz respeito à diversidade cultural”, afirmou
Weber ao “Expresso”.

Até à hora de fecho desta edição, já tinham visitado o “site” e feito a sua escolha 5.668.444 cidadãos de todo o mundo, entre os quais mais de 25 mil portugueses. São 25 os monumentos a concurso — 17 escolhidos por um júri especializado e os restantes oito por exigência do público — todos construídos após o ano 200 a.C.

O património português não está contemplado. Os portugueses deixaram muito património no estrangeiro, dos tempos da colonização, mas nós tínhamos que nomear estruturas que sejam bem conhecidas, se não como é que as pessoas iriam votar?, refere o fundador da campanha.

Ruínas do Coliseu de Roma, em Itália MARGARIDA MOTA

Apesar de não reconhecer, oficialmente, a iniciativa — por ter um estatuto que contraria a selecção de património em detrimento do seu levantamento exaustivo —, a UNESCO “considera que se trata de um projecto muito valioso, porque promove o património da Humanidade”, diz Weber. Todas as “maravilhas” a concurso constam, aliás, da lista de património da Humanidade da UNESCO.

Os Estados Unidos e a Itália são os campeões das nomeações, com três cada: Empire State Building, a Ponte Golden Gate e a Estátua da Liberdade (EUA) e o Coliseu de Roma, a Torre de Pisa e o Palácio dos Doges (Itália). Porém, se a iniciativa terminasse hoje, apenas o anfiteatro romano seria uma das 7 Novas Maravilhas do Mundo, cuja lista actualizada é encabeçada pelo Taj Mahal (Índia), seguindo-se o Chichén Itzá (México), a Grande Muralha (China), o Coliseu de Roma (Itália), a Ilha da Páscoa, a Basílica de Santa Sofia (Turquia) e o Kremlin (Rússia).

Seria um resultado, no mínimo, surpreendente se se levar em consideração que ficariam de fora candidatas de peso como as mediáticas Torre Eiffel (França), Estátua da Liberdade (EUA) ou Torre de Pisa (Itália) ou sítios tão emblemáticos como o Palácio Potala (Tibete), Machu Picchu (Peru), ou o Angkor (Cambodia).

É curioso, aliás, que, sendo os peruanos quem mais votou — com 24,45% do total de votos expressos até ao momento —, a sua maravilha (Machu Picchu) não seja eleita. Contrariamente, não é somente graças aos indianos (4,99% dos votos) que o Taj Mahal lidera as preferências, o que vem ao encontro do desejo de Weber de que as escolhas sejam verdadeiramente universais (e não nacionais).

“O Tesouro”, o templo mais famosa de Petra, na Jordânia MARGARIDA MOTA

Os portugueses não são, até ao momento, dos mais entusiastas, mas também não revelam uma total indiferença: ocupam o 20º lugar (com 0,45%, o que corresponde a cerca de 25 mil votantes), de uma lista de 238 países votantes e de onde se salienta, a título de curiosidade, a 151ª posição de Timor-Leste, com 0,003% dos votos.

Não está ainda definida uma data para o fim da votação, mas dificilmente será antes de 2003. Para Bernard Weber, é importante que continue até haver um resultado representativo de todo o mundo. A Ásia, por exemplo, ainda não participou. A China contribuiu com cerca de dois mil votos, o que é ridículo”. “Na próxima Primavera, estamos a planear acções de promoção, como por exemplo sobrevoar a Grande Muralha num balão”.

Não se trata de substituir as sete maravilhas da Antiguidade, mas de eleger sete símbolos da unidade do Mundo Moderno

Foi em 200 a.C. que Filon de Bizâncio, um engenheiro grego, elaborou a lista das 7 Maravilhas do Mundo, como um símbolo da unidade da Antiguidade Clássica. Das sete — as Pirâmides de Gizé, o Farol de Alexandria, os Jardins Suspensos da Babilónia, a Estátua de Zeus, o Templo de Artemis, o Colosso de Rodes e o Mausoléu de Halicarnasso — apenas as Pirâmides estão de pé e há dúvidas sobre se os Jardins Suspensos da Babilónia terão de facto existido.

A entrada num novo milénio surge, assim, como o momento perfeito para uma iniciativa deste género que, além do simbolismo histórico, possui uma vertente pedagógica de inegável interesse. Cada votante poderá registar-se como membro da Comunidade das 7 Novas Maravilhas, uma espécie de amplo grupo de trabalho em defesa da preservação do património mundial, que já começou a dar frutos.

Troço da Grande Muralha da China MARGARIDA MOTA

Há cerca de um mês, arrancou um projecto visando nada mais nada menos do que a reconstrução dos budas de Bamiyan, destruídos pelo regime talibã em Março. Se tudo correr como o previsto, as estátuas serão reconstruídas com um décimo do seu tamanho original e expostas no Museu Afegão em Bubendorf (Suíça).

Aos 49 anos, Bernard Weber não deixa que os seus sonhos morram às mãos da inércia, por isso tem já em mente novos projectos: os 7 Símbolos da Paz, as 7 Maravilhas da Natureza e as 7 Maravilhas da Técnica.

Fala de todos eles com grande entusiasmo e quando se lhe pergunta quais foram as “maravilhas em que votou, não evita uma sonora gargalhada e responde: “Não quero prognosticar, mas estou muito feliz que em primeiro lugar esteja o Taj Mahal. É o símbolo do amor e da paixão e isto vai ao encontro da forma como promovemos as Maravilhas — que cada uma tenha uma qualidade do ser humano.”

Nota: A 7 de julho de 2007, foram anunciadas as 7 Novas Maravilhas do Mundo: Chichen Itza (México), Estátua do Cristo Redentor (Brasil), Coliseu (Itália), Grande Muralha (China), Machu Picchu (Peru), Petra (Jordânia) e Taj Mahal (Índia).

Artigo publicado no suplemento Vidas do Expresso, a 1 de dezembro de 2001