Um dos principais suspeitos do ataque ao centro comercial de Nairobi é uma britânica de 29 anos. Há algum tempo que Samantha Lewthwaite está associada a atividades terroristas
Samantha Lewthwaite é uma britânica de 29 anos suspeita de ser um dos principais operacionais da célula terrorista que atacou o centro comercial de Nairobi.
Branca, loira e mãe (as informações sobre o número de filhos variam entre os dois e os quatro), ela é a viúva de Germaine Lindsay, um dos quatro bombistas suicidas dos atentados de 7 de julho de 2005, em Londres (56 mortos).
As suspeitas sobre Samantha decorrem de testemunhos de sobreviventes, que afirmam ter visto “uma mulher branca, velada” entre os sequestradores. Alguns dizem mesmo que a mulher era a voz de comando entre os terroristas.
Segundo o diário britânico “The Mirror”, o grupo terrorista Al-Shabaab — que reivindicou o ataque — louvou, numa mensagem no Twitter, a “irmã branca” e manifestou orgulho em te-la nas suas fileiras. A conta @HSM_PRESS2 foi, entretanto, suspensa.
Uma jovem normal
Filha de um militar, Samantha é oriunda de Banbridge, County Down, na Irlanda. Aos 15 anos, converteu-se ao Islamismo e, em 2002 — tinha 18 anos —, casou-se com Germaine Lindsay, nascido na Jamaica, também ele, um convertido à religião muçulmana.
Educado pela mãe, na área de Huddersfield, West Yorkshire, Germaine (conhecido por Abdullah Shaheed Jamal) nunca escondeu os seus pontos de vista extremistas, tendo mesmo alarmado alguns professores pelas suas tentativas de radicalizar alunos mais novos.
Em setembro de 2003, o casal estabeleceu-se em Aylesbury, Buckinghamshire. “Ela era uma rapariga média, britânica, jovem, normal. Tinha uma grande personalidade. Não tinha muita confiança”, testemunha Raj Khan, vereador do distrito de Aylesbury, que conhece a família de Samantha.
Após o 7 de julho de 2005, onde Germaine matou 26 pessoas após fazer-se explodir na estação de metro de King’s Cross, Samantha foi dada como fugitiva, juntamente com os filhos.
Um rasto de atividades suspeitas
Em dezembro de 2011, a polícia queniana invadiu um apartamento em Mombaça, onde encontrou químicos semelhantes àqueles usados nos ataques de Londres. O apartamento estava arrendado em nome de Samantha, que, porém, não foi capturada.
No local, foi detido um britânico, convertido ao Islão, Jermaine Grant, que afirmou trabalhar para Samantha. O julgamento de Grant, de 30 anos, começou hoje, em Mombaça, sob fortes medidas de segurança.
A 29 de fevereiro de 2012, o influente “The Times” publicou uma foto de Samantha na capa e titulou: “Viúva de bombista do 7 de julho perseguida em alerta terrorista”.
O artigo referia que Samantha, que usava várias identidades, incluindo a verdadeira, era procurada pelas autoridades quenianas por suspeitas de envolvimento em atividades terroristas. No mês seguinte, Samantha terá fugido para a Somália.
“Em artigos na imprensa, Lewthwaite tem sido descrita como uma financiadora, recrutadora e treinadora da Al-Qaeda e a criadora de um esquadrão jihadista feminino em África”, escreve o “Christian Science Monitor”. “Ela tem sido acusada de orquestrar ataques com granadas em centros de oração de ‘infiéis do Islão’ e cre-se que está por detrás do ataque num bar de Mombaça durante a transmissão de um jogo (Inglaterra-Itália) do Euro 2012.”
Um dos falsos passaportes que Samantha Lewthwaite terá usadoSamantha Lewthwaite, de 29 anos, nasceu na Irlanda do NorteSamantha é viúva de um dos bombistas suicidas do atentado de 7 de julho de 2005 em LondresAs autoridades quenianas acreditam que a jovem ajudou a organizar o atentado ao centro comercial WestgateHá relatos de sobreviventes que dizem ter visto “uma mulher branca, velada” entre os sequestradores
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 24 de setembro de 2013. Pode ser consultado aqui
Partido islamita que apoia o Presidente egípcio deposto Mohamed Mursi acaba de ser banido por decisão judicial
As atividades da Irmandade Muçulmana foram hoje totalmente banidas no país por um tribunal egípcio, que assim intensifica a campanha para debilitar o partido islamita que apoia o Presidente Mohamed Morsi.
“O tribunal ilegaliza todas as atividades da Irmandade Muçulmana e das suas organizações não-governamentais”, impedimento também aplicado a “todas as ações de outras organizações associadas”, disse hoje o juiz-presidente do tribunal Mohammed al-Sayed, citado pela Reuters.
O tribunal administrativo ordenou ainda ao Governo interino do Egito que confisque os fundos da Irmandade e que estabeleça uma comissão para administrar os seus ativos que foram congelados até que um eventual recurso seja apreciado. Fonte da Irmandade disse ao jornal egípcio “Ahram Online” que o grupo vai recorrer da decisão.
A Irmandade Muçulmana foi fundada no Egito em 1928 e funcionou, na maior parte da sua história, de forma ilegal. Com um eleitorado fiel na ordem dos 20%, o grupo ganhou relevância política na era pós-Mubarak, tendo o seu braço político — o Partido Liberdade e Justiça — vencido as eleições legislativas e presidenciais. Em março passado, a Irmandade foi legalizada enquanto Organização Não-Governamental.
Após o golpe militar de 3 de julho de 2013, que afastou o islamita Mohamed Morsi do poder, as autoridades egípcias desencadearam uma campanha de repressão contra o grupo. As manifestações permanentes de simpatizantes da Irmandade, em duas praças do Cairo, que exigiam a restituição de Morsi, foram violentamente reprimidas (centenas de mortos) e os principais dirigentes da organização detidos. Entre eles, estão o guia supremo Mohamed Badie, o seu vice Khairat El-Shater, o secretário-geral Ezzat Ibrahim e ainda Mohamed El-Beltagy, outro dos principais líderes. Todos são acusados de incitamento à violência.
Desde então, a ilegalização da Irmandade passou a ser apenas uma questão de tempo, estando apenas dependente de enquadramento legal. A 2 de setembro, a Autoridade de Comissários do Estado — um órgão que aconselha o Governo, de forma não vinculativa, em questões legais — recomendou a dissolução da Irmandade com base em acusações que a associavam a milícias armadas.
Artigo escrito com Paulo Luís de Castro.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 23 de setembro de 2013. Pode ser consultado aqui
Inspetores das Nações Unidas que investigaram as suspeitas de uso de armas químicas na Síria entregaram o relatório a Ban Ki-moon
O relatório dos inspetores das Nações Unidas sobre o incidente de 21 de agosto, nos arredores de Damasco confirma “o uso de armas químicas durante o conflito na Síria, visando também civis, incluindo crianças, numa escala relativamente grande”.
O documento, tornado público esta segunda-feira, refere que “as amostras ambientais, químicas e médicas recolhidas fornecem provas claras e convincentes de que foram usados mísseis terra-terra contendo o gás nervoso sarin” em três áreas da região de Ghouta.
Em apoio destas conclusões, os inspetores referem cinco factos:
— Foram encontrados mísseis terra-terra rebentados contendo gás sarin;
— Perto dos locais de impacto dos mísseis, em áreas onde pacientes foram afetados, o ambiente estava contaminado com sarin;
— Mais de cinquenta entrevistas dadas por sobreviventes e profissionais de saúde confirmaram os resultados médicos e científicos;
— Os diagnóstivos a vários pacientes / sobreviventes confirmaram a intoxicação com um composto organofosforado;
— Amostras de sangue e urina recolhidas dos pacientes acusaram positivo na análise ao Sarin.
Este relatório foi entregue ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, que, de seguida, o apresentou no Conselho de Segurança das Nações Unidas. “Este é o caso de uso de armas químicas contra civis confirmado mais significativamente desde que Saddam Hussein as usou em Halabja, em 1988” (contra a minoria curda no Iraque).
Alepo. Uma cidade-ruína dividida e bombardeada diariamente. Jihadistas andam de BMW e a comida e a água valem ouro
Majad posa junto às ruínas em que se transformou a sua casa, bombardeada, e onde morreram oito pessoas GABRIEL CHAIM
A possibilidade de um ataque dos Estados Unidos à Síria tirou as imagens da guerra dos ecrãs, como se uma trégua tivesse entrado em vigor enquanto Barack Obama decidia o que fazer. Porém, na Síria, as bombas nunca deixaram de cair.
“Todos os dias ouço mais de dez bombas. Durante a noite, os caças do regime rondam, intimidando as populações. Nunca se sabe qual vai ser o próximo alvo”, relata ao Expresso Gabriel Chaim, fotógrafo brasileiro de 31 anos, em Alepo, maior cidade síria, disputada há meses entre guerrilha e exército.
Várias vezes, Gabriel dormiu com roupa e botas, preparado para fugir do quarto. “Quando a noite cai, sei que vai ser longa. O barulho das bombas faz tremer as paredes. Parece que entra no corpo.” À noite, os motoristas guiam de faróis apagados para não se tornarem alvos.
A maior parte da cidade está nas mãos de Assad, cujo poder aéreo — que os rebeldes não têm — faz toda a diferença. Gabriel circula pelo lado controlado pelos rebeldes. “Alepo está toda destruída. Há muitas pessoas armadas, misturadas com a população.”
Durante o dia, vive-se uma aparente normalidade. “Os mercados abrem e muita gente aproveita para fazer as compras básicas. Por vezes, eu estou em mercados e, ao fundo, ouço barulhos de bombas. Ninguém se preocupa muito. Talvez a cidade já esteja habituada a tantas bombas e mortes. Passou a ser rotina.” Não há falta de alimentos nos mercados. Mas por causa da guerra, a libra síria desvalorizou muito. “Tudo está mais caro, às vezes 700%.” A eletricidade falha muitas vezes ao dia e o preço da água aumentou muito. Gabriel só tomou o primeiro banho ao terceiro dia em solo sírio. A internet é melhor após a meia-noite, contrabandeada desde a Turquia.
Gabriel entrou no país no passado dia 4, dentro de uma ambulância. Na Síria, acompanhara os trabalhos de uma ONG síria que distribui bens de primeira necessidade às populações, gere abrigos e apoia o funcionamento de escolas. O brasileiro visitou cinco escolas improvisadas em subterrâneos de casas. No caso de caírem novas bombas, professores e alunos estão mais seguros abaixo da terra. As verdadeiras escolas foram bombardeadas ou abandonadas.
Professores pagos com comida
“Os professores recebem apenas comida como forma de pagamento. Comida básica que, dizem, não é suficiente”, conta Gabriel, que nos primeiros dias comia apenas feijão enlatado e pão. “Com a guerra, a comida tornou-se um luxo. Muitos professores já foram embora. É difícil encontrar pessoas que aceitem dar aulas em troca de comida básica e arriscando a própria vida. Algumas organizações estrangeiras, sobretudo italianas, começaram a ajudar. Alguns professores recebem 20 euros…”
Além dos dois milhões de refugiados registados pelas Nações Unidas — sírios que atravessaram a fronteira para fugir à guerra —, a Síria vive um drama humano ainda maior dentro de portas: a guerra já fez cerca de 4,5 milhões de deslocados internos.
Gabriel Chaim anda sempre acompanhado por três seguranças do Exército Livre da Síria (ELS), o principal grupo rebelde. A presença de grupos jihadistas, com ligações à Al-Qaeda, salta à vista, mas além do ódio a Bashar al-Assad as duas fações pouco têm em comum. “Andam nas mesmas ruas, mas não lutam juntos. OELS não gosta da Al-Qaeda, considera-a um grupo radical. Porém, lutam para derrubar o poder e respeitam-se, como irmãos de armas.” Em Alepo, há também jihadistas da República Islâmica do Iraque.
Gabriel visitou o quartel-general da Al-Qaeda, um antigo palácio de cinco andares, protegido por barricadas e muito movimentado, cheio de gente armada. “A Síria tornou-seumreduto da Al-Qaeda”, diz. “Andam em carros importados, BMW e outros carros caros, geralmente pretos, diferentes de tudo o resto. Os carros do ELS são velhos.”
Se Obama atacar, Assad ataca
Entre os combatentes do ELS há mecânicos, padeiros, cidadãos comuns que, de um dia para o outro, pegaram em armas para lutar contra o regime. Gabriel diz que estes rebeldes não querem a Al-Qaeda na Síria, nem desejam uma intervenção militar norte-americana. “Dão sempre o exemplo da invasão do Iraque. Dizem que os Estados Unidos vão entrar, devastar tudo e, depois de acabar com a Síria, vão embora.”
Por outro lado, receiam que Assad use as armas químicas como retaliação por um ataque dos EUA. “Todos falam nisso, demonstrando certeza que é o que vai acontecer. Mal os EUA lancem a primeira bomba, Assad lança uma ofensiva com mísseis Scud com ogivas químicas. Eles dizem que o regime tem 500 e que já usou cerca de 100.”
Oriundo de São Paulo, este filho de libaneses elegeu como “prioridade” das suas viagens pelo mundo o contacto com populações refugiadas — o que já aconteceu na Jordânia, Irão, Iraque, Faixa de Gaza e Turquia. Gabriel tem um projeto chamado “Kitchen4Life” que combina a paixão pela fotografia (que estudou em Itália), pela gastronomia (que estudou no Brasil) — fez uma especialização em Fotografia de Comida no Dubai — e a solidariedade para com as vítimas de conflitos e da intolerância. “Não vim para cá para fotografar a morte. Vim fotografar a vida, para tentar sensibilizar o mundo para as consequências da guerra.”
Faz hoje uma semana, Gabriel viveu algo que jamais esquecerá. “Fui até um hospital perto da frente de batalha. A maioria dos doentes eram combatentes. Entrevistei um médico e depois fomos fumar um cigarro, fora do hospital. Subitamente, um caça começou a disparar a menos de um quilómetro. Assustámo-nos e fugimos para dentro. Dez minutos depois, começaram a chegar os feridos, rebeldes do ELS. Sem recursos, o médico estava desesperado, tentando salvar aquelas vidas. Nenhum sobreviveu. Após morrer o último, uma enfermeira, numa sala ao lado, chamou-me. Queria mostrar-me algo. Um bebé acabava de nascer…”
Uma criança acaba de nascer num hospital onde todos os feridos de um bombardeamento ali perto acabavam de morrer GABRIEL CHAIM
QUEM SÃO OS JIHADISTAS?
Domenico Quirico, jornalista italiano, esteve cinco meses refém de grupos jihadistas na Síria. Libertado há uma semana, descreve “o surgimento de gangues, como na Somália, que se aproveitam do Islão e do contexto revolucionário para controlar partes do território, saquear, raptar pessoas e encher os bolsos”. Um dos grupos era liderado pelo emir Abu Omar, que disfarçava tráficos e atividades ilícitas com uma aura islamita. “Essa fação faz parte do Conselho Nacional Sírio (oposição reconhecida pelo Ocidente) e os seus representantes reúnem-se com governos europeus.” Quirico foi mais bem tratado enquanto esteve cativo da Frente Al-Nusra, o maior grupo jihadista. “Davam-me da comida deles. Levam uma vida simples. São radicais, islamitas fanáticos que querem tornar a Síria um Estado islâmico e transformar o Médio Oriente, mas face aos inimigos — nós, cristãos ocidentais — sentem honra e respeito.” Muitos carcereiros eram “jovens desequilibrados que aderiram à revolução por esta ter passado a ser feita por grupos, a meio caminho entre o banditismo e o fanatismo”. Jovens que seguem quem lhes dá armas e dinheiro, vestem Adidas e fumam Malboro. “Eu, que não fumo nem bebo, tinha um ar mais islâmico do que a maior parte deles.”
Artigo publicado no “Expresso”, a 14 de setembro de 2013
Um fotógrafo brasileiro descreve ao Expresso, desde Alepo, como se vive numa cidade destruída, bombardeada diariamente pelos caças de Assad
Gabriel Chaim é dos poucos repórteres a noticiar a partir do interior da Síria. Ele conta como, aos poucos, as populações habituaram-se ao barulho das bombas e como tentam improvisar uma vida normal. Os professores, por exemplo, dão aulas em subterrâneos e recebem comida como forma de pagamento.
Parte da cidade está ocupada pelos rebeldes e, nas ruas, há muita gente armada, designadamente jihadistas. Distinguem-se dos restantes rebeldes, entre outras coisa, por circularem em carros de luxo.
Apesar do ódio a Bashar al-Assad, os sírios não querem que os EUA ataquem. Têm medo que se repita o que aconteceu no Iraque. E também que o ditador retalie sobre o povo com armas químicas.
Artigo publicado no “Expresso Online”, a 14 de setembro de 2013. Pode ser consultado aqui
Jornalista de Internacional no "Expresso". A cada artigo que escrevo, passo a olhar para o mundo de forma diferente. Acho que é isso que me apaixona no jornalismo.